terça-feira, 31 de agosto de 2010

Falta de rima – Jayme Copstein

Agosto está chega ao fim sem que nenhuma tentativa de golpe de estado tenha acontecido. Os mais prudentes alertam ser preciso esperar ainda 24 horas para se esvair completamente a maldição do mês.


 

Os crédulos que me perdoem, mas é tudo infantilidade, tipo "O bafo da múmia" ou "O pum do vampiro" que o cinema explora desde seus tempos mais remotos. Olhando para trás, fora o suicídio de Getúlio (24 de agosto de 1954), só tivemos a renúncia de Jânio Quadros (25 de agosto de 1961). Nenhuma das crises que abalaram o Império aconteceu no mês maldito. A Questão Religiosa começou em março de 1872, e a Questão Militar desembocou na Proclamação da República, em novembro de 1889. E todo o resto, depois, a Revolução de 1930, o fim do Estado Novo, o impeachment de Collor aconteceram em outubro, e nem por isso é considerado o mês das crises.


 

A maldição de agosto é mera questão de rima – mês do desgosto. Que pena. Julho até que rima com bagulho, mas como nenhum mês termina em "uno" – de gatuno – neste país rouba-se adoidamente, de janeiro a dezembro.


 

Velha América Latina


 

O casal Kirchner está de briga com a imprensa na Argentina. No palco, para a plateia, o discurso dos excessos da mídia a serviços de interesses ocultos - enfim, toda aquela coleção de chavões a que estamos acostumados em nossa Velha e Mesmíssima América Latina. Nos bastidores, a crise que assola a economia argentina com a hiperinflação voltando a ameaçar as finanças e, apesar de todos esses pesares, o patrimônio do casal crescendo nada menos que 710,55% nos últimos sete anos.


 

Um dos negócios dos Kirchner se assemelha ao da venda milionária da empresa de jogos eletrônicos, feita pelo filho do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva a uma concessionária de telefonia. O casal presidencial também tm sorte incomum nos negócios: por 34 mil dólares (R$ 59.800) comprou um terreno de 20 mil metros quadrados à prefeitura de El Calafate, Província de Santa Cruz, Patagônia. Três anos depois vendeu o mesmo terreno por 1 milhão 650 mil dólares (R$2.900 mil), com lucro de 4752%, recorde mundial em transações imobiliárias, digno de registro no Guinness.


 

A sorte dos Kirchner não para por aí e também guarda semelhança com o antigo deputado brasileiro, João Alves, conhecido "anão do orçamento". Alves gabava-se de ter ganho mais de uma centena de vezes o prêmio maior da loteria esportiva. As aplicações financeiras dos Kirchner conseguem rendimentos 20 vezes superiores aos das pessoas comuns.


 

Ninguém perguntou ao ilustre casal sobre suas fontes de renda. Néstor pode alegar 7.600 dólares (R$ 13.400) mensais como ex-presidente, Cristina recebe 3.900 dólares (R$ 6.450) como presidente. Fariam lembrar outra figura brasileira, a ex-ministra da Fazenda, Zélia Cardoso de Mello. Quando perguntada como conseguia financiar sua vida folgada em Nova York, respondeu que    era com a pensão do ex-marido, o comediante Chico Anísio lhe pagava.


 

Desafio aos gaúchos


 

Aplausos ao Vereador Walter Nagelstein, titular da Secretaria Municipal de Indústria e Comércio de Porto Alegre. Neste fim de semana, endureceu a fiscalização de bares e restaurantes da cidade, exigindo o cumprimento da proibição de se fumar fora dos espaços reservados. Foram aplicadas multas a 11 estabelecimentos infratores.


 

Que não se venha com a histeria da "indústria das multas". Lei é feita para se cumprir. Quem não quiser ser punido, que não a infrinja.


 

Rir ou chorar? – Jayme Copstein

O Supremo Tribunal Federal ocupa-se hoje de questão transcendental para a nacionalidade: se podemos ou não rir das patuscadas dos nossos políticos Como conseguimos passar 510 anos de história sem tomar uma decisão a respeito? É por isso que o Brasil não vai à frente...

Já que o STF sempre se vale de precedentes para firmar jurisprudência, vale a frase de José do Patrocínio, ao discursar em comício ao qual comparecera cansado, com os pensamentos dispersos.

"Somos um povo...." – começou Patrocínio. E engasgou, sem encontrar a continuação. Fez uma pausa e recomeçou: "Somos um povo...". E de novo engasgou.

A plateia começou a murmurar e logo vieram as risadas. Foi o suficiente para Patrocínio explodir na frase: "Somos um povo que ri quando devia chorar".

Já que os nossos políticos são os patuscos que são e ninguém vai para a cadeia, Só nos resta rir.

Dia do Professor gaúcho

Passado quase um ano, ninguém me socorreu com a informação de que existisse em Porto Alegre rua com nome do professor baiano Manoel Simões Xavier, como havia pedido em "O negro que nos ensinou o be-a-bá", em 15 de outubro do ano passado, Dia do Professor. Acabei descobrindo sozinho e por acaso: é a ruazinha da parte de trás da Praça Tito Tajes, na Tristeza.

Volto ao assunto hoje, 1º de setembro, porque acho que deveria ser o Dia do Professor Gaúcho. Nele, em 1778, Manoel Simões Xavier instalou a primeira aula de instrução primária, dando início oficial ao ensino primário em Porto Alegre. Simões Xavier era negro. Se esta condição de pele ainda hoje enfrenta preconceitos, apesar da evolução dos costumes e da legislação repressiva, imagine-se o que seria cem anos antes da Abolição.

De fato, a Câmara Municipal rebelou-se quando o governador José Marcelino, impressionado com o desempenho de Simões Xavier na cidade do Rio Grande, desde 1770, o chamou para dar início ao ensino primário regular na nova Capital. No tempo do Brasil Colônia, aulas de acesso público só podiam ser instaladas sob permissão expressa da Coroa Portuguesa. José Marcelino empenhou-se para consegui-la e, para atrair o baiano a Porto Alegre, prometeu-lhe pagar o aluguel da casa onde instalasse o curso.

Os vereadores recusaram, alegando não haver dinheiro, não ser de sua competência decidir sobre o assunto e não haver amparo no regimento da Câmara. Por trás da recusa, a rejeição ao negro que se reflete, em 1961, em texto de Ary Veiga Sanhudo, calcado em relatos da época: "(...) Quatro anos depois viria o mulato Manoel Simões Xavier com sua mulher, uma crioula gorda, instalar aula aqui e criar um sério problema para a Câmara (...)". (Crônicas da minha cidade, 1ª edição, Livraria Sulina, Porto Alegre).

O Governador José Marcelino, mandão de marca, não teve maiores dificuldade em dobrar a Câmara. Como já fizera antes, para transferir a capital de Viamão a Porto Alegre, ameaçou prender os vereadores. Foi assim que em 1º de setembro, Simões Xavier deu início às suas aulas. Sabe-se disso por ofício que lhe endereçou no dia seguinte o próprio Governador, querendo saber com quantos alunos as aulas tinham começado.

Nunca se soube. Se houve resposta de Simões Xavier, ela se perdeu.


 

domingo, 29 de agosto de 2010

Baile das cobras – Jayme Copstein

Com as pesquisas indicando que Dilma Roussef pode eleger-se presidente no primeiro turno, começa a pipocar na imprensa o "remake" de um velho filme: a tentativa do PT de detonar aliados, dos quais acha que não precisa mais. "Folha de São Paulo" publicou ontem que o vice de Dilma, Michel Temer, não consegue explicar significativo aumento de patrimônio, omitido na declaração de bens à Justiça Eleitoral. Mudou para erro de digitação a primeira versão de honorários polpudos supostamente ganhos como advogado de ação antiga, porém inexistente na Justiça de São Paulo.

Nenhuma informação chega a qualquer jornal, seja ao "Times" de Londres ou ao "Arauto da Moralidade Pública e Privada" de São João das Pantufas, sem que alguém "dê o serviço". No caso, em vez de "siga o dinheiro" para desmascarar o ladrão, a frase é "a quem interessa" para identificar a fonte.

Não há, na legislação eleitoral, prazo para substituir candidato a presidente, governador ou senador e seus respectivos vices e suplentes. A primeira tentativa de explodir candidatos, que deu certo, vitimou Roseana Sarney, com grande lucro: a culpa foi atribuída ao Governo de Fernando Henrique Cardoso, o que trouxe para as águas de Lula a figura impoluta e o caráter sem jaça de José Sarney.

Se os demais fidalgos da luzidia coorte (Jader Barbalho, Renan Calheiros & Cia Ilimitada) – se incorporaram ao beija-mão por solidariedade a Il Cappo ou por temer que lhes acontecesse o mesmo, pouco importa. Deu certo. Agora a receita está sendo aplicada em Michel Temer porque ele não será uma figura dócil e decorativa, como Hector Campora, o mamulengo de Perón, o foi na Argentina.

No baile de cobras em que se transformou a sucessão presidencial, Dilma, por "n" razões, é a figura mais frágil. Uma delas diz respeito à sua personalidade. É incorruptível, diligente e obsessiva tanto em cumprir como em exigir o cumprimento de metas, enfim um conjunto de predicados considerados virtude na vida privada, mas tidos como grave defeito na política – o da falta de "jogo de cintura", seja lá o que isso signifique.

Até que ponto a capacidade de resistir de Dilma a imunizará contra as inevitáveis pressões consequentes à sua "falta de cintura" a levará a episódio como o protagonizado por Jânio Quadros? Nesta hipótese, para "salvar" o país da crise, quem melhor que Lula, com seus 80% de popularidade? Seria o chavismo à brasileira.

Para que o projeto dê certo, é necessário maioria confortável no Congresso, para remover da Constituição o impedimento legal, como já foi feito com a reeleição de Fernando Henrique Cardoso. Além de o PT estar empenhado decisivamente nas eleições para o Congresso em todos os Estados, Zé Sarney, o dono do terreiro, já foi avisado para não se meter de pato a ganso. O "novo" dossiê contra Roseana, sua filha dileta – agora não tem como acusar FHC – foi apenas o requentamento da denúncia de 2002.

A resposta de Sarney está em seu artigo de 27 de agosto, na "Folha de São Paulo": "O resultado do conjunto das pesquisas orienta as manipulações: hora de bater, de informar, de distorcer, de exaltar, de alegrar, hora da razão, da emoção (...) e, por trás de tudo, a turma do dossiê, 'da maldade', que, conjugada com os jornalistas de investigação, vivem à cata do fato sujo, do escândalo, do provérbio da politicagem 'onde não tem rabo a gente põe'.

