É evidente que Joseph Ratzinger, padre alemão, hoje papa Bento XVI, está há muito tempo na alça de mira de determinados setores da mídia internacional. Sofre campanha desabonadora desde sua convocação pelo antecessor João Paulo II, para preservar e promover a doutrina católica como prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé.
O então cardeal Ratzinger foi escolhido porque João Paulo II tinha de enfrentar a indisciplina que ameaçava a unidade da Igreja de Roma, no fim dos anos 70. Foi a época de grandes rebeldias na Europa, com destaque na Alemanha para o movimento liderado pelo teólogo Hans Küng, que na América Latina pretendia adotar o marxismo como método de análise da realidade política e religiosa.
Assessor dos bispos progressistas alemães durante o Concílio Vaticano II, Ratzinger chegou a ser tido como teólogo de vanguarda. Recuou depois em suas posições ao se defrontar com excessos, como a utilização do Sermão da Montanha para embasar a pregação da luta de classes. Passou, então, a ser considerado ultraconservador.
Data desta época o apedrejamento a que Ratzinger vem sendo submetido sem tréguas, culminando às vésperas de sua eleição para o papado com uma nota biográfica que o aviltava, lida como novidade por dóceis repórteres de uma grande rede de tevê brasileira, apesar de já ter circulado dias a fio pela Internet. A mais recente das agressões é esta, às vésperas de sua viagem ao Reino Unido – atendendo a convite oficial, ressalte-se – do e-mail lançado à Internet, por funcionário do próprio Governo inglês, com permissão de um superior, enfatize-se também, incluindo no roteiro da visita o lançamento de preservativos com seu nome e a inauguração de uma clínica de abortos.
Não é apenas uma piada de mau gosto, uma gafe do ponto de vista dos deveres de hospitalidade. Originada dentro do Ministério de Relações Exteriores do Governo anfitrião, em departamento que tem a seu cargo a programação oficial da visita, é algo bem mais sério por acrescentar conselhos ao Papa sobre como lidar com as denúncias de abusos sexuais praticados por sacerdotes católicos. É clara a intenção de incitar manifestações desfavoráveis à presença de Ratzinger no Reino Unido, presença esta que lhe foi solicitada, ele não a pediu.
O Governo de Gordon Brown apresentou desculpas ao Vaticano e pôs panos quentes para dar o assunto por encerrado, glamorizando o "jovem promissor", que não demitiu, nem o superior que lhe permitiu a suposta brincadeira de mau gosto. O Vaticano aceitou o pedido de desculpas, a visita de Bento VI está mantida.
Mas já que é pensar livre, o que aconteceria se, em lugar do Papa da Igreja de Roma, o alvo do "gracejo" fosse um aiatolá do fundamentalismo islâmico? Os mesmos setores da mídia internacional que apedrejam Joseph Ratzinger, voltariam seus canhões para o Primeiro Ministro Gordon Brown, e ele ficaria se borrando de medo pela "fatwa" com que seria honrosamente condecorado.
Galvani na ARGL
O escritor e jornalista Walter Galvani fala hoje, às 4 da tarde, na Academia Rio-Grandense de Letras, sobre "Memórias de Adriano", da francesa Marguerite Yourcenar. Foi o livro que apaixonou Galvani pelo gênero biografia. Ele é autor de "Nau Capitânia", que conta a vida de Pedro Álvares Cabral, o descobridor do Brasil, já com várias edições, inclusive em Portugal.