quarta-feira, 27 de dezembro de 2006

A vez da TAM - Jayme Copstein

O que é a Anac, a Agência Nacional de Aviação Civil, não se precisa dizer. Bastam trechos das primeiras informações passadas aos jornais pelos auditores que tentam responsabilizar a TAM pela crise da aviação civil.
Segundo a Folha de São Paulo, foi “excesso de ousadia” como se, por comparação, uma mulher pudesse estar excessivamente grávida. O que chama a atenção na arremetida contra a TAM é que repete a campanha para liquidação da Varig, como se a bruxa tivesse se trasladado de uma empresa a outra.
Os auditores, apesar de não terem feito ainda o levantamento, portanto sem dados concretos para afirmar o que quer que seja, acusam a TAM de overbooking, a venda de assentos acima da capacidade. Ou se trata de ignorância pura ou de malícia deslavada. O overbooking existe há muito tempo em todo o mundo, para prevenir perdas das empresas e poupar despesa adicional aos passageiro que se atrasam para os seus vôos. Nunca foi causa de balbúrdia como esta a que assistimos no Brasil.
O que paira no ar é uma pergunta: por que a investigação só se ocupa da TAM que hoje detém mais de 50% do mercado? Acaso a Gol, a menina dos olhos, o ai-jesus de José Dirceu, não faz overbooking e seus passageiros não sofrem, como os demais, o desconforto da bagunça dos aeroportos?
Ou será que a Gol nasceu filha amada, empelicada de capitais colombianos, enquanto as gatas borralheiras Varig e Transbrasil foram trucidadas pelos sucessivos governos, a partir de Zé Sarney, que inaugurou a lata do lixo onde jaz hoje o melhor da história deste país?
Terá chegado a vez da TAM?

terça-feira, 26 de dezembro de 2006

Quem paga, manda - Jayme Copstein

Não é só através de regulamentações manhosas, com fingidos moralismos que se estrangula a liberdade de expressão. Há uma outra velhacaria na qual se especializaram os governantes brasileiros – o suborno dos meios de comunicação, dissimulado sob a capa de propaganda.
É o jornalista Carlos Brickmann, de São Paulo, quem chama a atenção sobre o assunto, em artigo para o Observatório da Imprensa.
Brickmann pergunta:
“Qual o maior anunciante do Brasil? Será a Coca-Cola, a Ambev? Talvez a Unilever, com todas as suas marcas? Ou as onipresentes Casas Bahia, com seu ‘quer pagar quanto?’ Seriam as campanhas eleitorais, caso os horários fossem pagos? Só a que levou Lula à reeleição custou mais de R$ 100 milhões!”
Brickmann responde. Prestem, a atenção no restante do artigo:
“Nada disso: o maior anunciante do Brasil, por incrível que pareça, é o Governo Federal. Em 2007, a verba a ser torrada em publicidade é de R$ 412 milhões! E, considerando-se que o Governo não tem concorrentes nem vende nada, para que irá gastar tanto dinheiro – seu, meu, nosso dinheiro - em propaganda?
“Não, não estamos esquecendo as empresas estatais que disputam o mercado. Estas têm verbas próprias, além dos R$ 412 milhões. O Banco do Brasil tem quase R$ 200 milhões para gastar, muito mais do que o Bradesco – e o Bradesco, consistentemente, ano após ano, tem conseguido resultados melhores. Há meio milhão para o Conselho Nacional de Justiça; há R$ 400 mil para o Senado - como diria o poeta Ascenso Ferreira, “para que? Para nada.
“Que é que podem propagandear o Senado, ou o Conselho Nacional de Justiça? O Ministério da Defesa terá verba publicitária de meio milhão de reais. Seu principal problema, no momento, é a crise dos aeroportos. De que adianta gastar dinheiro, o nosso dinheiro, para explicar o inexplicável?
“As publicações sempre tiveram de conquistar o público, para depois conquistar anunciantes. A coisa parece agora mais simples: circulação, qualificação do público, número de leitores por exemplar, custo por telespectador, nada disso é muito importante. Com toda essa verba, basta apoiar o Governo e seus políticos preferidos. A gente paga. E eles mandam.”
Os artigos de Carlos Brickmann são encontrados também em sua página na Internet – www.brickmann.com.br. Leitura obrigatória para quem deseja mergulhar mais fundo nos bastidores da mídia, são remetidos, por e-mail, a quem solicitar para brickmann@brickmann.com.br.

Desfaçatez - Jayme Copstein

O problema dos aeroportos brasileiros é apenas ser a bola da vez. Quando for resolvido, e o será, como sempre, com improvisos e jeitinhos, jogos de cintura e quebradores de galho, virão outros, e outros, e outros, como os muitos que já ficaram lá para trás.
O que parece existir aí é a nossa absoluta falta de modéstia. Deus é brasileiro e somos todos seus maiores profetas. É a semente de tragédias como a da nova governadora do Rio Grande do Sul, perdida em um beco sem saída, mesmo antes de assumir o Piratini, ou de comédias, como a do presidente da República, que agora promete comparar-se consigo mesmo, como se houvesse alguma utilidade em forçar a mão direita contra a mão esquerda, a não ser em antigos manuais de ginástica, hoje completamente fora de moda.
A desculpa mais calhorda desta crise do transporte aéreo é o crescimento da demanda. Terá sido o Brasil o único país do mundo em que a demanda por transporte aéreo cresceu ou onde mais ela cresceu? Terá acontecido da noite para o dia, tão inesperadamente como um tsunami que leva tudo de roldão?
O que desejavam os sucessivos governos que jamais planejaram o atendimento da multidão deslocada das rodoviárias para os aeroportos? Que não os usassem, mas apenas os mostrassem às crianças, nos passeios de domingo, como monumentos nacionais, enquanto era contada a história gloriosa de Santos Dumont?
É muita desfaçatez discursar grandiloqüências para enfeitar a realidade. Cães e gatos de apartamento arranham o soalho, simulando esconder os dejetos sob uma camada fictícia de terra. Mas eles são apenas animais irracionais.
terça-feira, 26 de dezembro de 2006

sexta-feira, 22 de dezembro de 2006

Sem medo de ser feliz - Jayme Copstein

O primeiro canhonaço coube à imprensa – sempre ela. Segundo o grande perito em aviação civil, companheiro Milton Zuanazzi, não tinha nada, era tudo invenção dos contumazes fofoqueiros que as democracias teimam em chamar de jornalistas.
No seguimento, entrou no pelourinho o mau tempo, com toda a certeza “como nunca se viu na história deste país”. Como os aviões, por mais de meio século, flanaram como garças, por esses céus de anil, com amor varonil etc. etc., foge à compreensão dos pobres mortais.
Generalizada a bagunça, a culpa passou às empresas aéreas. Como a velha Varig, com todas as mazelas, dava conta do recado?
Pura ilusão. Éramos alienados, pensávamos todos ser passarinhos. Voávamos sem consciência – que perigo! – sem ter asas de nascença. Já viram coisa mais politicamente incorreta do que esta?
Ainda bem que o nosso grande líder devolveu nossos pés ao chão. Bem verdade, andamos trocando caneladas no tumulto dos aeroportos congestionados, mas, ora que insignificância, mera penitência, por termos sido conduzidos ao paraíso.
Ou será que vocês ainda não perderam o medo de ser felizes?

quinta-feira, 21 de dezembro de 2006

Mágica besta - Jayme Copstein

A notícia de que o novo salário mínimo, de R$ 380, terá reflexos sobre as aposentadorias, é correta apenas em parte e induzirá beneficiários da Previdência Social a erro. Os magnânimos 8,5% por cento de aumento, a vigorar a partir de abril do ano que vem, só aumentam também os benefícios menores, os de 350 reais, correspondentes ao salário percebido por trabalhadores sem qualificação, assim mesmo em áreas onde a miséria seja feroz. Fora disso é difícil encontrar quem queira trabalhar por tão pouco dinheiro..
Todos os demais benefícios da Previdência Social ganharão apenas os 5% anunciados pelo Governo em fins de novembro. É que a reforma da Previdência de 1998 desvinculou aposentadorias e pensões do salário mínimo. Desde então, os benefícios têm sido corrigidas por índices para supostamente compensar ao menos à inflação.
No Brasil, entretanto, existe uma mágica besta chamada “O gato comeu”, criada pelo grande prestidigitador Luiz Carlos Bresser Pereira. Disso resulta, oito anos depois da reforma, em 40% de perdas – quase a metade – para os aposentados da classe média.
E aí vem o governo com gabolices de justiça social, argumentando com o aumento do rendimento médio das classes D e E. De novo a mágica besta: não foram as classes D e E que tiveram tão substancial ganho de seus proventos. Foi a transferência, pelo empobrecimento, de grande parte da classe B e de toda a classe C para D e E, que gerou a ilusão de enriquecimento dos mais pobres.
É pura mágica besta dos salvadores da pátria.

quarta-feira, 20 de dezembro de 2006

A copa dos deuses - Jayme Copstein

Que este mundo é uma bola, está decidido. O cardeal Tarcísio Bertone, secretário do Vaticano, sugeriu a possibilidade de a Santa Sé ter a sua própria equipe de futebol, à altura do Roma ou a Inter de Milão. Como não acrescentar aí o Inter de Porto Alegre, que ao contrário do xará italiano, é macho, sim senhor, e ainda por cima campeão do mundo?
Fica-se imaginando que, para equilibrar a disputa, a Fifa teria de modificar suas regras, tal como a Federação de Automobilismo faz quando alguém inventa um carro milagroso. Já pensaram vocês em uma seleção que tivesse São Pedro e São Paulo na zaga, Cosme e Damião no meio- de-campo, isso se o técnico São Baladão decidisse pelo velho dois-dois-quatro-dois, ainda no goal com São Judas Tadeu, o santo das impossíveis?
O problema estaria colocado quando essa seleção do Vaticano enfrentasse a seleção da Bahia com Xangô, Exu, Oxalá e Ogum no meio-de-campo, se o técnico Caboclo Ventania optasse pelo antigo dois-quatro-dois-dois. Quem venceria este encarniçado encontro das esquadras celestiais?
Nunca ficaremos sabendo. Tão logo o cardeal Bertone anunciou a boa nova, o Vaticano divulgou desmentido formal, com a clássica desculpa de que ele tinha sido mal interpretado. Jamais veremos São Genaro dar seus chapéus em Oxossi nem Oxumaré marcar seu gol de placa em São Brederodes.
Que pena!

terça-feira, 19 de dezembro de 2006

Onde mora o pecado - Jayme Copstein

Não é só o código de porta de cadeia, feito para garantir impunidade a quem possa pagar especialistas na endoidecida legislação de execuções criminais, que afoga o Brasil em inaudita violência. É o feudalismo político que transforma áreas vitais –a segurança, por exemplo – em latifúndios a serem distribuídos como quinhão eleitoral.
Resulta daí uma Polícia sem comando, dividida em seus próprios feudos, mal equipada, mal treinada e tão mal-paga em seus escalões inferiores, que empurra os mais humildes servidores ao convívio dos criminosos, em vilas periféricas onde a Polícia não chega.
Ali, eles não podem dizer que são policiais. Haverá cena mais patética que a de um PM obrigado a envergar a farda longe de casa, para não ser morto pelos marginais da vizinhança?
Se ele, “a autoridade”, é obrigado a tão humilhante agachamento, o que resta aos demais vileiros, que só existem para votar e pagar os impostos cobrados até mesmo de uma fatia de pão dormido, tudo para sustentar a malta de gatunos de alto coturno que refocilam em mensalões, sanguessugas e outras grossas bandalheiras sem batismo?
É só conferir a lista de protagonistas de latrocínios, seqüestros e tudo o mais que está nos apavorando. São insuspeitos empregados domésticos, vigias, biscateiros, desempregados, gente humilde, desprotegida e acossada no dilema de matar para não ser preso ou morrer por desobediência ao bandido do morro.
Aí, sobrevêm indignados clamores pela pena de morte ou de prisão perpétua. De acordo. Mas, quem a merece?

segunda-feira, 18 de dezembro de 2006

O padroeiro do eleitor - Jayme Copstein

Há poucos dias, um leitor de Zero Hora deu resposta contundente à outro leitor que perguntava – “Quando vai terminar tudo isso?” – referindo-se à esbórnia em que se transformou o nosso parlamento, com a falta de escrúpulos de uns e a cumplicidade de outros, que escondem sua própria imoralidade em conveniente silêncio.
A resposta contundente do leitor era: no dia em que as pessoas como a que fazia a perguntava, votassem com mais critério e consciência. Pois esta semana, ainda fervendo a indignação pelo assalto ao Tesouro, praticado pelas mesas do Senado e da Câmara, mas com o calado consentimento de todos os parlamentares, exceto alguns poucos do PT, a revista Veja publica a malandragem de um deputado do PSB de Alagoas, Oswaldo Carimbão, para ganhar a presidência da Comissão de Minorias da Câmara Federal.
Deve haver qualquer privilégio para que cargos assim sejam disputados com tanto entusiasmo. No caso, Carimbão defrontou-se com Luíza Erundina, que desejava o posto para a sua minoria, ou seja, a das mulheres. Ao que, de bate-pronto, Carimbão argumentou ainda com uma minoria bem menor. “Eu sou gay” – ele trovejou no recinto.
Como todo o mundo ficou bestificado – ou todos estavam de camanga para passar para trás Luíza Erundina, o machão Carimbão agora representa os gays na Comissão de Minorias. Como a quem alega cabe a prova, o ilustre representante socialista das Alagoas deveria ser intimado a comprovar a sua preferência sexual na prática. Sempre haveria alguns halterofilistas dispostos a contribuir a moralização, se não de todo o parlamento nacional, ao menos da presidência da Comissão de Minorias da Câmara.
A propósito: sabem quando o eleitor brasileiro vai votar com critério e consciência? No dia de São Nunca.