Todas as cobras do baile estão arregaçando seus caninos. Cuide-se quem não tiver perneiras.

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Sem alho nem espelho – Jayme Copstein

A melhor coisa que já li sobre a campanha para a Presidência da República, até agora, foi escrita por Carlos Brickmann. Para amenizar o fim de semana, eis o texto:

"Numa chapa, José Serra; na outra, Michel Temer. Ambos fariam sucesso na TV: nem precisariam de maquiagem para estrelar a Família Adams. Ambos fariam sucesso no cinema: Temer é o próprio Bela Lugosi, o astro de Drácula, e Serra nada fica a dever a Boris Karloff, o eterno Frankenstein - nem na cor da pele. Vale a pena ver na TV (passa com frequência) o Crepúsculo dos Deuses, obra-prima de Billy Wilder, em que o austríaco Erich von Stroheim faz o papel de um sinistro mordomo apaixonado pela patroa. Stroheim está ótimo no filme. Mas, se Billy Wilder conhecesse Michel Temer, não hesitaria: o papel seria dele.

Ambos preferiram outras carreiras, e nelas tiveram amplo sucesso. O mais perto que chegaram do show business foi a política, e nela também demonstraram grande capacidade. Um é candidato da oposição à Presidência, outro a vice na chapa da situação. Um só fala em saúde, apoiado em sua aparência saudável. O outro, jurista de peso, um dos grandes constitucionalistas brasileiros, não falou nada, até o momento, contra o crime que se comete contra os direitos individuais, com a violação maciça do sigilo fiscal de dirigentes adversários.

Um dos dois deve chegar lá. De acordo com as tradições populares a respeito de vampiros e demais seres fantasmagóricos, apoiadas em sólidas narrações literárias, essas criaturas não têm a imagem refletida no espelho, e por isso o evitam. E o alho faz com que desapareçam imediatamente. Que país será este, no momento em que não tivermos espelhos e a nossa comida ficar sem tempero?"

Ideia para Serra

Sérgio Machado, da cidade do Rio Grande, sugere para esquentar a campanha presidencial:

"A ideia pode ser meio maluca, mas no atual andar da carruagem até faz sentido. Se a legislação eleitoral tiver previsão que o candidato a vice, no impedimento do titular, assuma a campanha como titular, vamos imediatamente começar uma campanha para a renúncia do Serra, que assim poderá assumir, sem constrangimento, o Ministério da Saúde da Dilma, a candidata do Presidente que ele admira e respeita".

Sérgio Machado acrescenta que Índio da Costa, no comando da campanha, descerá o sarrafo na candidata do Governo. Sua preocupação "com que se desenha no horizonte não é mais Serra perder, é perder por uma goleada histórica que vai aniquilar as oposições no Brasil e mexicanizar nossa política".

Aproveito a deixa para discordar do termo "mexicanização", usado com frequência no Brasil como rotulo de ditaduras populistas que aprenderam a se mascarar de democracia através de mil e um subterfúgios legais. O termo historicamente mais adequado é "abrasileiramento". O México nada mais fez, a partir de 1929, com seu Partido Revolucionário Nacional, depois rebatizado de Partido Revolucionário Institucional, senão copiar os nossos "republicanos" e sua ditadura positivista, aqui implantada em 1889 e derrubada em 1930.

Melhor dito: substituída por outra ditadura, derrubada em 1945 por uma democracia, também derrubada em 1964, por uma democracia que está sendo substituída por uma ditadura vestida com "sombrero", só para dissimular que não é a mesma de 1889.

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Alan Kardec no Brasil – Jayme Copstein

Fico sabendo, por informação do colega Carlos Brickmann, que "O Livro dos Espíritos", de Allan Kardec, em nova tradução de Alberto Adriano Maçorano Cardoso, 488 páginas, está sendo lançado em papel (R$ 46,00) e em arquivo eletrônico (R$ 12,90).

Os preços me parecem excessivos, considerando-se que é obra em domínio público e tem mercado garantido de milhões de adeptos do Espiritismo no Brasil. Edição anterior, traduzida por Guillon Ribeiro, poliglota e vernaculista elogiado até por Ruy Barbosa, pode ser baixada, gratuitamente, em http://tinyurl.com/29pbh8u, ou comprada, a partir de meros R$ 10 reais em papel, ou por R$ 21,90 em audiolivro gravado por Carlos Vereza e sua filha, a atriz Larissa Verezo.

Não é essa a questão que eu desejava focalizar neste momento, ainda que a alusão ao abuso do preço me pareça importante. Parece-me, sim, que o lançamento da nova tradução, comparado com o que já existe, liquida a polêmica sem sentido sobre o futuro do livro, quando tal jamais esteve em debate, mas apenas a midia ou o veículo como queiram chamar o material através do qual ele ganha vida exterior ao do cérebro que o engendrou.

Os nostálgicos do papel, tal como ocorreu antes com os do papiro e do pergaminho, podem prolongar sua utilização por mais dez ou vinte anos, mas acabarão rendidos a duas realidades. A primeira é a falta de sentido de sacrificar uma floresta, agredindo o meio ambiente e encarecendo o preço final com os custos que começam com o abate de árvores, passam pela fabricação da celulose, do papel, da tinta, da cola, e terminam na impressão, encadernação, empacotamento e distribuição.

A segunda é que o livro como conceito nunca esteve em debate. No momento em que os antagonistas da versão eletrônica perceberem que tanto faz imprimi-lo na cabeça de um alfinete – há quem consiga – ou em Lâminas de ouro ou lajotas de cerâmica, desde que não perca o conhecimento que armazena, toda a resistência cessará.

Mural

Sobre "Cordoba Center", coluna de anteontem, Levy escreveu:

"Assisti também à tal entrevista [de Feisal Abdul Rauf, defendendo a localização do Centro] no 60 minutes. O sujeito líder da comunidade islâmica falava em tudo, menos liberdade religiosa. Disse, entre outras coisas, que a construção do Centro faria com que mais muçulmanos entrariam em NY e que isso traria mais negócios, gerando emprego etc. Grande preocupação com a liberdade religiosa! A construção do Centro no local pretendido é ofensivo às famílias que perderam seus entes naquele ato praticado em nome de uma religião. É dizer aos radicais muçulmanos: Venham, ataquem-nos. Em troca, construiremos mais mesquitas para vocês! Tente construir um centro cristão, uma igreja batista ou católica em Riad. Cadeia ou morte e sem julgamento. Sustentar direito à liberdade religiosa em casos como esses, constitui, de duas, uma: hipocrisia ou má-fé ou mesmo as duas."

Sobre "Deus e os Baha'is", coluna de ontem, Iradj Roberto Eghrari manifestou:

"Parabéns pela lucidez e clareza de seu artigo. Como bahá'í brasileiro sinto serem fundamentais manifestações como a sua para que possamos criar massa crítica na opinião pública de nosso país para que assim a voz da liberdade e da eliminação dos preconceito religioso brade bem alto para que as autoridades iranianas percebam que não iremos nos silenciar face as cruéis injustiças cometidas no Irã contra os bahá'ís e todas as minorias lá perseguidas, sejam elas étnicas, religiosas, homossexuais, e tantos outros."

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Deus e os Baha’is – Jayme Copstein

A propósito da polêmica em torno do Cordoba Center, que a comunidade islâmica deseja construir em Nova York, nas proximidades do World Trade Center (WTC), Lucy Miriam escreve, sobre caso de gratuita intolerância religiosa, envolvendo um brasileiro no Egito. Ele é guia turístico. Foi preso na quarta-feira da semana passada com duas mulheres, também brasileiras, sob acusação de proselitismo religioso.

A identidade dos envolvidos não foi divulgada. As mulheres já foram libertadas. A Embaixada do Brasil no Cairo desenvolve esforços para que o homem também seja solto.

Qual foi o crime do brasileiro? Subiu no topo de uma pirâmide e começou para pregar a "sua" Salvação? Invadiu um minarete para proclamar que Allah é Allah, mas Maomé tem de disputar o ouro olímpico com Moisés, Paulo de Tarso ou Buda?

Nada disso. O brasileiro em questão é evangélico. Carregava no automóvel exemplares da Bíblia e alguns folhetos com textos religiosos. É crime em um país islâmico, mesmo no Egito onde o fundamentalismo não predomina.

Lucy Miriam mandou a notícia sem a intenção de incluí-la no debate sobre a construção do Cordoba Center, mas "para assinalar a hipocrisia com que o jornalismo internacional trata questões de liberdade de expressão, quando se trata dos Estados Unidos".

"Parece que o mundo vem abaixo", acrescenta Lucy Miriam. "Nem uma palavra mais severa é dita quando a conveniência política faz descer a venda e a mordaça da ideologia sobre o martírio dos bonzos tibetanos, sob o tacão da China, ou dos Bahá'is, sufocados pelos xiitas do Irã."

A leitora tem razão. Particularmente no que diz respeito aos Baha'is do Irã, há noticiário nos jornais, porém sem a veemência com que se trata agora o caso do Cordoba Center, em que ninguém foi preso por ser contra ou a favor. Em agosto passado, sete líderes Baha'is foram condenados no Irã, acusados de "espionagem para Israel, blasfêmia contra o Islã e corrupção na terra".

De fato, o centro místico da Fé Bahá'i (6 milhões de adeptos em 176 países, 57 mil no Brasil) foi erigido em Akko, cidade do Norte de Israel, quase na fronteira com o Líbano, onde está sepultado seu fundador, Mirzá Hussein Ali, conhecido como Bahá'u'lláh (título religioso). O santuário, porém, foi ali construído ainda no século 19, ao tempo do Império Otomano, quando perseguido pelos clérigos islâmicos, Mirzá Hussein Ali foi banido sucessivamente de Teerã, Bagdá, Constantinopla e Adrianópolis, até ser confinado em Akko, cidade-prisão, na qual faleceu.

Já, então, Bahá'u'lláh também era acusado de blasfêmia contra o Islã e corrupção na terra ao pregar a origem divina de todas as religiões, a igualdade para o homem e a mulher (em pleno Século 19!!!) e abolição dos dogmas e do clero, para tornar a devoção ao Criador exercício da liberdade de ser e de sentir de cada um. Só para os leitores terem ideia das terríveis blasfêmias de Mirzá Hussei Ali, eis alguns de seus pensamentos:

A luz é boa, não importa em que lâmpada brilhe (...) uma flor é bela, não importa em que jardim floresça.

Somos as folhas e os ramos de uma mesma árvore (...) as gotas de um único mar. A humanidade assemelha-se a um pássaro, uma asa é o homem e a outra, a mulher. O pássaro não pode alçar voo sem o equilíbrio dessas duas asas...

