quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

A consagração do lema - Jayme Copstein

Já que o nosso hino é uma lema – “Sirvam nossas façanhas de modelo a toda terra” – já que uma das nossas mais excelsas virtudes dos gaúchos é a modéstia e, com toda a certeza, nosso pior defeito não é a megalomania, que não seja ao mundo, mas ao menos ao Brasil sirvamos de modelo: vamos resolver logo este caso das acusações do PSOL à governadora Yeda Crusius.

Pão, pão, queijo, queijo. O PSOL apresenta as provas, como cabe a quem argui, ou diz nas mãos de quem seus próceres as viram, para que sejam exigidas. Da maneira como as coisas foram postas, a única certeza é que há um crime, ou de calúnia e difamação ou de corrupção. Seja qual for a hipótese, impõe-se a punição
.
É a nossa oportunidade histórica para nossas façanhas servirem de modelo. Já que o mundo parece por demais ocupado com outros assuntos, só o Brasil já basta para a nossa consagração.

Nostalgias - Jayme Copstein

Os jornais noticiam, com alguma precipitação, o fim da dentadura postiça com a descoberta de um gene que controla a produção do esmalte dentário. Não duvido, como também não faço pouco de algum poeta, comovido com a extinção da espécie, decidido a escrever uma ode à dentadura da vovó.

Não pensem que estou ironizando. Até o digo com o máximo respeito. Sou do tempo em que todas as vovós era acrobatas com suas dentaduras, jogando-as no ar e as apanhando na boca com precisão milimétrica. Com um pouco de imaginação e de sonoplastia, poder-se-ia ouvir até o “clic” do encaixe.

Já era um progresso, apesar do sorriso alaranjado, quando não vermelho-pimenta. Feitas de vulcanite, o mesmo material dos pneus, era tingido com um corante que relutava em não ser rosa como as gengivas, talvez por homofobia.

Antes disso, rezam crônicas coloniais, havia um escravo-artesão, cujo nome não lembro, oferecendo aos domingos, na porta da igreja, dentaduras esculpidas em osso. As pessoas as experimentavam ali mesmo, até encontrar uma que melhor se adaptasse ao seu sorriso.

Ditos e achados

“Transporte o protecionismo para outro campo e verá como se torna clara a demonstração. Suponha dois médicos numa cidade pequena, um bom, outro mau. O bom, visto que cura os doentes, atrai enorme clientela. O mau vê-se às moscas. Mas intervém o protecionismo. Uma lei municipal põe guardas à porta do bom médico e cobra uma taxa feroz de cada cliente que o procure. Os ricos se arrumarão. Pagarão a taxa e terão boa assistência. Os pobres – e eles constituem os 99% da cidade – não podendo pagar a taxa, recorrem ao mau médico. Este prospera, está claro, enriquece – mas lucrou com isso a comunidade? Cresceu o índice da saúde geral?”

Monteiro Lobato, sobre liberdade de marcado e protecionismo, em “Mr. Slang e o Brasil”, 1927.

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

O “outro” - Jayme Copstein

Jarbas Vasconcellos e Pedro Simon não têm razão sobre a corrupção que assola o país ser apanágio do “outro” PMDB. Ou o “PMBD” simplesmente, porque já é o “outro” para o PT, calado porque dele precisa para sustentar-se no poder e garantir sua própria impunidade, ou o PMDB “lá de cima”, como dizemos no Sul, para esconder nossas próprias mazelas.

Pois é o PSBD “cá de baixo”, mais precisamente o de Canoas, que inutiliza o “eu e o outro” dos dois senadores. Em 2005, para beneficiar o então prefeito Marcos Ronchetti, os tucanos aprovaram na Câmara Municipal a incorporação de metade da remuneração de prefeito ou de vice-prefeito ao salário do servidor municipal que se elegesse para um desses cargos.

Ronchetti, médico da Prefeitura de Canoas, apesar do rastro de controvérsias que deixou atrás de si, ao terminar o mandato, vai abiscoitar pensão vitalícia de 8.900 reais, se a Justiça não acatar a ação direta de inconstitucionalidade levantada pelo atual prefeito Jairo Jorge. Que, aliás, há poucos dias queria em sua administração César Busatto, consumado mestre da arte de fazer política, como diz o vice-governador do Estado, Paulo Feijó.

Poupemos os adjetivos. Quando a imoralidade foi aprovada em Canoas,, atentando contra a Constituição, Ronchetti não era o “outro”. Agora, ele é.

Profissões originais

Eis uma profissão assaz original: organizador de camarote de cervejaria no sambódromo do Rio de Janeiro. Bebendo e aprendendo: é o encarregado de povoar aqueles recintos com celebridades convidadas a peso de ouro.

Este ano as verbas encolheram e o sambódromo só se povoou de boatos: Fulano tinha recebido tanto, veio, mas não apareceu, beltrano não recebeu o “outro tanto”, não veio e, lógico, não tinha como aparecer.

Na confusão, estrelas caboclas brigando com repórteres abelhudos, criançada acordada fora de hora e boiando em um oceano publicitário de bebidas alcoólicas, o desabafo do organizador de camarote: "Se o Carnaval do Rio não for suficiente para atrair alguém, eu paro tudo e vou fazer futebol”.
Faz sentido...

O guru da fronteira

O Ivo tornou-se mito na fronteira do Rio Grande do Sul, mais precisamente em Uruguaiana, pela fama do seu cabaré e também pela sua sabedoria pitoresca. Não o conheci pessoalmente, só através de racontos dos meus queridos irmãos, jornalistas Danilo Ucha e Kenny Braga, nascidos, criados e vividos nas vizinhanças, mais precisamente Santana do Livramento.

Pois se diz que Ivo, diante de uma dessas profecias apocalípticas frequentes nos jornais, respondeu ao lhe perguntarem o que faria se o mundo terminasse: “Pegava as minhas ‘gurias’ e ia para Libres”.

Para quem não sabe, Libres é do outro lado da fronteira com a Argentina, basta atravessar a rua para chegar-se até lá. Tudo isso me veio à cabeça diante da advertência de uma devota de horóscopos, no sambódromo do Rio de Janeiro, já sentindo as primeiras penúrias da crise financeira, alertando a cidade e o mundo de que estamos na Era do Aquário, um momento decisivo para a humanidade.

“Ou transformamos nosso ‘modus vivendis’, ou tudo será exterminado”, profetizou.

Ou então vamos para Libres, queridinha – como diria o Ivo, se vivo ainda fosse.

