domingo, 15 de novembro de 2009

Diferenças e trivialidades – Jayme Copstein

Luíza Erudina e Paulo Maluf foram prefeitos em São Paulo, fizeram péssima administração e foram processados por problemas com dinheiros públicos.
Terminam aí as semelhanças e as trivialidades. Erundina saiu mais pobre do que entrou na maior Prefeitura do país, Maluf enriqueceu ainda mais. Erundina não embolsou o dinheiro público, mas apenas o gastou mal, pagando um e apenas um anúncio defendendo greve dos transportes em 1989. Os processos enfrentados por Maluf são excelente material didático para ensinar o Código Penal e, principalmente, os labirintos do Código de Processo Penal.
Erundina está entregando o único apartamento que possui – abriu mão da impenhorabilidade assegurada por lei – dois calhambeques (um Fiat Pálio 1997 + um Gol 2002), e mais 10% de seu salário para pagar a dívida. Os oficiais de Justiça não conseguem encontrar o Porsche de Maluf e ele alegou – pobrezinho! – que os 40 mil reais penhorados de sua conta salário eram para seu sustento. Não paga os 120 mil reais a que foi condenado por difamação de uma procuradora de Justiça. Pelo resto ainda nem foi julgado.
Tem toda razão o advogado Flávio Crocce Caetano que defendeu Erundina: "Ela não fez chicana. Fez o que a Justiça pediu e a execução foi rápida. No Brasil, se a pessoa age com má-fé, se se esquiva de oficiais, não declara bens para a penhora, nunca é punido
Resumindo: a diferença fica com Luíza Erundina, a trivialidade nacional com Paulo Maluf.

Bartolomeu de Gusmão

Se não leio ontem em O Sul a reportagem de Felipe Caruso sobre os 200 anos da experiência do padre brasileiro Bartolomeu de Gusmão, a data me teria passado despercebida. Mas também passou despercebida ao autor da reportagem a real importância do evento que estava muito além da invenção do balão de São João e que "havia algo mais leve que o ar" (sic).
A demonstração do Padre Bartolomeu de Gusmão é um momento decisivo da história da aviação. É, ao que se tem notícia, a primeira demonstração de que se poderia navegar no ar, era a fronteira entre o sonho de Ícaro e a realidade de Santos Dumont: "(...) um instrumento para andar pelo ar da mesma sorte que pela terra e pelo mar, capaz de vencer duzentas léguas e meia por dia, o que poderia ser muito importante para os exércitos" – palavras textuais quando solicitou a D. João V permissão para demonstrá-lo na corte em Lisboa.
Concedida a licença, o padre Gusmão trouxe um pequeno balão de papel, como os de São João, que se elevou quase à altura do teto e foi derrubado pela criadagem porque flutuou em direção do cortinado, ameaçando incendiá-lo. Bastou para que considerassem a demonstração um fiasco e o padre caísse no ridículo, ganhando o apelido de Passarola.
Muitos anos depois, quando a tecnologia do voo tornou-se disponível, a história foi reescrita para absolver os patetas que não tinham percebido aquele primeiro passo a caminho do céu. Transformaram uma caricatura da época – um pássaro gigante com passageiros no bucho – em projeto batizado convenientemente de "Passarola", atribuindo tudo ao padre Bartolomeu de Gusmão, para esconder a perfídia com ele praticada.