Deus é um, a religião é uma, a humanidade é uma... o objetivo da criação humana é conhecer e adorar a Deus... Todas as religiões provêm de um mesmo Deus.

terça-feira, 24 de agosto de 2010

O Cordoba Center – Jayme Copstein

Assisti, na semana passada, reportagem da Globo News sobre a polêmica em torno da construção do Cordoba Center, centro cultural islâmico, com uma mesquita, nas proximidades do local onde ficava o World Trade Center (WTC), em Nova York. A matéria antecipava manifestações que ocorreram neste domingo e foi conduzida sob a ótica da liberdade religiosa.

Não me parece que, no caso, a liberdade religiosa esteja em questão. Os islâmicos podem construir suas mesquitas onde bem entenderem, cá no Brasil ou em caixa-prego, e devem tê-lo feito tanto em Nova York como em qualquer outro ponto do território norte-americano, nestes nove anos desde que militantes radicais destruíram as duas torres do WWC em ato de guerra.

A recíproca não é verdadeira. Ninguém conseguirá construir templo de outras religiões no Irã porque os aiatolás não deixarão. O argumento tem sido levantado por quem se opõe ao Cordoba Center, mas esse não é o ponto. O que estão discutindo em Nova York não é a liberdade religiosa. Tal como a liberdade de pensamento, nunca esteve em questão nos Estados Unidos. O tema do debate é a inadequação do local, marcado para sempre pela tragédia de 2001.

Feisal Abdul Rauf, líder da comunidade muçulmana norte-americana, defendeu a localização do Centro, dizendo que marcaria naquele local posição para defender a fé muçulmana, homenagear os mortos e separar os terroristas como fanáticos que desrespeitaram os verdadeiros princípios do islamismo.

Estas declarações recentes de Rauf contrastam suas declarações em entrevista ao programa "Sessenta Minutos", logo depois da tragédia do WTC. Na ocasião, afirmou que a política mundial dos Estados Unidos havia contribuído para o episódio. Diante da repercussão negativa, Rauf viu-se obrigado a esclarecer o que pretendera dizer. Alegou que falava das ações da CIA, de apoio os talibãs, quando os invasores do Afeganistão eram os soviéticos. Como se dissesse que o feitiço havia se voltado contra o feiticeiro.

Se é assim, se ele foi sincero nas duas as ocasiões, a polêmica não é de difícil solução. Basta que o Centro Córdoba perpetue em um monumento, dentro de sua área, mas facilmente visível a quem por ali passar, a condenação ao atentado de 2001, o pesar pela morte de milhares de pessoas e a repulsa a qualquer tipo de terrorismo, seja a que pretexto for.

Traduzca

Que alívio, na hora da necessidade, ter bom atendimento. Usufruí esta satisfação há poucos dias, quando precisei, com urgência, de tradução juramentada e fui socorrido pela presteza e competência da Traduzca, na Marquês de Pombal, 785, 6º andar, Floresta. Especializada em grande leque de idiomas, com todos os seus profissionais registrados na Junta Comercial, a Traduzca preserva neste mundo agitado de hoje, em que todos parecemos peça de uma engrenagem, aquela postura afetuosa e o interesse pessoal que fazia os bairros de antigamente serem conhecidos como vizinhança. São profissionais, sim, mas sem perder a ternura.


 

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Agosto 24 – Jayme Copstein

Agosto esvai-se em seus últimos dias e deixa cada vez mais distante o mito de ser o mês das crises na política brasileira. Como se fossem apenas episódios periódicos sazonais e não um único confronto nascido ainda ao tempo de D. João III, entre donatários de capitanias, os já estabelecidos e os que querem se estabelecer. A tudo o povo tem assistido embasbacado, e não só na Proclamação da República, como registrou Aristides Lobo, sem nada a ver com calendários.

Foi assim em 24 de agosto de 1954, quando Getúlio Vargas se suicidou. Já ouvi e li muitas teorias a respeito, quando o mito, tido como verdadeiro, era objeto de "sérias" elucubrações universitárias, hoje banquete das traças nas bibliotecas. A tese mais confortadora ao materialismo histórico em versão cabocla – isso também existe – foi a que circulou ao tempo da renúncia de Jânio Quadros, de que agosto era o mês da comercialização da safra de café e a briga pelo financiamento do Banco do Brasil sacudia a República.

O café cedeu seu "status" de primogênito na economia brasileira e nem por isso perdeu-se o hábito de querer depor governantes. Claro, agora tudo dentro do figurino legal – a nossa moda mais recente – como aconteceu em 1991com Collor, e que se presta muito a chantagens políticas, das quais Lula, tal como antes Fernando Henrique Cardoso, foge como o vampiro diante da cruz e do dente de alho, partilhando o governo geral com inimigos de infância.

A todas essas, agosto fica na lembrança pelos esquecimentos. Ninguém mais fala que o Getúlio daqueles dias era uma figura solitária, seus adeptos mais próximos entontecidos no redemoinho do "mar de lama", ele enfrentando de peito aberto o canhoneio que juntava todos na mesma trincheira, da extrema esquerda à extrema direita. Carlos Lacerda não precisava justificar-se, ele queria mesmo o poder, mas Luiz Carlos Prestes alegava que era para não entregar o comando da crise aos lacaios do imperialismo norte-americano (leia-se Lacerda). No próprio dia 24 de agosto de 1954, a imprensa comunista pedia a deposição de Getúlio. No horas seguintes à da sua morte, o glorificava como mártir.

No meio de tanta indignidade, o único gesto digno, o suicídio, dissecado em um livro magistral do qual também não se fala mais e quase ninguém conhece: "Lições da crise", de Hermes Lima.

Lições, aliás, que parecem não ter servido para nada. Getúlio hoje é apenas bandeira, espólio, brasão ostentado pela mesma sede de poder que esteve na raiz da sua tragédia.

A propósito

Já naquele tempo – 1954 – Hermes Lima fazia o diagnóstico das mazelas da política brasileira, citando Oswaldo Trigueiro não só na Proclamação da República:

"Em teoria, o princípio [o voto] proporcional é, sem dúvida, mais justo que o do voto majoritário, pois assegura a todas as correntes mais ou menos ponderáveis de opinião representação correspondente aos votos obtidos. Na prática, contudo, o princípio proporcional conduz a resultados incompatíveis com a estabilidade da vida pública, estimulando desde logo a multiplicidade de partidos e a debilidade das minorias. (...) O candidato a mandato legislativo só precisa que o partido lhe dê o lugar na chapa, o que é fácil, quando há tantos partidos (...) Cada candidato tem, antes de tudo, de cuidar de si mesmo (...) O resultado é que os partidos, antes de enfrentarem os concorrentes no prélio das urnas, têm que sofrer a luta intestina de seus candidatos guerreando-se uns aos outros, num salve-se quem puder incompatível com a lealdade (...).

domingo, 22 de agosto de 2010

A paz do Oriente Médio – Jayme Copstein

Daqui a uma semana, líderes palestinos e israelenses estarão reunidos na enésima tentativa de pacificação, desta vez patrocinada pelo presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, "sem condições prévias". É a retomada de negociações, interrompidas há um ano e oito meses e também a reprise de Campo David, quando Bill Clinton pareceu ter conseguido um acordo entre Arafat e Ehud Barak. Em vão. Arafat voltou para Gaza e ficou o dito pelo não dito.

A reviravolta deixou Bill Clinton atônito. Nas memórias publicadas pouco depois deixar a Presidência dos Estados Unidos, conta a sua frustração ao relatar o diálogo com Arafat, ao recebê-lo em visita de despedida na Casa Branca.

"O senhor foi um grande estadista", lhe disse Arafat. "Não", respondeu Clinton. "O senhor não permitiu que eu fosse."

Clinton não entendeu que o obstáculo maior para os entendimentos no Oriente Médio está no desentendimento entre os próprios islâmicos sobre a questão palestina. Pode-se até debitar como "erros do passado", como tem sido arguido como justificação, o assassinato do rei Abdulah da Jordânia porque aceitava a realidade dos dois estados, o judaico e o palestino, ou de Anwar Sadat, presidente do Egito, o primeiro mandatário islâmico a reconhecer a existência de Israel. São muito recentes, porém, a ocupação do Sul do Líbano pelo Hizbollah e o massacre de lideranças cristãs, quando Ehud Barak retirou unilateralmente o exército israelense da região, para mostrar boa vontade, e a expulsão do Fatah pelo Hamas, na Faixa de Gaza, quando Ariel Sharon repetiu o gesto, com a mesma intenção.

Oxalá todo este raciocínio esteja errado e se consiga, desta vez, dar paradeiro à tragédia do Oriente Médio. Contudo, Barack Obama parece estar destinado não a se decepcionar como Clinton, que apesar disso saiu engrandecido da Casa Branca, mas a fazer companhia a Jimmy Carter, do qual, passados 30 anos, pouca gente lembra que também foi presidente dos Estados Unidos.

A morte de Castello Branco

Conversava com amigos, o mito do assassinato de Castello Branco, o primeiro presidente do regime militar, veio à tona. Não tem nenhum fundamento. Em 1989, entrevistei Rachel de Queiroz sobre este assunto. Primos distantes, o Marechal fora visitá-la, em Quixadá, no interior do Ceará. Foi de lá que partiu para a morte.

A hipótese de assassinato político surgiu logo depois. Rachel refutou a versão. Contou que, ao partir para Fortaleza, Castello pediu ao piloto para sobrevoar, no trajeto, um conjunto habitacional, construído na região em seu tempo de presidente.

Tal como ocorrera com Salgado Filho anos antes, e iria acontecer com Ulysses Guimarães anos depois, o piloto se opôs, mas foi vencido pela teimosia de Castello. Diferente do caso de Salgado e Ulysses, em que havia problemas de mau tempo, o piloto alertou Castello que a área era reservada ao treinamento dos caças da FAB, portanto, vedada a aviões civis pelo alto risco de acidentes.

Houve também boatos de que pretendesse voltar à presidência da República e até fizera pronunciamento contra o regime para cuja instauração contribuíra como líder, não como figura secundária.

Não confere com as informações que se tinha na época. Castello discordava do grupo de Costa e Silva e defendia a volta à democracia. Para tanto, desejava concorrer a uma cadeira no Senado. Fora ao Ceará, seu Estado natal, para coordenar apoios à candidatura. Aproveitou a viagem para visitar Rachel, com quem esteve alguns dias.