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

E daí? - Jayme Copstein

A Câmara Federal acaba de aprovar mais uma ridicularia, a proibição do “trote violento ou vexatório” nas universidades brasileiras. Tanto um quanto o outro já são proibidos pela legislação penal, dentro ou fora das universidades.

E daí?

Como todo o universo das infrações, da mais leve à mais grave, estão também sob a proteção da única lei realmente abrangente e vigente Brasil, a da mais absoluta impunidade.

É mais papel, é mais palavrório, é mais desfaçatez para esconder a realidade dos grandes gatunos e até assassinos, aboletados nas tetas do poder e fora do alcance da lei.

Já não se dão sequer ao trabalho de simular desaforos, quando acusados frontalmente, como aconteceu recentemente, ao serem desmascarados pelo senador Jarbas Vasconcellos. A rotina são essas inutilidades atrás das quais se acobertam, desviando a atenção para outros alvos.

Alguém da imprensa deplorou uma falha da nova “legislação”: obriga os reitores das universidades abrir inquéritos – os “rigorosos”, que todos conhecemos – e punir os responsáveis, sem prever punição para que os que deixarem de fazê-lo.

Ora, a omissão desses reitores em comunicar a ocorrência às autoridades policiais – porque caso de Polícia é – já significa acobertamento, cumplicidade e obstrução da Justiça em qualquer país civilizado. Não era nisso, porém, que os deputados estavam pensando, quando duplicaram tanto a proibição como a impunidade.

Desenvolvimento indígena

Um intelectual engajado em causas politicamente corretas acaba de se surpreender com a inédita descoberta de que indígenas não tem em seu idioma nativo a palavra “desenvolvimento”.

Como teriam, se o que entendemos por desenvolvimento, organização da atividade econômica, crescimento, é passo adiante que os haveria de tirar idade da pedra onde esses povos são mantidos, como espécimes vivos de um museu antropológico por religiosos e ingênuos, ou como massa de manobra pelo velho imperialismo.

Que se dê uma faca a um índio para ver se ele ainda há de querer cortar qualquer coisa com os dentes. Ou uma enxada – nunca mais ele irá usar as mãos na escavação da terra. Eles acabarão incorporando em seu idioma o vocábulo “desenvolvimento” tal como é dito na língua de quem lhe transferiu a tecnologia.

Não há nenhum crime em transmitir conhecimento a esses povos. Além de fortalecê-los para que se defendam de seus exploradores, em nada impede que preservem sua cultura.

Há exemplos de sobra em cada recanto do mundo. Os ciganos nem ao trocarem suas carroças por caminhões, deixaram de ser ciganos. Budistas e judeus cultuam suas respectivas religiões como já o faziam há mais de dois mil anos. Os muezins já não sobem mais ao topo dos minaretes para proclamar a grandeza de Alá – o microfone e a amplificação poupam-lhes a garganta e a escalada.

Nem por isso deixaram de ser ciganos, budistas judeus ou islâmicos.

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Carnaval e trabalho - Jayme Copstein

Quando o Estado Novo, a ditadura de Getúlio Vargas (1937 a 1945), achou de moralizar o país, decidiu começar pelo Carnaval. Não pela informalidade da festa, mas pelas letras das suas canções que em sua maior parte só falavam de samba, mulher e cachaça. Nada criticável, não passava de versão cabocla do “Vinho, mulheres e canções” de Johann Strauss com melodia e ritmo nativos:

“Eta, moleque bamba, / pega a cabrocha, / pisca o olho / e cai no samba. (Samba de Lamartine Babo)”

Mas assim não entendeu o DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda). Proibiu aos compositores a palavra “malandragem” e ordenou a glorificação do trabalho. A ordem foi obedecida com malandragem pelos compositores Haroldo Lobo e Milton Oliveira, na marcha “Passarinho do Relógio”;

“O passarinhoi do relógio está maluco. / Ainda não pé hora do batente / Ele fica impertinente / Acordando toda a gente”.

Quando o cerco apertou, os primeiros sinais de submissão ao DIP apareceram em “Sete Horas da Manhã”, samba de Cyro de Souza (1942). Mesmo glorificando o trabalho e bajulando a chefia, como desejava a ditadura, a letra registrou o eterno drama do operário que vive nos subúrbios do Rio de Janeiro:

“Quatro horas da manhã / eu já estou de pé. / Enquanto eu lavo o rosto, / ela faz o meu café, / embrulha meu almoço. /Que me visto e vou andar. / Pego o trem da Leopoldina / e vou trabalhar. / Sete horas da manhã entro na repartição, / cumprimento meu chefe / e vou marcar meu cartão.”

Anos mais tarde, em 1953, Luiz Antônio e Brasinha aproveitaram o mesmo tema em “Zé Marmita”, retratando o trabalhador que sai de casa de madrugada, com a comida requentada em uma marmita e sofre no trem superlotado que o leva ao trabalho:

“Quatro horas da manhã, / sai de casa o Zé Marmita./ Pendurado na porta do trem, / Zé Marmita vai e vem.”

Mesmo quando as letras eram bem comportadas,satisfazenbdo o gosto dos censores, o povo das rua corrigia a submissão.

“Bonde de São Januário (1941) dizia: “Quem trabalha / é que tem razão / Eu digo e não tenho medo de errar, / O bonde de São Januário / leva mais um operário, / sou eu que vou trabalhar”.

São Januário é o bairro onde o Vasco tem seu estádio. Nas ruas o povo cantou:

“O bonde de São Januário/ leva mais um otário / pra ver o Vasco apanhar”.

Quando a ditadura Vargas caiu, a resposta ao bom-mocismo imposto pelo DIP não se fez esperar. Apareceu em 1946, em um samba DCE autoria desconhecida, sucesso do carnaval daquele anos, com o título de “Trabalhar, eu não”.

A letra, entretanto, não ressuscitava a malandragem proibida pelo DIP. Pelo contrário, retratava a inconformidade e o desânimo do trabalhador anônimo diante da perversa divisão de renda no país:

“Eu trabalho como um louco / até fiz calo na mão. / O meu patrão ficou rico / e eu pobre sem tostão. / Foi por isso que agora / eu mudei de opinião:/ “Trabalhar, eu não, eu não.”

domingo, 22 de fevereiro de 2009

O xixi do causídico - Jayme Copstein

Faz muito tempo que não assisto, nem mesmo pela tevê, a coisas de Carnaval. Perdi o interesse depois que a alegria do povo foi expelida das ruas, e o próprio viu-se confinado às arquibancadas, para assistir e aplaudir a espetáculo bem comportado.

Serei apenas um saudosista, ruminando o “no meu tempo” como as velhas beatas que mastigam rezas menos para salvar suas próprias almas, mais para condenar a dos pecadores às chamas de Belzebu, ou alguma coisa se perdeu pelo caminho?

