quinta-feira, 30 de abril de 2009

Enganação - Jayme Copstein

Toda a barulheira que se está fazendo em torno da corrupção no Congresso brasileiro só tem um objetivo: enganar o eleitor mais uma vez. Criar normas que seriam desnecessárias se senadores, deputados e seus assessores tivessem um comportamento decente é o mesmo que arrancar um “não faço mais de uma criança”. Ela o fará enquanto for imatura, da mesma maneira que os safados continuarão com suas safadezas.

Se a criança cresce e amadurece, quanto aos safados não há esperança de que deixem de sê-lo um dia.

Não há nada que possa moralizar o Congresso brasileiro a não ser a reforma política, permitindo acesso ao mandato a pessoas, que afora a conduta ilibada, tenham alguma contribuição a dar ao país. Isso só se descobre no discurso direto ao eleitor, com a exposição da vida pregressa do candidato, o que só é possível no voto distrital em que o eleitor sabe em quem está votando e o eleito sabe quem nele votou.

Em outras palavras, o eleitor fiscaliza, o eleito sabe que é fiscalizado, e os dois sabem também que o mandato pode ser retomado mediante representação direta à Justiça, e não submergir nas águas barrentas das Comissões de Ética, cujo nome deveria ser bem outro.

A revista Veja desta semana dedicou duas páginas à reforma política, analisando virtudes e defeitos de todos os sistemas de votação. O voto distrital foi o único contra o qual toda a argumentação coube em uma única linha – cria, segundo seus opositores, “vereadores” estaduais e federais.

Nem se necessita dizer da impossibilidade de cada um desligar-se de suas raízes. O ser humano é chão que pisa, a família que tem, a casa em que mora, a rua que habita, a cidade onde vive e assim até integrar-se na comunidade nacional.

É um defeito, se é correto chamá-lo assim, que nenhum sistema de votação conseguirá erradicar. É só relembrar, também, momentos ditos históricos, em que senadores e deputados se levantam para cantar o Hino Nacional – mais adequado seria o “Mamãe eu quero mamar” – e dedicam suas decisões ao “povo heróico e sofrido de São João das Bombachas ou Santa Urraca do Ziriguidum. Afora serem confessos vereadores de luxo, por sua falta de representatividade só têm compromisso com o próprio bolso.

quarta-feira, 29 de abril de 2009

De cara lavada - Jayme Copstein

Leitores me perguntam com frequência: onde estão os “caras pintadas” que abalaram a Nação em nome da moralidade?

Antes de responder, uma observação: senadores e deputados estão entregando os anéis para preservar os dedos. As providências supostamente moralizadoras em torno das passagens aéreas são apenas cortina de fumaça para esconder, por exemplo, que o Senado, além dos 81 atuais senadores, paga seguro-saúde perpétuo para 310 ex-senadores e seus familiares.

Mas, o que são ex-senadores? Para adquirir o título desta duvidosa nobreza, ninguém necessita de um voto sequer: basta ter substituído o titular na condição de suplente, por no mínimo seis meses – 180 dias – não se exigindo sequer continuidade.

É suficiente os dois “regra três” ocuparem a cadeira menos de dois dias por mês, ao longo dos 96 meses de mandato, nas licenças curtas do titular.

Por falar em caras pintadas, o senador Fernando Collor de Mello já emplacou o priminho Euclydes Affonso de Mello Neto, seu primeiro suplente, enquanto a priminha Ada Mercedes de Mello Marques Luz (PTB-AL), segunda suplente, cumpre estágio – mais algumas substituiçõezinhas e ela chega lá.

Mas Collor, o único que os caras pintadas alijaram da Presidência da República, é apenas um dos 81 senadores, mas não o único morgado do feudo. Há outros 160 suplentes e, não se esqueçam, seus familiares. Quantos deles já faturaram o plano de saúde para toda a vida, quantos ainda vão faturar?

Enquanto isso, na Câmara Federal, o deputado do Mato Grosso do Sul, Geraldo Resende, ora no PMDB pagou com a verba indenizatória da Câmara um dos advogados que o defendeu no Tribunal Superior Eleitoral quando sofreu processo de perda de mandato, ao abandonar a legenda do PP.

Teoricamente, advogados só podem contratar a consultoria de bacharéis para apoio à atividade parlamentar, o que não era o caso. Outro deputado, Eugênio Rabelo (PP-CE) fez a Câmara Federal pagar 77 passagens para a equipe de futebol do Ceará Sporting Club disputar partidas da Série B do Campeonato Brasileiro.

Voltando à pergunta inicial: onde estão os caras pintadas que abalaram a Nação em nome da moralidade? Alguns lavaram a dita cuja, outros a envernizaram, a maior parte afiou os dentes para mamar nas tetas da mãe-pátria. Eles não estão nem aí para a moralidade da Nação. Será que algum dia estiveram?

terça-feira, 28 de abril de 2009

Bom senso vale para gripe = Jayme Copstein

Bom senso e aquele tanto de civilidade que se perdeu nos últimos anos é tudo de que se precisa, neste momento, para enfrentar os riscos de propagação da gripe suína, casos já constatados no México, Estados Unidos, Canadá e Espanha.

O bom senso é necessário para não se entrar em pânico e tão somente prestar a atenção no que dizem as autoridades sanitárias, de cuja competência estamos muito servidos no Rio Grande do Sul, com a equipe do médico Osmar Terra na Secretaria Estadual da Saúde. A civilidade ensina a tapar boca e nariz com lenço descartável quando se espirra e depois, a lavar as mãos antes de apertar as dos nossos semelhantes, para não contaminá-los com os nossos vírus.

Gripe, seja qual for o vírus que a cause, tem sintomas bem definidos e podem ser detectados por qualquer pessoa – febre alta (dá arrepio de frio), garganta inflamada, tosse, sensação de fadiga e dores no corpo no corpo.

O que vai definir o tipo de gripe, se é comum, avícola ou suína, é a identificação do vírus no exame de sangue. Se não houver contato recente com quem tenha viajado às áreas de risco, o mais provável é que se trate de gripe comum, mas só o médico é que tem conhecimento para diagnosticar.

Aí entra de novo o bom senso porque o bebum do bodega da esquina, que receita cachaça com mel de pau até para câncer, não sabe que não é o vírus da gripe que mata, mas a reação exagerada do organismo de alguns doentes. Como se alguém para se defender de uma assombração que não vê, disparasse um revólver para todos os lados, inclusive contra si mesmo.

Tudo isso acontece porque não há doenças e sim doentes. Cada organismo reage de maneira diversa diante da mesmo germe. È por isso que o médico é indispensável na avaliação do quadro, seja para recomendar apenas líquidos e repouso, ou receitar medicamentos adequados ou até requerer a hospitalização, se for o caso – mas só ele é que tem condições dizer o que deve ser feito.

O que se depreende do noticiário, em primeiro lugar, é que as autoridades federais estão agindo com presteza e correção, monitorando nos aeroportos o desembarque de passageiros que tenham estado nas áreas de risco, notadamente no México onde foi registrado número significativo de casos e também de mortes. O pessoal da ANVISA vai para reter e observar os que eventualmente apresentem sintomas de gripe – ainda não aconteceu nenhum caso – e.está anotando o destino dos demais, para alcançá-los caso a doença venha a se manifestar.

Nada de pânico, portanto. O que se pode acrescentar é a necessidade da vacina antigripal e também de algumas precauções, como evitar locais com aglomeração de pessoas, contato direto com pessoas doentes e não compartilhar alimentos, copos, toalhas e objetos de uso pessoal.

E mais aquele conselho da vovó que dizia, com muita razão, que a gripe pega carona no frio e na umidade e entra no corpo pela cabeça, peito e pés. Abrigá-los ajuda também.

segunda-feira, 27 de abril de 2009

O eleitor e seu voto - Jayme Copstein

Sou réu confesso. Assustou-me menos o quilométrico currículo do ministro Carlos Augusto Ayres de Freiras Britto que sua opinião sobre o papel do cidadão nas eleições brasileiras. Ao justificar o empossamento de candidatos derrotados – e o empoçamento da vontade do eleitor – em eleições para governador do Maranhão, ele escreveu textualmente, em artigo publicado ontem na Folha de São Paulo:

“(...) eleição popular é uma coisa e, outra, votação de cada candidato”.

Em palavras mais simples, uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa, como já esclareceram para a posteridade, em circunstâncias diversas, notáveis teóricos da política brasileira.

Mas, enfim, se o ministro Brito nos convoca a profundas reflexões sobre verdades tão transcendentais, não havendo votação sem eleitor, conclui-se que o eleitor é apenas uma coisa na política brasileira.

Os mais doutos hão de pensar no voto acropóstico, pois na prática, como se comprova no caso do Maranhão, é sempre deixado de lado, e os gentis leitores hão de me fazer o favor de correr ao dicionário para saber do que se trata, enquanto escondo a minha ignorância e obscuridade na lembrança das famigeradas Comissões de Verificação dos Poderes da República Velha, quando os deputados governistas, depois de apurados os votos, decidiam em quem os eleitores tinham votado. Por coincidência, nunca na oposição.

A relembrança não está fora de propósito. Os dois candidatos ao governo do Maranhão, Jackson Lago e Rosena Sarney, tiveram suas candidaturas impugnadas por denúncias de corrupção, porém mantidas por medidas liminares. A Justiça Eleitoral, que concedeu as liminares, levou dois anos para julgar a procedência das denúncias contra Jackson Lago e deve bater este recorde, gastando outro tanto para decidir sobre as acusações contra Roseana Sarney.

Não há legislação específica para eleições estaduais, mas a Constituição Federal, à qual ela deverá se subordinar quando for criada, ordena nova eleição direta, vagando a presidência e a vice-presidência da República antes de se esgotar a primeira metade do mandato, ou eleição indireta pelo Congresso, se já tiver decorrido mais da metade do mandato.