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

É verdade ou é mentira? – Jayme Copstein

A respeito da reação do massacre moral que está sofrendo Geraldo Santiago, ex-diretor da Previ, por ter denunciado que o Governo petista transformou o fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil em fábrica de dossiês contra adversários do partido e do Governo, o jornalista Carlos Brickmann escreveu ontem, no "Observatório da Imprensa": "Se [Geraldo] tem ou não razão, isso não importa nesse tópico: que o caso seja investigado e esclarecido, e se ele mente que se abram os competentes processos. O problema é que parte da imprensa entrou na campanha para desqualificar o acusador. Uma informação é que ele registrou seu companheiro como dependente; outra é que, como advogado, foi quem pediu o habeas-corpus que garantiu a realização da Marcha da Maconha, no Rio.

OK, homossexual e chegado à maconha. E também irmão de um autor de novelas de sucesso. E que é que isso tem a ver com as denúncias que fez? Se fosse casado com uma mulher belíssima, mantivesse em casa uma cabrita de estimação, tomasse incenso no café da manhã ou rezasse todas as tardes em frente a uma foto de Che Guevara, com a cabeça voltada para Caracas ou Havana, isso faria alguma diferença com relação às denúncias que fez?"

Brickmann tem razão. É verdade ou é mentira o que Geraldo Santiago denunciou? É só o que interessa saber.

Não me façam rir

Hilariante a seriedade, veemência e compenetração de um apresentador da GloboNews, tentando passar aos espectadores a mensagem de que o crime não compensa. Noticiando a prisão de vigaristas que clonavam cartões de crédito, empostou bem a voz para dar ideia do rigor com que seriam "processados por estelionato e formação de quadrilha." Podia ter acrescentado, com ar galhofeiro: "(...) e em seguida soltos pelo bom mocismo calhorda, segundo o código da impunidade ampla, geral e irrestrita, escrito pelos rábulas de porta de cadeia, que infestam a Justiça brasileira.

Por falar nisso...

Faz dez anos que o jornalista Pimenta Neves matou a colega e ex-namorado Sandra Gomide, faz quatro anos que foi condenado pelo Tribunal do Júri e continua em liberdade. Sabem por quê? Porque de acordo com o código dos rábulas de porta de cadeia, inspirado no bom-mocismo calhorda, mesmo tendo confessado o crime e não havendo nenhuma dúvida sobre a autoria, perante a legislação brasileira é considerado inocente até que a defesa esgote a última firula jurídica ao seu alcance. Faz dois anos que o pedido de POimenta, para que o julgamento seja anulado e se comece tudo outra vez, dormita no Supremo Tribunal Federal.

Os fiscais de Alah

Ali Karimi, craque do Steel Azin FC, ganhou bilhete azul do clube por não ter iniciado o jejum, um dos principais preceitos do islamismo. Karimi, conhecido na Europa como o "Maradona asiático", já atuou pelo Bayern de Munique. Segundo a notícia, publicada pela Folha de São Paulo, bateu boca com membros da Federação iraniana quando foi cobrado pela apostasia. Como diria o finado Mendes Ribeiro, Alah não joga, mas os aiatolás fiscalizam.

Mural

Sobre "O novo alçapão de Lula", Luiz Lander comenta: "O inimaginável é que tudo o que se disser, a respeito desta quadrilha que assalta os cofres e mentes públicas, ainda será pouco. Até as pesquisas estão sob suspeição, como demonstra Lúcio Neto em seu Blog, mas até o dia do voto na urna eletrônica, teremos que lutar para esclarecer, opinar e demonstrar, pois o que restará para um homem de bem é sua consciência de ter lutado um bom combate. Redundante, mas necessário."

terça-feira, 17 de agosto de 2010

O novo alçapão de Lula – Jayme Copstein

Desde que o senhor Luiz Inácio Lula da Silva assumiu a presidência da República, seu partido tenta forçar o país para dentro de alçapões, no fundo dos quais esconde uma ditadura ao estilo cubano. .

Primeiro foi aquele ridículo Conselho Nacional de Jornalismo que, a pretexto de "controlar excessos" da imprensa, revogava cláusula pétrea da Constituição e impunha mordaça à liberdade de expressão. A mais recente novidade é a mudança proposta para a legislação dos direitos autorais, confiscando do autor, único e legítimo dono, a propriedade da obra criativa (artística, literária, científica). .

Fica difícil identificar o mentor ou os mentores da malandragem porque, como no caso dos dossiês contra adversários, todos se fingem de mortos. Convocam-se reuniões para o debate "democrático", às quais comparecem militantes treinados em intimidar, para no fim "tirar" cartas cuja texto, já redigido de antemão, pretende dar legitimidade à decisão imposta.

São táticas por demais conhecidas e que já não mais conseguem dissimular que Lula e seus correligionários pretendem transferir ao aiatolá eventual na Presidência da República, o poder de administrar o uso da obra criativa, alegadamente "quando o autor ou titular do direito de reprodução, de forma não razoável, recusar ou criar obstáculos ao licenciamento".

A democratização do acesso à cultura, como o projeto sugere na superfície, esconde em suas dobras a liberdade de deturpar a obra criada. Não é dinheiro que se pretende negar ao criador da obra, pois esse o Governo do Sr. Luiz Inácio Lula da Silva distribui generosamente para correligionários, aliados, amigos e favorecedores no país e no estrangeiro. Da mesma maneira que os aiatolás do Irã fraudam o Corão para legitimar seu sadismo contra uma mulher indefesa, a obra do autor pode ser "licenciada" até para dar aval a teses a que ele se opõe com toda a sua convicção.

Mural

Jovita M. pergunta o que é "maganão", palavra usada na coluna de ontem e por ela considerada "difícil". É pouco usada, mas difícil não é, no sentido que a leitora levantando. Aprendi "maganão" com os portugueses na minha bem amada cidade do Rio Grande, onde nasci e me criei. Eles assim chamavam os brincalhões que não levam nada a sério, vivem contando anedotas e pregando peças nos outros. Sem considerar o milhão de novas máquinas, cuja engenharia ainda não foi montada, será que não é piada exigir que as empresas deste país acrescentem à papelorreia a que estão obrigadas para cumprir as obrigações fiscais, uma montanha de mais 20 milhões de papeluchos por dia, para compensar a fiscalização que a Pasta do Ministro Carlos Lupi não faz? Apenas acrescento: lá em Rio Grande também diziam "manganão". Não sei explicar a intromissão de um "n" na primeira sílaba.

A impunidade

Victor Zé-Povinho externa sua indignação contra o projeto do novo Código de Processo Penal, que amplifica e aprofunda a impunidade no Brasil: "Até quando a impunidade será a única regra séria neste país lulista? Até quando armações como esta do novo Código de Processo Penal serão adotadas para alimentar a procura de advogados para usar as brechas criadas por juristas e politicalhas que depois vão voltar a usar "liminares" para se reelegerem e, assim, gozarem das benesses da imunidade ou impunidades parlamentares. Isto é novo ou velho como as raposas do poder e do dinheiro público?! Até quando?"

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

O maganão – Jayme Copstein

Manoel, o filósofo português que não vê necessidade de inventar piada de brasileiro pergunta se a notícia é verdadeira. É verdadeira, sim.

Portaria do Ministério do Trabalho, de 2009, obriga as empresas brasileiras com mais de dez funcionários, a adotar máquina de ponto eletrônico que emitam recibo impresso toda a vez que o funcionário sair ou entrar. Bem mais de 20 milhões de papéis terão de ser emitidos por dia, "para evitar possíveis fraudes", segundo justificativa do Ministro Carlos Lupi.

Mas este não é o maior problema para se cumprir a exigência, em vigor a partir de 25 de agosto. Há necessidade de substituir um milhão de máquinas. Como a capacidade atual de produção do Brasil é de 100 mil unidades por ano, seriam necessários dez anos, no mínimo, para dar conta do recado.

Quando o Manoel soube que ainda não foram criados, em nenhum país do mundo, modelos que atendam às exigências inventadas pelo Ministro Carlos Lupi, ele deu aquela risadinha sarcástica e acrescentou: "Vosso ministro é um maganão, pois, pois."

Falta de cadeia

Com essa falta de cadeia que assola o país – vergonha na cara não se exige mais já há muito tempo – qual a estranheza que vereadores torrem 15 milhões de reais em diárias, para "cursos de qualificação" nas praias de Fortaleza ou no camelódromo de Foz de Iguaçu?

Houvesse um pingo de seriedade neste país, e o objetivo fosse mesmo qualificar vereadores, bastaria trazer os professores para ministrar os tais cursos nos próprios municípios dos interessados, sem ter de sangrar os cofres públicos.

No fundo, mesmo, o que falta é cadeia. Como em toda a corrupção sempre há um corruptor e um corrompido, fossem os mentores de tais "cursos" e os vereadores que os frequentam, postos a capinar as ruas e a recolher o lixo, certamente nasceriam todos muito qualificados, para proveito de todos nos.

A propósito

Por falar em falta de cadeia, artigo do promotor e jornalista Cláudio Brito, publicado ontem na Zero Hora, alerta sobre as benesses que os mentores do novo Código de Processo Penal estão engendrando para ampliar a já oceânica impunidade oferecida a toda a espécie de criminoso no Brasil.

Poderia repetir aqui as estarrecedoras revelações do Cláudio Brito, colhidas no convívio com seus colegas durante o Encontro Nacional dos Promotores de Justiça do Tribunal do Júri. Mas apenas faço um resumo do novo Código: "Artigo 1º - É terminantemente proibido e considerado crime hediondo, ser honesto no Brasil. Artigo 2º - Revogam-se as disposições em contrário".

E agora, Zé Sarney?

Zé Sarney, aquele do governo de triste memória que pôs na lata do lixo vários anos da História deste país, deve ter feito alguma coisa que desagradou seu parceiro, Luiz Inácio Lula da Silva. Não há outra explicação para o súbito reaquecimento das denúncias contra a milagrosa multiplicação dos pães e bolachinchas do Casal Murad – Roseana Sarney e seu marido, o padeiro Jorge Murad.

Desta vez, não dá para acusar Fernando Henrique Cardoso, como Zé Sarney fez da outra vez, quando foram flagrados esses mesmos "dinheiros não contabilizados". Naquela ocasião com o "coração de pai dilacerado pelas ofensas à sua inocente pimpolha" correu para ios braços de Lula que o esperava de braços abertos, para vesti-lo com uma "biografia de respeito".

E agora, Zé Sarney, que ficou claro quem é quem nessa história, vai correr para onde? Já não há mais braços tão abertos como antigamente.

domingo, 15 de agosto de 2010

No Cemitério de Praga – Jayme Copstein

A Editora Record comprou os direitos de tradução e publicação no Brasil de obras inéditas de Umberto Eco, celebrizado pelo sucesso de "O nome da rosa". O primeiro lançamento, em 2011 (na Itália, já sai mês que vem) é "O Cemitério de Praga", história de conspirações e assassinatos vivida por espiões e políticos, tendo o velho Cemitério Judaico da capital tcheca como cenário principal.

