Sou do tempo em que 19 de abril era feriado nacional porque o ditador do Estado Novo, Getúlio Vargas, estava de aniversário. Adolf Hitler, o ditador nazista soprava as velinhas do seu bolo no dia seguinte, 20 de abril. A coincidência era contada de boca a ouvido, entre risadas, com grandes cuidados para ver se não tinha polícia por perto.
Naquele tempo, Getúlio não era chamado ditador, porque também dava cadeia. Era o chefe da Nação. Seu retrato estava em toda a parte, nas repartições públicas e nos estabelecimentos comerciais. O Departamento de Correios e Telégrafos reduzia as tarifas para telegramas de quem desejasse felicitá-lo.
O tom de opereta retratava o provincianismo do qual Getúlio, homem do campo, jamais conseguiu se desvencilhar. Contrastava com as profundas mudanças por ele instituídas desde 1930, para modernizar um Brasil arraigado a estruturas pouco mais do que medievais, herdadas dos tempos coloniais.
Foi quando a legislação trabalhista tornou efetivo o dia de oito horas de trabalho, que só existia no papel, e colocou o brasileiro sob a proteção da previdência social, até então pouco abrangente. Foi quando teve início a democratização do ensino e a inclusão de crianças e gestantes em inéditos programas de medicina preventiva.
Essas mudanças, nas quais se deve incluir, também, o início da industrialização do país, lhe conferem mérito de estadista. Algumas delas, porém, acabaram traçando uma fronteira a separar interesses atendidos e interesses contrariados. A paixão do confronto impede até hoje uma visão clara do período histórico e contribui para o que se possa pensar em enigmas: Qual a ideologia de Getúlio?
O próprio Getúlio costumava comentar que as oligarquias brasileiras não percebiam que ele as salvara do comunismo. A extrema esquerda, até seu suicídio, exigia-lhe a cabeça. Foi só depois da morte que passou a ostentar seu cadáver como bandeira de nacionalismo.