O TSE/não entendeu assim e elucubrou sobre votos anulados, decidindo, como explicou com tanta clareza o ministro Carlos Augusto Ayres de Freiras Britto: “eleição popular é uma coisa e, outra, votação de cada candidato”. Ou seja, o eleitor é uma coisa, o seu voto é uma loisa.

E é bom parar aqui, sem provocações, porque, na próxima elucubração o TSE pode se zangar e decidir: o voto é tão secreto que nem o eleitor pode saber em quem está votando.

domingo, 26 de abril de 2009

A dignidade dos indignos - Jayme Copstein

Millôr Fernandes perguntou certa vez: “Vocês já examinaram a cara de absoluta dignidade desses parlamentares que não têm nenhuma?” Lembrei-me da frase, anteontem, quando ouvi um senador, absolutamente desconhecido cá no Sul (sem trocadilho – Sul do Brasil, entenda-se), justificar suas trampolinagens com os dinheiros públicos, alegando que, convocando-o para defender seus interesses, a Nação tinha de financiá-lo.

Afora poucas exceções, a maior parte das quais mal e mal consegue arrebanhar os votos dos próprios familiares, e também quando se trata de escolher síndico de condomínio, não me lembro de candidato a qualquer coisa neste país que não tenha bajulado eleitores, prometendo mundos e fundos, pagando cabos eleitorais, distribuindo beijos, abraços e cestas básicas.

De minha parte, ainda que comovido com o despreendimento do digno “pai da pátria”, quero preservá-lo desta compulsão ao martírio. Pode ficar em casa, no convívio da família, lá nos cafundós do Judas, alma preservada dos pecados, sem ser tentado pelos mensalões e congêneres.

A tanto que lhe ofereço, só exijo retribuição para lá de modesta: não encherá a minha caixa de correio com os seus santinhos nem a minha paciência com sua carantonha na tevê.

Os bicudos do Supremo - Jayme Copstein

Ícone do movimento negro brasileiro, o ator Abdias do Nascimento caiu na cilada de um repórter em busca de pauta, respondendo afirmativamente à pergunta de ser o racismo a origem do incidente de trasanteontem, no Supremo Tribunal Federal, entre o presidente da Corte, ministro Gilmar Mendes, e o ministro Joaquim Barbosa. Abdias viu, em respostas ásperas de Gilmar Mendes um “viés racista”.

O incidente, todavia, não se gerou com as asperezas de Mendes. Antes, com insistência, Barbosa acusara Mendes de cercear o debate sobre processo envolvendo burocratas do Paraná, julgado pela Corte na sua ausência. Barbosa estava licenciado na ocasião e – pelo menos foi o que deu a entender – ficou ressentido por não ter podido expressar sua opinião.

Foi a partir desta acusação que o episódio se desdobrou em ritual absolutamente inadequado à austeridade do STF. Joaquim Barbosa não consegue delimitar com precisão a fronteira entre a veemência e a descortesia, e isso nada tem a ver com raça, religião, biótipo ou preferências esportivas. Em outras ocasiões, também por diferenças de opinião, andou se atritando com colegas, excedeu-se e acabou pedindo desculpas. Com dois deles – Eros Grau e Marco Aurélio Mello sequer troca cumprimento convencionais.

Por sua vez, Gilmar Mendes não exercita as virtudes dos cristãos primitivos. Não se exigiria dele que oferecesse a outra face, apenas postura de magistrado entre magistrados, pois este é o papel do presidente do STF, como o demonstrou de sobejo a ministra Ellen Gracie.

Não se vê razão, porém, para o catastrofismo do noticiário a respeito do incidente. Mendes e Barbosa não são os dois únicos bicudos que não se beijam no STF, mas nenhuma dessas quizilas pessoais têm influído na atuação da Corte. Pelo contrário. Se faltam condores de oratória para vôos acima do Himalaia, sobre os arroubos dos que pregam procedimentos informais e atropeladores do bom Direito, na média têm prevalecido o equilíbrio e o bom-senso dos que preservam os cânones para assegurar aos brasileiros o exercício da cidadania plena. É algo tão inédito que causa estranheza a muita gente.

sábado, 25 de abril de 2009

O eleitor e seu voto - Jayme Copstein

Sou réu confesso. Assustou-me menos o quilométrico currículo do ministro Carlos Augusto Ayres de Freiras Britto que sua opinião sobre o papel do cidadão nas eleições brasileiras. Ao justificar o empossamento de candidatos derrotados – e o empoçamento da vontade do eleitor – em eleições para governador do Maranhão, ele escreveu textualmente, em artigo publicado ontem na Folha de São Paulo: “(...) eleição popular é uma coisa e, outra, votação de cada candidato”.

Em palavras mais simples, uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa, como já esclareceram para a posteridade, em circunstâncias diversas, notáveis teóricos da política brasileira.Mas, enfim, se o ministro Brito nos convoca a profundas reflexões sobre verdades tão transcendentais, não havendo votação sem eleitor, conclui-se que o eleitor é apenas uma coisa na política brasileira.

Os mais doutos hão de pensar no voto acropóstico, pois na prática, como se comprova no caso do Maranhão, é sempre deixado de lado, e os gentis leitores hão de me fazer o favor de correr ao dicionário para saber do que se trata, enquanto escondo a minha ignorância e obscuridade na lembrança das famigeradas Comissões de Verificação dos Poderes da República Velha, quando os deputados governistas, depois de apurados os votos, decidiam em quem os eleitores tinham votado. Por coincidência, nunca na oposição.

A relembrança não está fora de propósito. Os dois candidatos ao governo do Maranhão, Jackson Lago e Rosena Sarney, tiveram suas candidaturas impugnadas por denúncias de corrupção, porém mantidas por medidas liminares. A Justiça Eleitoral, que concedeu as liminares, levou dois anos para julgar a procedência das denúncias contra Jackson Lago e deve bater este recorde, gastando outro tanto para decidir sobre as acusações contra Roseana Sarney.

Não há legislação específica para eleições estaduais, mas a Constituição Federal, à qual ela deverá se subordinar quando for criada, ordena nova eleição direta, vagando a presidência e a vice-presidência da República antes de se esgotar a primeira metade do mandato, ou eleição indireta pelo Congresso, se já tiver decorrido mais da metade do mandato.

O TSE/não entendeu assim e elucubrou sobre votos anulados, decidindo, como explicou com tanta clareza o ministro Carlos Augusto Ayres de Freiras Britto: “eleição popular é uma coisa e, outra, votação de cada candidato”. Ou seja, o eleitor é uma coisa, o seu voto é uma loisa.

E é bom parar aqui, sem provocações, porque, na próxima elucubração o TSE pode se zangar e decidir: o voto é tão secreto que nem o eleitor pode saber em quem está votando.

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Ditos e achados - Mabel Rehnfeldt (*)

“Em vez da reforma agrária, o que os paraguaios estão recebendo é uma telenovela”.

(*) Mabel Rehnfeldt é colunista do jornal ABC Color. A frase foi escrita em mat´peria sobre as múltiplas paternidades atribuídas ao bispo licenciado Fernando Lugo, após empossar-se como presidente do Paraguai.

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Os bicudos do Supremo - Jayme Copstein

Ícone do movimento negro brasileiro, o ator Abdias do Nascimento caiu na cilada de um repórter em busca de pauta, respondendo afirmativamente à pergunta de ser o racismo a origem do incidente ontem, no Supremo Tribunal Federal, entre o presidente da Corte, Ministro Gilmar Mendes, e o ministro Joaquim Barbosa. Abdias viu, em respostas ásperas de Gilmar Mendes um “viés racista”.

O incidente, todavia, não se gerou com as asperezas de Mendes. Antes, Barbosa acusara Mendes, com alguma insistência, de cercear o debate sobre processo envolvendo burocratas do Paraná, julgado pela Corte na sua ausência. Barbosa estava licenciado na ocasião e ficou ressentido por não ter podido expressar a sua opinião.

Foi a partir desta acusação que o episódio se desdobrou em ritual absolutamente inadequado à austeridade do STF. A verdade é que Joaquim Barbosa não consegue delimitar com precisão a fronteira entre a veemência e a descortesia, e isso nada tem a ver com raça, religião, biótipo ou preferências esportivas. Em outras ocasiões, também por diferenças de opinião, andou se atritando com colegas, excedeu-se e acabou pedindo desculpas.

Não se vê razão, porém, para o catastrofismo do noticiário a respeito do incidente. Mendes e Barbosa não são os dois únicos bicudos que não se beijam no STF, mas nenhuma dessas quizilas pessoais têm influído na atuação da Corte. Pelo contrário. Se faltam condores de oratória para vôos acima do Himalaia, tem sobrado bom-senso para assegurar aos brasileiros Brasil o exercício da cidadania plena, algo tão inédito que causa estranheza a muita gente.

A lã das ovelhas - Jayme Copstein

Cada povo tem o político que merece? Ou cada ovelha têm o tosquiador que elege?

É absolutamente inofensiva e despida de qualquer sentido a reação do eleitor diante da Casa de Mãe Joana em que se transformou o Parlamento brasileiro.

Repetem-se os mesmos desaforos, as mesma piadinhas e mesmíssimas sugestões estapafúrdias de fechamento do Congresso, quando seria o caso de ir para as ruas exigir o fim imediato da patifaria, com a devolução do dinheiro apropriado ou indenização pelos abusos cometidos e, principalmente, a imediata reforma política – voto distrital, eleição também dos suplentes dos senadores e instituição da retomada do mandato, como existe em qualquer país civilizado, para que o povo decida o destino dos corruptos.