Não é a primeira vez que este Cemitério serve de cenário a histórias macabras. É o mais antigo das necrópoles judias da Europa. Os nazistas não o destruíram porque pretendiam transformá-lo, com a Sinagoga, em "museu de uma raça extinta".

Certamente, os mentores da maluquice tinham em mente o capítulo de um romance do Século 19, "Biarritz", de "Sir John Retcliffe". Intitulado "No Cemitério Judaico de Praga", relatava a fictícia reunião de treze rabinos, conspirando para dominar o mundo.

"Sir John Retcliffe" era pseudônimo do falsário Hermann Goedsche, demitido dos serviços postais da Prússia por fabricar um "dossiê" (já naquela época!) contra o socialdemocrata Benedic Waldeck. Tido como agente secreto da polícia prussiana, Goedsche engajou-se a fundo no antissemitismo fomentado pelo chanceler Bismarck nos embates políticos de 1848. Produziu farta propaganda antijudaica. O capítulo referido de "Biarritz" mais tarde inspirou o serviço secreto russo, ao tempo dos tzares, a forjar outro "dossiê", "Os Protocolos dos Sábios do Sião", em que os nazistas acreditavam com toda a convicção, como se fossem dogmas.

Não está fora de propósito, portanto, supor que o zelo nazista pelo Cemitério Judaico de Praga tivesse a ver com esta origem de sua bíblia antissemítica. Não é o caso de Umberto Eco, cuja fixação pela capital tcheca tem outra origem – a brutal repressão soviética de 1968, que testemunhou e à qual alude no início de "O nome da rosa".

Eco já tinha sido publicado no Brasil pela Perspectiva, antes de seu best-seller torná-lo conhecido. Era texto de pequeno interesse fora do meio universitário. Esquematizava a estruturação e redação de trabalhos acadêmicos. Quando "O nome da rosa" estourou em 1980, alguns zoilos andaram resmungando que se tratava do livro mais citado e menos lido depois da Bíblia.

Se a referência à repressão soviética teve alguma coisa a ver com isso, é difícil de saber, mas também não está fora de propósito pensar-se no vínculo. A Primavera de Praga, como ficou conhecido o episódio da liberação do comunismo tcheco e seu esmagamento pelas tropas soviéticas, está entre os fatos mais contundentes, mas é o menos citado da história dos anos 1960.

Aconteceu tanta coisa naquela década: Vietname, Woodstock, Maio em Paris, feminismo, assassinato de Martin Luther King, só para citar alguns dos acontecimentos daqueles tempos de decisiva e transformadora rebelião, relembrados até hoje nos meios de comunicação e também fartamente documentados em livros. Toda a ênfase, porém, é posta no idealismo de Chê Guevara, também assassinado em 1968, cuja imagem continua estampando camisetas nas manifestações de rua. Sobre os mortos da Primavera de Praga, a discrição tange o limite, ultrapassado o qual caímos no silêncio sideral.

Guevara foi a teoria de um idealismo, cuja prática é a Primavera de Praga. Entre os dois, a teoria e a prática, a frase que os tchecos escreveram nos muros de sua capital, perguntando aos soldados soviéticos que os massacravam: "Vocês não eram nossos amigos?"

Se não for o epitáfio de uma utopia é o ícone de certas ingenuidades

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

A tranca da porta – Jayme Copstein

Depois da porta arrombada, como diz a velha e desgastada frase, a tranca, mas não propriamente de ferro porque, até agora, não passa de um mera esperança de moralização: o TCU quer rever as generosidades da Comissão de Anistia ao conceder indenizações a vítimas da ditadura militar, algumas delas notoriamente se dizentes perseguidas, sem nenhum pé na realidade. Se isso acontecer e se, depois, o Judiciário concordar com a faxina sugerida pelo noticiário, então poderá se falar em tranca de ferro.

Há indícios de que quase 4 bilhões de reais foram distribuídos na verdadeira ação entre amigos, nada inédita no Brasil, em que se transformou a dita Comissão, a qual se arrogou atribuições administrativas, concedendo promoções até a militares, como foi o caso de Carlos Lamarca, com pagamento de "atrasados".

É tardia a preocupação moralizante. A imprensa cansou de falar no escândalo sem que ninguém se dignasse a desmentir. Nem mesmo agora a Comissão da Anistia se dispõe a justificar objetivamente tais decisões. Apenas como lembrança, reproduzo o que escrevi a respeito em outubro de 2008:

"Não faz muitos dias, eram manchete da imprensa os jornalistas Carlos Cony, Ziraldo e Jaguar pelas polpudas indenizações obtidas a título de reparação por prejuízos morais e materiais quando integravam a 'resistência democrática'. A expressão é gravada entre aspas pela dificuldade, no caso específico, de se saber em que consiste tal resistência democrática. Desafio às estatísticas de epidemiologia hepática, no caso de Jaguar? Esperta infiltração nas hostes inimigas, para abater seu moral com bem pagos trabalhos por empresas estatais, no caso de Ziraldo? Ou a linguagem cifrada dos iracundos editoriais do Correio da Manhã – onde se lia "Fora!" deveria ler-se "Fica!" – escritos por Carlos Heitor Cony, pregando a deposição de Jango, ipso facto a derrubada do regime?"

[b] Boa pergunta [/b]

Em entrevista à televisão, o candidato a presidente da República, José Serra, trouxe para o debate o destino de R$ de 40 bilhões de reais de dinheiros públicos. Textualmente: "Do começo de 2003 para cá, foram arrecadados R$ 65 bilhões para transportes, para estradas na Cide. É um imposto. Sabe quanto foi gasto disso pelo governo federal? Vinte e cinco. Ou seja, foram R$ 40 bilhões arrecadados dos contribuintes para investir em estradas do governo federal que não foram utilizados."

Eis uma pergunta que o Governo Federal deve responder: aonde foram parar esse 40 bilhões? Pela resposta, há de se medir o tamanho da cueca.

Palmadas na lei

A propósito da "Lei da Palmada", um caderno de apoio pedagógico, distribuído pela Coordenadoria de Educação da Prefeitura do Rio de Janeiro, ensina assim o "Chicotinho Queimado":

"Em círculo, todas as crianças batem palmas e cantam: 'Chicotinho queimado, custa dois cruzados, quem olhar para trás ganha chinelada". Logo adiante, acrescenta: 'Se esta criança não perceber, terá, como castigo, 'chicotadas' leves no bumbum'.

Aldori e o cavalo

O Aldori, o gaúcho perplexo, fala com seu cavalo sobre a "conjuntura nacional". O cavalo chama-se Camões não por ser dado à poesia, mas porque é caolho. Cada vez mais perplexo. Aldori quer saber do Camões porque Lula assinou "contrariado" a Resolução da ONU, ampliando sanções ao Irã.

"Se ele não estava de acordo, por que assinou? Tinha alguém metendo a faca no pescoço dele, para obrigar?", perguntou ao cavalo.

Como não entendesse a resposta, perdeu a paciência:

"Fala, cavalo! Tu só relincha!"

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Recenseamento – Jayme Copstein

Jovens estudantes me pedem-me socorro sobre o recenseamento ora em curso no Brasil. Antes de mais nada, para compreender o que está acontecendo é preciso saber a diferença entre censo e recenseamento.

Censo é o registro geral do número de habitantes de um país e das coisas que fazem. O recenseamento é a coleta dos dados que permite o registro. Não basta apenas contar pessoas, animais e coisas. É preciso definir várias particularidades, como idade, sexo, grau de instrução, onde vivem, o que fazem, o que produzem. O IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) estima a população brasileira, hoje, em 192.924.526 habitantes. Mas, apenas contar os habitantes, um por um, até chegar a este número, não informa, por exemplo, se o país pode contar com 100 mil especialistas, caso necessite de mão de obra capacitada para incrementar seu programa nuclear.

O censo vai apurar o número de habitantes, distribuição geográfica, capacitação profissional, poder aquisitivo e as suas necessidades. Sem eles, o Governo poderia construir, por exemplo, 5 mil novos hospitais, mas se o governo os construísse só em São Paulo, Guanabara ou Rio Grande do Sul, novo levantamento mostraria que, assim mesmo, o país ainda estaria precisando dos mesmíssimos 5 mil novos hospitais porque as zonas de carência, provàvelmente, seriam Amazonas, Ceará, Sergipe, Bahia, Mato Grosso e Goiás.

História

A história dos censos é remota. Escavações arqueológicas mostram que o efetivo dos exércitos, o número de prisioneiros e o de inimigos abatidos nos campos de batalha era sempre apurado. Era necessário comparar os recursos próprios com os do inimigo e garantir que pudesse ser enfrentado com vantagem e, depois de vencida a batalha, impedir a sua recuperação. Está explícito na referência encontra na Bíblia em Números: "No segundo ano, após a saída dos filhos de Israel do Egito, no primeiro dia do segundo mês, falou o Senhor a Moisés no deserto do Sinai, na tenda da Congregação, dizendo: - Levantai o censo de toda a congregação dos filhos de Israel, segundo as suas famílias, segundo a casa de seus pais, contando todos os homens nominalmente, cabeça por cabeça. Da idade de vinte anos para cima, todos os capazes de sair à guerra em Israel: a esses contareis segundo os seus exércitos; tu e Arão".

Em Roma

Foram os romanos que tornaram o censo instituição permanente, realizando-o a cada cinco anos. Com a decadência e o fim do Império, os censos desapareceram. Na Idade Média, a eles foram atribuídos, como períodos sucessivos de fome e de peste castigos divino ao "pecado de contar homens".

Apenas duas vezes, durante esse tempo, a avaliação de recursos foi intentada. Uma, por ordem de Carios Magno: a outra, por Guilherme, o Conquistador, desconfiado da sonegação das taxas que os proprietários de terras deviam pagar à Coroa.

No Brasil, os censos periódicos se iniciaram a partir de 1872. Estimativas da população foram calculadas anteriormente, desde os tempos coloniais, mas extraídos dos registros paroquiais, os dados não refletiam inteiramente a realidade. O censo repetiu-se em 1890, 1900, mas deixou de ser feito em 1910 devido à grande agitação que marcou a disputa pela Presidência da República, entre Ruy Barbosa e o Marechal Hermes da Fonseca. Foi retomado em 1920 e, de novo foi suspenso em 1930, pela precária situação política. Desde então, tem sido realizado regularmente a cada 10 anos.

terça-feira, 10 de agosto de 2010

A justiça das mãos – Jayme Copstein

O drama vivido por Sakineh Mohammadi, a mulher iraniana condenada a morrer apedrejada pelos aiatolás, comove o mundo e particularmente camadas significativas da população brasileira. Pena que alguns segmentos pródigos em manifestações ruidosas quando se trata de casos como o do terrorista Cesare Battisti, assassino condenado pela Justiça italiana, não se manifestem agora em defesa daquela pobre mulher, vítima de uma sociedade que não conseguiu sair ainda da Idade Média.

