quinta-feira, 29 de julho de 2010

Fim de uma história – Jayme Copstein

O calendário histórico assinala como efeméride na data de amanhã, 31 de julho, a volta de Pedro Álvares Cabral a Lisboa em 1501, encerrando a viagem que resultou no Descobrimento do Brasil. Se a partida do Tejo, em 8 de março do ano anterior fora majestosa, com o próprio Rei D. Manuel indo entregar a Cabral a bandeira de Cristo, o regresso da expedição foi sombrio.

Festa, nenhuma. Glórias, muito menos. Pelo contrário, Pedro Álvares Cabral foi relegado ao ostracismo, perdendo, inclusive, o comando de nova expedição projetada para 1502 e que de fato partiu, mas com Vasco da Gama.

Nenhuma explicação clara pôde ser oferecida, até o presente, para a mudança de atitude da Coroa Portuguesa em relação ao Descobridor que lhe tinha acrescentado tanto território. As versões são muitas, indo desde a recusa do próprio Cabral em aceitar um comando cuja autoridade seria dividida com outros capitães, até a ingratidão de D. Manuel.

A versão mais provável, mas pela qual os historiadores não mostram apego, é apenas sugerida por Jaime Cortesão, ao atribuir a Cabral "prudência chegando ao extremo limite que ultrapassado se torna em cobardia". É referência ao fato de que "tendo as naus quase de todo carregadas, evite o combate com as naus do Samorim", e indica que o Descobridor do Brasil descumpriu a finalidade principal da expedição. Em vez de demonstrar a força que asseguraria o monopólio comercial em Callecute, nas Índias, criou problemas que só seriam resolvidos mais tarde por Duarte Pacheco. Para que a bravura dos portugueses não pudesse perdoar a falta, a "prudência" deveria estar muito bem caracterizada.

Que existiu motivo justo para a destituição, pode ser deduzido da carta que Afonso Albuquerque, tio da esposa de Cabral, endereçou a D. Manuel em dezembro de 1514.
O documento está incompleto em virtude de se acharem alguns trechos apagados pelo tempo, mas no que restou, pode-se ler:

"(...) como obra de minha obrigação que neste caso tenho a minha irmã e aos meus sobrinhos e a meus parentes; e por isso hei por pedir Pedro Álvares meu cunhado casado com minha sobrinha... eu fui o que concertei e ordenei este casamento... era mui bom fidalgo e merecedor disto... e acredito que Vossa Alteza tinha de sua pessoa o contentamento dos seus serviços e de sua bondade... agora Senhor vejo esta quebra sua ante Vossa Alteza durar muitos dias em tempo que Vossa Alteza se serve geralmente dos cavaleiros e fidalgos do vosso Reino... os quais recebem mercês e rendas... segundo cada um faz e merece... Assim o tendes lançado de vosso serviço e quanto a mim mais parece que a culpa deste feito era sua... hei de crer que ele tem certo o perdão e galardão de Vossa Alteza como vimos por experiência em outras pessoas serem lhe seus erros perdoados... eu Senhor vos beijarei as mãos por ele ser chamado de Vossa Alteza aconselhado e repreendido e tornado em vossa graça e serviço...".

Por que haveria Afonso de Albuquerque dizer que lhe parecia culpa de Cabral o "ter sido "lançado" do serviço do rei". E por que haveria de pedir perdão para ele, de pedir para que fosse chamado, repreendido e aconselhado e, depois disso tomado novamente a serviço?

Se El-Rei respondeu, não se sabe. Mas que não atendeu, isso é certo. Cabral ainda continuaria vivo por mais três anos, sem que nenhum outro encargo lhe fosse confiado.

Um comentário:

  1. Que muvuca, hein ! Além de tudo, só eles queriam ser prolixos. A fala daquela época, comparada à linguagem de hoje parece até um dialeto. Curioso ! O Jayme mergulhou fundo na História ...

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