Da proverbial carneirice resulta mais tosquia: o presidente da Câmara Federal, ele próprio envolvido na esbórnia das passagens – vai moralizar o “pedaço” aumentando os subsídios dos deputados. Deseja apenas ganhar tempo. Conta com a falta de memória do eleitor e também porque amanhã é outro dia. Vocês sabem... aquele empreguinho, aquela concorrenciazinha...

De fato, cada ovelha tem o tosquiador que elege.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Ainda Tiradentes

A coluna de ontem recebeu inusitada quantidade de mensagens, de leitores discordando da afirmação aqui feita, de Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, não ser a figura central da conspiração, mas apenas símbolo adotado por seu martírio – foi o único a ser executado.

É uma pendenga antiga, esta, da Inconfidência Mineira, episódio cuja única documentação é os Autos da Devassa, o processo organizado pelas autoridades portuguesas contra os inconfidentes. Resulta da interpretação, uma narrativa sinuosa, que às vezes acrescenta sacralidades e demonizações, outras vezes omite fatos.

Um dos exemplos é a delação de Joaquim Silvério dos Reis, cujo nome completo era Joaquim Silvério dos Reis Montenegro Silveira Guites. Não foi ele o único nem o denunciante principal – inclusive foi preso com os demais conspiradores. Como se pode concluir dos Autos da Devassa, o primeiro delator, antes de Silvério dos Reis, foi Basílio de Brito Malheiro do Lago, de quem ninguém fala e teve a companhia, depois, de Inácio Correa Pamplona, outro nome sumido dos relatos.

A principal omissão, porém, na história da Inconfidência é a do nome de José Joaquim da Maia e Barbalho, o verdadeiro mentor da utopia de se proclamar uma república no Brasil. Fazia parte de um grupo de estudantes brasileiros matriculados na Universidade de Coimbra e, depois, na Universidade de Montpellier, fascinados com as idéias políticas que grassavam por toda a Europa e redundaram na Revolução Francesa. Eram seus companheiros Domingos Vidal de Barbosa, José Mariano Leal da Câmara e José Álvares Maciel.

Maia desenvolveu intensa atividade política na Europa, inclusive encontrando-se com Thomas Jefferson, naquela época apenas embaixador dos Estados Unidos, pedindo-lhe auxílio, caso o movimento tivesse êxito e tornasse o Brasil independente. Jefferson conversou e desconversou.

Prometeu ajuda ao novo país, depois da Independência, não antes, porque os EUA, recém emancipados da Inglaterra, não desejavam se atritar com Portugal. O encontro ocorreu entre março e maio de 1787. No fim daquele ano, Maia morreu tuberculoso, sem retornar ao Brasil.

Foi José Álvares Maciel, ao regressar a Minas Gerais, quem trouxe as ideias revolução e engajou Tiradentes na conspiração. Se o objetivo era, como se supõe, organizar a rebelião entre os militares, foi um equívoco.

Àquela altura, desiludido com as carreiras das armas, pelas preterições sofridas em promoções a que tinha direito, Tiradentes engajara-se na batalha pela concessão do fornecimento de águas à população do Rio de Janeiro, aonde ia com freqüência. Se não as gabolices com o destino que daria à fortuna ganha com o fornecimento, ou quando tomassem o poder – há depoimentos nesse sentido, nos Autos da Devassa – as frequentes viagens ao Rio de Janeiro podem ter despertado as suspeitas das autoridades portuguesas.
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Em resumo, a Inconfidência Mineira, a despeito de todas as reuniões conspiratórias, jamais passou de um piquenique intelectual. A não ser planos, nenhum dos participantes tinha nada de concreto na mão para realizá-la.

A própria Coroa Portuguesa sabia disso, tanto que os juízes receberam instruções para não condenar ninguém à morte. Tiradentes foi a exceção dentro do quadro comum em despotismos – amedrontamento.para prevenir discordâncias e inconformidades.

terça-feira, 21 de abril de 2009

Tiradentes - Jayme Copstein

O historiador Waldemar de Almeida Barbosa certa feita escreveu no excelente e hoje extinto DO Leitura (suplemento literário do Diário Oficial do Estado de São Paulo), que de todos os episódios da História do Brasil existem duas versões, a oficial, escrita por quem detém o poder no momento, e a versão documentada, defendida pela Universidade e pelos intelectuais.

No caso da Inconfidência Mineira, efeméride comemorada hoje, passa-se o contrário: intelectuais desejosos de repudiar a versão oficial, a de um líder que se sacrificou pela utopia – o herói enlouquecido de esperança, como disse Tancredo Neves – acabaram resvalando para a versão da corroa portuguesa que fez de Tiradentes um pobre diabo pondo tudo a perder com suas indiscrições.

A Inconfidência Mineira foi, de fato, momento importante da nossa História, mas não o único sonho revolucionário que precedeu a Independência. Foi incluído entre nossas datas magnas – vem logo depois do Sete de Setembro – por conveniência política. Em 1873, quando se realizou a Convenção de Itu e recrudesceu a propaganda republicana, houve necessidade de se encontrar um mártir para sacralizar o movimento. O médico Pedro Bandeira de Gouveia propôs Tiradentes como personagem porque sua tragédia pessoal se ajustava ao papel pretendido: de origem humilde, irreprimível idealismo que o tornava imprudente na pregação política, foi o único a ser executado, em uma lista numerosa de políticos, juristas, mineradores e fazendeiros.

A sacralização, contudo, redundou em mitos que até hoje são objeto de incandescentes polêmicas. Há até quem manifeste a convicção de que o enforcamento de Tiradentes, apesar de os juízes terem ordem expressa da Coroa, de não condenar ninguém à morte, deveu-se a que não tinha dinheiro para subornar os juízes obter sentença mais leve.

Os fatos não confirmam a suspeita. A ordem da Coroa, de não condenar ninguém à morte, veio antes de se iniciar o processo e não era nenhuma benevolência. Todos sabiam que a Inconfidência Mineira não passava, como já disse alguém, de um piquenique de intelectuais. Falavam muito em República, em não pagar o imposto do ouro exigido pela Coroa lusitana, mas não passava disso. Ninguém tinha um projeto de revolução. Além de faltar meios materiais, não havia nem força nem disposição para fazer qualquer coisa.

Foi por acaso que Tiradentes entrou na conspiração, não para organizar o levante entre “as forças armadas” como já disse alguém.. Viajava muito ao Rio de Janeiro, para conseguir a concessão do fornecimento de água à população carioca e vivia se gabando da fortuna e do consequente poder que ganharia se o seu projeto fosse aprovado.

Os inconfidentes viram no alferes o mensageiro ideal. As viagens frequentes, com objetivo conhecido, o tornariam insuspeito para levar mensagens secretas aos conspiradores do Rio de Janeiro. Só não contavam com a sua tagarelice. Ele acrescentava às suas jactâncias de poder, o tempo em que assumiria papel de relevância na nova República.

Essa é a conclusão que se tira dos depoimentos colhidos na Devassa, o processo que julgou os inconfidentes. Enquanto os demais buscavam atenuar sua culpa, Tiradentes percorreu caminho contrário. Gradativamente tomado por delírio de grandeza, o que fez Tancredo Neves chamá-lo de “herói enlouquecido de esperança”, assumiu a responsabilidade integral do movimento.

Foi seu passaporte para a História

segunda-feira, 20 de abril de 2009

A loucura da gente - Jayme Copstein

Anda acesa em São Paulo discussão sobre a legislação que extinguiu os hospitais psiquiátricos do Governo. Desencadeada pelo poeta Ferreira Gullar, a partir de artigo publicado na Folha de São Paulo no domingo retrasado, pedindo a revogação da “idiotice”, teve a intervenção dos calhordas do bom-mocismo que julgam ser a bem-aventurança mera questão de decreto.

O debate continuou ontem, na mesma Folha de São Paulo. Quem repôs os pontos nos “is” foi Jorge Cândido de Assis, portador de esquizofrenia e co-autor do livro "Entre a Razão e a Ilusão: Desmistificando a Loucura": nem oito nem oitenta – paciente fora de crise pode e deve ser tratado em ambulatórios. Em surto, não. É um risco para ele e para os outros.

O grande problema, portanto, não é o dilema, de internar ou não internar, que nem existe. O grande problema são as soluções simplórias, tipo retirar o sofá da sala para impedir namorados – os antigos – de fazer travessuras.

É o que afeta outras instituições da comunidade, particularmente os presídios, sepulcros onde a sociedade enterra culpas para se absolver dos crimes que comete. Ou alguém vê diferença entre a carne humana macerada nas masmorras do Estado e a que geme de dor e desamparo em macas, nos corredores dos hospitais superlotados?