Fronteiras - Jayme Copstein

Não se trata de contestar a sentença dos jurados de Novo Hamburgo, condenando um marido acusado pelo assassinato da mulher, com requintes de premeditação que incluíram a incineração do cadáver em algo comparável a um ritual viking. A jornalistas, não cabe aprovar ou reprovar decisões judiciais.
Cabe, porém, análise das contradições da lei penal brasileira, tão cheia de vírgulas e rituais que descambariam para o pastelão puro e simples, não as marcassem como tragicomédia os lances dramáticos.
Já não se fala na aberração que reduz a pena do réu a menos de 20 anos, para evitar novo julgamento, imposto auto0maticamente pela lei. É a leniência, feita sob medida para beneficiar quem possa pagar bons advogados. Foi o caso, entre muito outros assemelhados, daqueles jovens de Brasília que trucidaram Galdino, o índio pataxó, e escaparam lampeiros e fagueiros de qualquer punição, pagando cestas básicas.
Houve uma tentativa, originada na indignação popular, para corrigir a aberração através do conceito de “crime hediondo”. Mas o Supremo Tribunal Federal, após longos anos da vigência, considerou a lei inconstitucional, o que faz réus, condenados já com brandura a menos de 20 anos de prisão, a cumprirem pouco mais de três anos de sentença.
Tudo para mostrar que este é um país justo, civilizado e humanitário. A começar pelos magistrados e parlamentares, que aumentam seus salários sem nenhuma modéstia, enquanto o resto da população rói o toco das unhas. Como todos sabemos, a justiça começa por casa. Só que, no Brasil, ela nunca ultrapassa essas fronteiras.

sexta-feira, 15 de dezembro de 2006

A próxima vítima - Jayme Copstein

Os assaltantes porto-alegrenses trucidaram mais um inocente – desta vez uma professora amada por seus alunos. Zero Hora publica entrevista do provável secretário de Segurança da governadora Yeda Crusius, deputado Enio Bacci, propondo resolver o problema da violência com diplomas e medalhas de estímulo aos policiais.
Na mesma página Zero Hora noticia a investigação do assassinato de dois policias, um em Canoas, outro em Gravataí, um dos quais, com toda a certeza, vai receber o clássico reconhecimento do “cumprimento do dever”, pois foi morto em ação, ao tentar identificar criminosos. De que lhe valerá a honraria é uma pergunta sem resposta.
Entrevistado por Zero Hora, o deputado Ênio Bacci mostrou-se entusiasmado. Disse que o time está montado e que tem coragem de matar um leão por dia. Mas como Esporte Clube São Paulo, da cidade do Rio Grande, conhecido como o Leão do Parque, já está na segunda divisão, um castigo no futebol do Rio Grande do Sul, só restam os leões do circo. Esses, coitados, só freqüentam o noticiário mortos de fome, abandonados pelos cirquinhos falidos.
Enquanto isso, as pessoas se entreolham. Não pelos leões e medalhas do deputado Ênio Bacci, mas pela certeza de que seguirão tombando nas ruas se a Secretaria da Segurança Pública continuar um quinhão político.
As pessoas se entreolham, sim, em muda interrogação.
Quem será a próxima vítima?

Recordes - Jayme Copstein

Festejemos, irmãos: em Cachoeira do Sul acabam de descobrir um fóssil de 228 milhões de anos o que, segundo a Zero Hora, pode mudar a história dos dinossauros na face da Terra.
Pranteemos, irmãos. O Congresso brasileiro acaba de sacramentar mais uma indecência, dobrando sua remuneração. Daqui a 228 milhões de anos, os arqueólogos ao remexerem em ossadas, dirão que jamais houve na história do mundo políticos tão imorais quanto os do Brasil, e por isso jamais mudou o destino deste país.
Festejemos irmãos. Os arqueólogos só precisaram de meia dúzia de fragmentos de ossos, para concluir que o dinossauro descoberto era um dos elos perdidos entre formas mais primitivas e formas mais evoluídas da espécie.
Pranteemos, irmãos. A absolvição de praticamente todos os mensaleiros e sanguessugas são provas demasiadas que qualquer elo que acaso houvesse entre o “politicus brasiliensis” e o mínimo de decência que se exige de qualquer ser vivo, perdeu-se irrecuperavelmente, se é que existiu algum dia.
Festejemos, irmãos. Se a importância desta descoberta em Cacheira do Sul for confirmada, o Brasil vai para o Livro dos Recordes do Ginness como detentor do fóssil mais antigo de toda a história da humanidade.
Pranteemos, irmãos. Não se precisa mais de comprovação. Os números são eloqüentes: passando ganhar a quase 30 vezes o que percebe um congressista norte-americano e mais de 30 vezes o que ganha um parlamentar inglês, em um país onde a renda média da população é 15 vezes menor do que a dos habitantes dos Estádios Unidos ou da Inglaterra, já estamos no Guinness: trata-se do Congresso mais imoral da história do planeta.

quinta-feira, 14 de dezembro de 2006

O tédio de ser vice - Jayme Copstein

É só examinar a relação dos vices desta república, desde que lhes foi permitida a carona na votação do titular, para surgir a interrogação: quantos deles conseguiriam se eleger síndicos do prédio onde moram, se tivessem de enfrentar as urnas.
A legislação é clara. O papel do vice é substituir o titular nos impedimentos. Mas como esses impedimentos são poucos e pífios, os vices acabam sempre sofrendo da mais incurável das moléstias, a do tédio. Desandam a falar do que não sabem e até do que não lhes cabe.
Getúlio Vargas dizia ser necessário manter os vices muitos ocupados para que não preenchessem seus ócios com conspirações. Sua experiência com eles não era nada boa. Ao longo dos 18 anos de poder, só teve dois: João Neves da Fontoura, vice quando Getulio presidia o Rio Grande do Sul e com ele brigou por não entender que lhe estava sendo reservado papel maior na Revolução de 30; e Café Filho, que conspirou para depô-lo em 1954.
Tem gente a propor a volta do sistema antigo, em que o vice dispute o cargo com seus próprios méritos. Também não vai solucionar o problema. Se caroneiros, já perturbam tanto, imaginem com o apoio das urnas. Aí mesmo é que não ficariam quietos.

Segurança e demagogia - Jayme Copstein

A governadora eleitas Yeda Crusius enfrenta, no preenchimento da Secretaria da Segurança, o seu grande problema. Ela deseja um técnico para liderar a Pasta, em um Estado cuja capital, apesar de ostentar invejável renda per capita, a maior do país, exibe também índices de criminalidade e violência, nada invejáveis mesmo para quem vive no conturbado Oriente Médio.
Neste contexto sócio-econômico é fácil deduzir-se que a pobreza e a miséria tem menos a ver com a delinqüência do que a desorganização, o espírito corporativista e a inércia de uma burocracia que impede a modernização e conseqüente eficiência do aparto da segurança pública.
Não se necessita de uma lupa similar ao telescópio espacial Hubbie, para catar as miudezas que infernizam a vida do porto-alegrense. Elas não estão a anos-luz de distância. É só olhar para uma das muitas insignificâncias como a área de habilitação de motoristas. O Centro de Formação de Condutores da Restinga, por exemplo, é alvo de reclamações de usuários mal atendidos, inclusive com dados bloqueados para impedi-los de buscar solução em outros centros mais eficientes. Afora o rei na barriga que se instalou no CFC da Restinga, esses usuários não conseguiram sequer que o Detran lhes ouvisse a reclamação.
A governadora Yeda Crusius tem razão em querer um técnico para a Segurança. Os políticos que por lá passaram, até agora, sem exceção, não conseguiram resolver sequer as quinquilharias. Parece que consideram apenas um lugar para arrecadar votos. Feito isso, o eleitor que se arranje.

terça-feira, 12 de dezembro de 2006

De Bismarck a Orestes Quércia - Jayme Copstein

Nada de novo sob o Sol, diz o Eclesiastes. Os jornais de hoje dão destaque à espirituosa declaração do presidente Lula Inácio Lula da Silva, renegando sua militância à esquerda.
É plágio mal-feito de um chiste de Bismarck, o chanceler alemão do século 19, que dizia com menos palavras e mais contundência: quem não foi socialista aos 18 anos ou continua sendo aos 60, é um tolo.
Mas comparar Lula a Bismarck é uma demasia. Mais apropriado seria falar-se em Orestes Quércia, que confessadamente faliu o Banespa para reeleger seu sucessor, Luiz Fleury, no governo de São Paulo. Naquele tempo não havia reeleição, caso contrário os paulistas teriam Quércia em dose dupla.
Se Lula bagunçou a economia para se reeleger é uma interrogação ainda sem resposta. Quebrar o Brasil ele não quebrou porque é tarefa impossível por mais que o roubem tão desbragadamente os seus políticos. Mas os primeiros sinais de alarma, que algo começa a se deteriorar, estão em pesquisa da Federação do Comércio de São Paulo, mostrando elevada taxa 76% de endividamento entre trabalhadores que percebem de um e três salários mínimos. Sessenta por cento deles estão com as contas em atraso. Nas faixas salariais superiores, o endividamento cai, mas o média geral é de 43%. Ou seja, quase a metade da população assalariada enfrenta dívidas, como o resultado do crédito fácil, com fins nitidamente eleitoreiros, propagado quase como aumento de salário, pois não vinha acompanhado da advertência que o dinheiro teria de ser devolvido mais adiante.
A frase espirituosa pode ser de Bismarck. O espírito da coisa, entretanto, é de Quércia.