Não atribuam, porém, a responsabilidade ao pessoal das escolas de samba. Foram coagidos a um Carnaval sério, sisudo, cheio de regras, porque não há como enfrentar a concorrência da folia cotidiana neste país tropical abençoado por Deus.

Eu poderia citar muitos exemplos, mas me restrinjo a apenas um caso em que o xixi de um bacharel foi parar no Supremo Tribunal Federal. Tem advogado que faz pior nos autos e não acontece nada. O ilustre causídico foi condenado em primeira instância, por ter se “defendido” em um muro, durante desfile carnavalesco, na cidade de Diamantina, Minas Gerais.

Com toda a certeza o transcendental processo atravessou a segunda instância, o Superior Tribunal de Justiça e foi parar na Corte Suprema porque o ilustre causídico defende a revolucionária, alternativa e progressista tese de que é seu direito constitucional fantasiar-se de chafariz.

Só faltou quem pedisse uma análise clínica para saber se o ilustre causídico estava ou não grávido, pois todos sabemos da relevância deste dado para instruir o libelo e a defesa. Há notícias de um prêmio da Rainha Vitória para o primeiro “homem-homem” que engravidar e sempre há possibilidade, mais uma vez, de a Europa curvar-se ante o Brasil, como dizia em outros carnavais o palhaço negro Eduardo das Neves, para festejar Santos Dumont.

Não sei como o caso andou. Suspeito que ainda repouse placidamente em alguma gaveta, na boa companhia das traças de Brasília.Decisão de tal importância não poder ser tomada de afogadilho, sem uma profunda e demorada reflexão, concordem comigo.

Ditos e achados

“Sem internet seríamos mais pobres. Ponto. O problema não é a tecnologia, e sim o uso que se faz dela. Excelente, mas convém não esquecer as bobagens que ela produz.” Chris Andersen, na revista “Wired”, em artigo transcrito pela mais recente edição da Revista da Semana.

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Um triângulo nada amoroso - Jayme Copstein

A denúncia sobre suposta participação da governadora Yeda Crusius nos comes-e-bebes do DETRAN tem todas as características de um drama passional. Difere porque os personagens quebram a rotina e protagonizam um triângulo nada amoroso: a governadora fecha a primeira metade de seu mandato com o inédito déficit zero e é candidata forte à reeleição, o PSOL necessita de exposição pública para ampliar seu reduzido espaço na política riograndense, e o vice Paulo Feijó, empenha-se desde o primeiro dia do governo em derrubar Yeda.

Os protagonistas encontram-se agora como aqueles antigos gregos, cujo general mandou queimar os navios para que não pensassem em fugir na batalha contra os persas. Não há recuo possível.

Como de quem alega é o ônus da prova, cabe ao PSOL e também a Paulo Feijó (a fonte da informação, segundo Luciana Genro) exibir as provas da denúncia, para que a Justiça possa agir com rapidez em relação à governadora. Ou então arcarem com as consequências que não serão menores das que sofreria Yeda, caso fosse provada a sua responsabilidade.

Todavia, são discutíveis os dividendos políticos da permanente disposição de denunciar. Ao longo dos anos, jamais vi chegar ao poder quem apenas denunciasse antagonistas.

O eleitor parece perceber que essas pessoas dizem contra o que elas são, mas não a favor de que elas lutam. O exemplo mais recente é o de Luiz Inácio Lula da Silva, o furibundo ex-inquisidor da política brasileira, transmudado em Lulinha Paz e Amor, aliado aos que antes denunciava como os corruptos da pior espécie.

O “cumpanheiro” Zé Sarney que o diga...

O tamanho do vexame

Encaminha-se para um final melancólico o episódio envolvendo uma advogada brasileira em Zurich. Já admitiu às autoridades suíças ter inventado a história e agora encaminha alguma “coitadice” para escapar da acusação de ter premeditado um golpe, de olho na aprazível indenização da legislação suíça a quem sofrer atentados em lugares públicos.

Apenas um comentário para mostrar o tamanho do vexame das autoridades brasileiras, chamando o embaixador suíço para lhe pedir explicações sobre mera ocorrência policial, independentemente de que fosse farsa ou não.

Já pensaram em nossos embaixadores, chamados para dar explicações aos ministros de Relações Exteriores dos países desses turistas que há três dias são assaltados em albergues do Rio de Janeiro?

Fernando Gabeira, ontem, em artigo na Folha de São Paulo, comentando a precipitação com que o incidente foi tratado – não só pelo governo e pelos políticos, de maneira geral, mas também pelas imprensa cunhou uma frase que deveria ser incorporada definitivamente a todos os manuais do bom jornalismo:

“(...) problema da pressa é anexar os fatos à nossa visão de mundo, como se estivéssemos sempre procurando algo para comprovar uma teoria.”

Jornalista tem que contar o que vê, não o sente ou o que acha a respeito do que vê.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Os gladiadores das urnas - Jayme Copstein

Ministros do Superior Tribunal Eleitoral andaram batendo boca por divergirem sobre o que fazer, após cassarem o governador da Paraíba, Cássio Cunha Lima.

O relator Arnado Versiani queria, como manda a Constituição, fosse o resto do mandato preenchido por eleição indireta, através da Assembléia Legislativa.

Dele discordaram Joaquim Barbosa e Eros Grau, o primeiro por achar o voto “absurdo”, o segundo, por “afronta à Constituição” (?!?), o que na elevada linguagem do “pretório excelso” deve equivaler ao “feiosa” e “exibida” das antigas menininhas (até elas já se modernizaram), quando brigavam e punham a língua umas às outras.

Os ministros do STE andam realmente de mau humor. Não percebem que deviam cair na gargalhada por estarem julgando, já na metade final do mandato, se a eleição de um governador valeu ou não valeu. Por isso discutem se o substituto é o candidato que obteve o segundo lugar ou alguém a ser escolhido em eleição indireta.

Tanto faz como tanto fez. Nossa legislação eleitoral é tão cheia de requififes, que parece ter sido feita por um bêbado. Afora essa, que o derrotado em um pleito pode ser o vencedor, permite que parlamentares se elejam mesmo sem ter nenhum voto – basta estar registrado como candidato na lista partidária.

Como pretender mais? Em um país onde os “cidadãos” exigem mais favores que ética e decência de seus políticos, a regra transforma as eleições em arena romana. Nela só sobrevivem os gladiadores mais demagógicos, os mais inescrupulosos e os mais acomodatícios, e não necessariamente nesta ordem porque, ao mais das vezes, temos é uma mistura liquidificada dessas elevadas virtudes.