Ferreira Gullar referiu-se à defesa que um deputado fez do fechamento dos manicômios ou hospícios – seja lá o nome que queiram dar – para evitar que famílias dos doentes mentais os internassem “para se livrar deles”. Como se essas mesmas famílias, de baixa renda, sem condições de manter os doentes em casa, não continuem se “livrando deles”, abandonando-os em outros bairros, em outras cidades até, bem longe de casa para que não encontrem o caminho de volta, restando-lhe perambular pelas ruas, dormir em baixo de pontes e viadutos, sofrer todo o tipo de violência e morrer de frio e de fome.
Cirandas
Deveras engraçada a notícia estampada por O Sul, ontem, revelando comentários do presidente da França, Nicolas Sarkosy, sobre seus colegas de outros países, durante encontro com deputados e senadores, para relatar suas impressões sobre o recente encontro do G-20 em Londres. O governo francês negou que seu presidente tivesse dito coisas vazadas por “fontes anônimas” ao jornal Liberation de Paris.
Segundo a notícia, Sarkozy acha Obama inteligente e carismático, porém indeciso, enquanto o primeiro-ministro espanhol José Luís Rodrigues Zapatero lhe pareceu meio burro e a chanceler Ângela Merkel teve de dar a mão à palmatória, concordando com ele quando a crise mostrou-se mais séria na Alemanha do que ela tinha percebido.
O jornal The Times. De Londres mostrou-se alarmado: “É o fim da curta lua-de-mel franco-americana”, publicou. El País, de Madri pediu briga, dizendo que as supostas declarações de Sarkozy deixaram “as nações à beira de um incidente diplomático”. Os redatores de tais comentários provavelmente têm pouca experiência em relações internacionais. Se houvesse um máquina de ler pensamentos e cada presidente levasse a sério o que outro presidente acha a seu respeito, eles se pegariam a tapas em todos os seus encontros, algo como uma mesa de pôquer onde só tem passador de cachorro.
O único que não sabe disso é o “Cara”, plenamente convicto de que relações internacionais é pura “ciranda-cirandinha-vamos-todos-cirandar”.

domingo, 19 de abril de 2009

Cirandas - Jayme Copstein

Deveras engraçada a notícia estampada por O Sul, ontem, revelando comentários do presidente da França, Nicolas Sarkosy, sobre seus colegas de outros países, durante encontro com deputados e senadores, para relatar suas impressões sobre o recente encontro do G-20 em Londres. O governo francês negou que seu presidente tivesse dito coisas vazadas por “fontes anônimas” ao jornal Liberation de Paris.

Segundo a notícia, Sarkozy acha Obama inteligente e carismático, porém indeciso, enquanto o primeiro-ministro espanhol José Luís Rodrigues Zapatero lhe pareceu meio burro e a chanceler Ângela Merkel teve de dar a mão à palmatória, concordando com ele quando a crise mostrou-se mais séria na Alemanha do que ela tinha percebido.

O jornal The Times. De Londres mostrou-se alarmado: “É o fim da curta lua-de-mel franco-americana”, publicou.

El País, de Madri pediu briga, dizendo que as supostas declarações de Sarkozy deixaram “as nações à beira de um incidente diplomático”.

Os redatores de tais comentários provavelmente têm pouca experiência em relações internacionais. Se houvesse um máquina de ler pensamentos e cada presidente levasse a sério o que outro presidente acha a seu respeito, eles se pegariam a tapas em todos os seus encontros, algo como uma mesa de pôquer onde só tem passador de cachorro.

O único que não sabe disso é o “Cara”, plenamente convicto de que relações internacionais é pura “ciranda-cirandinha-vamos-todos-cirandar”.

sábado, 18 de abril de 2009

Hitler e os judeus - Jayme Copstein

Notícia colhida há muito tempo em tablóides ingleses, os mesmos cuja maior preocupação parece ser a cor das calcinhas de Elisabeth II, atribuiu o anti-semitismo de Hitler e o conseqüente Holocausto a sífilis que ele teria contraído de uma prostituta judia.

Ou seja: se a prostituta não fosse judia, Hitler não teria sido anti-semita e não teria havido Holocausto e todos seríamos felizes para sempre...

A tese foi levantada por um psiquiatra de nome Bassem Habeeb em congresso ou seminário internacional do Royal College of Psychiatrists, em Edimburgo, Escócia, transformado pelo noticiário da época em “encontro mundial”.

Procurei na própria Internet currículo que qualificasse Bassem Habeeb como palestrante de um encontro mundial. Em vão. Menos ainda encontrei que os psiquiatras escoceses tenham cacife para iluminar a psiquiatria universal.

Enfim, vá lá. Vivemos em uma época de irrestrita liberdade de expressão, que oxalá não se esgote nunca, para que jamais volte a prevalecer o obscurantismo do qual o Holocausto foi conseqüência. Dentro do mesmo princípio, ninguém me negará o direito de defender a tese de que psiquiatras escoceses possam se contaminar com a paranóia de seus pacientes, ou contaminá-los com sua própria loucura.

Minha maior preocupação, entretanto, é bem outra. É o cuidado para não enxergar anti-semitismo em tudo, até mesmo quando alguém esbarra em mim na rua, sem querer. O problema, contudo, aqui se coloca de maneira diferente. Atribuir culpa às minorias – aos negros, aos homossexuais, aos judeus, aos ciganos, aos armênios – pelas tragédias que os vitimaram ao longo do tempo, é artimanha muito antiga do racismo.
É uma técnica que consiste em ordenar fatos, sem nenhum critério lógico ou cronológico, para justificar crimes que muitas vezes os antecederam. Os autores e comentaristas de “Os protocolos dos sábios do Sião” foram mestres nesta distorção, a ponto de o próprio Adolf Hitler reconhecer a fraude, mas convencer-se que a “realidade dos fatos” a legitimava.

A seriedade impunha aos psiquiatras reunidos em Edimburgo que exigissem de Bassem Habeeb, para admitir sua tese ao debate e seqüente divulgação, as evidências científicas sobre as quais criou a versão.

Não há nenhuma referência, em toda a vasta bibliografia sobre o nazismo e seus protagonistas, de que Hitler tenha contraído sífilis em qualquer época de sua vida. Suas dificuldades em se relacionar com mulheres, prostitutas ou não, tinha outra origem: a invencível timidez, descrita em “O jovem Hitler que conheci”, por seu único amigo de infância, o maestro August Kubizek.

Nada a ver com homossexualismo, como algumas análises superficiais também pretenderam retratá-lo.

Mas que Hitler tivesse contraído a sífilis de uma prostituta, a não ser com ela tivesse vivido um razoável período de tempo, como identificá-la como judia, em encontros instantâneos e fortuitos? Não seria, acaso, cigana, cujo povo ele também massacrou? Ou eslava? – Os civis poloneses e soviéticos mortos pelos nazistas, fora de ações bélicas, apenas para fabricar “espaço vital”, somam mais de 10 milhões de pessoas.

Quem sabe um travesti? – O ódio de Hitler aos homossexuais era igualmente invencível.

Pode ser que não haja nada por trás tese de Bassem Habeeb e que eu apenas fique cismado com coisas desse tipo. Será que os psiquiatras de Edimburgo não vieram com a novidade de deixar que pacientes também apresentem teses em seus congressos?

Ora, ora...

sexta-feira, 17 de abril de 2009

A governadora - Jayme Copstein

A governadora Yeda Crusius foi convidada, ontem da direção e dos profissionais que atuam nos veículos da Rede Riograndense de Comunicação para o café da manhã. Conversou mais de duas horas com os jornalistas de O Sul, da Rádio Pampa e da TV Pampa, expondo seus pontos de vista e respondendo perguntas.

Exceto voto distrital e parlamentarismo, convicção de que compartilhamos com significativo número de cidadãos, mas utopia desalentada pelo ceticismo diante da prostituída prática política enraizada no país, não tinha nada a lhe perguntar.

Venho observado com atenção o destemor com que Yeda Crusius enfrenta verdadeiro fogo de barragem, começado alguns minutos após ter entrado no Palácio Piratini para governar, sem perder a cabeça, mas a cada momento provocando, com excessos de temperamento, novos conflitos. Nada de vulgaridades, porém.

Somos amigos desde os tempos em que ambos trabalhávamos na RBS, Yeda comentando economia na RBS TV, eu apresentando o Brasil na Madrugada, na Rádio Gaúcha. Afeiçoei-me a ela tanto por suas virtudes quanto por seus defeitos, mas há um traço particular do seu caráter que ora parece defeito, ora parece virtude.

À primeira vista, até se poderá falar em teimosia, para definir o apego às decisões assumidas, desatendendo a palpites, contrariando vontades e desafiando interesses. Depois, porém, quando se analisam os resultados da “teimosia”, como, por exemplo, o inédito equilíbrio das contas públicas do Rio Grande do Sul ou o também inédito equacionamento para saldar os precatórios, começa-se a procurar palavra melhor. Ocorre-me: tenacidade. Persistência? Perseverança? Tenacidade?

Não sei se Yeda é candidata à reeleição e, se for, consegue reeleger-se. Quando uma pergunta se aproximou deste tema, não repetiu o esfarrapado discurso que não diz “sim” nem “não”, mas espertamente significa que cavalo passando encilhado é para ser montado. Obstinou-se a falar do que pretende fazer até o último dia do mandato e anunciou que a destroçada segurança pública é a próxima meta. Yeda é a governante que mais recursos destinou à área no Rio Grande do Sul, mas ela própria reconhece que a situação é de caos. Exige uma ação pronta e integrada.

Tudo o que enfrentou até agora é nada diante do desafio que isso representa e há quem sinta arrepios só de ouvir falar em mexer na casa dos maribondos. Mas é o que vai decidir se a governadora tem a teimosia como defeito ou a tenacidade como virtude.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

A nova religião - Jayme Copstein

O tititi da vez é a paternidade de um filho informal, assumida com relutância pelo atual presidente do Paraguai, o bispo licenciado da Igreja Católica Romana, Fernando Lugo, mas assim mesmo louvada por colegas de batina, como demonstração de honestidade e transparência.

Não estranhem nenhum dos termos usados no parágrafo anterior. Um bispo católico jamais deixa de ser bispo. Mesmo nos casos extremos de excomunhão, os padres que ordenarem são legalmente padres à luz do Direito Canônico. Levantada a excomunhão, retomados os votos e a reafirmação da obediência ao Papa, são devolvidos às suas mitras, tal como aconteceu recentemente com os bispos lefevristas.

Já “paternidade informal” corre por conta do “politicamente correto”. Soa com menos cinismo que a também politicamente correta “cultura deles”, como argumentou o cientista político Alfredo Boccia Paz: “A sociedade paraguaia é bem flexível sobre esses assuntos”.