Depois da vírgula - Jayme Copstein

Quem especula com a rejeição das contas de campanha pelo TSE, para impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em seu segundo mandato, tomou bonde errado. O Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo já antecipou em parte a decisão sobre uma das irregularidades apontadas, a das contribuições de concessionárias do serviço público.
A irregularidade maior nas contas de Lula são 10 milhões de reais doados oito empresas vinculadas concessões públicas. Contudo, ontem, ao julgar as contas do governador eleito José Serra, cujo balanço acusa 700 mil reais de doações desta natureza, concluiu pela legalidade, porque a legislação não é muito clara em suas definições.
Serra não foi também o primeiro beneficiado com esta interpretação. Já antes dele, o deputado José Mentor, do PT, o ex-prefeito Paulo Maluf (PP) e, mais recentemente, o governador Aécio Neves (PSDB) foram favorecidos por essas acrobáticas interpretações.
Quem tinha razão era um empresário poderoso dos anos 60, 70, que pedia aos seus advogados a leitura das proibições de determinada lei. Quando os bacharéis começavam a recitar a lengalenga, ele cortava: “Comecem daquele ponto que diz – porém...”
O grande problema da Justiça brasileira é que, aqui, todas as leis começam com letra maiúscula, como devem, mas só valem de fato a partir de alguma virgulazinha perdida logo adiante.

segunda-feira, 11 de dezembro de 2006

A igualdade das ditaduras - Jayme Copstein

Nada mais igual a uma ditadura que outra ditadura, seja qual for o pretexto erigido como doutrina para justificar seus crimes. O pensamento me veio à cabeça nos idos de 1980, em Santiago do Chile, aonde eu fora como editor de turismo do velho Correio do Povo. Na rua, um policial me avisou dos minutos que faltavam para ser preso se não atendesse ao toque de recolher, à meia-noite.
Seis anos antes eu visitara Berlim Oriental, capital da Alemanha comunista. Era notável a semelhança da ladainha ideológica, recitada pelos dois jovens guias, o alemão e o chileno. O alemão só apontava monumentos construídos para lembrar os crimes cometidos pelos alemães contra a União Soviética, apesar dos quase 30 anos decorridos do fim da Segunda Guerra Mundial. O chileno passava versões sobre a conspiração comunista para escravizar os povos livres da América, apesar de Salvador Allende ter sido eleito legalmente em um pleito sem contestações.
Não consegui passar uma noite em Berlim Oriental. Era proibido. Fora incluído em uma excursão pela Internaziones, de quem era hóspede em Berlim Ocidental. Tudo cronometrado, a passagem pela fronteira marcada pelo Muro, após identificação com fotografia de frente e perfil, para ser conferido o retorno também na hora marcada. Ao entrar em Santiago, fui obrigado a comparecer a um departamento do governo, onde me fotografaram de frente e perfil e me forneceram uma carteira de identidade, confiscada na saída.
Todas essas coisas me voltam à lembrança com a morte do ditador fascista Augusto Pinochet, sem nunca ter sido julgado pelos seus crimes. Há alguns anos, o ditador alemão comunista Erich Honecker foi também indultado por sofrer de câncer e veio morrer no Chile.
Não é coincidência. Nada mais igual a uma ditadura que outra ditadura, seja qual for o pretexto erigido como doutrina para justificar seus crimes.

A morte de Castello Branco - Jayme Copstein

De volta ao noticiário as especulações sobre a morte do marechal Castello Branco, primeiro chefe da ditadura militar instaurada em abril de 1964. A revista IstoÉ desta semana traz reportagem de cinco páginas, com suspeitas do procurador da República no Ceará, Alessander Wilson Cabral Sales, manifestadas em ação civil contra a União, para obter “informações mais detalhadas”.
Tenho uma pequena contribuição ao caso, colhida acidentalmente ao entrevistar Rachel de Queiroz para a Rádio Gaúcha, em 1989, quando a Editora José Olímpio reuniu sua obra adulta em cinco volumes. O nome de Castello Branco surgiu na entrevista porque eles eram primos distantes. O marechal tinha ido visitá-la, em Quixadá, no interior do Ceará. Foi de lá que partiu para a morte.
A hipótese de assassinato político já era rumor corrente, então. Rachel refutou a versão. Contou que, ao partir para Fortaleza, Castello pediu ao piloto do avião para sobrevoar, no trajeto, um conjunto habitacional, construído na região em seu tempo de presidente.
Tal como ocorrera com Salgado Filho, muitos anos antes, e iria acontecer com Ulysses Guimarães, poucos anos depois, o piloto se opôs, mas foi vencido pela teimosia de Castello. Diferente do caso de Salgado e Ulysses, em que havia problemas de mau tempo, o piloto alertou Castello que a área era reservada ao treinamento dos caças da FAB, portanto, vedada a aviões civis pelo alto risco de acidentes.
Não confere, também, com as informações que se tinha na época, suposto pronunciamento de Castello contra o regime para cuja instauração contribuíra como líder, não como figura secundária. Discordava do grupo de Costa e Silva e defendia a volta à democracia. Para tanto, desejava concorrer a uma cadeira no Senado. Era por isso que estava no Ceará.

sexta-feira, 8 de dezembro de 2006

Da ficção à realidade - Jayme Copstein

Um filme americano que sequer nos Estádios Unidos tem conseguido crítica favorável, despertou amargos protestos aqui no Brasil. Eu até me dispunha a comentá-lo com indignada solidariedade, não tivesse perdido a razão para fazê-lo diante da notícia do assalto sofrido pela presidente do Supremo Tribunal Federal.
A ministra Ellen Gracie e seu colega Gilmar Mendes vieram ao Rio de Janeiro participar de atividades oficiais. No trajeto do Aeroporto Tom Jobim para o hotel, foram atacados por bandidos que os deixaram a pé, levando o carro que os conduzia. Não se trata de ficção cinematográfica de quinta categoria, mas da descategorizada realidade brasileira, repetida diariamente, apenas com outros personagens menos importante do que uma das três maiores autoridades da República.
Desalentadora foi a explicação de um policial do Rio de Janeiro, atribuindo o assalto a falha da equipe de segurança do STF. Devia ter solicitado, segundo este policia, acompanhamento especial da Polícia Federal.
Ora, se nem mesmo a alta administração da República pode transitar pela Linha Vermelha, sem especiais cuidados da Polícia Federal, não se tem nada a reclamar de um filme que não passa de idiotice. Por deprimente que seja a sua história não conseguirá jamais ser pior que a realidade por nós vivida diariamente e estampada nos jornais, no rádio e na tevê.

O jeito da barreira - Jayme Copstein

O Supremo Tribunal Federal derrubou ontem, por unanimidade, a chamada cláusula de barreira, aprovada em 1995 pelo Congresso. Os ministros deram-se até ao luxo de ornamentar sua decisão com tiradas que de tiradas que julgaram inteligentes, como chamá-la de “cláusula de caveira”, “condenação à morte por inanição” e “retirada dos tubos que mantêm um doente vivo”. Em comum nos engenhosos trocadilhos, em forte concorrência ao humorismo do rádio e da tevê, a admissão de que os partidos atingidos pela barreira são moribundos, mantidos artificialmente com suculentas verbas públicas, ou seja, o dinheiro extorquido de todos nós através dos impostos.
É verdade que cláusulas de barreira não solucionam o problema da falta de representatividade do parlamento, eleito por esta aberração chamada voto proporcional que consegue eleger seis deputados federais de uma chapa que só tinha cinco candidatos, como foi o caso do Prona, em 2002.
Isso não tem a menor importância. Se alguém quisesse resolver alguma coisa, o voto distrital puro já teria sido implantado há muito. Este é mesmo um país gracioso, sobre o qual não se necessita criar anedotas porque seus homens públicos são por demais talentosos para o “jeitinho”.
No caso da cláusula da barreira, passaram-se onze anos, tempo mais do que suficiente para se decidir, antes das eleições, se era ou não inconstitucional. Mas como fazê-lo sem saber o bicho que ia dar?
Deu-se jeito.

quinta-feira, 7 de dezembro de 2006

O preço real - Jayme Copstein

A partir de março, o brasileiro vai sentir diretamente no bolso o preço da demagogia e da alienação. A demagogia é do ministro das Comunicações, pretendendo mostrar-se amigo dos pobres, barateando a tarifa telefônica, sem levar em conta que quase a metade da conta que pagamos todos os meses é imposto. A alienação é de amadores arvorados em defensores do consumidor, sem examinar que o atual sistema reduzia o preço ao garantir às empresas de telefonia um faturamento mínimo mensal.
Os defensores do consumidor queriam o preto no branco, nos mínimos detalhes. Saber quanto as telefônicas cobravam por cada perdigoto cuspido no bocal do aparelho. Agora vão ficar sabendo: o minuto excedente, que custava pouco menos de três centavos, passa agora a 31 centavos – dez vezes mais.
Já o novo pai dos pobres, ministro Hélio Costa sabe que das contas, mas prometeu, no ano passado, subsidiar as contas dessas pessoas com o dinheiro do Fust, o Fundo de Universalização de Serviços de Telecomunicações, hoje somando cerca de R$ 3 bilhões. Quando esses reais acabarem, os pobres cairão “na real”. Ficarão sem telefonia. O Fust, sem dinheiro.
Só restará apelar ao grande filósofo português Manoel, que acha desnecessário inventar anedota de brasileiro. Segundo ele, este é um país gracioso pela própria natureza, salve, salve, pátria amada e, também – quem puder.

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Surfista Prateado: Dentro da "Revolução Bolivariana" a que estão nos submetendo aos poucos, como sapos colocados dentro de uma panela em fogo brando, nada mais surpreende. Dizia Roberto Campos que o Brasil tem saída, é o aeroporto, mas até com isso estão acabando... Provavelmente, quando o dinheiro do FUST acabar, aumentarão os impostos, porque já deve estar até na Constituição que o Estado deve providenciar o sagrado direito do cidadão fazer ligações, a "inclusão telefônica". É o Brasil, dividido entre os que tudo podem e os que tudo pagam.

quarta-feira, 6 de dezembro de 2006

Mistério da Anac - Jayme Copstein

Enfim, a Câmara de Deputados se sensibiliza para o caos em que mergulhou a aviação civil brasileira e ensaia a primeira providência: criação de uma comissão parlamentar externa para investigar os problemas do setor aéreo.
É bom que a Comissão concentre a atenção na Anac, a fantasiosa Agência Nacional de Aviação Civil, cuja responsabilidade na crise vai muito além da mera omissão ou incompetência de seu chefe, Milton Zuanazzi.
Há acusações muito sérias, de que a Anac concentra todos os seus esforços para dividir as linhas aéreas da Varig entre a Tam e a Gol. Trata-se de projeto da Casa Civil, ainda do tempo do deputado cassado José Dirceu, que estranhamente continua mexendo os cordéis no governo e também na própria Câmara Federal, onde se ocupa de reeleger o atual presidente Aldo Rebello.
Não se trata de acusação leviana. É suficiente pesquisar nos jornais a obsessão da Anac nesse sentido, rebelando-se contra quatro decisões judiciais que garantiram à nova Varig a manutenção das rotas que ela pudesse atender, para perceber-se que a Anac cuida do que não deve e descuida do que deve.

A cultura dos protestos - Jayme Copstein

O jornalista Ney Gastal, nítida vocação para irritantes instigâncias, remete mensagem convidando a quem interessar possa ao difícil exercício de pensar. É o contraponto a uma convocação para o clássico “abaixo-assinado”, devidamente sacramentado com bordão extraído do Hino Rio Grandense, protestando contra a sugerida fusão da Cultura ao Turismo, em uma única secretaria estadual no Rio Grande do Sul.
O “abaixo-assinado” foi redigido por quem, como assinala o Ney Gastal, é incapaz de juntar duas idéias, menos ainda colocar pontos e vírgulas em seus devidos lugares. Serve apenas para mostrar como o debate está mal colocado.
Gastal põe a questão no devido lugar, ao escrever textualmente: “Sou muito cético sobre ser a existência de uma Secretaria específica – ou não – que fará a diferença no panorama cultural. Ainda lembro dos tempos da SEC e da SMEC, onde Paulo Amorim e (Frederico) Lamacchia faziam chover com verbas limitadas, mas enorme criatividade”.
Conclui: “De modo geral, não consigo me livrar da impressão que a criação das secretarias específicas (na época aspiração de todos nós) resultou apenas em baitas cabidões de emprego e agremiações de amigos da patota no poder. E no evidente sumiço da inventividade”.
Digamos que, apesar das suas exigências, Ney Gastal não é muito inventivo, afora a coragem de dizer. Sua opinião é a mesma de uma multidão calada que gostaria de ver as instituições públicas, sejam quais forem, pouco importa se juntas ou separadas, de volta ao papel para que foram criadas.