É bom que o drama vivido por Sakineh tenha comovido parte significativa da sociedade brasileira. Mostra como evoluímos positivamente, aqui, no que diz respeito aos direitos humanos. Quem se der ao trabalho de percorrer jornais antigos vai se surpreender com as cenas de selvageria protagonizadas por cidadãos "indignados", decididos a fazer justiça pelas próprias mãos.

Tenho anotações de um caso, colhidas nos jornais de 1899, envolvendo um francês, José Pomaret, na cidade do Rio Grande. Em 16 de agosto daquele ano, uma menina de dois anos que brincava na calçada, na frente de casa. Foi levado por um desconhecido para as macegas que existiam no fim da Rua Francisco Marques. Só ao anoitecer, a garotinha reapareceu, com as vestes rasgadas, bastante machucada e com evidências de ter sofrido estupro.

O crime chocou a população, cujo clamor movimentou a Polícia. Já no dia seguinte, era preso José Pomaret, acusado da autoria. Nem isso acalmou a revolta popular. As pessoas começaram a lotar a Praça João Telles (hoje Xavier Ferreira), em frente ao Quartel da Guarda Municipal, onde o francês estava preso, exigindo que ele lhes fosse entregue para ser ali mesmo justiçado.

Às 8 da noite, a multidão decidiu invadir o Quartel. Houve arrombamento dos portões, tiroteio, e por fim Pomaret foi retirado da cela e trucidado pelos manifestantes ensandecidos. O espetáculo de selvageria completou-se com o cadáver arrastado pelas ruas da cidade, até ser queimado no mesmo lugar onde se dizia ter ocorrido o estupro.

O "Almanak do Rio Grande do Sul", de Alfredo Ferreira Rodrigues, na edição de 1902, traz relato a respeito do episódio e conclui com estas linhas: "É o primeiro exemplo que se dá no Rio Grande; mas esse foi tremendo e servirá de exemplo aos celerados que ousam afrontar a lei e a moral, em satisfação aos seus instintos bestiais."

Passados muitos anos, na década de 1940, um funcionário do antigo Banco da Província, Nelson Penna, me falou do caso e contou que, passado algum tempo, descobriu-se ser o francês inocente, tal como ele bradava enquanto teve fôlego para falar, antes de ser morto. Já não havia o que se pudesse fazer para consertar a "justiça" pelas próprias mãos.

Nelson Penna não testemunhou os acontecimentos de 1898. Era menino então e dele só ouviu falar pelos mais velhos. Referiu-se, porém, a um mito: a terra por onde o cadáver de Pomaret fora arrastado, tornara-se estéril, como sinal dos céus para perpetuar o remorso no coração da multidão que o martirizara.

Ao Mérito

Hoje, é dia de festa para mim e para todos os amigos e admiradores do advogado Nestor Fernando Hein. Logo mais, às 7 da noite, ele recebe a Medalha Oswaldo Vergara, com que a OAB-RS homenageia advogados com relevantes serviços prestados ao Direito e à entidade.

Nestor soma ao talento profissional a integridade de caráter. A visão maior da realidade brasileira o torna um interlocutor muito agradável. A homenagem da OAB é merecida por todos os títulos.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Mais do mesmo – Jayme Copstein

Mais do mesmo – Jayme Copstein

Faz alguns dias, nos Guerrilheiros da Notícia, programa de sintonia obrigatória, apresentado por Flávio Alcaraz Gomes na TV Pampa, o desembargador Túlio Martins abordou a epidemia legisferante brasileira, o chorrilho de leis que nada acrescentam ao que já existe, muitas vezes até colidindo com o que já existe. O "mais do mesmo".

Criticam-se os advogados por suas artimanhas e a elas se atribuem a lentidão da justiça. Descontadas as chicanas, alimentadas pela zoura da demagogia, como saber realmente o que vale e o que não vale nesse inço de "pode" e "    não pode", na verdade sempre "podendo" se ninguém estiver olhando ou alguém fechar os olhos de propósito?

Pois o Senado acaba de aprovar projeto de Marcelo Crivela, do PRB do Rio de Janeiro, alterando o Artigo 1338 do Código Civil, para proibir a venda ou aluguel das garages de uso independente em condomínios.

Na verdade, a "obra-prima" de Crivela, afora desnecessária, é gritantemente inconstitucional ao pretender limitar o uso da propriedade privada, quando ao Estado cabe apenas conter o abuso. Só os condôminos, os proprietários do espaço, é que podem fazer ou deixar de fazê-lo, assim mesmo se a cada unidade (apartamento ou sala) corresponder apenas o direito de uso, mas não a propriedade da garage, o que é definido no memorial descritivo e sacramentado em escritura de compra e venda.

É tudo por demais conhecido, e o próprio relator, senador Pedro Simon, ciência da inutilidade do projeto, mas, com toda a certeza, quis fazer um agrado ao colega, concedendo o parecer favorável. Como cortesia, valeu. Como eficácia, foi futilidade.

Que medo!

Levei um susto, ontem, ao ler nos jornais que pode pegar oito anos de cadeia quem vender seu voto. Caramba! O susto foi tão grande que até a interjeição antiga me veio à cabeça. Depois, fiquei pensando: por que será que os "homi" estão tão zangados, como dizia o neguinho Agenor, na velha Redação do Diário de Notícias. Será que é por que essa gente não dá valor ao voto e vai logo trocando por camiseta, boné e outras porcarias?

Pergunto, mas não por maldoso. Pura curiosidade. Não consigo entender como aquela gente, lá em cima, vende voto, não acontece nada e ninguém é ameaçado. Mensalão é de milhão, voto de eleitor é de tostão. Vai ver que é esta a diferença.

60 anos da OSPA

Quem quiser manifestar à OSPA, a Orquestra Sinfônica de Porto Alegre, a gratidão pessoal pelos momentos de indizível prazer que ela lhe proporcionou ou levar aplauso pela contribuição à cultura do Rio Grande do Sul, vai visitar a Exposição comemorativa dos seus 60 anos de criação que será inaugurada depois de amanhã, quinta-feira, na Praça de Eventos do Moinhos de Vento Shopping, 2º andar.

A Exposição, concebida pelo arquiteto Joel Fagundes e Daniela Corso, ao lado de contar a memória da instituição, através de documentos, fotos e vídeos, explica como funciona uma orquestra sinfônica, exibindo e demonstrando cada instrumento.

Como se dizia antigamente, é instrução e diversão para crianças de 9 a 99 anos que amem o belo e nele desejem mergulhar.

domingo, 8 de agosto de 2010

Hitler no Maranhão – Jayme Copstein

A coluna "Os sósias de Hitler" despertou bastante interesse entre os leitores. O jornalista Ney Gastal nos remeteu o relato de uma lenda, encontrada em blogs, que afirma ter Adolf Hitler estado no Maranhão em 4 agosto de 1944, logo após atentado sofrido em 20 de julho, no seu quartel-general de Rastenburg, Prússia Oriental.

A contribuição do Ney Gastal é didática. Mostra como se constroem versões na Internet, nem sempre por má intenção, meramente pelo desejo de contar "um causo". Aí, nem mesmo a coerência que fatos associados devem guardar entre si, é levada em conta.

Segundo o relato, mal explodiu a bomba que quase o matou, "um de seus "oficiais, em agonia (?!?), encaminhou Hitler ao submarino "de sua confiança (?!?), o S-199, que seguiria, em segurança, para lugar incógnito e remoto. Para fugir das conspirações de parte de seu exército, que o queria morto. (...) De acordo com o Diário de Bordo do SS-199, citado na reportagem da Der Spiegel, Hitler e sua amante, Eva Braum, estacionaram no dia 4 de agosto daquele ano a 2°o7′57" de Lat. S e 44°36′04" de Long. W". Estas são as coordenadas geográficas de Guimarães, no Maranhão".

FCMoraes, leitor mais atento do Blog do Alexandre (http://tinyurl.com/2bckhcx), já havia detonado a geografia do conto: "Experimenta colocar estas coordenadas 2° 7' 57" de Lat. S e 44°36' 04" de Long. W. no Google Earth e vais ver que este ponto é no continente. A menos que o litoral tenha avançado em direção ao mar (...).

A lenda, recheada de mais detalhes, descreve Eva Braun entediada com a reclusão, pedindo "para ser levada, de bote, à noite, à praia avistada pelo telescópio", onde ganhou camarões de um pescador.

Sem outras considerações para não se perder mais tempo com a historinha, o prefixo dos submarinos alemães era "U", não "S". De fato, existiu o U-199. Era o submarino que andava torpedeando navios brasileiros em nosso litoral. Foi afundado em ação conjunta da FAB e da Força Aérea Americana, em 31 de julho de 1943, um ano antes da Operação Valquíria, o atentado cometido contra Hitler em 20 de julho de 1944.

Salvaram-se 12 de tripulantes do U-199, incluindo o comandante Hans Werner Kraus. Todos foram levados para os Estados Unidos, para serem interrogados. Só foram libertados após terminar a guerra. Hans Werner Kraus viveu até 1990.

Mas que fosse outro o submarino: nos dias subsequentes ao do atentado, Hitler esteve frenético, exigindo o julgamento sumário e a execução imediata dos mentores da Operação Valquíria, ordem cumprida com requintes de crueldade. Foram todos enforcados com arame de aço, içados a ganchos de açougue. Um filme foi feito, exibindo para Hitler, naquela mesma noite, mostrou os condenados estrebuchando, enquanto as calças caiam-lhes aos pés. Haviam lhes tirado as cintas, para cobrir de ridículo o espetáculo da sua morte.

Hitler não se afastou da Alemanha, e isso é comprovado por fatos e testemunhos. Logo depois do atentado, em 23 de agosto de 1944, diante inevitável derrota na frente ocidental, emitiu ordem para incendiar Paris, descumprida pelo comandante das forças nazistas de ocupação, general Von Choltitz. É célebre a frase de Hitler, angustiado com a falta de notícias que confirmariam a destruição da capital francesa: "Está Paris em chamas?"

Nunca houve dúvida quanto ao suicídio de Hitler na tarde de 30 de abril de 1945, em Berlim. Foi relatado por várias testemunhas e cadáver foi fotografado, sendo a foto amplamente divulgada após o término da guerra na Europa.