O que está em discussão não é a flexibilidade do povo paraguaio em matéria de prática sexual, mas a conduta de um bispo católico romano, quando ainda comprometido com os votos de celibato e castidade, seduzindo uma menina de 17 anos a quem devia preparar para a Crisma, mantendo-a como amante durante longo tempo sob promessa de casamento e lhe dando uma machista bofetada quando ela engravidou e lhe cobrou responsabilidades de pai.

A pergunta pertinente é se Fernando Lugo, sacerdote ou não de qualquer religião, mereceria tanta atenção e projeção não fosse um desses tantos gurus populistas, paridos no ventre fértil da política latino-americana, e aos quais todos os pecados são perdoados, alguns, inclusive, transformados em excelsas virtudes.

Não está em questão, no caso, a norma da Igreja Católica Romana, impondo celibato aos seus sacerdotes. A constatação é outra: estamos diante de uma nova religião com indulgências plenas muito peculiares. Basta pronunciar o sagrado nome de Marx para se obter a absolvição de todos os pecados.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Os “estrangeiros” - Jayme Copstein

Leitores me escrevem preocupados com a notícia de que o Senado aprovou em primeiro turno o Projeto de Emenda Constitucional que aumenta o número de deputados federais, para permitir a representação de brasileiros residentes no exterior.

“Se já deixaram de vez o país, se querem ser estrangeiros, por que serem representados no Parlamento?”, me pergunta alguém. Outro quer saber o que esses deputados acrescentariam ao Congresso, já que não podem propor ou decidir nada fora do território nacional. E assim por diante.

Os leitores têm toda a razão de se mostrar indignados e até se poderia alinhar argumentos mais fortes, mas é tempestade em copo d’água. Apesar de aprovada por unanimidade no primeiro turno, deverá ser rejeitada por grande maioria no segundo turno de votação e ser sepultada.

A novidade saiu da cachola do senador Cristóvão Buarque, cujos neurônios há algum tempo entraram em greve. É dele, também, a sugestão de um plebiscito para decidir-se sobre o fechamento do Congresso.

A criação dos novos deputados passou na primeira votação para não trancar a pauta do Senado e permitir a aprovação de novas regras para o pagamento dos precatórios. Nessas circunstâncias, passaria até a revogação da Lei da Gravidade

terça-feira, 14 de abril de 2009

O velho pecado - Jayme Copstein

O Estado da Califórnia elegeu o álcool de cana como combustível alternativo à gasolina e ao diesel por ser significativamente menos poluente; Ao mesmo tempo em que é boa notícia para o Brasil, o mais importante produtor mundial, deixa transparecer o velho pecado deste país, o da falta de investimento em pesquisa de tecnologia para assegurar privilégios que a Natureza lhe deu de presente.

Vai para mais de 30 anos que se desenvolveu no Brasil a produção do álcool combustível. A tanto quanto se sabe, nada a ela foi acrescentado em termos de produtividade. Produz-se mais porque se planta mais, não porque se extraia mais da cana plantada. A decisão da Califórnia está a indicar que tanto o hidrogênio quanto a eletricidade – os dois mais falados – ainda estão longe de se universalizar como combustível para veículos automotores.

A notícia, publicada originalmente no jornal Valor Econômico e glosada em editorial da Folha de São Paulo, menciona relatório do Conselho de Recursos Aéreos da Califórnia, dando conta de que no Brasil o álcool reduziu em 72% as emissões de veículos que agravam o efeito estufa. O relatório recomenda o nosso produto como vital para reduzir em até 80%, nos próximos 40 anos, os níveis atuais de carbono na atmosfera californiana.

Evidente, o álcool combustível não está livre de polêmicas. Argumento consistente contra a ampliação dos canaviais assinala a redução de outras culturas, afetando a produção de alimentos. É aí que entra a necessidade da pesquisa de tecnologia, aliás, já em andamento nos Estados Unidos e em países da Europa, para extrair o álcool da celulose, presente em qualquer vegetal e, enfatize-se, no bagaço da cana, descartado depois da moagem.

Não é difícil saber-se quanto de álcool ainda poderia ser extraído da celulose do bagaço, caso o governo brasileiro percebesse que o calendário já rodou até o século 21, para não se repetir com a cana-de-açúcar o que, no passado, aconteceu com o café, quando éramos o “rei do pedaço”. Hoje, afora disputarmos mercado com outros países, importamos tecnologia dos alemães e dos italianos que não produzem um grão sequer em suas próprias terras.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

A volta da assombração - Jayme Copstein

É notícia interessante, mas tenho cá minhas dúvidas se entusiasmante: segundo o Ministério da Saúde, de 1980 a 2003, houve decréscimo anual de 9% nas estatísticas de morte por doenças cardíacas.

Os números foram publicados em estudo de pesquisadores da Fiocruz e Universidade Federal do Rio de Janeiro, mas inspiram um pergunta: qual foi o aumento das mortes prematuras – gente moça que não viveu o suficiente para sofrer do coração – provocadas por crimes e acidentes de trânsito?

Na primeira metade do século passado, sem as políticas de prevenção e antes do surgimento dos antibióticos, estatisticamente morria-se muito menos ainda de câncer e das doenças cardíacas. A mortalidade infantil e a tuberculose ceifavam vidas de tal maneira no Brasil (a expectativa de vida mal ultrapassava 40 anos, ao começar a segunda metade do século), que poucos viviam o suficiente para sofrer daquelas moléstias.

Por falar em tuberculose, John Rennie, editor da revista American Science, alertou os leitores na edição de março, para o fato de que a doença nunca deixou de ser uma das ameaças mais letais que afetam a humanidade. Nos últimos 60 anos, porém, esta realidade tem passado despercebida dos meios de comunicação social porque 99% dos casos são assinalados nas camadas pobres dos países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento, caso queiram dourar a pílula.

Reside aí, também, a omissão da cobiçosa indústria farmacêutica na pesquisa e fabricação de remédios para a tuberculose porque se trata de consumidores de baixo poder aquisitivo, incapazes de proporcionar os polpudos lucros que os grandes laboratórios andam sempre à caça.

É verdade que medicamentos potentes foram criados, mas perderam gradativamente a eficácia porque a ignorância, parceira infalível da pobreza, faz as pessoas interromperem o tratamento tão logo desapareçam os sintomas, sem a eliminação completa da infecção. Resultou daí uma cepa microbiana super-resistente que encontrou no enfraquecimento das defesas orgânicas consequente à AIDS, o paraíso para a sua proliferação.
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É evidente que não estamos nos defrontando com o irrevogável Apocalipse, mas apenas diante de uma das muitas lições que os nossos equívocos podem proporcionar. Políticas de saúde exigem educação do povo e esta se faz com equipes bem estruturadas e treinadas de agentes sanitários, não com comerciais milionários, capazes de arrebanhar prêmios em festivais de propaganda, porém incapazes de serem assimilados pelos seus destinatários.

domingo, 12 de abril de 2009

Ditos e Achados - Marcos Rolim (*)

“A administração pública no Brasil se fragiliza por muitas razões. A primeira delas é a corrupção endêmica – um fenômeno que, a par de todas as denúncias, segue subestimado. A segunda é a colonização do Estado pelos partidos; processo que torna a ideia de ‘interesse público’ uma miragem e dissemina a incompetência”.

(*) Marcos Rolim, jornalista, em “Pelo bom Debate” (Zero Hora, 12/04).

sexta-feira, 10 de abril de 2009

Caixa de Perguntas - Jayme Copstein

Já houve tempo em que emissoras de rádio tinham espaços para responder perguntas de seus ouvintes. Quem começou foi Almirante (Henrique Foréis), em mil novencentos e trinta e poucos, com sua “Caixa de Perguntas”, apresentada em auditório e dando prêmios a espectadores que soubessem a resposta.
O programa de maior sucesso de todos os tempos, entretanto, foi “Pergunte ao João”, na Rádio Jornal do Brasil, título sugerido por Alberto Dines ao seu criador e redator, o jornalista João Evangelista João Evangelista Alves de Sousa e tendo, entre seus apresentadores, a atriz Irene Ravache, então em início de carreira.

Não consigo entender porque um programa de tanto agrado para os ouvintes foi riscado da grade de programação. O “Pergunte ao João” chegou a ser publicado também no Jornal do Brasil. Lembro-me do sucesso por longos anos, do “Pergunte à Guaíba”, escrito originalmente por Luiz Gualdi e depois por mim, por Amir Domingues e outros colegas, do quais não guardei o nome, até sair do ar.

Ouvinte curioso – e leitor, também – é o que não falta. João Evangelista reuniu em quatro volumes toda a sua produção de “Pergunte ao João”, aos quais deu o subtítulo de “Um Curioso a Serviço de Milhares de Curiosos”. Lembro também – e aqui conto mais uma vez – que a primeira coisa que me perguntaram, quando comecei a apresentar o Brasil na Madrugada, na Rádio Gaúcha, foi: como se conhece a fêmea do quero-quero?

Nunca consegui descobrir. Já perguntei a meio mundo. Palpite não tem faltado nem mesmo referência a certo ferrão traseiro que tornaria o namoro um inferno para o macho. Resposta concreta, no duro, jamais.

Por que não me perguntaram a diferença entre jacarés e crocodilos? Esta eu sei por ter lido no Almanaque do Biotônico Fontoura que nem existe mais. Crocodilos têm o focinho mais estreito e comprido. Quando fecham a boca, aquele quarto dentão de cada lado fica de fora, metendo medo em todo o mundo. Jacaré é mais discreto.

Sei também a diferença entre camelos e dromedários. O camelo tem duas corcovas, o dromedário parece só ter uma porque a segunda se atrofiou. Sei até mais e conto sempre que me pergunto sobre esta diferença: ao tempo do império, alguém inventou a importação de camelos para resolver o problema da seca no Nordeste...