terça-feira, 5 de dezembro de 2006

Pechinchas - Jayme Copstein

Parece que surra em dose dupla, na mulher e na sogra, está mesmo em liquidação para magistrados no Estado de São Paulo. Cento e setenta e cinco reais é o valor da multa paga por um juiz de direito do interior paulista, porque a agressão, cometida em março de 2004, foi considerada crime de pequeno potencial ofensivo.
Claro que as duas mulheres, do alto de seus arranhões, equimoses e esparadrapos discordaram do “barato”. Foram elas que apanharam. A “liquidação” da sova, entretanto, não ficou por aí.
A história, meio complicada, tem relato da revista eletrônica Consultor Jurídico. O juiz encontrou no computador de casa, uma mensagem da mulher a um suposto amante. Na mesma hora deu-lhe uma surra e a expulsou de casa. Quando a sogra veio com a filha, para tentar a reconciliação do casal, espancou as duas e as botou porta afora.
Como era conduta incompatível com a toga, afora o procedimento penal, um processo disciplinar foi aberto no Conselho Superior da Magistratura que lhe aplicou simplesmente a pena de censura, a despeito de ter o juiz intimado, sem mais aquela, a Policia Militar a destacar dois soldados, um na porta de sua casa, outro na do colégio das crianças, para impedir a mulher de ver os filhos do casal.
Com tudo isso, o juiz achou a censura do Conselho Superior de Magistratura uma demasia e apelou para o Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo, baseado em algo que o saber universal ainda não conseguiu decifrar: o sexo dos anjos. Quem deveria julgar o juiz: o Conselho Superior ou o Órgão Especial?
Após breves dois anos e nove meses de profundas reflexões, não chegaram a nenhuma conclusão, mas o assunto foi encerrado porque a punição estava prescrita.

segunda-feira, 4 de dezembro de 2006

Tempos idos, tempos vindos - Jayme Copstein

Sem a ênfase devida na mídia, entra em votação no Senado, nos próximos dias, projeto que permite a homologação pura e simples no cartório, de divórcios, partilhas e inventários em que as partes estejam de acordo. Esta providência simples deve contribuir bastante para desafogar os tribunais, obrigados a intervir mesmo onde não eram chamados.
Há quem atribua caráter moralizador à intervenção não solicitada dos juízes, como se o banquete de papel, servido aos carunchos na montanha de processos que se acumulam nos Foros, exorcizasse a desonestidade. Basta atentar para a irregularidade de incontáveis registros de propriedade, decorrente da incapacidade de herdeiros pagarem custas de processos, ou patrimônios dilapidados pelos juros extorsivos sobre as dívidas do “de cujos”, para saber-se que não é bem assim.
A burocracia que entrava a Justiça no Brasil nunca teve caráter moralizador. A maior parte das vezes nasceu da necessidade de El-Rei, de criar sinecuras para seus apaniguados.
Nem El-Rei nem seus fidalgos existem mais. São tempos passados. O Brasil deixou de ser colônia em 1822, mas só agora, depois de alguns séculos, é que esses tempos começam a se encerrar no Brasil.

O lápis, o dedo e a mula - Jayme Copstein

O Ministério Público juntou-se aos senadores do 13º salário do bolsa família, aos deputados que aumentam seus subsídios e aos juízes que se negam a cumprir leis salariais legalmente fixadas e por eles aceitas. O seu Conselho Nacional aprovou hoje resolução que acaba com o subteto definido pela Constituição, para os vencimentos dos promotores públicos estaduais. Com isso, passam todos a 24.500 reais por mês, pouco importando a precariedade dos Tesouros Estaduais.
Quando se pergunta a qualquer membro dessas ilustres confrarias, de onde vai sair o dinheiro para pagá-los, os argumentos da resposta começam com um lápis mágico, mostrando que a pretensão só é exorbitante na aparência. Pelo contrário, na prática resultará em economia pela agilização dos serviços, sem que ninguém consiga, até agora, perceber na teoria ou sentir na prática em que consiste esta agilização, que já tem barbas brancas pelo tempo em que é prometida.
Quando se muda a pergunta – qual a contribuição que cada um pode dar para resolver esta crise em que se debate a nação – o lápis se transforma em dedo, apontado para os... “outros”: combater à corrupção, sem quartel!
Olha-se em redor, tudo o que vem à mente é uma velha marcha carnavalesca: “Que me importa que a mula manque, o que eu quero é rosetar.”

sexta-feira, 1 de dezembro de 2006

O espírito dos números - Jayme Copstein

O jornal O Estado de São Paulo estampa hoje a informação de que, em pelo menos sete Estados – Rio Grande do Norte, Paraíba, Espírito Santo, Rondônia, Amapá, Roraima e Rio Grande do Sul – a manutenção do Judiciário e o pagamento dos seus salários privilegiados superam todo o gasto com a segurança pública. Em outros seis – São Paulo, Maranhão, Ceará, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Sergipe – a relação fica entre 90 e 100%.
No caso do Judiciário não se está contando o pagamento de aposentadorias. Entram no orçamento na rubrica de gastos previdenciários, enquanto na segurança pública são incluídos toda polícia civil, a militar e ainda os presídios.
Não são números criados pela mídia, para fazer sensacionalismo, neste momento em que a toga chama a atenção pela sua investida contra limites de remuneração por ela aceitos e fixados dentro da mais estrita legalidade e também por sua falta de cooperação. Foram colhidos nos balanços da execução orçamentária de 13 Estados, apresentados à Secretaria do Tesouro Nacional, conforme exige a lei. Chama a atenção também fato de que apenas Espírito Santo e Ceará não têm nenhum dos 2978 servidores que ganham acima do teto máximo estadual de R$ 22.111,25.
Não passa pela cabeça de ninguém que estes números sirvam para atribuir ao Judiciário parte da responsabilidade pela falta de segurança. Mesmo sendo exceção, é no Espírito Santo que o crime organizado tem fundas raízes.
São apenas um argumento para fomentar na magistratura gaúcha maior identificação com a realidade do orçamento estadual.

quinta-feira, 30 de novembro de 2006

O fim de uma legenda - Jayme Copstein

O deputado Raul Pont, do PT, tem toda a razão ao criticar os colegas da Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul que aboliram a proibição de contratar, em cargos de confiança, jornalistas vinculados aos meios de comunicação. Pont foi até por demais cortês ao dizer que, com a decisão, a Assembléia inaugura uma ante-sala do tráfico de influência.
É mais do que isso. O que a Assembléia gaúcha está fazendo é destruir a tradição de honra, que se supunha possuir desde a rebelião dos farrapos contra as extorsões do Poder Central. Corromper jornalistas para assegurar incenso nos veículos de comunicação, só pode ter por meta entontecer a opinião pública, desviando sua atenção de alguma imoralidade nos bastidores.
Esta é a hora das entidades de classe e dos próprios veículos de comunicação, de protestar com veemência contra a tamanha imoralidade. Qualquer pesquisa de opinião dirá que o jornalismo se inclui no pouco que ainda resta de confiável nesta bacanal em que se transformou a política brasileira. Só falta destruí-lo para reencarnarmos os dias finais do Império Romano.

quarta-feira, 29 de novembro de 2006

A vergonha das estatais - Jayme Copstein

Bela análise das relações entre governo e imprensa, foi publicada hoje pela Folha São Paulo. Está contida em entrevista do presidente da Radiobrás, Eugênio Bucci. Deveria merecer estudo sério nos cursos de comunicação, além de motivar um debate nacional.
Bucci é presidente da Radiobrás, a agência estatal de notícias, que existe no Brasil como nos demais países democráticos. A entrevista é conseqüência de pressões de líderes do PT, para que deixe de ser uma agência de notícias de verdade e se transforme em ridículo instrumento de louvaminhas de algum “guia dos povos”, como nas jurássicas ditaduras que ainda persistem pelo mundo.
A intenção é clara tanto nas críticas à linha editorial da Radiobrás como na proposta de se incentivarem veículos “independentes”, através de gordas subvenções públicas. Como alguém pode ser independente se aceita ser pago por um governo para esconder as mazelas deste mesmo governo, foge ao entendimento. Isso sem falar que daria origem a dinheiros de mensalões e dossiês. Que nunca seriam denunciados.
Eugênio Bucci tem discernimento e coragem para dizer que cabe à imprensa analisar o governo e não o governo analisar a imprensa. Reconhece, entretanto, que jamais houve qualquer ingerência do Palácio do Planalto na Radiobrás.
Foi por isso sua equipe pôde fazer o trabalho ater agora, sempre noticiando apenas o fato e seu contexto, sem opiniões pessoais ou análises críticas.
“Cobrimos o mensalão com normalidade, buscando informações oficiais em vários lugares onde isso estava sendo apurado, nas estatais, no Ministério Público ou no Congresso. As falas das autoridades do governo entram nas reportagens da Radiobrás entre aspas, são falas de fontes que nós ouvimos, não são parte de um programa, de uma plataforma expressa da Radiobrás. Ela não existe para assumir a defesa de autoridades, ela existe para bem informar o cidadão.”
Ninguém sabe se Eugênio Bucci continuará presidindo a Radiobrás, O presidente Luiz Inácio Lula da Silva ainda não lhe falou nada a respeito. Talvez seja difícil, a julgar-se por críticas de militantes petistas, acusando a Rádiobrás de ter vergonha de ser estatal e não ter uma narrativa própria do governo Lula, seja o que isso queira dizer.
É uma pena se não for mantido. Sua grande virtude é exatamente ter vergonha suficiente para não transformar uma agência de notícias em uma sinecura para os sanguessugas de plantão. Os que fariam aquela narrativa própria, qual seja de dizer que a gatunagem do mensalão só tinha por objetivo salvar a pátria.

terça-feira, 28 de novembro de 2006

Sobras e carências - Jayme Copstein>

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva acertou em parte quando apontou as aposentadorias da área rural como fonte do déficit da Previdência Social. Não pelos números porque, neste particular, o presidente está matematicamente correto: dos 37 bilhões e 400 milhões de reais pelo rombo constatado entre janeiro e outubro deste ano, muito mais da metade, 23 bilhões, dizem respeito a essas aposentadorias rurais.
Faltou ao presidente assinalar que o problema está na origem das aposentadorias, quando foram concedidas a torto e a direito, sem regras para prevenir fraudes e, também, sem previsão de onde sairia o dinheiro para concedê-las na orgia que se inaugurava, como era fácil adivinhar.
Não que falte coragem a Luiz Inácio da Lula da Silva. Também demonstrou que a tem em parte ao vetar o jeton e a criação de assessorias para os membros do Conselho Nacional do Ministério Público, que derrubaria o teto moralizador dos salários públicos. É de se esperar que, na mesma senda, ele vete também o pretendido jeton pelo Conselho Nacional de Justiça.
Para que o presidente demonstre que tem toda a coragem para tornar real o projeto de um Brasil melhor, precisa dizer a todos que dinheiro não nasce em árvores nem é maná para cair do céu. Tem que começar dentro de casa, cassando cartões de crédito e extinguindo mais da metade daquela nebulosa constelações de assessores de porcaria nenhuma que infestam a administração e contribuem para perpetuar o déficit público.

segunda-feira, 27 de novembro de 2006

O que não foi - Jayme Copstein

A improvisação e a falta de visão do futuro são retratadas em uma mensagem remetida pelo empresário Ralph Hofmann, de Porto Alegre, ao abordar a crise da aviação civil brasileira.
Ralph Hofmann relembra que, em 1953 a revista norte-americana Time publicou artigo de página inteira, pondo o Brasil entre os vanguardeiros da aviação mundial. Nossos aviões, naquele tempo, chegavam às aldeias mais remotas do país, precedendo neste desbravamento até mesmo os velhos e valentes jipes.
O transporte aéreo foi tomando corpo. Linhas aéreas aventureiras cederam lugar a empresas bem estruturadas. Ser passageiro de avião era indício de prosperidade.
O problema foi o abandono de outros meios de transporte de passageiros, como o trem e os navios. Ralph Hofmann sugere uma ficção – o que seria o Brasil de hoje se os velhos Itas e Aras, do Lóide e da Costeira, ainda singrassem nosso litoral.
Ele escreve: “Um gaúcho tomaria uma embarcação rápida, de Porto Alegre a Rio Grande. Lá subiria em um Ita. Tomaria o café da tarde ao largo do Rio Mambituba, jantaria perto de Florianópolis, no dia seguinte trabalharia com seu Notebook e seu celular, ou faria sauna, musculação, praticaria tiro-ao-prato, e na manhã seguinte estaria em Santos, de onde iria a São Paulo em ônibus especial, chegando descansado e com ânimo para triturar seus inimigos comerciais.
“Os aeroportos ficariam às moscas. Os turistas de feriadão nem mesmo tentariam chegar aos hotéis das praias de Porto Seguro. Se limitariam a flutuar pela costa brasileira, descansando”.
Ralph Hofmann tem toda a razão. Se tudo tivesse sido feito ontem, hoje o Brasil seria tudo. Menos o que é.