O TSE não se livra de mandar reempossar o governador cassado se o Supremo Tribunal Federal acolher o recurso que ele está impetrando. Haverá um segundo problema: para assumir o governo, o perdedor declarado vencedor, renunciou ao mandato no Senado, ocupado agora por um suplente que não obteve nenhum voto e naturalmente vai também entrar com seus recursos para manter-se na cadeira.

Ainda bem que é carnaval e a eleição de Rei Momo é coisa séria. Ou será que....

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

A guerra dos tremoços - Jayme Copstein

Em 19 de fevereiro, sempre estou de aniversário. Não por mim, que sou de janeiro, mas pela cidade do Rio Grande, RS, nascida neste dia como uma Jerusalém bem-amada - a minha mão direita há de secar (e a esquerda também) bem antes que eu consiga esquecê-la.

Pode parecer curioso, mas evocações cívico-municipais, como seria adequado a uma efeméride que se preze de sê-lo, não as tenho. Acho que era a época, o tipo de ensino que nos davam na escola. Sabíamos mais das andanças de Amundsen no Pólo Sul que sobre a própria cidade em que vivíamos.

Eu, pessoalmente, tinha noções muito vagas do desembarque de Silva Pais naquelas costas, para fundar o presídio de Jesus-Maria-José. Vinham de um historiador local, não mais que diletante bem-intencionado, que me contava das lutas titânicas dos portugueses contra os espanhóis pela posse de nossas areias.

Isso me intrigava. A cidade era praticamente habitada por portugueses, mas a todos eu reunia e condensava no Manoel dos Burros, símbolo que não sei se ainda vale hoje em dia, do bem sucedido homem de negócios. Depois de anos como carroceiro – daí o nome que ostentava como brasão – prosperou com uma bodega onde vendia tremoços em gamelas para acompanhamento do vinho tinto em copos.

De espanhóis, só conhecia, assim mesmo de vista, o Fuentefria, que tinha loja de guarda-chuvas na rua Uruguaiana, mais tarde promovida a avenida e rebatizada como Silva Pais em homenagem à data. Esse Fuentefria viveu e envelheceu como um homem bem posto, cidadão honorável e exemplar chefe de família, deixando descendência da qual já não tenho mais notícias. Mas, naqueles dias de infância, ele me confundia, não por lhe adivinhar mistérios terrificantes mas porque o chamavam de guarda-soleiro (naquele tempo guarda-chuvas era também guarda-sol), eu entendia guarda-soleira e não conseguia ver nenhuma relação entre guarda-chuvas e as soleiras das portas.

Se os adultos diziam que era assim, era porque era assim. As orelhas ressabiadas recomendavam prudência. Se diziam que portugueses e espanhóis – para mim, o Manoel dos Burros e o Fuentefria – tinham brigado um dia, era porque tinham brigado. Ficava engraçado imaginar o Fuentefria, escorado atrás de um guarda-chuvas, resistindo à artilharia de tremoços do Manoel dos Burros, mas o feriado provava esta guerra original.

Foi ao sabor dessa história que nasceu meu inconformismo. Portugueses e espanhóis brigavam em Rio Grande – me contou o historiador diletante – mas não era por Rio Grande, era pelo Rio da Prata, que não era de prata mas era de água.

Ora, se o Manoel dos Burros e o Fuentefria fizeram mesmo a tal Guerra dos Tremoços, sei lá por quê, que pelo menos a tivessem feito de março a novembro, para dar feriado na época das aulas. Em fevereiro, era tempo de férias. Grandes paspalhões! De que adiantava feriado em tempo de férias?...

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

O guizo da cascavel - Jayme Copstein

O que vai acontecer ao mandato do senador Jarbas Vasconcellos, depois da sua entrevista à Veja desta semana, é uma incógnita. Ele mostrou ao Brasil a cara que o Brasil tem, refletida no espelho chamado Congresso Nacional. Ou acaso alguém acha que aqueles senadores e deputados são ETs caídos de Marte, com ética e costumes absolutamente alienígenas?

O que torna ainda mais indecifrável a resposta é o silêncio de José Sarney e Renan Calheiros – havia o anúncio de entrevista coletiva de Roseana Sarney no correr do dia de ontem para defender papai – mas as coisas não ficarão por aí.

Entre os hábitos dos coronelões do Norte e do Nordeste, dos quais Sarney e Calheiros são versões apenas atualizadas, quando o antagonista não respondesse de pronto a afronta, estava o de não sair de casa, à noite, para matar alguma cascavel que subitamente tilintasse o guizo no fundo do quintal. Era, na certa, tiro nas costas, desferido por um jagunço acoitado.

Já não se fazem essas coisas hoje – pelo menos daquela maneira – mas Jarbas Vasconcellos não perde por esperar. Desde quando neste país, a honestidade e a coragem de dizer a verdade ficaram impunes?

Ditos e achados - Jayme Copstein

“Enquanto os tucanos se debatem sobre o processo de escolha do seu candidato à Presidência em 2010, a ordem unida do PT bate continência à ministra Dilma Rousseff, sob o olhar vigilante do comandante Lula. A campanha petista já começou. (...) Será que o tucanato consegue enxergar o desfile eleitoreiro do PT? A resposta é sim. Ocorre que essas aves de coloração preta, vermelha, laranja, amarela e verde, com sua plumagem dorsal negra, carregam uma síndrome: a da exuberância ostensiva, pouco comum às outras famílias. Raros e exóticos, consideram-se superiores às demais aves. Cada qual quer aparecer mais alto nas copas das árvores. Fernando Henrique, o mais proeminente dos tucanos, acaba de alertar: Luiz Inácio, presidente da República é cabo eleitoral de Dilma, botou a campanha na rua. Parece até que os tucanos, além do bico grande e oco, também são surdos.”

Transcritode artigo dop jornalista Gaudêncio Torquato em O Estado de São Paulo.

O vexame - Jayme Copstein

Não há como escapar do vexame, tanto o governo brasileiro, que desceu da sua dignidade para se envolver em mero episódio policial, como os opinadores de plantão, agora tentando justificar excessos verbais com a verossimilhança de uma versão. Se o que se crê pudesse ser tomado por verdadeiro, ainda estaríamos queimando bruxas como na Idade Média.

Com a confissão do pai da suposta vítima dos “skinheads” suíços, de que não saberia sequer onde encontrar provas da gravidez da filha – ele antes vociferava indignação pelos netos perdidos – o caso se encaminha para o arquivo inaugurado com a Escola de Base de São Paulo e engordado com toda a espécie de “achismos”.