Típica idéia de jumento. Os animais foram comprados em Paris pela Sociedade Imperial da Alienação (esse negócio de Ongs é antigo!...) e chegaram em Fortaleza em 23 de julho de 1859.

Eram quatorze animais, quatro machos, dez fêmeas. Quando desembarcaram, todo mundo começou a rir. Em lugar de camelos, tinham vindo dromedários. Ninguém sabia a diferença. Uns achavam que a corcova faltante era defeito de fabricação. Outros, que tinha sido furtada pelo caminho, para ser vendida no “camelódromo”. A bicharada nem chegou a dar cria. Em poucos meses, morreu tudo.

Agora, como se identifica a fêmea do quero-quero, tenham paciência. Não consigo descobrir. Depois de tanto palpite furado, acho que só perguntando ao macho. Por ser o maior interessado no assunto, deve ser o único a conhecer a diferença.

quinta-feira, 9 de abril de 2009

O público e o privado - Jayme Copstein

Com freqüência, lêem-se campanhas nos jornais para não se emporcalhar as ruas com lixo. Motoristas jogando cascas de frutas, latas de cerveja, outras embalagens e até coisas inimagináveis pelas janelas dos carros é um espetáculo comum em qualquer cidade brasileira. Bueiros entupidos por garrafas de plástico e outros objetos, também inimagináveis, é lugar comum em noticiário de tevê nos alagamentos dos dias de chuva.

Não é por falta de apelos e conclamações que as pessoas continuam emporcalhando as ruas. O que há é uma visão equivocada do “público” e do “privado”. Lembro-me de cena que testemunhei na Rua da Praia, em Porto Alegre, de um menina de 15 anos repreendida por uma senhora porque tinha jogado a embalagem do picolé no calçadão, mesmo com uma lixeira disponível a dois metros de distância. A menina respondeu: “A rua é pública e eu faço o que eu quero.”

Se a rua é pública – e de fato é – pertence a todos, não a alguém em particular, à menina em questão ou a quem mais seja. Não pode ser usada ao arbítrio de cada um. Dentro de casa – espaço privado – sim, o dono ou os seus familiares podem jogar o que bem entenderem no chão, escreverem o que bem quiserem nas paredes e até fazerem banheiro da sala de visitas. Este, aliás, foi o tema de um comercial premiado em festival internacional de propaganda: se você não faz dentro de casa, que é sua, por que faz na rua que é de todos?

Se aprofundarmos a análise da questão, vamos chegar à conclusão de não haver diferença entre o aparentemente inofensivo porcalhão que joga lixo nas ruas e o político ladrão que se ceva nos dinheiros públicos. Se qualquer de um de nós deixar cair a carteira, ao passarmos perto de um governante, senador, deputado ou vereador, tenham certeza: eles a devolverão intacta em comovedora demonstração de honestidade.

Porém, quando se trata de dinheiro da Nação – sendo público, não é de ninguém – fazem o que bem entendem: pagam celular dos filhos, compram passagens aéreas para os amigos, abastecem o carro da família, contratam a empregada doméstica como assessora, esbanjam em restaurantes caros e até o põem tranquilamente no bolso.

De que nos queixamos, então? De não termos um mandato político? No resto, parece que somos muito iguais.

Abrantes e seu quartel -- Jayme Copstein

Enquanto Ruy Castro, na Folha de São Paulo, festejava o “choque de ordem” do prefeito carioca Eduardo Paes, o noticiário lamentava que a “lei seca” tinha ido para o beleléu – o número de bebuns na direção de veículos voltou ao que era antes de julho de 2007, quando foi entronizada com honras de grã-senhor.

Ainda em janeiro de 2008, entrevistando agentes rodoviários federais na Rádio Pampa, expressei dúvidas de que a fiscalização se mantivesse com o rigor necessário para fazer a lei “pegar”.

Não deu outra. A volta do álcool à direção foi gradativa até chegar ao que era antes. Vai acontecer a mesma coisa com o “choque de ordem” do prefeito do Rio, que pretende terminar com os abusos dos flanelinhas, dos camelôs, de gente urinando nos postes e nas árvores, de caminhões atravancando ruas a qualquer hora para descarregar cerveja nos bares, carros estacionados em lugares proibidos – enfim, daquela bagunça institucionalizada que mantém o país atado ao atraso.

Nos próximos dias, haverá muitas fotos nos jornais, o prefeito Eduardo Paes dará muitas entrevistas, será cogitado para o governo do Estado ou para a vice-presidência da República e tudo voltará ao que era dantes no quartel de Abrantes.

No Brasil, fiscalização, em matéria omissão e desleixo, assim como era no princípio, será agora e sempre, por todos os séculos dos séculos, amém. É uma espécie de religião.

Ditos e achados - Jayme Copstein

O problema das profecias é que elas dependem do futuro. Em um país como o Brasil, onde nem o passado é confiável, até Nostradamus corre o risco de morrer de fome.

A Páscoa de todos - Jayme Copstein

Hoje é o início das comemorações da Páscoa, e há quem pense que há uma Páscoa judaica e uma Páscoa cristã. Equívoco. Trata-se da mesma festa e mostra o estreito vínculo entre as duas religiões, na verdade uma só religião, com pequenas diferenças litúrgicas, com uma única mensagem de amor e de confiança em Deus, e separadas apenas por um tempo de verbo. Os judeus dizem - o Messias virá. Os cristãos - o Messias já veio.

O nome Páscoa vem de Pessah, em hebraico. Significa passagem. Para os judeus recorda a libertação de seus ancestrais da escravidão no Egito, por Moisés, no 13º século antes de Cristo. É a festa mais antiga e o mais importante acontecimento da história judaica, porque foi o prelúdio da revelação no Monte Sinai.

Desde este distante século 13 antes de Cristo, há 3.308 anos, os judeus e celebram a Páscoa da mesma maneira. Na primeira lua cheia que se sucede ao dia 14 de Nissan, iniciam os festejos com uma ceia, chamada seder, cujo cardápio consiste de erva amargas, matzá, o pão ázimo (pão sem fermento) - e um cordeiro assado. A cerimônia começa com o homem mais velho da família abençoando a data com um gole de vinho, que todos os presentes também tomarão, junto com uma partícula de matzá, polvilhada com um pouco de sal.

Uma das partes mais bonitas desta ceia é quando se pergunta às crianças - por que esta noite é diferente de todas outras noites? Por que nas outras noites podemos comer pão comum ou matzá e nesta só podemos comer o matzá? A resposta é uma lição da história: por que lembramos os sofrimentos do passado, o amor de Deus que nos resgatou e nos deu por recompensa a liberdade de viver e a alegria da nossa fé em seu nome. Este, em resumo, o simbolismo da Páscoa festejada pelos judeus.

Os cristãos comemoram, junto com a Páscoa, a Ressurreição de Jesus. Ainda que no passado todos os ramos do cristianismo as religiões dessem mais ênfase à crucificação de Jesus, episódio historicamente pouco esclarecido, sem o dogma da Ressurreição, o cristianismo não existiria. Jesus teria sido apenas mais um judeu morto pelos romanos e o cristianismo mais uma seita entre as tantas que proliferaram naquela época.

Como os eventos principais da vida de Jesus ocorreram na Páscoa – a Santa Ceia é um seder – ela é, também, é a data mais importante do Cristianismo, culminando sua comemoração com a Ressurreição. No início, a Páscoa era uma só porque judeus e judeus-cristãos, após a crucificação de Jesus, continuaram sendo apenas judeus. Os desentendimentos começaram no ano 70 da nossa era, quando fiéis aos ensinamentos de não opor resistência à violência, os judeus-cristãos estiveram ausentes na resistência judaica contra os romanos na Fortaleza de Massada.

O rompimento definitivo aconteceu no ano 132, última revolta judaica contra o domínio romano, desencadeada pela ordem do imperador Adriano, para que se construísse um templo a Júpiter no local onde estivera o templo de Jerusalém. Nesta ocasião, desejando reforçar os laços nacionais, o rabino Akiba proclamou o chefe da revolta, Simão Bar-Kokheba, o Messias anunciado pelos profetas. Os judeus-cristãos, na crença de que o Messias tinha vindo com Jesus, não podiam aceitar e se separaram definitivamente.

terça-feira, 7 de abril de 2009

A banda de Zé Sarney - Jayme Copstein

Todo domingo havia banda no coreto do jardim. Era a banda do Serafim, que tinha uma tuba, dentro da qual entrou um gato, e a tuba tocou assim... rom-rom-rom – MIAU – rom-rom-rom-rom.

É uma velha marcha de Carnaval, mas como vivemos em alegria permanente, como nunca na história deste país, é meio parecida com o empenho (reserva de verba) de 135 mil reais que o Senado fez para comprar microfones, um de alta sensibilidade para captação de voz, três para captação de instrumentos, sete varas para usomde microfones direcionais e outros 10 para repórteres.

Tudo indica que Zé Sarney, em sua nova e moralizadora administração do Senado, decidiu formar uma banda para alegrar o povo desta Nação, tão cansado de demagogia e corrupção.

Especula-se quem será o maestro, se Renan Calheiros ou Fernando Collor de Mello, sabidamente dois eminentes tocadores de tuba com gato. Como será um espetáculo híbrido, misturando forró com prestidigitação, já se formou uma fila imensa de candidatos a mágicos especializados em sumir com o miado do gato. O bicho berra dentro da tuba, mas todos fingem que não ouvem. O que, aliás, já enseja a oportunidade de se empenhar mais alguns milhares de reais para comprar aparelhos de surdez.

Enquanto isso, a Câmara Federal também empenhou uma verbinha de 560 reais para comprar “frascos de creme para as mãos”. Com o que o ilustre presidente Michel Temer cumpre a promessa de acabar com os escândalos de verbas de representação, passagens aéreas, combustível, auxílio moradia etc. etc. etc. Lubrificando os dedos, a manipulação torna-se mais discreta, suave e silenciosa.