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

A extensão da tragédia – Jayme Copstein

Agostinho Wolfart aprofundou a análise das estatísticas do trânsito no Brasil ("Que mal tem?" – coluna de 27 de julho) e nos remeteu uma comparação para ressaltar a extensão da tragédia brasileira:

"Aproveitando os dados de teu comentário: 42 mil mortos por ano em acidentes de trânsito. Quando cai um avião com quase 200 pessoas no Brasil, é notícia por muitos meses e até anos. Se dividirmos 42 mil mortos por 200, que é a capacidade média de um avião, chegaremos ao impressionante número de 200. Isto mesmo. O número de mortos no nosso trânsito equivale a queda de 200 aviões lotados, por ano no Brasil. Sem contar os mutilados para o resto da vida.

E a responsabilidade, a quem atribuir? Grande parte aos legisladores, que se preocupam em discutir bobagens, como a que estão debatendo agora, se o proprietário de dois boxes de um edifício pode ou não alugar um deles. Leis mais severas tem que ser votadas. E cumpridas. O que houve com a "Lei Seca"? Falta aplicá-la. Os que são contra ela, o são até que um familiar seu seja morto por um bêbado ao volante. Não há fiscalização, pois o efetivo da PRF é irrisório.

E as estradas esburacadas que também são causa de acidentes? Não é de admirar que nenhum governador do RS tenha sido reeleito: basta olhar a vergonha que é a RS 118 entre Sapucaia do Sul e Gravataí. É o legítimo atestado de incompetência dos últimos governadores. É um cartaz na testa dizendo: "eu não respeito o cidadão deste estado e não estou nem aí para sua vida".

E a nível federal as coisas estão no mesmo pé. Depois de oito anos de governo Lula irá inaugurar a inacabada duplicação da BR 101 até Palhoça. Qual é o problema se continuar a morrer gente por causa disto!?"

Os sósias de Hitler

Sobre "Os sósias de Hitler" (coluna de anteontem), Heitor de Paola corrige: "A segurança pessoal de Hitler não era feita pela Gestapo, na qual ele também não confiava, e sim pelas SS, fundadas para fazer a segurança dos membros do NSDAP. (Mais tarde aumentaram seu poderio e alcance até constituírem Panzer Divisionen, as Waffen SS). Foi criado um regimento especial, só para ele: o Leibstandarte Adolf Hitler". Heitor de Paola tem toda a razão. Fica corrigido, com os nossos agradecimentos.

O jornalista Ney Gastal nos passa a transcrição de outra fábula que descreve Adolf Hitler no Maranhão, já em agosto de 1944, nove meses antes da queda do III Reich. Será publicada na semana que vem, quando for retomado o assunto que despertou bastante interesse entre os leitores.

O enterro

O jornalista Marcello Vernet de Beltrand, citado na coluna "O metro da corrupção" (1º de julho) acrescenta sobre o hilariante caso da nota do Sindicato dos Contabilistas, publicada como sendo do Sindicato dos Contrabandistas: "Tudo o que contei é rigorosamente verdade, mas esqueci de um detalhe, digamos, tragicômico. Ocorre que a tal nota que gerou toda a confusão era, na verdade, convite de enterro publicado pelo Sindicato dos Contabilistas".

Uma palavra a mais

Uma palavra a mais ("fora") no texto de ontem ("Lula e seus companheiros") deixou um pouco confuso o parágrafo que dizia: "Sakineh foi julgada novamente, desta vez por adultério. Não há provas fora de sua participação, fora do alegado pelo assassino, tanto assim que dois juízes a absolveram". É só excluir o primeiro fora para se entender que não há provas de sua participação, fora do alegado pelo assassino.

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Lula e seus companheiros – Jayme Copstein

O Presidente Luiz Inácio Lula da Silva meteu-se em camisa de onze varas nesta questão da iraniana Sakineh Mohammadi Ashtiani, condenada a ser apedrejada até a morte por "crime" de adultério. Lula, homem de pequena instrução formal, incapaz de perceber e manter a conexão que as ideias devem guardar entre si, não tem condições de assimilar o intrincado labirinto das Relações Internacionais. Deixa-se levar pelos arroubos de Marco Aurélio Garcia que também não percebe a diferença entre uma sala de diretório acadêmico, onde reinou como agitador, e o mapa mundi, no qual não passa de figura hilariante.

O resultado desta salada mal temperada foi o erro crasso de o Presidente do Brasil dirigir-se diretamente ao Presidente do Irã ("companheiro Ahmadinejad"), para oferecer asilo a Sakineh, contra todas as regras da diplomacia, e descabidamente por não se tratar de crime político, nem a interessada o ter solicitado.

Ahmadinejad, para conter a gafe nos limites da descortesia e não ter de reagir diante da clara interferência em negócios internos de seu país, sequer se dignou a responder ao "companheiro" Lula. Incumbiu um aspone de terceiro escalão, porta-voz do Ministério de Relações Exteriores do Irã, Ramin Mehmanparast, de mostrar-se indulgente porque o emotivo "senhor Lula (...) não recebeu informações suficientes". De maneira mais sutil, repetiu o "Por que não te callas?" do Rei da Espanha a Hugo Chaves, porém acrescentado de um " não sabe do que está falando".

Segundo avaliação do Governo brasileiro – leia-se do cérebro privilegiado de Marco Aurélio Garcia, o Meternich da Azenha – a culpa é da imprensa. Se as "negociações" entre Brasil e Irã tivessem ocorrido nos bastidores, Lula traria Sakineh para cá e fecharia com "chave de ouro" os cinco meses que lhe restam de mandato. O fato de Lula ter conclamado o "companheiro Ahmadinejad" em comício eleitoral mostra que os repórteres são uns asnos. Como não perceberam que era tudo segredo de estado, apesar dos milhares de pessoas que estavam assistindo ao comício?

Lula, por sua vez, ficou feliz por ser considerado um homem emotivo e humanitário. Mas o aspone iraniano tem razão: ele não sabe do que está falando. Se soubesse estaria se juntando a milhões e milhões de vozes indignadas que se levantam em todo mundo, protestando contra mais este crime da feroz ditadura dos aiatolás.

Sakineh Mohammadi Ashtiani foi condenada inicialmente a 99 chibatadas por manter "relações sexuais" fora de casamento, crime segundo o fundamentalismo islâmico. A pena foi aplicada publicamente, testemunhada pelo seu filho.

Um dos homens com quem Sakineh manteve o relacionamento "ilícito" era o assassino de seu marido. Ao ser julgado, alegou já ser amante da mulher antes de cometer o homicídio, com a clara intenção de convencer os juízes que fora induzido por ela para fazer o que fez. Com isso, atenuou sua culpa naquele mundo de fanatismo medieval.

Sakineh foi julgada novamente, desta vez por adultério. Não há provas fora de sua participação, fora do alegado pelo assassino, tanto assim que dois juízes a absolveram. Três a condenaram à morte por lapidação. A imprensa tem noticiado "apedrejamento". Ainda que não seja incorreta, a palavra é insuficiente para descrever a crueldade do suplício: as pedras são desbastadas para ter bordas afiadas. Machucam, cortam, maceram a vítima, como se ela fosse submetida a um lento moedor de carnes.

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Os sósias de Hitler – Jayme Copstein

Admar Mendonça Ferreira gostou de "As mortes de Napoleão" (coluna de ontem). Também achou que não dá para acreditar na história de Napoleão Bonaparte ter vivido como joalheiro em Verona, indo um sósia em seu lugar para a Ilha de Santa Helena. Ele pergunta se é ou não verdadeira a versão de que Adolf Hitler e Eva Braun não se suicidaram em Berlim, mas fugiram para a Argentina. Sósias é que teriam se suicidado em seu lugar.

É mito, nascido do fato de não terem sido achados os despojos do casal nazista quando Berlim caiu. A suspeita de que os russos haviam ocultado os restos do casal nazista foi confirmada no fim das União Soviética, com a liberação de documentos até então considerados secretos. Stalin pretendia usar a incerteza da morte de Hitler como trunfo nas cartadas da Guerra Fria que já iniciara antes mesmo de terminar a II Guerra Mundial.

A versão mais corrente sobre a fuga secreta do ditador nazista não fala em sósias, mas em cadáveres de soldados, incinerados para que nem seu próprio sexo pudesse ser identificado. Seja como for, favorece o surgimento desses mitos o pouco que vem à luz sobre os bastidores do poder em qualquer época.

Por exemplo, a Gestapo nunca utilizou um sósia de Hitler porque ele não permitia. Dotado de imensa vaidade, considerava-se o messias da germanidade. Daí não admitir alguém à sua "imagem e semelhança". Paranoico a não mais poder – nisso também se igualava a Stálin – quem pudesse ser confundido com ele seria risco permanente de conspirações para apeá-lo do poder.

O recusa de Hitler de usar sósias fez a Gestapo desenvolver procedimentos especiais para preservar sua segurança, neles incluindo mudanças de trajetos ou dos horário de suas aparições públicas, impedindo o planejamento sem o qual os atentados não são exequíveis.

Mesmo assim, não faltaram histórias fantásticas sobre um inexistente atentado, no qual teria morrido Julius Schreck, o motorista de Hitler. Segundo a versão, Schreck não era motorista, mas "obscuro professor do interior da Baviera" que, por ser cópia tão fiel, impressionara o próprio Fuehrer. Convocado para ser seu sósia, teve de submeter a regime para emagrecer – era um pouco mais gordo – e usar sapatos com solado alto para compensar os três centímetros que lhe faltavam em altura.

Honrado com a tarefa, ainda segundo a versão, Schreck concordou em se tornar motorista de Hitler, revezando-se com ele na direção. E assim encontrou a morte, quando fingindo ser o Fuehrer, sentou-se no banco de trás, enquanto Hitler fingia dirigir o carro em viagem para Bernau.

A história é absolutamente sem sentido, a começar pelo absurdo de Hitler utilizar um sósia como motorista. Julius Schreck realmente existiu e foi motorista de Hitler, mas não há referência alguma a semelhanças físicas entre os dois.

Schreck militou no Nacional Socialismo desde o início, e desde o início dedicou-se à segurança pessoal de Hitler. Participou da tentativa de golpe de estado em Munique, conhecida como Putsch da Cervejaria. Foi preso com os demais líderes nazistas.

Quando o Partido foi reorganizado em 1925, subiu na hierarquia das SS e chefiou a guarda pessoal do Fuehrer. A partir de 1930, efetivamente dirigia o carro de Hitler, mas como homem de confiança, não mero serviçal, E o fez até 1936, quando adoeceu de meningite e morreu em uma cama de hospital. Foi sepultado com honras, discurso de Hitler e promoção post-mortem.


