Com toda a certeza, depois desses anos todos, devo ter desaprendido a interpretar pesquisas de opinião. Daí a minha perplexidade diante do alvoroço causado pelos números da última Pesquisa Data/Sensus, com direito a vaticínios sobre o resultado do pleito.
Tenho a mesma posição de Paulo Santana, quanto ao próximo presidente da República, limitada a escolha a Dilma Roussef ou José Serra, mas não por indiferença. Ambos têm mostrado ao longo do tempo, não serem suscetíveis ao banditismo utópico que ainda não encontrou porta aberta cá no Brasil.
Há uma segunda razão para o "tanto faz, tanto fez". Se alguém tem alguma dúvida do que é uma herança maldita, o fim de novembro vai ensinar: está à espera do sucessor de Lula uma bomba de várias gigatoneladas, facilmente detectável com o dólar que começa a fugir e principalmente com a inflação que começa a subir, deixando para trás os números de 2003, quando Fernando Henrique Cardoso transmitiu a presidência.
Portanto, Serra ou Dilma, Dilma ou Serra, tanto faz como tanto fez. O legado é muito semelhante ao de Orestes Quércia, quando faliu o Estado de São Paulo – ele só admitiu ter quebrado o Banco do Estado – para eleger seu sucessor, Luiz Fleury. Todos sabemos do que custou ao povo paulista e a Mário Covas repor a locomotiva nos trilhos, o que, aliás, já induz a uma reflexão: como teria sido escrita a História do Brasil, se em lugar de se distraírem com a briga do sindicalista com o caçador de marajás – os dois agora são tão amigos! – os eleitores tivessem prestado atenção aos que lhes dizia Mário Covas.
Mas voltemos à última Pesquisa Data/Sensus. Se depois de toda a exposição dos últimos meses, a tiracolo de Lula, de Seca a Meca, Dilma só conseguiu 27,8%, enquanto Serra, sem sair de São Paulo, ainda subiu 1,4%, onde está a transferência dos 81,7% da popularidade do presidente Lula à sua candidata? Se ele lhe repassasse apenas 40%, menos da metade, ela já estaria abrindo um boqueirão sobre todos os outros competidores. Mesmo a pesquisa espontânea mostra a resistência do eleitor à candidata: toda a exposição lhe valeu 9,5% das indicações, apenas 0,2% acima dos 9,3% de um Serra que só estará presente e mostrando sua plataforma a partir de abril.
Chama a atenção que a diferença mais apertada de 6,9% só aparece quando Ciro Gomes é apresentado ao eleitor, também como candidato à Presidência da República. Quando não acontece, Serra dispara para 40,7% enquanto Dilma tem de se contentar com meros 28,5 – raquíticos 0,7% de transferência.
Ciro Gomes tira votos de Serra, mas não os transfere para Dilma? Ou será que os 11% de Ciro – correspondem a 10 milhões de eleitores – são aqueles mesmos votos que foram negados a Lula, no primeiro turno de 2006, quando ele achou que sua popularidade poderia reelegê-lo sem necessidade de aliados? E que retornaram ao seu cantil, após a apressada visita de penitência a São Luiz do Maranhão, Belém do Pará, e, principalmente, Belo Horizonte?
É um enigma cuja solução, do alto de seus bigodes, Zé Sarney & Cia Ilimitada podem falar com autoridade.
Ditos e achados
Fernando de Barros e Silva, sobre o Forum Social Mundial, na Folha de São Paulo: "Que esquerda é essa que vira as costas aos estudantes venezuelanos e não se manifesta contra a escalada autoritária de Chávez? Que esquerda é essa, para quem o mensalão não existiu ou acha que 'a vida é assim mesmo'? Que esquerda é essa, capaz de defender a barba de Fidel Castro e o bigode de José Sarney?"