Velha cantiga - Jayme Copstein


As grandes reformas que salvarão a pátria e destravarão o Brasil, para fazê-lo crescer como nunca na história deste país, já estão em tratativa, segundo os jornais. São três: previdência, tributos e política, não necessariamente nesta ordem por sua importância, urgência ou encaminhamento, mesmo porque sairão dentro do velho figurino nacional, de mudar tudo o que não mude nada.
Da reforma política, já tem se falado com abundância. Uma malandragem aqui e outra acolá, para perpetuar o reinado dos raposões, já está em andamento com o voto de lista.
Para o resto, previdência e impostos, o governo anuncia apenas “um esforço concentrado de gestão”, seja o que isso signifique, para combater a fraude, o desperdício e o esbanjamento, com economia de bilhões de reais.
Este “esforço de gestão”, entre aspas, não é coisa nova. Já tinha sido alardeado na campanha eleitoral que antecedeu o primeiro mandato. Ao fim desses primeiros quatro anos, porém, sem somar mensalões e ambulâncias, só a despesa com passagens aéreas subiu para mais de um bilhão de reais. Quase nada do dinheiro foi gasto pelo Presidente e seus ministros na tarefa de governar. Foram outras pessoas, cujo trabalho se intensificou, por coincidência, em setembro, às vésperas das eleições.
Pode-se adivinhar o que vem pela frente, por mera semelhança.
É uma velha cantiga.

sexta-feira, 24 de novembro de 2006

A nova semântica - Jayme Copstein

O que mais tem mudado nos últimos quatro anos, e como nunca na história deste país, é a língua portuguesa.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em uma de suas habituais discurseiras, anunciou ontem que deseja, para o segundo mandato, um governo mais ousado.
O que será que está palavra significa no discurso do presidente? Será, por exemplo, mais honrado?
A dúvida vem de recente pedido de demissão, do ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, sem repercussão maior fora das paredes envidraçadas do Planalto, o que dá margens a especulações.
Por que a decisão extrema, faltando menos de dois meses para o término do primeiro mandato? Terá o ministro cansado dos “aloprados”, que não cessam de fazer “trapalhadas”, sejam o que estas palavras agora signifiquem? Antigamente, isso se chamava corrupção, mas o dicionário foi realmente transformado como nunca na história do país.
Não são as águas passadas que importam no caso da demissão abafada do ministro Márcio Thomaz Bastos. É a correnteza do rio. Haverá outro mensalão, outro dossiê, prestes a estourar, e ele cansou de carregar o time das costas?
Seja como for, nestes anos de governo, o sr. Márcio Thomaz Bastos é autor de obras-primas, dignas de registro no anais internacionais do Direito Penal. Só este caso do dossiê, em que, apesar da abundância de delitos, nenhuma acusação pode ser formulada por não se conseguir saber a origem do dinheiro, garantiria sua imortalidade no Panteão.
Realmente, como advogado criminalista, Márcio Thomaz Bastos é um gênio. Já como ministro da Justiça, não se pode dizer a mesma coisa. É preciso saber o que a palavra ministro significa neste novo português do Brasil.

Os duendes - Jayme Copstein

Enquanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, apela em vão para o civismo da oposição do PSDB, conclamando-a a governar pelo Brasil, no Rio Grande do Sul o deputado Raul Pont, do PT reconhece que a governadora Yeda Crusius, do PSDB, tem razão na questão do orçamento, mas acha não cabe à oposição resolver problemas do governo.
Exigir coerência de políticos no Brasil é crer em ficções. O que não é nenhuma novidade porque a recusa dos deputados gaúchos, de reduzir os 0,8% pretendidos pelo Judiciário torna o orçamento do governo rio-grandense uma obra de ficção. Ninguém sabe, em um estado onde quase 100% da arrecadação estão irrevogavelmente comprometidos com o funcionalismo e a dívida da União, de onde vão sair os mais de 180 milhões de reais representados por esses “meros” 0,8%.
Como Legislativo e Judiciário do Rio Grande do Sul estão brincando de conto de fadas, o rumo é previsível. Mais adiante vão ter de achar uma bruxa malvada para justificar o feitiço da falta de dinheiro para a educação, a saúde e a segurança.
Não será fácil achar a bruxa. Não dá para esconder que foram os duendes, desta vez, que mexeram o caldeirão. Mesmo por que a governadora Yeda Crusius, além das advertências sobre o rombo desses 0,8%, decididamente não tem o físico exigido pelo ofício de megera.

Comentários:

Rodrigo: Maior problema dos 0,8% é que o orçamento do Estado tem que ser encaminhado com a concordância dos trÊs poderes e do ministério público. Assim determina a Constituição do Estado. A pretensão do governo eleito era impor unilateralmente o orçamento, coisa que o judiciário e o MP não aceitavam. Na contramão do que prega, a governadora recém eleita acena com a criação de novas secretárias, o com certeza causará mais despesas, o que torna sua pretensão de reduzir as despesas um tanto contraditória, visto que parece querer impor austeridade apenas na casa alheia...


Surfista Prateado: Discordo completamente do Sr. Rodrigo. Embora extremamente perdulário, o Poder Executivo é austero comparativamente aos Poderes Judiciário e Legislativo. Um tanto infantil a pretensão de exigir que o Executivo corte algo ao mesmo tempo em que pede um corte (insignificante) ao Poder Judiciário, como crianças trocando figurinhas. Se cortasse não em 0,8% mas em 50% o total das verbas do Judiciário, Yeda seria aplaudida nas ruas. O Judiciário, com a mecânica processual atual, é algo que está fora do alcance e paciência dos cidadãos, sem falar na prática nefasta da "justiça social" aplicada por muitos de seus membros. Se a lei que define o andamento processual for dinamizada e o uma verdadeira reforma trabalhista for feita, pode-se reduzir em 50% todo o Poder Judiciário em todas as instâncias e ainda assim sobrará muita gente sem ter o que fazer. Mas é aquilo: nunca vai acontecer. É da nossa cultura criar dificuldades para vender facilidades. Normalmente com muitos empregos públicos, com ou sem concursos, pouco importa, nefastos do mesmo modo.

quinta-feira, 23 de novembro de 2006

A escolha - Jayme Copstein


Fosse permitida a cobrança de tarifa por espirro, os banqueiros no Brasil empestariam as suas agências com generosas doses de rapé para extorquir ainda mais dinheiro da conta de seus clientes.
Vai pára o noticiário dos jornais, agora, a exigência dos promotores federais de São Paulo, sustando a cobrança de 50 centavos por cheque de pequeno valor, emitido pelos correntistas.
Não há um critério, entre os banqueiros, para definir o que seja um cheque de pequeno valor. A coisa parece ter relação com a cara do freguês: uns o limitam em 20, outros em 30 e até 40 reais.
Os regulamentos do Banco Central só prevêem duas tarifas. A primeira é sobre a substituição de cartões de crédito fora da data do vencimento. Tem banqueiro malandro, sem que os clientes percebam, renovando cartão fora de época, sem, solicitação, para poder tirar a casquinha.
A segunda tarifa, já para dificultar a emissão de cheques de pequeno valor, é permitida sobre o segundo talão solicitado dentro do mesmo mês. Da mesma maneira que para haver crime é necessário haver definição em lei, nenhuma tarifa pode ser cobrada sem esta previsão.
Sempre haverá quem, para botar panos quentes na pendenga, sugira uma retirada maior para cobrir o pagamento de contas miúdas. O problema é alguém andar com dinheiro no bolso, no Brasil. Vai para o livro dos recordes se conseguir passar por três esquinas sem ser assaltado.
Como se vê, estamos entre cruz e a caldeirinha. É mera escolha de quem vai pôr a mão no bolso da gente, o banqueiro ou o gatuno.

quarta-feira, 22 de novembro de 2006

Notícias incompletas - Jayme Copstein


A notícia está incompleta porque não informou se os dois pilotos americanos do Legacy já foram liberados para voltar aos Estados Unidos. O que saiu nos jornais é o reconhecimento, de parte do comandante da Aeronáutica, em depoimento no Senado, que erro do controle de tráfego aéreo foi responsável pela tragédia do Boeing da Gol.
A demora na libertação imediata, que a gente vê no cinema como final feliz, com toda a certeza se deve à proverbial morosidade da Justiça brasileira. Até agora, fora dos dois pilotos americanos, não se ouviu nenhuma preocupação em punir culpados outros, que não fossem eles.
Será que estamos invertendo o dogma de que todos são inocentes, desde que não sejam todos os norte-americanos, que serão sempre suspeitos até prova em contrário?
Não há outra explicação para o silêncio em torno da entrevista de um controlador de vôo, cuja identidade foi preservada por razões óbvias. Denunciou que, há muito tempo, ele e seus colegas queixavam-se em vão das deficiências técnicas e de pessoal do controle de vôo, o que aliás constou da matéria do jornalista do New York Times, Joe Sharkey. passageiro do Legacy, relatando o acidente.
Segundo o controlador de vôo, o próprio ministro da Defesa, Waldir Pires, o que não sabia de nada, e todas as autoridades competentes – muito competentes – foram alertadas sobre os problemas, prometeram providências e nunca mais falaram no assunto.
Estamos diante de uma tragédia sobre a qual seria de mau gosto fazer o trocadilho de “crônica de mortes anunciadas”. Não é descabido exigir que a notícia se complete com a informação do que vai acontecer agora com os pilotos norte-americanos. Vão continuar retidos ou poderão voltar para casa?
E os demais responsáveis? O que vai acontecer com eles?

Mandarins e chupa-cabras - Jayme Copstein


Recebo manifestação de um magistrado aposentado, questionando se não fui severo demais no comentário de ontem, sugerindo que o Judiciário e o Legislativo estão dando jeitinhos para obter aumento de proventos. Como é meu amigo de longa data, me pediu reservas em relação à sua identidade, ao se mostrar preocupado com a possibilidade de um processo que me dificultasse a vida. Há tantas ameaças pairando ar...
Respondi que não se preocupasse. Magistrados e jornalistas têm muito em comum: são pessoas solidárias com seus semelhantes, tal como ele estava sendo comigo, e nasceram sem medo. Do contrário, não seriam magistrados nem jornalistas.
Sobre políticos não sei por falta familiaridade, mas me lembro do mestre de todos, Getúlio Vargas, homem solidário e sem medo. Criticado duramente e até injuriado, ao promulgar a legislação trabalhista que modernizou o país nos anos 30, desabafou: “Eles não sabem que os estou salvando do comunismo.”.
Mais modesto, sem pretensões a estadista, lembro algo lido há muitos anos: mandarins chineses, no início do século passado, exigiram da população adiantamento de impostos dos próximos dez anos. No ano seguinte, decretaram anistia ao contrário. Aquela antecipação tinha sido só para salvar a pátria. Os impostos continuariam a ser cobrados.,
Leio hoje, sobre a China pós-Mao Tse Tung, que a família de um corrupto é obrigada a pagar até bala com que ele é executado. Curiosamente, desapareceram do noticiário os abusos dos mandarins.

terça-feira, 21 de novembro de 2006

O novo conto do vigário - Jayme Copstein


A insistência com que os políticos estão batendo na tecla do voto de lista e do financiamento público das campanhas, ao eleitor deve soar como alarma. Agora é o governo federal em peregrinação, tentando convencer o presidente da OAB a aceitar o pacote.
É preciso dar nome aos bois. O que chamam de financiamento de campanha é financiamento de candidaturas. Como até agora esse dinheiro sai dos impostos sonegados ou das propinas dos mensalões e das ambulâncias, a proposta só tem um único objetivo: legalizar a corrupção para perpetuar a impunidade da pilantragem. Nos dois casos os dinheiros são públicos. Só que um deles não é oficialmente surrupiado. Não é difícil adivinhar qual seja.
O voto distrital puro, limitando a campanha do candidato a uma zona eleitoral, reduziria o custo das candidaturas a quase nada. Tome-se, como exemplo, o caso do Rio Grande do Sul, com bancada de 31 deputados federais. Dependeria do critério a ser adotado, mas digamos que da divisão resultassem 15 distritos eleitorais. A despesa cairia para a sexta parte do que hoje necessita um candidato e seus gastos seriam facilmente monitorados pelos eleitores adversários.
A proposta do financiamento público, entretanto, não pretende moralizar coisa alguma. A reforma deseja o voto de lista, que é a mesma perversão que temos hoje, com uma diferença: em vez de o eleitor escolher em quem ele vota, são os “donos” dos partidos que o fazem. Nunca mais este país se livrará desta quadrilha que o empobrece e mantém a grande maioria da população em miséria, doença e desesperança.