 

 

terça-feira, 3 de agosto de 2010

As mortes de Napoleão – Jayme Copstein

A Revista Veja desta semana praticamente liquidou a tese de que Napoleão Bonaparte morreu envenenado pelos ingleses, de quem era prisioneiro na Ilha de Santa Helena. A conclusão não deixa dúvida: câncer de estômago.

O mito teve origem em autópsia nos idos de 1960, quando foi encontrado elevado teor de arsênio em seus cabelos. Parece ter escapado a quem levantou a suspeita, que os compostos arsenicais tinham muita presença no mundo em que Napoleão viveu. Eram ingredientes de um sem número de produtos, como pigmento verde de tintas, elemento ativo de desinfetantes e inseticidas, pomadas contra espinhas e psoríase, remédios para eliminar vermes, combater infecções (malária e sífilis) ou vermes, isso sem contar as poções para aplacar epilepsia, asma, aliviar úlceras de estômago, acalmar os "nervos" e também como afrodisíaco masculino.

É possível até estabelecer uma relação entre a presença anormal de arsênico nos cabelos de Napoleão e o câncer de estômago que o matou. A relação foi percebida pela primeira vez em 1822, ano da Independência do Brasil e cinco anos após a sua morte, em vacas que pastavam nas proximidades de metalúrgicas e que apresentavam tumores nos quartos traseiros. A fumaça resultante da fundição dos minérios de chumbo, cobre e zinco tem elevado teor de arsênio. Aliás, tal como a fumaça de cigarros, charutos e cachimbo.

O envenenamento não foi o único mito surgido quando Napoleão morreu. Correram fortes rumores, sem nenhum pé na realidade, de que não tinha sido ele, mas um sósia, François Eugène Robeaud, soldado do Exército Francês que teria chamado a atenção pela estreita semelhança física com o Imperador e também pela extrema habilidade com que imitava seus menores gestos, a ponto de, certa vez, ter iludido uma célebre atriz em encontro amoroso.

Esse François Eugene Robeaud realmente existiu, mas curiosamente sua morte, "vítima de desastre" foi registrada em novembro de 1809. Os cultores do mito alegam que foi fraude montada pelo Governo francês, para que não se suspeitasse da existência do sósia.

Afirma-se ainda, para dar mais credibilidade ao mito, que Robeaud desapareceu sem deixar vestígios após a derrota de Waterloo. A versão de que fora ele que havia morrido em Santa Helena surgiu alguns anos depois, acrescentando que Napoleão fugira para Verona, na Itália, e lá se estabelecera como ourives, sob a falsa identidade de Silvio Landry.

Em 1821, quando chegou a notícia da morte de Napoleão, o ourives Landry teria pedido a um vizinho, de nome Petrucci, para guardar um envelope com documentos. Ia viajar. Recomendou que, se não voltasse em três meses, os documentos deveriam chegar às mãos de Luís 18, rei da França.

Logo em seguida, um jornal de Viena noticiou que um homem fora morto quando tentava invadir o palácio de Schöenbrunn, onde vivia o Duque de Reichstadt, filho de Napoleão com a princesa austríaca Maria Luisa.

Como Sílvio Landry não retornasse a Verona, findo os três meses do prazo, Petrucci teria remetido o envelope ao rei da França, recebendo uma fortuna para guardar segredo sobre o episódio.

Alguns jornais, muito tempo depois, publicaram matérias a respeito, mas a versão da dupla morte de Napoleão nunca foi confirmada.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Reflexões de um velhinho mal comportado – Jayme Copstein

Recebo manifestações sobre "A peruca de Dilma", coluna publicada sexta-feira passada. Umas concordantes, outras tantas discordantes, como é da vida e da democracia. Houve até quem, lendo apenas o título, me atribuiu injustamente a intenção de "tripudiar" sobre a doença curada da candidata governista, quando nenhuma referência foi feita neste sentido.

A metáfora da "peruca de Dilma" foi usada em contraposição à "careca de Serra" porque, como corre nos bastidores, havendo acordo entre ele e Lula, para que não se baixe o nível da campanha eleitoral, petistas se excederam em ataques pessoais ao candidato tucano, ao reagir às manifestações de Índio da Costa.

Chamou-me a atenção, porém, a mensagem de uma leitora, indagando se eu sou um "dedicado anti-PT". Pelo tom da pergunta, presumo que a leitora tem irremovíveis dificuldades para descobrir que há vida no Sistema Solar além do dilema de ser contra ou a favor do PT. De resto, a opção só paga as contas de fim de mês do Zé Dirceu ou do Paulo Maluf. O supermercado nunca me pediu atestado de ideologia ao cobrar a fatura.

Se tivesse de fazer uma declaração de princípios, eu que já ando pelos "fins", confessaria ser um velhinho malcomportado e teimoso que não pede nem aceita atestados de boa conduta. Mesmo porque, quem anda namoriscando de mãozinhas dadas com Zé Sarney, Jáder Barbalho, Renan Calheiros e Collor de Mello, não tem autoridade moral para fornecê-los a quem quer que seja. Muito feliz será se os conseguir para si próprio.

As moscas

Não sei onde li ou ouvi a história das duas moscas. Se alguém puder identificar o autor, de bom grado a autoria lhe será devolvida, em lugar de andar ao léu, na Internet, como folha nos ventos do outono. Mas o fato é que me lembrei desta história porque assisti a uma discussão entre dois entendidos em eleições sobre o valor da experiência para predizer resultados.

Como sentenciava Noel Rosa em um samba que já há muito tempo deixou de ser célebre, em toda a façanha, um perde, o outro ganha. Passou-se o caso que as duas moscas, talvez por gulosas, caíram em um copo de leite. Uma nadou, tentando subir até a borda, mas como o vidro é muito liso, escorregou várias vezes até cansar e desistir da luta. Afogou-se.

A outra – sempre há uma outra, senão a história acaba em tragédia e sem moral para vender livro de autoajuda – mais tenaz e perseverante, continuou se debatendo furiosamente. Surpresa: tanto se debateu que acabou formando no leite um pequeno floco de manteiga. Ato contínuo, nele subiu, esperou as asas secarem e saiu voando, para mosquear em outra freguesia.

Mas como não há bem que sempre dure e mal que nunca se acabe, certo dia a mesma mosca da manteiga, muito senhora de si, porque já tinha experiência, mergulhou em outro copo de leite. Começou a se debater, a se debater, a se debater, mas nada da manteiga se formar.

Uma terceira mosca que ia passando por acaso – em qualquer historinha de autoajuda há sempre terceiras moscas passando por acaso – quando viu aquilo, quis ajudar: "Tem um canudo aí! Sobe por ele!"     Pois a mosca da manteiga a olhou com desprezo. Que não viesse dar palpite. Ela sabia o que estava fazendo. E ficou se debatendo até cansar e se afogar... em um copo de água.

Resumindo a ópera: quem só ouve a si mesmo, mosqueia.

domingo, 1 de agosto de 2010

O metro da corrupção – Jayme Copstein

Sou um jornalista feliz pela certeza de que, aos sábados, tenho no mínimo quatro leitores atentos. Tão logo leram O Sul, anteontem, endereçaram-me mensagens assinalando o absurdo que escrevi em "Curiosidades": "Se conseguíssemos empilhar um milhão de moedas de um real, uma em cima da outra, formaríamos uma coluna de 2 quilômetros de altura, ou seja, um edifício de 10 andares".

Não sei dizer como esse cálculo maluco surgiu na frase, eu diria até por geração espontânea, revivendo teorias científicas há muito arquivadas. Inicialmente, pretendi apenas dar ideia da corrupção no Brasil, utilizando inclusive um texto antigo, mas usando notas de um real. Calculei que três delas teriam a espessura de um milímetro. Juntando um milhão, teríamos uma coluna de 333,33 metros, algo aproximado à altura do Empire State, com seus 104 andares.

Como não achei no bolso nenhuma nota de um real – estão sendo recolhidas – e não tenho como conferir a relação três por milímetro, mudei para a moeda, com espessura de dois centímetros. Continuo sem saber como os 2 quilômetros se transformaram em um prédio de 10 andares.

O leitor Newton Campos foi generoso: "Sou seu leitor diário e logicamente admirador de seus textos. Pena que na matemática você também não seja tão bom. A altura de sua coluna de moedas de um real está correta, mas o seu prédio de dez andares, teria para cada andar, um "pé-direito" (altura de cada andar) de 200,00m o que me parece um exagero. Na realidade o seu prédio teria 666 andares (com um pé-direito médio de 3,00m).

Bondosa, também, foi Neide La Salvia: "Grande admiração por sua coluna à qual fazemos leitura diária, mas em cálculos o jornalista falhou. Um edifício de dez andares tem em média uns 30 metros de altura. Nada a ver com sua competência e argúcia jornalística e observador comentarista a quem muito respeitamos".

Gabriel Moraes igualmente foi afetuoso: "Acompanho-lhe desde os tempos do Gaúcha na Madrugada, mas é trágico quando a gente se mete a fazer contas sem ter noção relativa (muito comum em jornalismo). Um edifício de 10 andares não deve passar de 30 ou 40 metros de altura. Se 1 milhão de moedas empilhadas perfaz  2 quilômetros, poderíamos empilhar ao lado, aproximadamente, 14 Pirâmides de Quéops. Continuo sendo seu fã".

Sou particularmente grato ao Gabriel Moraes. Ele achou a medida que eu procurava: a corrupção no Brasil mede 14 Pirâmides de Quéops. É ladroeira para nenhuma múmia de faraó botar defeito.

Também cortês, mas zangado, Carlos Quintela não deixou por menos: "Reveja  o tamanho desse seu edifício com 10 andares e mais de 10 Kms de altura. Aliás, a sua coluna é pródiga em absurdos como este!!!".

Só que não escrevi 10 Kms – apenas 2 quilômetros. Mas para consolo meu e também do Carlos Quintela, se ele me permitir, passo adiante o que me contou anteontem o jornalista e professor Marcello Vernet de Beltrand,
quando lhe falei, e também ao Carlos Augusto Bisson, Eurico Sallis e Flávio Del Mese, sobre o meu "prédio" de 10 andares.

Marcello iniciou-se na profissão como revisor do "Correio do Sul" de Bagé, ao tempo em que Mário Lopes era o editor-chefe. Certo dia, o Sindicato dos Contabilistas solicitou a publicação de uma nota sobre interesses da categoria. Até hoje, estão tentando explicar porque a nota foi atribuída ao Sindicato dos... Contrabandistas.