Não se pode, contudo, deixar sem registro o pior momento de toda a sua história tanto da diplomacia com da imprensa brasileira. Alguém até pode defender as bondades do governo brasileiro com a “cumpanheirada” aboletada no poder por países afinados no cantochão ideológico.

Mas, pedir ao embaixador de um país, qualquer país, explicações sobre mera ocorrência policial, não passa de demagogia barata e ignorância das coisas mais comezinhas da diplomacia.

Ou acaso embaixadores brasileiros foram convocados pelos governos respectivos, quando turistas americanos, italianos, franceses, japoneses, portugueses e espanhóis foram assaltados e até assassinados no Rio de Janeiro?

Já a imprensa brasileira parece ter perdido o discernimento para separar interpretação dos fatos do que um ou outro pensem a respeito.
Reinaldo Azevedo, em artigo recente na revista Veja (11 de fevereiro) definiu com precisão:

“‘Relatar a versão de todas as partes envolvidas e o leitor que tire as suas conclusões’. É o jornalismo entendido como uma vitrine de divergências para satisfação do voyeurismo ideológico. Entre os produtos expostos, deveria estar também o elogio ao terror, já que há consumidores que o desejam.”

E também o incitamento das massas, acrescente-se.

Os rumos de uma notícia - Jayme Copstein

Tomar novos rumos o caso da brasileira que teria sofrido sevícias de “skinheads” em Zurique, Suíça, e em consequência abortado gravidez de gêmeos. O exame médico-legal revelou que o aborto não existiu porque a moça não estava grávida, levantando a suspeita de os ferimentos terem origem em automutilação.

A imprensa deu destaque ao caso. Não podia ser de outra maneira. Brasileiros são maltratados até por autoridades na Europa e dificuldades decorrentes da atual crise acentuaram a xenofobia por todo o Velho Continente. Há precedentes de ataques dos skinheads – não muitos, reconheça-se, na Suíça em particular.

Enfim, cenário, havia. Inaceitáveis, porém, foram comentários furibundos de determinados opinadores que acabam funcionando como incitamento à violência. Como não há abundância de suíços pelas ruas brasileiras, sofrem o telefone público e o torcedor do clube adversário.

Não é este o papel da imprensa nem o de quem nela exerça papel. Não se sabe ainda o desfecho do caso, mas os jornais não terá por que pedir desculpas pelas notícias publicadas. Desde que façam as possíveis retificações com o mesmo destaque, ou seja, guardando proporcionalidade.

A semântica de Zé Sarney - Jayme Copstein

Não se discutirá se o erudito Zé Sarney, apóstolo do despreendimento, que renunciou ao grande prazer de presidir a Academia Brasileira de Letras para submeter-se ao sacrifício enfadonho de idem o Senado da República, seja poderoso o suficiente para mudar a semântica.

Ele está zangado pela divulgação de conspirata sua e de seu filho Fernando para usar as empresas de comunicação da família contra adversários políticos no Maranhão e decretou: “(...) se nós estivéssemos num regime de absoluta democracia, isso não existiria (a publicação do grampo telefônico que o flagrou combinando a ação com o filho)”.

Só o indesmentido gênio de Zé Sarney é que poderia colar o absoluto ao conceito de democracia. Como todos estamos cansados de saber, já era de pleno uso para distinguir mulheres meio grávidas das absolutamente grávidas, ou aquele preto bem preto do preto mais clarinho.

É mais um item que ele acrescenta à sua já larga de serviços prestados à Nação, onde constam o boi no pasto e os maribondos de fogo, apenas para citar os mais populares.

A lição de Gandhi - Jayme Copstein

O país inteiro, de Norte a Sul, espuma de indignação diante das cenas de violência protagonizadas por jovens universitários paulistas contra seus colegas recém admitidos na instituição.

Mas o país apenas espuma e nada faz. Daqui a alguns dias, os jornais, as emissoras de rádio e as de tevê falarão de outra coisa, e no ano que vem, sem nenhuma inovação, o incidente se repetirá, com as mesmas manchetes dos jornais, o delegado de Polícia dando lições gratuitas de direito penal e prometendo de tantos a tantos anos de cadeia, reitores tirando o corpo fora, alegando que a universidade não encoraja vandalismos e sadismos, pais contratando bons advogados para livrar a cara de seus pimpolhos, e tudo fica por isso mesmo, à espera da reprise.

Qual a novidade do ácido jogado na menina grávida ou no “bixo” da Veterinária? Em 2003, no interior do Rio Grande do Sul, universitários pararam um ônibus e derramaram um líquido corrosivo sobre três calouras que tentavam escapar da selvageria. Há vários crimes aí, da perturbação da ordem a lesões corporais com todos os agravantes previstos pelo Código Penal, a começar pela premeditação.

Aconteceu alguma coisa aos agressores?

Se aconteceu ninguém ficou sabendo.

E aquele estudante de medicina, afogado em uma piscina? E aquele outro, colocado de olhos vendados ao lado dos trilhos do trem, que morreu de susto? É toda uma fieira de histórias macabras com a marca comum da impunidade.

As pessoas perguntam: o que está acontecendo com esses jovens? Resposta: o mesmo que está ocorrendo com toda a nossa sociedade.Já corrompida, não mais orienta seus jovens “para ser”, mas apenas “para ter”. Porque nesta sociedade pervertida, ter significa poder e é isso o que importa.

A partir daí, a escola antes e a Universidade, depois, não conseguem mais disciplinar seus alunos, porque impor a esses príncipes herdeiros normas de convivência e deveres de solidariedade na vida em comum significa castrar o poder que suas famílias ostentam na sociedade.

Na verdade, os veteranos que agrediram seus colegas calouros apenas exerceram o poder que lhes dá um discutível status de veterania. E exercendo o poder discricionário, tão somente seguiram o padrão de comportamento de adultos com os quais convivem. O ingresso na Universidade apenas confirma na prática o aforismo de Gandhi, o líder espiritual indiano: o conhecimento sem ética é um mal muito poderoso.

O devoto - Jayme Copstein

Tenho a impressão que o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, é um devoto consumado. Todas as manhãs, ao acordar, indaga em tom de oração: que posso fazer pelos meus semelhantes?

Digo isso porque, ao saber da “bolsa-geladeira”, por ele proposta desde que assumiu a Pasta, lembra sua iniciativa, ao tempo da Fernando Henrique Cardoso presidente, de ressuscitar as apólices emitidas por Campos Sales em 1904, corrigindo o valor original de 50 mil-réis para 323 mil reais.