De fato, não dá escândalo. E para mostrar seu despreendimento, como não há referência no Orçamento da Câmara, o ilustre presidente deve pagar do próprio bolso o Óleo de Peroba para manter impávida a sua augusta face.

Polêmica - Jayme Copstein

Despercebida no noticiário – curiosamente não recebeu ênfase – uma resolução do Conselho de Direitos Humanos da ONU contra a difamação religiosa está despertando polêmica. Proposta pelo Paquistão, em nome da Organização da Conferência Islâmica e aprovada em 26 de março, por 23 votos contra 11 (houve 13 abstenções), a resolução expressa “profunda preocupação pela frequência da difamação das religiões”, mas só menciona o Islã entre elas.

A Igreja Católica reagiu quando a resolução foi publicada, com o arcebispo Silvano Tomasi, observador permanente vaticano na ONU em Genebra, afirmando, através da Rádio Vaticano que atualmente a comunidade cristã é a mais discriminada do mundo, particularmente no próprio Paquistão, proponente da resolução, onde a Lei de Blasfêmia é instrumento de perseguição religiosa e causa cada vez mais vítimas, condenado a morte ou prisão perpétua por “ofensas ao Alcorão”.

“Se falamos de lutae contra a difamação religiosa, o desafio consiste em encontrar um equilíbrio saudável, que harmonize a própria liberdade com o respeito dos sentimentos dos demais, e o caminho para conseguir este objetivo passa por aceitar os princípios fundamentais de liberdade, que estão inscritos nos tratados internacionais”, afirmou o arcebispo Tomasi.

segunda-feira, 6 de abril de 2009

O gás do bebum - Jayme Copstein

O esbanjamento do governo brasileiro no tempo das vacas gordas pode ser comparado à prodigalidade do bebum no bar, em dia de salário – todos bebem, ele paga. E vai pagando até o que ninguém bebe porque, como todos sabemos, nada do bebum tem dono. O dinheiro não seria exceção.

É o que está acontecendo com o preço do gás, em cujo cálculo se somaram a sede de dólares do “companheiro” Morales, mais outro tanto para financiar parte das obras da Petrobrás previstas no PAC, mais outra fração ainda a apurar em fraudes e superfaturamentos de contratos com a Petrobrás, descobertos pela Polícia Federal na Operação Águas Profundas e Operação Royalties, segundo denúncia de Diogo Mainardi.

Em consequência, o preço do gás vendido à indústria no Brasil – US$ 12,36 (São Paulo) e US$ 10,30 (Rio de Janeiro), por milhão de BTU aumentou 60,7% em 2008, equivalendo ao dobro do valor cobrado nos Estados Unidos e Inglaterra (US$ 5,30), ou Alemanha e, França, entre outros países (US$ 6,50) e quase o triplo no México (US$ 4,70).

Com o preço do gás nessas alturas, a falta de competitividade em um mercado em crise afetou as indústrias que movem suas plantas queimando gás. Grandes empresas do setor vidreiro e do cerâmico fecharam suas fábricas, produtores de fertilizantes planejam voltar ao óleo combustível, mais barato, porém, bem mais poluente.

Enquanto isso, o bebum continua fazendo sucesso no bar, com a companheirada lhe batendo nas costas e o festejando como o “Cara”. Ele não tem medo de ser feliz.

Ano da Astronomia - Jayme Copstein

Os cientistas definiram 2009 como Ano Internacional da Astronomia, para comemorar o quarto século das primeiras descobertas astronômicas de Galileu, comprovando as idéias de Copérnico de que a Terra não era o centro do universo e girava em redor do Sol.

Ao observar as quatro luas de Júpiter e as fases de Vênus, Galileu deduziu que o sistema formulado por Copérnico, fazendo a Terra e os planetas girarem em redor do Sol era o acertado, em vez de considerar a Terra o centro, em torno do qual todo o Universo rodava, como propunham Aristóteles e Ptolomeu.

As constatações de Galileu ofenderam à Igreja porque as Escrituras falam do Sol em movimento e a Terra estática no centro da Criação. Julgado pela Inquisição, ele foi obrigado a se desdizer, para escapar da fogueira. Assim mesmo, recebeu sentença perpétua de prisão domiciliar.

Ditos e achados - Guilherme Fiúza

“Lula é bacana porque é paraíba, Obama é legal porque é preto, árabes são bons porque não são israelenses. O problema é que Bush saiu de cena, e o papel do vilão planetário está fazendo falta. Bonzinhos profissionais como Paul Krugman já não sabem a quem dirigir seus ataques de pelanca.” (Guilherme Fiúza, Coluna Política e tudo mais – http://colunas.epoca.globo.com).

Carência - Jayme Copstein

Zé Sarney, cujo governo de triste memória pôs na lata do lixo alguns decênios da história brasileira, volta a freqüentar o noticiário. Roberto Pompeu de Toledo escreveu na Veja desta semana uma frase antológica: “Há muitos campeões do atraso na política brasileira. Sarney é o campeão dos campeões, tanto por antiguidade quanto, sobretudo, por mérito”. (“O Oligarca perfeito”, página 138).

Há poucos dias, nesta coluna, falei de Zé Sarney e de suas reincidências (“Bugios, papagaios e quero-queros”). Ele tem sido meu assunto ao longo dos anos, desde a morte de Tancredo Neves. Quando apresentava o Brasil na Madrugada (Rádio Gaúcha), a partir do estelionato do Plano Cruzado contei, dia por dia – e no último dia, as horas – os três anos e pico que faltavam para encerrar seu governo.

Por cansado, já não me entusiasmo com esses assuntos. Tudo é tão repetitivo, sempre as mesmas falcatruas, os mesmo personagens... Sarney, Maluf, Barbalho, Dirceu, Quércia... O dia, porém, que alguém for preso de verdade – não apenas se hospedar por algumas horas em celas de luxo – prometo voltar a contar apenas as horas que faltam aos corruptos, não para terminarem mandatos, mas para dar com os costados de vez no xilindró.

Dove stà Battisti - Jayme Copstein

A extradição do italiano Cesare Battisti, condenado na Itália por quatro assassinatos, desapareceu dos jornais. De pouco valeria, entretanto, se permanecesse nas manchetes. Graças à morosidade, tradição da nossa Justiça, o Caso Battisti é apenas um dos 69 processos de extradição, pendentes no STF, vindos de todas as geografias, da Argentina a Israel.

Nenhum caso, porém, a não ser o de Battisti, teve o devotado engajamento do ministro da Justiça, Tarso Genro, apesar da semelhança com o do major uruguaio Manuel Juan Cordeiro Piacentini, também acusado de vários assassinatos políticos quando integrava Operação Condor. O que leva a crer, por questões de equidade, que o empenho do ministro deveria ser o mesmo nos dois casos. Apesar do antagonismo ideológico, os crimes foram os mesmos.

Interessante: o caso Battisti guarda semelhança com o de Leonardo Roy Kolschowsky, extradição pedida pelo governo norte-americano, acusado de fraude em falência e falsas declarações prestadas para um banco. Alegou, como Battisti, não serem verdadeiras as acusações e não haver “provas claras e robustas (...) dos delitos que lhe foram imputados”, mas aqui o Tarso Genro também não se manifestou.

A propósito, o ministro do STF, Celso de Mello, indeferiu pedido de liberdade para Kolschowsky, porque o processo de extradição, no Brasil, “observa o sistema de contenciosidade limitada, em cujo âmbito não se permite a discussão em torno da prova penal nem a renovação da instrução probatória”.

A defesa de Kolschowsky é um catálogo de artimanhas, das quais resulta a fama internacional do Brasil, de ser o país da impunidade. Ele se casou com uma acreana para adquirir nacionalidade brasileira e assim escapar da extradição, como o assaltante de trens Ronald Biggs, no século passado, tornado pai de um brasileiro.

O ministro Celso de Mello botou paradeiro na pândega jurídica, ao rejeitar, também, a alegação da cidadania adquirida pelo casamento. Isso não existe no nosso Direito e o próprio STF já tem definido em outros processos, que o parentesco com brasileiros não impede a extradição de estrangeiros.

Apenas a título de curiosidade, os países com mais pedidos de extradição, ora tramitando no STF, são: Argentina (10), Portugal (10), Uruguai (8), Alemanha (7), Estados Unidos (6), Itália (6) e Espanha (5). Os crimes imputados vão do furto e do estelionato a assassinato e tráfico de drogas.

sábado, 4 de abril de 2009

O Primor da Arte - Jayme Copstein

Quando ouço falar que o norte-americano Bernard Madoff conseguiu aplicar um dos contos de vigários mais antigos da era capitalista, não me surpreendo. Voltaire dá a entender que à espera de um otário para depená-lo há sempre há um espertalhão na próxima esquina. Até afirma que, quando o primeiro espertalhão encontrou o primeiro otário, ele inventou as religiões.

Mas falava em contos de vigário e o nome nada tem a ver com religião. Dizem que a falcatrua foi assim batizada quando um malandro francês fez-se passar por padre e extorquiu bons dinheiros de devotos. Cito a versão não para me mostrar erudito, mas com a intenção de debater se é a ingenuidade ou a voracidade que leva as pessoas a caírem no golpe.

Quase sempre é uma mistura das duas coisas. Por exemplo, em 1881, Porto Alegre viveu uma comédia quando o pintor Veríssimo Barbosa de Souza convenceu-se de ter inventado o navio movido a pressão de ar.

Estava “assuntando”, sem o que fazer, a idéia lhe veio à mente. Construiu um pequeno modelo, fez experiências na banheira de casa e se entusiasmou. Radiante e já antevendo a fortuna que a invenção poderia lhe trazer, contou tudo em segredo a alguns amigos mais chegados.