O biscoito - Jayme Copstein

Judiciário e Legislativo querem aumentos desmesurados de proventos, se encarados no contexto das contas públicas e do rendimento do restante população. Mas como anteriormente aprovaram uma balaio de medidas altamente moralizadoras, para acabar de uma só cajadada com as mordomias e o mau uso dos dinheiros públicos, apelam agora para o que há melhor na tecnologia nacional: o jeitinho.
O Judiciário vai aumentar jetons, o Legislativo vai transformar em remuneração fixa as verbas indenizatórias, por despesas eventuais, e tudo se insere legalmente dentro de “um fica o dito por não dito” em matéria de austeridade. Afinal, este é um país tropical, e cantemos e sambemos, irmãos, que o carnaval está batendo às portas e ninguém é de ferro.
Tem aí um senão: o salário mínimo, 60 vezes menor do que ganha um ministro do Supremo Federal e do que conspiram abocanhar os nossos ilustres parlamentares.
Só para facilitar o entendimento, um trabalhador de salário mínimo necessita cinco anos para somar o que a Nobreza cabocla abiscoita em apenas um mês – 30 dias.
Por falar em biscoito, diante das negaças do governo, recusando aumentar o salário minimo para 375 reais, para não estourar as contas públicas, não há necessidade de nenhuma Maria Antonieta dizendo: se essa gentinha não tem pão, que coma bolachinhas.
O jeitinho é o nosso velho biscoito.

segunda-feira, 20 de novembro de 2006

Ciência de sarrabulho - Jayme Copstein


O deputado João Almeida, do PSDB da Bahia, é o autor do argumento mais imoral que se tem ouvido, no Brasil, em defesa da perversão chamada voto proporcional que transformou o Congresso brasileiro em mercado persa. João Almeida diz não haver necessidade de voto distrital misto porque “mais de 50% do Congresso sequer compreende o que é isso".
Há muitas coisas que ninguém compreende no Brasil, não só esses modestos 50% do Congresso, mas com toda a certeza 99,999 por cento do eleitorado. Uma delas é como João Almeida e seus assemelhados conseguem eleger-se para abocanhar um sarrabulho de mais de 100 mil reais por mês, fora o alho, entre subsídios, verbas disso e verbas daquilo, ao que deverá ser acrescentada, proximamente, a equiparação aos ministros do Supremo Tribunal Federal.
A suposta simplificação do debate, pretendida pelo tucano João Almeida, defende a única proposta de reforma política em andamento no Congresso. Institui o voto de lista. É o novo milagre brasileiro, que de novo só traz a possibilidade de novas patifarias a partir do financiamento público das campanhas.
O atual sistema de voto proporcional é voto de lista, apenas com o eleitor, não o partido, indicando quem será eleito para as cadeiras conquistadas. O voto de lista, se aprovado, só vai piorar a situação. Vai perpetuar a malandragem: em vez de o eleitor dizer quem deseja que ocupe a cadeira de deputado, são os “donos” dos partidos que o farão. E aí, nunca mais nos livraremos dos filhinhos de papai ou dos genros do bastantão.

Os lados da corda - Jayme Copstein


Continua o caos nos aeroportos brasileiros sem que o governo se digne a assumir a única providência cabível: a substituição de comando, a apuração das responsabilidades e conseqüente indiciamento, para que a Justiça puna os culpados.
Não se trata apenas de identificar incompetências. Há algo mais em toda esta confusão dos aeroportos. Relatórios acabam de ser divulgados, mostrando que o acidente com o Boeing da Gol era só questão de tempo. Em três ocasiões anteriores, por erros de controladores de vôo, a tragédia não ocorreu por um único detalhe: Deus não quis.
É preciso apurar porque tais relatórios foram omitidos, pondo em risco a vida dos passageiros. Chama a atenção que, confrontado com a tragédia da Gol, o ministro Waldir Pires disse que nada sabia, que nada tinham lhe informado.
Não é a primeira vez que Waldir Pires alega ignorância para justificar a sua alienação. Quando ministro da Previdência, ele também anunciou a liquidação do déficit. Só este ano, o rombo da Previdência é de mais de 40 bilhões de reais.
A diferença entre os dois casos está na centena e meia de pessoas que perderam a vida. Alguém tem que responder por isso, mas não controladores de vôo mal pagos, mal supervisionados, estourando horários e quebrando as regras mínimas de segurança do trabalho. São o lado mais fraco da corda.

sexta-feira, 17 de novembro de 2006

Hora da reflexão - Jayme Copstein

Alguma coisa não está fazendo sentido nas preliminares do segundo mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. O presidente com dificuldades até dentro de seu próprio partido, para montar o ministério, atua também, sem nenhuma cerimônia, para definir a presidência do Senado e da Câmara, o que, em última análise, é uma interferência indevida de um poder em outro.
Cada vez fica mais claro que o presidencialismo, inaugurado pelo golpe militar de 15 de novembro de 1889, esgotou suas possibilidades. O inquilino do Planalto não passa de mero joguete nas mãos de coronelões que lhe impõem sua vontade, graças a contingentes de deputados e senadores gerados em outra perversão, a do voto proporcional, em que o eleitor nem sabe em quem está votando e o eleito não sabe quem nele votou e, por isso mesmo, torna-se submisso aos oligarcas.
Não será agravando as mazelas descambando para a ditadura que há de se corrigir o problema. Mudam-se apenas os donos do fantoche que habita o Planalto. Voto distrital puro para devolver ao povo a representatividade do parlamento e possibilitar o parlamentarismo verdadeiro, não um arremedo, é o que se impõe nesse momento. Se nem isso der certo, então terá chegado a hora de refletir sobre a história brasileira.

Comentário

Pedro Luso de Carvalho: Caro Jayme: venho fazendo a leitura de todos os teus excelentes textos aqui publicados; quanto a este, concordo inteiramente contigo, no que diz respeito às dificuldades que o Presidente Lula vem enfrentando para montar o seu ministério em razão do sistema presidencialista, sem o voto distrital. Mais ainda, melhor que o voto distrital, no meu entender, seria a mudança para o regime parlamentarista, sem dúvida, uma esperança vã. Uma informação ao ilustre escritor e jornalista: o “Blog do Jayme Copstein” é um dos importantes links que enriquecem o meu blog. Um abraço. Pedro Luso.

Jayme: Obrigado pela generosidade das palavras. Voto distrital e parlamentarismo não são excludentes. O grande problema é assegurar a representatividade do Parlamento, para não incidirmos de novo no erro. Não creio que parlamentarismo sem voto distrital seja viável.

quinta-feira, 16 de novembro de 2006

A sabedoria dos profetas - Jayme Copstein


A princípio não dava para entender porque o sr. Luiz Inácio Lula da Silva, que patrolou o adversário Geraldo Alkimin na eleição presidencial, em vez de festejar com churrasco, cerveja e pelada na Granja do Torto, choramingava contra a imprensa como se fosse o perdedor. Fez queixa até a Hugo Chaves, apesar de o balanço mostrar apenas uns poucos colunistas mais contundentes, em contraste com outros, também poucos, que o apoiavam claramente e chamavam Alkimin de picolé de chuchu. Isso, sem contar terceiros que se mostraram contidos em nome da imparcialidade.
Não criticável em nenhuma das posições, desde que explícitas. Como diria Acácio, o Conselheiro, vivemos uma democracia. Não havendo o subterfúgio da meia-verdade ou do boato plantado para dissimular o engajamento, enquadra-se tudo no exercício do livre pensar.
Parece, entretanto, que o velho Acácio enganou-se desta vez. A levar-se em conta as lamúrias perdedoras do presidente vencedor, o que temos aqui é um neo-fundamentalismo islâmico, a exigir muezins que cantem “Lula é Lula e Márcio Thomaz Bastos o seu maior profeta”.
De fato, a mais recente “sura” do novo Corão é recitada pelo delegado federal de Cuiabá, dizendo que o escândalo do dossiê não vai dar em nada por não ser possível saber a origem do dinheiro. É a pergunta, cuja resposta Lula não deu a seu adversário durante toda a campanha eleitoral e que, com notável precocidade, Márcio Thomaz Bastos adivinhou ser difícil de se obter.
Nada como a sabedoria dos profetas.

O mais importante - Jayme Copstein


Difícil achar sentido na entrevista do coronel-aviador Rufino da Silva Ferreira, presidente da comissão que investiga a tragédia do Boeing da Gol. O seu trabalho tem por objetivo apurar as causas do acidente, para evitar sua repetição.
É o que contrasta com o inquérito policial, já a cargo, aliás, da Polícia Federal, que há de apurar as responsabilidades no episódio. A opinião pública, particularmente as famílias das vítimas, sob o impacto da tragédia, a maior da história aeronáutica brasileira, tem pressa em saber o que aconteceu, para identificar e punir eventuais culpados.
Só que, ao contrário do que ocorre em uma investigação criminal comum, com poucos personagens envolvidos e um único equipamento para a prática do crime, em acidentes aéreos há toda uma multidão de protagonistas, manejando uma parafernália de máquinas, motores, computadores e o que mais for. Não se tem um cálculo preciso de quantas operações são necessárias para pôr um avião no ar e trazê-lo em segurança de volta a terra. Mas se falarmos em centenas de procedimentos, estaremos pecando pela modéstia, nunca pelo exagero.
Daí, porque um inquérito desta natureza é muito demorado e não pode partir de idéias preconcebidas, a serem confirmadas ou não. Não é rotina nem deverá acontecer também com a tragédia do Boeing, mas há investigações de acidentes aéreos que levam anos até que se possa chegar a alguma conclusão.
Há outro problema paralelo, simultâneo à tragédia, que é a crise da aviação civil brasileira, pelo mau gerenciamento do setor de controle de vôo. Não será, contudo, o resultado do inquérito que vai resolver o problema nem dele desviar a atenção. Mais valeria substituir o prestimosos e cordial ministro da Defesa, Waldir Pires, por alguém, civil ou militar, que tivesse realmente liderança suficiente para comandar uma pasta tão complexa e exigir eficiência de todos os setores, civis e militares, que lhe estão afetos.
É até mais urgente do que saber que foi o culpado pela queda do Gol.

terça-feira, 14 de novembro de 2006

Ortotanásia - Jayme Copstein


Mais uma palavra, fora do uso corrente, chega às páginas dos jornais: ortotanásia. Faz lembrar o conto de Arthur Azevedo, narrando as agruras de um pai para explicar ao filho o significado da palavra plebiscito.
No caso do ortotanásia, o furo é mais embaixo, como se diz hoje neste Brasil, onde não só palavras, mas idéias também – qualquer uma sem a esfericidade de uma bola de futebol – têm curso pouco corrente.
Daí, a polêmica sobre a deliberação do Conselho Federal de Medicina, aprovada pela Igreja, de definir como ética a decisão de não tentar prolongar o que restar da atividade orgânica em corpos devastados, nos quais só restou do que chamamos vida o inútil sofrimento.
Não se trata de matar, mesmo a título piedoso. Ortotanásia consiste, sempre por decisão do paciente ou de sua família, em o médico não mais interferir, para deixar a natureza seguir seu curso.
A grande dificuldade de encarar a questão chama-se culpa. Como o ser humano é o único animal que tem consciência de que vai morrer, considera a morte a punição extrema porque lhe rouba a vida, o bem supremo. Daí, a criação de entidades sobrenaturais que hão de recompensá-lo com a imortalidade da vida eterna ou castigá-lo com a morte interminável nas chamas do inferno.
Daí, também, o argumento falacioso, travestido de religião, de que ninguém é Deus para decidir sobre a vida. Mas ninguém pode se arvorar também em demônio, para impor sofrimento sem sentido aos seus semelhantes.
Com a ortotanásia, o Conselho Federal de Medicina e Igreja estão dizendo que o homem, quando se torna impotente diante da doença, deve pôr o destino nas mãos do Criador.