Na ocasião, quando ainda era do PFL, e o PFL ainda não era DEM, Lobão se disse condoído com as atribulações de três velhinhas mineiras que apareceram em seu gabinete no Senado, carregando uma papelada debaixo do braço.

Como o bom devoto faz o bem sem saber a quem, ele sequer perguntou o nome das velhinhas, mesmo porque seria em vão. Todos sabemos que, jovens ou velhos, homens, mulheres ou gays, os mineiros agem sempre em silêncio.

A caridade de Lobão frustrou-se porque em 1956, ainda ao tempo de Juscelino presidente, o Tesouro já resgatara 98% das apólices de 1904, trocando-os por outros títulos. Os dois por cento restantes tiveram prazo para resgate em 1967, após o qual perderam a validade.

Agora, ao que tudo indica, a bolsa-geladeira do ministro, criada para substituir a geladeira velhas dos pobres, terá mais chances de sucesso por seus apelos politicamente corretos. Inicialmente Lobão queria acabar com o desperdício de energia dessas geladeiras velhas.

Depois, porém, de outro gesto caridoso, concordando em pagar à Bolívia pelo gás que não necessitamos e não consumimos, a preços impostos pelo companheiro Evo Morales, focou a argumentação na ecologia: as geladeiras dos pobres brasileiros são responsáveis pela poluição do meio ambiente e – pé lícito concluir – pelo aquecimento global, o buraco de ozônio, o derretimento da calota polar.

Não se espantem nem se deprimam se acabarem descobrindo que também foram responsáveis pelo Dilúvio da Bíblia e pela erupção do Vesúvio que soterrou Pompéia. Importantes são a devoção e a caridade.

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Das idéias e dos metais - Jayme Copstein

Idéias não são metais que se fundem. Érico Veríssimo detestava a frase de Silveira Martins, com toda a razão: a única utilidade dos metais é a sua fusibilidade. Sem ela não serviriam de nada. Seriam meros seixos a ornamentar jardins ou a arrombar vidraças, dependendo do uso ou destinação que se quisesse dar.

O dr. Anis Kurban remete mensagem sobre o conceito de “desproporção”, expressado por este colunista na semana passada: “Permita que me reporte a Vossa Senhoria para lembrar-vos que as vossas opiniões externadas sobre a "manipulação" das baixas dos palestinos em Gaza são muito semelhantes as dos revisionistas e até negacionistas do Holocausto (eles também alegam montagem fotográfica e aumento no número de vítimas, os famosos cabalísticos 6 milhões!).”

O colunista poderia dizer, mas não o faz, que dr. Kurban parece decepcionado porque a granada do morteiro não caiu na escola da ONU e não fez o número de vítimas que as primeiras notícias noticiaram com grande destaque. Seria uma opinião, tal como o dr. Kurban faz quando põe dois adjetivos qualificativos – “famosos cabalísticos” – ao se referir aos números do Holocausto.

Ele está equivocado porque o colunista não opinou sobre o número das vítimas do suposto bombardeio da escola. Neste particular, limitou-se a divulgar o desmentido do coordenador de ajuda humanitária da ONU, Maxwell Gaylord, de que a escola não fora atingida.

O colunista opinou, isto sim, sobre a diferença entre as manchetes da primeira notícia e a discrição do desmentido. Há poucos dias, houve jornais – não todos – que publicaram a retificação de Gaylord em páginas internas. A televisão simplesmente o omitiu. Salvo melhor juízo, configura-se aí absoluta desproporcionalidade.

Em que o colunista não vê nenhum sentido é trazer o conflito para o Brasil, onde todos nós, imigrantes e descendentes de imigrantes árabes e judeus, vivemos em paz. Ninguém se iluda com a exaltação de certas solidariedades que põem a Sinagoga em primeiro lugar na alça de mira. Há lugar reservado, também, para a Mesquita e para a Igreja. A ordem com que são dispostas nesse “paredón” depende dos interesses eventuais de quem hoje incendeia o Oriente Médio.

Isso também é uma opinião. Espero que o dr. Anis Kurban, a cuja mensagem agradeço, dela compartilhe.

No país da impunidade

Batem boca a presidência do DEM e o deputado Edmar Moreira, cuja expulsão do partido eram favas contadas no dia de ontem. Velho conhecido da opinião pública desde o mensalão (foi absolvido, como todos os outros, exceção de Jefferson e José Dirceu), Moreira apega-se ao conceito de “discriminação pessoal”, e muda de partido para preservar a cadeira na Câmara Federal.

Sua expulsão justificada por conduta desabonatória – sonegação de imposto de renda, apropriação das contribuições de seus empregados à Previdência Social – devolveria o mandato ao DEM. Mas Edmar Moreira não sofrerá nenhuma sanção até esgotar os 65 recursos que tem à sua disposição para provar a influência da camisa listrada nas auroras boreais.

Não fosse este o país da impunidade, já estaria correndo processo de cassação deste deputado, em nome da moralidade para cujo zelo, com tal currículo, a própria Câmara o elegeu corregedor.

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

A ressaca - Jayme Copstein

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva houve por bem lembrar ao “companheiro Obama” – ninguém sabia que ele havia assinado ficha no PT – que a crise começou lá nos Estados Unidos e nós é que vamos pagar o pato. Lula já havia advertido ao “Bush” – não há como ser íntimos dos grandes – que ele desse conta da crise que ele criou lá país dele e deixasse a gente sem medo de ser feliz.

É um raciocínio interessante, porém de difícil entendimento. Se a prosperidade brasileira dos últimos oito anos foi afetada diretamente pela crise dos subprimes norte-americanos, isso só significa uma coisa: que era conseqüência daquela suposta prosperidade , tal como a nossa crise, agora, é conseqüência da crise deles.

Este colunista não está dizendo nenhuma novidade e até repete .de alguma maneira, o que já escrevera no tempos das vacas gordas: que o bom senso recomendava poupança. O governo preferia a gastança.

Talvez tivesse sido mais eficaz exemplificar com metáforas a que o Presidente está acostumado a lidar, tanto assim que as usa costumeiramente em seus discursos. Pensemos em um bar que apanhasse uma leva de torcedores eufóricos, na saída do estádio, para festejar, o supercampeonato do time. Em vez de guardar a “féria” extra para manter o bar nos dias sem futebol e sem vitórias do time, o dono entrou na farra com torcedores e bebeu “todas” com eles.

Agora, de ressaca, ele se queixa: – Se “eles” não tivessem vindo beber no meu bar, eu teria resistido à tentação.