A idéia era fascinante e os amigos de Veríssimo acabaram contaminados com seu entusiasmo. Eles o estimularam a fundar uma empresa para construir o navio que haveria de revolucionar a navegação mundial.

Não houve dificuldade para angariar o capital. O pintor batizou o notável invento de “Primor da Arte” e, com o dinheiro dos acionistas, logo pôde construir um trapiche e começar a montagem da traquitana.

De repente a cidade se tomou de demência. Não se falava de outra coisa, todos queriam associar-se ao empreendimento, os primitivos sócios recusavam novas adesões. No máximo, a amigos muito chegados, concordavam em ceder algumas poucas cotas, assim mesmo com respeitável ágio.

A construção do Primor da Arte foi demorada, alimentando ainda mais o delírio. Correram rumores de espionagem internacional, de uma corporação inglesa pressionando para comprar o navio. O assunto tomou tal proporção que o governo da Província contratou engenheiros para avaliarem o projeto.

O laudo negativo – não passava de mirabolância – serviu para alimentar a polêmica. Os entusiastas do “Primor da Arte” o receberam com desprezo. Que todos esperassem para ver quem estava com a razão. Depois, não se queixassem da sorte que lhes batera à porta e a encontrara fechada.

O tempo foi passando e o Primor da Arte não dava o ar da graça. Os acionistas começaram a pressionar Veríssimo e o fizeram apressar o arremate do navio. Foi programada com alarde a viagem inaugural que deveria terminar em Triunfo, onde os numerosos adeptos do empreendimento ofereceriam uma festa para comemorar o sucesso.

Dito, mas não feito. A decepção começou em Porto Alegre, quando Veríssimo exibiu o revolucionário Primor da Arte. Era um barco comum ao qual ele havia adaptado foles imensos para soprar o “combustível”.

Na hora de partir, o desastre. Os foles não davam conta, o Primor da Arte foi se arrastando à custa de remo, com o devido acompanhamento de palavrões, até conseguir aportar em Triunfo dois dias depois.

Veríssimo tentou em vão tirar o corpo fora, alegando que a “pressa” resultara em foles defeituosos. De nada valeu. A empresa foi dissolvida, cada um ficou com seu prejuízo e ele foi literalmente cantar em outra freguesia. Poucos anos mais tarde, protagonizou episódio semelhante no Pará, onde “inventou” um avião também revolucionário. Depois de novo fiasco sumiu na História.

O perguntador - Jayme Copstein

Alguém – o Perguntador – me escreve, perguntando o que vou fazer diante da aprovação da Câmara ao aumento do número de vereadores. A resposta é simples – vou continuar escrevendo contra a demagogia dos deputados que apenas desejam cabos eleitorais de luxo em seus feudos políticos.

Mas não é isso que o Perguntador tem em mente. Quer saber o que de concreto vou fazer para impedir “mais este assalto aos dinheiros públicos”.

Ocorreram-me várias coisas, uma delas exercer a cidadania do Perguntador. Porque ele, “entende”, não pode fazer nada. A sobrinha da cunhada está para ser nomeada para uma “mamata” que o deputado fulano vai arranjar e, “entende”, aí pode complicar...

Ah! Tem o filho do primo segundo, assessor de vereador, entrega metade do que ganha para o edil, mas – “entende” – ele pode se incomodar, e mesmo a metade do salário sempre dá para alguma coisa.

Não tenho como assumir a cidadania do Perguntador, como ele quer. Então, continuarei escrevendo contra a demagogia e a corrupção, e o Perguntador vai continuar me perguntando e se corrompendo porque – “entende” – ele tem o que perder se a corrupção de fato acabar algum dia.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

A bula do Saphrol - Jayme Copstein

O Supremo Tribunal Federal adiou por uma quinzena o julgamento da constitucionalidade da Lei de Imprensa e também o do recurso que contesta a legitimidade da exigência de diploma universitário específico para o exercício profissional do jornalismo.

Tem gente fazendo confusão entre os dois julgamentos, por terem sido incluídos na mesma pauta, e também sobre a sua origem e objetivos. Enquanto a Lei de Imprensa foi obra do regime militar, com óbvios propósitos, a regulamentação profissional do jornalismo, exigindo a formação universitária específica, foi reivindicada pelos próprios jornalistas para o aprimoramento intelectual e também para moralizar a área profissional, contaminada por espertezas inimagináveis.

Lucídio Castello Branco, antigo presidente do Sindicato dos Jornalistas de Porto Alegre e um dos líderes da campanha pela regulamentação, pode relatar fatos que hoje soam como engraçados, mas eram estarrecedores naquele tempo.

Não se está falando, por exemplo, do cidadão registrado como “redator da bula do Saphrol”, um remédio popular daquela época, mas de um empresário que tinha a seu soldo a jornalista mais bem paga do país – talvez do mundo. Particularidade: a “jornalista” era manicure e exercia esta profissão com muito sucesso em um salão no centro da cidade. Como naquele tempo, tal como os professores, jornalistas estavam isentos de imposto de renda, em troca do aluguel do salão, o empresário obtinha comprovantes de despesas para diminuir seus lucros.

Pôr as duas questões no mesmo saco e até relacioná-las, como se a regulamentação profissional do jornalismo fosse consequência da Lei de Imprensa, é pura malícia. Não há nenhuma semelhança ou ponto de contato entre elas. Daí a falta de fundamento para a afirmação que a exigência de formação universitária para o exercício profissional do jornalismo atente contra a liberdade de pensamento.

Como se já disse ontem, nesta coluna, ninguém está impedido de ocupar os generosos espaços postos à disposição do público pelos veículos de comunicação. Há centenas de gráficas que aceitam com prazer imprimir jornais e revistas de quem quer que seja. A internet, recebe de braços abertos quem deseja, além do blog, pôr estações de rádio ou de tevê no ar.

Daqui a 15 dias, o STF volta a julgar a pauta interrompida hoje. Tudo indica – já há dois votos neste sentido – que a Lei de Imprensa seja sepultada, e isso já se faz com muitos anos de atraso. Espera-se, porém, que os ministros percebam a diferença entre as duas questões, para não devolver o jornalismo brasileiro à bula do Saphrol.

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Pela dignidade do diploma - Jayme Copstein

Em 1946, ingressei no curso Odontologia da Faculdade de Medicina de Porto Alegre, para satisfazer a vontade paterna de ter uma profissão de nível universitário. No ano seguinte, um deputado – Pedroso Junior – propôs a extinção do diploma de cirurgião-dentista. Desejava que a Nação desse vários passos para trás, alegando bastar pulso de atleta e um pouco de jeito para ser dentista. O boticão faria o resto.

Eu já era jornalista ao ingressar na Odonto, e logo me tornei redator de “O Bisturi”, criado e editado pelo segundo-anista de Medicina, Helio Gomes Leal. No ardor dos 18 anos, contra-argumentei nas páginas do jornalzinho que, para ser deputado como Pedroso Junior, bastavam apenas de alguns votos acaudilhados no interior.

A luta para preservar a dignidade da Odontologia como profissão, tornada prerrogativa exclusiva dos portadores de diploma universitário específico a partir de 1934, prolongou-se por um decênio, enfrentando sucessivas tentativas de demagogos, cujos argumentos não conseguiam em nada atenuar a sandice de Pedroso Junior.

Estou relembrando acontecimentos de um Brasil abrutalhado, com mais de 50% de analfabetos e expectativa de vida que não ultrapassava os 43 anos de idade, mas que eu supunha ter ficado lá para trás, no meio do século passado, porque me sinto perplexo por ter de assistir, hoje, o Supremo Tribunal Federal gastar tempo de seus ministros e recursos da Nação, para decidir se o Brasil volta lá para trás, cassando a dignidade da profissão de jornalista, cujo exercício, também após décadas de luta, tornou-se prerrogativa de portadores de diploma universitário específico.

A perplexidade cresce quando vejo a Universidade assistir, inerte, sem protestar, sequer franzindo a testa de desagrado, como se em nada lhe dissesse respeito, este atentado a uma suas instituições – os cursos de comunicação social.

Da última vez que estive na UFRGS, em dezembro passado, como orador dos jubilados de 1948, cobrei o absenteismo, perguntando “por que setores da sociedade brasileira, com a omissão e a passividade de outros setores influentes, desejam voltar ao passado, retirando do jornalismo o status de profissão de nível universitário, com exigência de diploma específico”.

Uma professora, após a solenidade, me argumentou com a demasia das regulamentações na sociedade brasileira e a necessidade de enxugá-las, em nome da liberdade de pensamento. Não perguntei a ela porque escolhera crucificar o jornalismo para salvar a pátria. Ocorreu-me que com chá de urtiga eu haveria curar espinhela caída, mas que a excessiva regulamentação da Medicina me impede de salvar a humanidade.

Também tenho idéias muito próprias de como aplicar leis e emitir sentenças. Nem por isso estou reivindicando o fechamento dos cursos de Direito e a abolição dos tribunais, apesar de me impedirem de fazê-lo, por “excesso de regulamentação”.

O diploma universitário do jornalista não inibe o livre pensar nem sua livre manifestação.Os jornais, as emissoras de rádio e tevê reservam espaços generosos para os colaboradores, convidados ou não, aos quais basta enviar a matéria em originais legíveis, respeitadas as normas de linguagem e a limitação do espaço. Da mesma maneira, a interação, através das cartas de leitor, do e-mail ou telefonemas de ouvintes e telespectadores, é parte importante das atividades do jornalismo de hoje.

Alegar que a exigência do diploma de curso superior para o exercício profissional do jornalismo atenta contra a liberdade de pensamento é uma balela. Ofende a inteligência e o bom-senso, qualidades que deve prevalecer hoje na decisão do STF.