segunda-feira, 13 de novembro de 2006

As pontas da marosca - Jayme Copstein


É só juntar as pontas para perceber do que se trata. Tem continuação o projeto petista de restringir a liberdade de pensamento no país, através do controle da imprensa.
Começa Marco Aurélio Garcia, presidente interino do PT, mal fechada as urnas já assestando as baterias contra os jornalistas, convidando-os a uma auto-reflexão, mesmo que, fora do atual círculo do Planalto, não se conheça jornalista acusado de mensalões ou dossiês, mas apenas de tê-los denunciado, o que até há quatro anos era considerado dever ético e não crime de lesa-majestade contra Lula I e Único.
Não é voz isolada. Neste domingo, o ex-deputado petista Marcos Rolim, contagiado pela amnésia inaugurada por seu arqui-adversário Fernando Henrique Cardoso (“Esqueçam o que escrevi.”), deslembrou-se de um belo artigo que publicou em Zero Hora, em 24 de julho de 2005, intitulado “Sonhos roubados”, e lascou ontem, domingo, na mesma Zero Hora, um “A mídia perdeu as eleições” para acusar a imprensa de disputar a presidência da República com o sr. Luiz Inácio Lula da Silva, este sim, imune à amnésia mas atacado de errática ignorância – ora sabe, ora não sabe o que aconteceu.
Tem mais: entre as grosserias que militantes supostamente petistas enviam para contestar idéias ou argumentos que não lhes agradem, chamou-me a atenção a de um patrulheiro ideológico que não resistiu a chamar de “choro de perdedor”, a ressalva a programas assistencialistas – verdadeiras esmolas - feita em elogio ao projeto do senador petista Paulo Paim, instituindo um fundo específico para a capacitação profissional, democratizando o acesso ao conhecimento que verdadeiramente libera as pessoas para o exercício pleno da cidadania.
O que importa é a sincronia das três manifestações, diferentes apenas no jeito de expor a mesma posição. Tanta unanimidade só indica uma resolução “tirada” pela oligarquia partidária, no seguimento da ação começada com o fracassado Conselho Federal de Jornalismo e que terá continuidade na “democratização dos meios de comunicação social”, seja o que isso signifique, afora a montanha de “dinheiros não contabilizados” em bolsos politicamente corretos.
A tática é criar uma imagem negativa da imprensa para restringir a liberdade de informar. Fica bem clara a intenção na sugestão maliciosa de que foram os jornais e as emissoras de rádio e tevê que impediram a consagração triunfal de Lula no primeiro turno.
Ora, é só examinar o pânico do presidente-candidato e sua movimentação febril por todos os quadrantes da rosa dos ventos, no intervalo entre o primeiro e o segundo turno, para se perceber que ele gestionava reassegurar o apoio das oligarquias com as quais os governantes deste país tem se elegido, todos sem exceção, ele incluído na relação, desde o primeiro mandato.
Era claro o recado que os oligarcas lhe tinham mandado, diante da empáfia com que se conduzia, embalado pela diferença cavalar que as pesquisas de opinião lhe concediam. Tanto foi assim, tanto foi que ele entendeu o recado e se comprometeu a volta a ser um bom menino, comprova-o a transferência para Lula, no segundo turno, de mais de dois milhões dos votos obtidos por Alkimin no primeiro turno.
Não existe, sem um fato gritante que destrua a reputação de um político, tal migração de eleitores, a não ser dentro de uma esperta manobra para dizer ao sr. Luiz Inácio Lula da Silva que brincadeira tem hora e que ele se comportasse.
A comprovação, também, pode ser encontrada na sem-cerimônia com que o sr. Jader Barbalho, mesmo respondendo a processo por peculato no Supremo Tribunal, lidera as negociações para a formação do novo governo. Isso sem falar em outras figurinhas fáceis.
Chega, pois, de balelas em relação à imprensa e sua atuação. Ideologicamente a se dizente esquerda brasileira não necessita de pretextos. É só revirar o baú escondido no sótão e retirar de lá a afirmação de Lênin, de que é uma liberdade burguesa. E atentar às claras, sem subterfúgios, contra a ordem democrática.

Toda honestidade será castigada - Jayme Copstein


Não havia razão para tanto estardalhaço, só porque um batedor de carteiras, com mandato no Centro de Porto Alegre, estava de volta às ruas antes mesmo de concluído o registro de sua prisão em flagrante. Havia pungado o dinheirinho contado de um perigoso aposentado que, como todos sabem, é inimigo da pátria, pois não consegue viver com o que sobra depois dos grandes patriotas terem se cevado à farta nos mensalões, nos dossiês e outras mamatas que a amaldiçoada imprensa teima em descobrir.
O santo punguista, abençoado com a liberdade pela devoção prescrita pelo apostolado de porta de cadeia, mas querendo guardar a modéstia que caracteriza os virtuosos, raspou a cabeça para não ser reconhecido por outros aposentados que assim não escaparão do crime de não conseguirem viver do ar que tão generosamente lhes é dado de graça.
Razão para estardalhaço haveria se o senador Ney Suassuna decidisse equilibrar, no alto de sua luciferante calva, uma capilosa peruca de bandó para afogar em falsa modéstia as excelsas virtudes de repassador de ambulâncias, mediante módicas comissões. Os impolutos pais da pátria, entronizados na Comissão de Ética do Senado, já o estão condecorando com a Grã-Cruz da Ordem da Impunidade e mandando um recado à Nação: honestidade e decência é como propaganda política – só durante a campanha eleitoral.
O que faz lembrar uma historinha contada pelo jornalista pelotense Ricardo Pierobom: alguém que cometera assassinato em Jaguarão e depois se escondera no Uruguai, achou que o crime já estava esquecido e voltou lampeiro para o Brasil. Preso e interrogado pelo juiz de direito, se também não andara fazendo o que não devia no Uruguai, respondeu: “Qu’esperança, doutor magistrado. Lá tem lei!”

quinta-feira, 9 de novembro de 2006

Depois da tempestade - Jayme Copstein

Com o adiamento da votação pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado, cessou a polêmica sobre o projeto-de-lei que tipifica crimes cometidos através da Internet. Deverá ser objeto de audiência pública antes de concluir a tramitação.
De novo é necessário repisar sobre o exagero da alaúza que se fez em torno disso. O jornalista Políbio Braga, em sua página da Internet, publica o voto do relator na íntegra. O que se vê ali não tem nada a ver com atentados à liberdade de expressão ou invasões de privacidade. O máximo que pode ser alegado são dúvidas sobre a redação da exigência de se identificar quem acessa a rede.
O noticiário da mídia passou a idéia absurda de que, a cada vez que o usuário acessasse a Internet, teria de se identificar. Não teria nenhum sentido. A identificação é automática através do IP, o Protocolo da Internet, que marca o acesso de cada computador.
A identificação já é exigida pelos provedores para se preservar de processos judiciais e também de calotes, mas sem imposição legal. O problema são provedores que até garantem identidade falsa aos usuários. Tem de ser tipificado como crime porque é alvará ilimitado para a impunidade.
Se a redação do projeto é pouco clara nesse item, então que seja aperfeiçoada até não restarem dúvidas nem dar margem a sutilezas de interpretação.
O resto é chover no molhado. Privacidade é uma garantia constitucional que não necessita de acréscimos, mesmo porque não está sujeita a limitações e só pode ser devassada por ordem judicial, com objetivo específico de prova nos tribunais.

quarta-feira, 8 de novembro de 2006

A mão estendida - Jayme Copstein

Enfim, a lucidez iluminando os caminhos na proposta do senador gaúcho Paulo Paim (PT), criando o Fundo de Desenvolvimento da Educação Profissional, específico para o objetivo que expressa no nome, com recursos do imposto de renda, do IPI e Pis/Pasep. Cuidemos apenas que não se repita com esse Fundep o que aconteceu com a CPMF, que devia oxigenar a saúde, ou a CIDE, para transformar as estradas em tapetes voadores.,
Quando se ouve mirabolâncias de crescimento econômico, o que estarrece mais é a ignorância crassa sobre o grande obstáculo – a falta de mão-de-obra especializada.
Em grande parte, aliás, o problema do desemprego se atenuaria com a capacitação da multidão de despreparados que o paternalismo secular teima em manter na pobreza, submetidos a esmolas do tipo bolsa-isso, abono-aquilo-outro.
Não que, na permanente emergência em que vivemos, o assistencialismo não evite o pior. Não há, realmente outra saída, senão dar destino a migalhas enquanto o grosso da riqueza apenas engorda os privilégios de oligarquias, transplantadas para cá desde o Descobrimento.
Ajudar o homem a ajudar-se vai muito além de bolhas de crescimento que irão estourar um pouco depois de sopradas. Com o estômago forrado de comida e a cabeça nutrida de conhecimento, os deserdados tornam-se cidadãos, capazes de discernir entre a paixão e a razão, entre a moralidade e a safadeza, e de contribuir efetivamente para um país melhor onde a mão que se estende não é a da caridade, mas a da igualdade.

Ruído na Internet 2 - Jayme Copstein

A polêmica despertada pelo projeto do senador Eduardo Azeredo, tipificando crimes eletrônicos levou ao adiamento da votação na Comissão de Constituição e Justiça do Senado e à convocação de audiência pública para ampliar o debate.
Foi judiciosa a decisão dos senadores. As opiniões estão muito divididas. Está certo o jornalista Everton Maciel, da Rádio Noroeste de Santa Rosa, ao afirmar que todos têm um pouco de razão na pendenga. O que também está expresso na manifestação da senadora Patrícia Saboya Gomes (PSB-CE): “Tenho muitas dúvidas em relação ao projeto, mas também não podemos continuar sem punições para crimes na internet”.
Braian Zanini, de Porto Alegre, estudante de engenharia elétrica, considera cerceamento de liberdade de expressão o monitoramento do tráfego de dados pela Internet. Ele contesta o que foi dito, ontem, aqui, argumentando que o sigilo da comunicação telefônica só é admitida sob autorização judicial. Mais: que o criador da internet detectou o problema, mas não propôs uma solução. Zanini suspeita que, por trás do projeto, esteja o lobby dos fabricantes de software, no seu combate à pirataria.
Há muito material para reflexão nesta polêmica. O ponto importante do projeto é a tipificação dos crimes eletrônicos, para que possam ser punidos e reprimidos. É necessidade criada por uma tecnologia nova, como aconteceu antes, por exemplo, com as leis do trânsito, quando o automóvel se tornou realidade no cotidiano humano.
Se o projeto é defeituoso, cabe aperfeiçoá-lo. É para isso que serve o debate. E é para debater que serve a democracia.


Comentários
:

Surfista Prateado
: Pergunto: qual a diferença entre andar na "estrada virtual da informação" e andar na rua mesmo? Para mim é a mesma coisa, em contextos diferentes. Por que não identificar cada pessoa que sai de casa e passa a transitar na via pública, mesmo a pé? E também pedir identificação ao entrar numa loja, num banco, num hospital... Saberíamos onde as pessoas estavam e em que momento. Seria muito mais fácil identificar quem roubou um banco, por exemplo, afinal ele teria mostrado o RG na hora do assalto. Percebeu o absurdo? Sei onde isso vai dar, qual o objetivo por de trás: poder rastrear as pessoas, saber quem elas são, onde andam, o que pensam, de qual corrente política, entre muitas outras coisas. No fim, a perseguição aos inimigos, para os mais audaciosos. Mais um mecanimos de implantação do Totalitarismo. Há que se proteger as pessoas dos maliciosos que usam a rede para cometer crimes, mas tipificando-os e apontando as penas.

terça-feira, 7 de novembro de 2006

Os pontos do ranking - Jayme Copsteuin

Algumas páginas da Internet ficaram indignadas com a notícia de que o Brasil, nos últimos anos, avançara significativamente no chamado ranking da corrupção. Estranhamente chamaram isso de “alarido” e o atribuíram às elites mundiais que se opunham à reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Seria laborioso discutir a estatura de Lula como líder mundial, a ponto de preocupar essas supostas “elites”. Há controvérsias. Há o sorriso elegante de Putin, quando felicitou nosso presidente pelas façanhas futebolísticas do Brasil, ao lhe ser lhe proposto o eixo Moscou-Brasília, ou o olhar enigmático dos chineses, quando cobrados pelo troco à concessão gratuita de status nação de livre comércio. Mesmo no continente, Hugo Chavez, Evo Morales e Nestor Kirchner negam unanimidade ao pedestal.
Nossos talibãs caboclos conseguiram enxergar luto até em um traje preto da apresentadora de tevê Ana Maria Braga quando faz muitos anos ninguém mais usa luto neste país. É estranho, porém, que, quem tem a vista tão acurada, não consiga ver que “caixa 2” e “dinheiro-não- contabilizado” seja pura roubalheira.
Vai ver, esta cegueira é que conta mais pontos no ranking da corrupção.