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

O sentido das palavras - Jayme Copstein

Ontem, nos Guerrilheiros da Notícia, o programa diário de Flávio Alcaraz Gomes na TV Pampa, um telespectador queixou-se da resposta “destemperada” do jornalista Antônio Carlos Baldi à sua afirmação de que Israel deveria ser banido do Oriente Médio. O telespectador exigia o cumprimento das resoluções da ONU, na melhor das hipóteses sem saber do que tratam, isso para não lhe atribuir a prática da meia verdade para dar consistência às suas acusações.

Se a primeira das resoluções referidas pelo telespectador é a partilha da região em dois Estados, um judaico, outro arábico, quem não reconhece sua legitimidade não tem como exigir o cumprimento das demais resoluções, votadas como conseqüência da primeira e sem revogá-la.

Dentro deste contexto, Antônio Carlos Baldi disse que a exigência era uma tolice. O telespectador reagiu com veemência, porém com a intenção clara de desviar o foco do essencial. Ao alegar desproporção da resposta do jornalista, não vai mais discutir os fatos, mas a “truculência” do antagonista.

Nestes últimos dias, tenho pensado bastante sobre o sentido desta palavra “desproporção”, subitamente trazida para cena por militantes políticos dentro da mesma tática de tirar de foco o essencial. O Hamas bombardeava Israel apenas com foguetes “caseiros” – modelo fabricado pela indústria bélica soviética nos anos 70 – os israelenses “massacravam inocentes em uma escola da ONU em Gaza”, conforme as manchetes da imprensa mundial.

A conta era terrível – 43 mortos, dezenas e dezenas de feridos. O próprio secretário-geral da ONU, Ban Ki-Moon perfilhou a versão de que as tropas israelenses haviam sido avisadas sobre a escola ter se transformado em refúgio de civis, e denunciou Israel por crimes de guerra.

Pois no início desta semana, o jornal “The Globe and Mail”, do Canadá, publicou com destaque declarações de Maxwell Gaylord, coordenador de ajuda humanitária da ONU com sede em Jerusalém, admitindo que o bombardeio havia ocorrido em ruas próximas da escola, mas ela não havia sido atingida e nenhum dos alunos ou civis nela refugiados haviam sequer sido feridos.

Um professor, entrevistado por “The Globe and Mail” disse que três alunos mortos nos bombardeios, tinham saído da escola e estavam na rua, mas que não pôde esclarecer a questão porque alguém da ONU lhe recomendara que não falasse à imprensa.

Esta matéria foi publicada na segunda-feira e foi repercutida pelo jornal israelense na terça-feira. Tenho procurado em todos os jornais brasileiros, não vi até ontem uma linha a respeito. Não ouvi uma frase no rádio ou na tevê.

Comparo o ruído daquelas manchetes, contra as quais não protestei, com o silêncio deste desmentido, que não exijo, apenas comparo, repito. Confesso-me absolutamente incapaz de reconhecer qualquer significado na palavra desproporção. Assalta-me a dúvida, também, se devo mudar o sentido que atribuía a palavras como honestidade, decência e dignidade.

A cassação do “H” - Jayme Copstein

O jornalista Sérgio Reis, sugere acréscimos à afirmação ( em “Imagina, Cara!”, coluna de ontem) de que o regime militar cassou Cândido Norberto para impedir a eleição de Ruy Cirne Lima ao Governo do Estado: “Cândido foi cassado para que ‘fosse eleito’ governador o Peracchi Barcelos”.

Sérgio tem razão no acréscimo porque delimita a fronteira em que o Movimento de 1964 – um contragolpe, como defendeu o historiador Hélio Silva – evoluiu para uma reles ditadura.

Ninguém podia levantar nada contra a integridade e a capacidade de Cirne Lima, jurista, professor universitário, escritor e jornalista, mas o regime mudara e impusera regras eleitorais estritas, para poder “nomear” a seu bel-prazer os governadores estaduais. No Rio Grande do Sul, o quinhão estava destinado a Walter Peracchi Barcellos, coronel da Brigada Militar, homem da “Revolução”.

Com toda a certeza, Cirne Lima seria o vencedor, não só com os votos da oposição, maioria na Assembléia, mas também com os de vários deputados governistas. Era uma questão de currículos e Peracchi não desfrutava de simpatia nem mesmo entre seus correligionários, o que, aliás, lhe valera fragorosa derrota para Leonel Brizola, disputando a mesma governança, alguns anos antes.

A cassação de Cândido e de outros deputados permitiu a Peracchi Barcellos governar o Rio Grande do Sul, mas castrou a política brasileira. Mem de Sá, então ministro da Justiça, outra grande figura da vida pública, deixou o governo em protesto. Raul Pilla renunciou ao mandato de deputado federal com memorável discurso de despedida da vida pública que deveria ser oferecido aos jovens em nossas escolas como uma cartilha de altivez e coragem.

A mesma altivez e a mesma coragem faltaram ao parlamento brasileiro e a toda a oposição para se autodissolver e retirar a legitimidade ao regime. Teria sido bem mais eficaz para derrubá-lo que fazer correr o sangue generoso da juventude, com o único objetivo de substituir uma ditadura por outra.

O Brasil nunca mais foi o mesmo depois daquele dia. Os grandes personagens, que faziam a História do país com H maiúsculo, saíram de cena, abrindo-se espaço para a fauna de aventureiros, oportunistas e aproveitadores, sobre os quais é escusado qualquer comentário porque é de todos conhecida.

Não terá sido este o maior crime que se cometeu contra a nacionalidade?

Imagina, Cara! - Jayme Copstein

No início dos anos 50, quando faleceu Antônio Amabile, o Piratini, Cândido Norberto prestou-lhe comovedora despedida. Substituiu “Pensando em voz alta”, seu contundente comentário diário na Rádio Gaúcha, por um amoroso recado ao amigo, contando “o boato que corria pela cidade”.

“Imagina, ‘Gringo’” – começava o Cândido – disseram que tu morreste”... E descreveu os funerais, com os discursos, as lágrimas da família, dos amigos, e contou da solitária rosa, depositada por uma velhinha da Casa do Artista Rio-Grandense, fundada por Piratini. E concluiu: “Imagina, Gringo, disseram que tu morreste, mas eles não sabem que pessoas como tu não morrem jamais. Vivem para sempre no coração da gente”.

Já naquela época, com muito futuro ainda a percorrer – não completara sequer os 30 anos de idade – Cândido já inscrevera o nome na história do rádio do Rio Grande do Sul, pelo pioneirismo, tanto o jornalístico do “Pensando em voz alta” como por introduzir na Rádio Gaúcha a primeira equipe de redatores profissionais para escrever a programação e a publicidade.