Ruído na Internet - Jayme Copstein

Noticiário desvirtuado chega à imprensa a respeito de projeto do senador Eduardo Azeredo, acusando-o de pretenso controle e conseqüente censura na Internet.
É difícil perceber o objetivo da distorção. Terá a malta de vigaristas e predadores que infesta impunemente a rede mundial, contaminado também os computadores dos jornais? Ou os nossos indefectíveis rábulas de porta de cadeia já estão a postos para preservar o faturamento?
O projeto do senador Azeredo simplesmente atualiza o Código Penal, ao definir 12 crimes eletrônicos e a respectiva pena. São cometidos através das chamadas pragas – os vírus, vermes e scamers - para furtar dinheiro de contas bancárias, falsificar cartões de crédito e chantagear empresas.
Identificar esses criminosos não é novidade. Já se faz isso com a comunicação telefônica, mediante autorização judicial.
Não se compreende, pois, a reação descabida. Por ser recente, o crime eletrônico ainda não foi definido na maior parte dos países. Sua omissão em nossa legislação penal é mais uma porta escancarada para a impunidade aparentemente inextirpável que nos dá lugar de destaque na corrupção mundial.
O senador Eduardo Azeredo não está sozinho em seu ponto-de-vista. Há poucos dias, sem que o mundo tenha desabado, o britânico Tim Berners-Lee, criador da Internet, alertou para os riscos de a rede ser corrompida por golpistas, o que comprometeria a sua utilidade.
Tanto barulho por nada, aqui no Brasil, faz a gente desconfiar.

segunda-feira, 6 de novembro de 2006

O mito da Selic - Jayme Copstein

Mais um mito vem abaixo com os bancos aumentando os juros de financiamento às pessoas jurídicas, apesar da redução da Taxa Selic. Sejam grandes, pequenas ou microempresas, todas vão pagar o Pato. Em última análise, nós, consumidores é que teremos de arcar com o aumento dos preços.
Nas últimas décadas, a cantilena sempre foi essa da Taxa Selic elevada. Na prática, agora, a teoria demonstra ser outra.
Não é por falta de esforço do governo, mas por sua visão equivocada do problema. O ministro Guido Mantega anunciou medidas para estimular a concorrência bancária e para reduzir o custo dos empréstimos. Foi incluída aí até a isenção do Imposto sobre Operações Financeiras de empréstimos novos em bancos diferentes, para liquidar dívidas anteriores, contraídas a juros mais altos.
Tudo estaria certo se os banqueiros fossem anjinhos de faces rosada e cabelos louros crespinhos, tangendo liras para o contraponto de canções sacras. Eles simplesmente elevaram o spread, que é aquela diferença entre o juro pago na captação do dinheiro e o que é cobrado a quem emprestam esse mesmo dinheiro.
Como a Taxa Selic baixou e o Governo fez a sua parte, os banqueiros justificam a extorsão com o aumento dos calotes.
Todos sabem que maus pagadores se evitam com um bom cadastro, mas essa não parece ser a preocupação dos nossos banqueiros. Há muito tempo adquiriram o mau hábito de cobrar calotes dos bons pagadores.
Esta é parte da explicação. O que se esconde por trás desse jogo escuso, é que suas majestades transferiram aos empresários, pouco importando sejam pequenos ou grandes, a responsabilidade de lhes suprir os lucros suculentos que obtinham do governo quando a Selic estava lá em cima.

O miado do gato - Jayme Copstein

Personagem também importante da arte de salvar o Brasil, é Luiz Carlos Bresser Pereira, ex-ministro da Fazenda nos tempos inglórios de Zé Sarney presidente. Faz parceria com João Sayad, coleguinha naquele governo de triste memória, e Delfim Neto, guru da economia no regime militar.
A “troica” freqüenta com assiduidade as páginas da Folha de São Paulo, com receitas infalíveis para sermos felizes para sempre. Só não consegue resolver um pequeno e intrigante mistério: por que não salvaram o Brasil quando tiveram a faca e o queijo na mão.
Bresser Pereira agora defende o modelo argentino, derramando-se em elogios ao populismo de Kirchner. Compara os 8,9 do crescimento argentino com os modestos 2,9 por cento do Brasil, reconhecendo, entretanto, que nossa inflação é de modestos 3 por cento, enquanto a de lá é de 11 por cento, assim mesmo a custa de controle oficial de preços. Simploriamente conclui que, quando este problema estiver resolvido, o Rio da Prata será um caudal de leite e mel.
Ora viva! Bresser Pereira, porém, não diz como se resolve o probleminha da inflação contida com o controle de preços. Nos tempos de Zé Sarney, perpetuou sua visão de estadista uma frase sobre os números escamoteados: o gato comeu.
Agora, esconde também, em sua receita mágica, que a economia argentina não faliu nesse meio tempo, porque Hugo Chaves comprou os títulos da respectiva dívida externa com a receita extra do óleo. Quando os preços do combustível desabarem, como já começou a acontecer, o rugido do suposto tigre latino-americano soará como miado de gato.
Muito afinado, aliás, com a batuta do maestro Bresser Pereira.

Comentários:

Mister X: As estações de rádio e tv deveriam ter detectores de mentiras nas entrevistas destas "figurinhas" e políticos. O telespectador veria em tempo real, simultâneamente ao conteúdo da entrevista, a avaliação do detector de mentiras em forma de gráfico, no vídeo.

quarta-feira, 1 de novembro de 2006

A carne e os açougues - Jayme Copstein

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deseja marcar o segundo mandato com crescimento econômico. É boa notícia desde que haja projeto verdadeiro neste sentido, sem o apelo a sonoros bordões, sem pé na realidade.
Seria proveitoso ao presidente a leitura de um discurso do professor Weber Figueiredo, paraninfando turma de engenheiros da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, em setembro de 2002. Pode ser localizado na Internet com facilidade.
O exemplo do professor Weber Figueiredo fala de uma vovó, fazendo uma bananada para vender a cinco reais o quilo. Um quilo de bananas custa apenas um real. Por que a diferença de preço?
A resposta é simples: quando se colhe um cacho de bananas cria-se apenas um emprego para o qual não se necessita de capacitação. Basta estender o braço e cortar o cacho. Quando a vovó faz a bananada, ela cria empregos na área do açúcar, do gás de cozinha e na indústria de fogões, panelas, talheres e embalagens.
A diferença entre a vovó e o colhedor de bananas é o conhecimento, a receita, a tecnologia para fazer a bananada. O exemplo pode ser aplicado à plaquinha do computador que pesa apenas 100 gramas e custa em torno de 250 dólares. Para pagar cada 100 gramas de plaquinha de computador, o Brasil precisa exportar 20 toneladas de ferro, ou seja, 200 mil vezes mais o peso em matéria-prima. A fabricação de placas de computador criou milhares de bons empregos lá no estrangeiro, enquanto que a extração do minério de ferro cria pouquíssimos e péssimos empregos no Brasil.
A mensagem do professor Weber é muito objetiva: sem conhecimento, não há desenvolvimento. Mas conhecimento não se adquire com bordões sonoros ou decretos. Menos ainda com a profusão de universidades que só fabricam diplomas sem gerar conhecimento. A verdade é que a abertura de novos açougues jamais resolveu o problema da falta de carne.

terça-feira, 31 de outubro de 2006

De volta à arquibancada - Jayme Copstein

O dia seguinte à eleição presidencial devolve o brasileiro ao que ele mais gosta – a arquibancada, onde dá palpites, cria boatos, faz certezas de suas meras especulações, com direito a aplaudir o nosso time e xingar o do adversário.
Desta vez, começou com os ministros Tarso Genro e Luiz Marinho, proclamando, domingo, quando a certeza da reeleição de Lula tornou-se matemática, que a Era Palocci havia terminado.
Ora, todos nós pensávamos que o prestígio de Palocci, como guru da economia, que ele nunca foi, havia acabado quando, com o rabo entre as pernas, foi obrigado a demitir-se no seguimento do vexatório episódio do caseiro Francenildo Costa.
O que se reflete nas palavras dos ministros Tarso Genro e Luiz Marinho é a mentalidade entranhada na alma do brasileiro, moldada ainda no tempo do Brasil Colônia, de submissão à figura de El-Rei todo poderoso ou de seu preposto-fidaldo que lhe transmite as ordens.
O programa de estabilização das finanças brasileiras, o Plano Real, não nasceu na cabeça de Palocci, tampouco na de Pedro Malan, ministro durante oito anos, ou do próprio Fernando Henrique Cardoso, quando ministro de Itamar Franco. Foi elaboração de uma equipe de economistas, da qual faziam parte Pérsio Arida, André Lara Resende, Gustavo Franco, Pedro Malan, Edmar Bacha, Clóvis Carvalho e Winston Fritsch, alguns dos quais a maior parte das pessoas nunca ouviu falar nem sabe de quem se trata.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva mandou um recado duro aos dois ministros: a política econômica é do governo.
Em outras palavras: “Toca de volta para a arquibancada. O dono do espetáculo sou eu!”

segunda-feira, 30 de outubro de 2006

Lições do pleito - Jayme Copstein

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi eleito com mais de 60% dos votos. Mesmo não sendo a unanimidade, é votação expressiva diante das denúncias de desmazelo e corrupção que marcaram seu governo. Só tem um significado: o povo brasileiro o absolveu.
História não se faz com condicionais. Mas, vale perguntar: o que aconteceria a Fernando Collor de Mello, se em vez de enfrentar um congresso hostil, tivesse podido pregar diretamente ao eleitor as excelências do seu governo. Que também existiram. Por sinal, nunca foram revogadas.
A resposta não é difícil. Collor está de volta à cena política, como senador por Alagoas, onde tem tevê, rádio e jornal para fazer a pregação. Até se diz que será um dos líderes de Lula no Congresso.
Em nenhum dos dois casos se pode contestar a lisura da votação e a legitimidade dos dois novos mandatos. Vale, porém, a reflexão: o eleitor se queixa da corrupção, mas acaba de sacramentá-la. Se o faz porque cansou de esperar pela Justiça ou se nunca teve a ética como virtude, é a dúvida que resta esclarecer.

sexta-feira, 27 de outubro de 2006

Um país curioso - Jayme Copstein

Há uma polêmica nos jornais, trazida por ilustre advogado criminalista, sobre uma senhora algemada por policiais militares, após “apenas ter se envolvido em um acidente de trânsito”, segundo uma das partes, mas após “a constatação de irregularidades em seus documentos de condução do veículo, desacato aos policiais e ter tentado atropelar um deles”.
São versões conflitantes das partes envolvidas, mas com toda a certeza esta senhora não mora na Vila Cachorro Louco. Se morasse, deixaria de ser uma “senhora”, para ser reduzida a “uma mulher” e ter o nome estampado com todas as letras no noticiário. A árvore genealógica não, porque naquelas bandas quase ninguém sabe quem é. Não tem como alegar o “sabe-com-quem-está falando”.
Chama a atenção o que se pretende da Polícia aqui no Brasil. Os governantes escamoteiam as verbas para treiná-los e equipá-los porque têm outro destino a dar ao dinheiro. Destino, aliás, que caberá à Polícia investigar depois, para definir a legalidade ou ilegalidade, o que dependerá, também, de “quem está falando”, mesmo que não tenha nenhuma árvore genealógica em seu pomar.
Na planície habitada pelo cidadão comum, a Polícia serve para exigir dos “outros” o cumprimento da lei e dos deveres de cidadão. Por que ela não está lá "onde todos os crimes são cometidos"? Por que ela teima apenas em comparecer quando “eu, cidadão direito, cumpridor dos meus deveres", decido deixar de ser tão direito assim e descumprir meus deveres?
Manoel, o grande filósofo lusitano, não diria desta vez – que país gracioso. Apenas, que país curioso.