As agências de publicidade e os cursos de comunicação social decretaram a obsolescência daqueles “produtores”, como eram chamados, mas a visão de que o veículo necessitava de aprimoramento intelectual para cumprir o seu papel tem sua assinatura na primeira página.

Logo em seguida, Cândido ingressou na política, e de novo pôs a sua marca, na defesa da cidadania, levando para o mandato de deputado estadual a inteligência contundente, a sinceridade de seus propósitos e uma agilidade mental que jamais se viu em outro político gaúcho. Incontáveis e notáveis os seus apartes nos desmascaramento de hipocrisias, como foi por ocasião do assassinato de quatro manifestantes comunistas, em manifestação de 1º de Maio, na cidade do Rio Grande.

"A Polícia, em legítima defesa, atirou para o ar”– defendia o líder do governo na Assembléia. “Neste momento quatro trabalhadores passaram voando...”, atalhou Cândido, fazendo o líder calar e sentar, após resmungos ininteligíveis.

A trajetória política de Cândido interrompeu-se três mandatos depois, quando o regime de 1964 evoluiu para uma reles ditadura, através de golpes sucessivos, e era preciso cassar deputados para impedir a eleição de Ruy Cirne Lima ao Governo do Estado.

Ainda que isso o tivesse afetado pela impossibilidade de reagir, voltou ao rádio com o mesmo desassombro e de novo deixou a sua marca, criando “Sala de Redação”, a semente do radiojornalismo de qualidade que o Rio Grande do Sul ostenta atualmente.

Por essa época,um assaltante que lhe apontou o revólver, quando parou no sinal em uma esquina da Avenida Ipiranga, deu-lhe o melhor atestado de probidade e honradez que alguém possa obter. Ao reconhecer Cândido, fez um gesto ao comparsa, do outro lado do carro, e disse: “Para tudo! Este é cidadão!” E foram embora os dois

Todas essas coisas, por mim sabidas e testemunhadas – fui seu amigo, o primeiro redator daquela equipe de produtores e emissário de Alberto André para lhe levar a solidariedade da Associação Riograndense de Imprensa quando foi cassado – , passaram-me pela cabeça quando li ontem de manhã, a notícia do seu falecimento. E não acreditei.

Imagina, Cândido. Disseram que tu morreste, mas eles não sabem que pessoas como tu não morrem jamais. Vivem para sempre no coração da gente.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

O dono da bola - Jayme Copstein

O militante da esquerda fundamentalista, Emir Sader, confessou-se decepcionado com o resultado do Fórum Social Mundial, recém terminado no Pará:

“Onde estão as massas nas ruas, mobilizadas pelas ONGs?” – perguntou para expressar seu desencanto.

No mesmo lugar em que estavam quando ele anunciou, em 2005, a excomunhão de Porto Alegre da congregação do politicamente correto, porque os eleitores livremente tinham elegido um prefeito de outras convicções ideológicas, não afinadas com as do sr. Emir Sader.

Desde a primeira realização em 2001, a cidade abrira os braços amorosamente aos participantes do Fórum, imaginado pelo empresário Oded Grajew, empresário bem-sucedido, sensível às carências da vida e aos descompassos do mundo, como alternativa a Davos. “Objetivo – palavras textuais de Grajew – “criar uma nova cultura política quem não seja a antiga, na qual um punhado de pessoas dirige os rumos e determina os conteúdos da ação política”.

Devia ser assim, mas como todas as coisas bem-sucedidas na vida acabam tendo uma enxurrada de pais, Emir Sader dele se adonou e já durante a campanha eleitoral que antecedeu a escolha de José Fogaça para a Prefeitura, ameaçava retirá-lo de Porto Alegre se o eleitor não reconduzisse mais uma vez o candidato petista ao governo municipal. Ou seja, “um punhado de pessoas dirigindo os rumos e mais que conteúdos da ação política, determinando a vontade do eleitor.

Não vou afirmar que eleitor porto-alegrense seja birrento e por isso desafiou Emir Sader. Mais provável é ter percebido que, ao contrário do apregoado pelo Partido dos Trabalhadores e por facções de esquerda, o Fórum não era uma conquista da cidade e da cidadania. Não passava de mero espetáculo ideológico, algo como uma espécie de rodeio de vaqueiros, de propriedade de um grupo identificado mais por sua idiossincrasias do que por suas coerências, só emprestado aos amigos do peito e aos correligionários.

Não fosse assim, Emir Sader não se atreveria a ameaçar o eleitor porto-alegrense. O fato é que, saindo de Porto Alegre, o Fórum Social Mundial nunca mais foi o mesmo. Andou de Seca a Meca, dividido e subdividido por dezenas de sedes e até serviu de palanque para o demagogo Hugo Chaves.

No ano passado, não pôde ser realizado por falta de recursos e este de Belém – palavras do próprio Sader – foi decepcionante.

No contraponto, Porto Alegre reelegeu o prefeito José Fogaça e vai muito bem obrigado. Não serei descortês a ponto de dizer que ninguém sentiu a falta do Fórum Social Mundial. A cidade se propõe a abrigá-lo de novo, sem pedir atestado de ideologia, como o fazem as reles ditaduras.

Professor Enro Loll e a nova ortografia - Jayme Copstein

Quatro professores de Direito Constitucional – Angola, Brasil, Guiné-Bissau e Portugal, respectivamente, em ordem alfabética para não ferir suscetibilidades – publicaram artigo na Folha de São Paulo, revelando virtudes insuspeitadas na recente reforma ortográfica da língua portuguesa.

Segundo os mestres, Camões, Machado e Luandino estão imunes à nova ortografia, mas as Constituições, não – terão de ser "’recompostas’ em nova ortografia portuguesa, adaptando-se às normas legais que, em cada país, incorporaram o acordo comum”.

Enfim, a luz no fim do túnel – e nós, há séculos, sem perceber algo tão simples como resolver todos os problemas constitucionais fazendo reformas ortográficas.

Os mestres descobriram algum mau comportamento do Padre Vieira, Alexandre Herculano, Castilhos, Camilo Castello Branco para excluí-los do rol dos intocáveis, mas foram peremptórios: “(...) a supremacia da Constituição, ‘cantada em verso e prosa’, se curvará às determinações de uma lei quanto à sua própria grafia”.

Perguntado a respeito, o professor Enro Loll, reconhecida autoridade mundial em questões lingüístico-constitucionais, opinou que se trata de uma questão de “assentos”.

– Não serão “acentos?” – perguntou-se ao professor.

– Não – retrucou o professor Enro Loll – É assento mesmo, de acordo com o vínculo por mim descoberto entre o fundilho das cuecas e o cós das calças,