segunda-feira, 17 de abril de 2006

Um dia depois do outro - Jayme Copstein

Quem vocês acham que poderia ter dito:
“Como ser humano, tenho pena. Uma pessoa que teve a oportunidade de fazer alguma coisa de bem para o Brasil, com o respaldo da grande maioria do povo brasileiro, ao invés de construir um governo construiu uma quadrilha como ele construiu, me dá pena.”
Não se apressem na resposta porque, no Brasil, é preciso saber quando foi dito, para saber-se quem disse. Pode ser qualquer um. É a eterna mesmice da política brasileira.
As declarações são de Luiz Inácio Lula da Silva, em entrevista concedida em 1992, há 14 anos, ao jornalista Milton Neves, hoje atuando na TV Record, respondendo sobre o impeachment de Fernando Collor de Mello. Está reproduzida integralmente na página eletrônica do radialista Mução (http://www.mucao.com.br), âncora de um programa muito popular no Nordeste.
Seguindo com o barco, a Bíblia, no Eclesiastes, tem uma frase lapidar: “Geração vai, geração vem, mas a terra permanece para sempre”. O que talvez devesse ser adaptado assim para a nossa realidade: “Geração vai, geração vem, o Brasil continua o mesmo”.
Como se faz no bom jornalismo, ao reproduzir a entrevista de Lula, Mução convocou Fernando Collor de Mello para que fazer a contraparte. Perguntado se sentia pena de Lula, Collor devolveu:
“Acredito que não seja o caso de pena. A entrevista do Lula foi concedida logo depois do meu afastamento da presidência da República, cargo para o qual fui conduzido por 35 milhões de pessoas e que um magote de deputados safados me tiraram de lá. Entre esses deputados estavam José Genoíno, José Dirceu, estavam auxiliando esse processo o Duda Mendonça, o Paulo Okamoto, esse Jorge Mattoso, enfim todos esses que estão enterrados até o pescoço no maior assalto já visto nesta Nação. Luiz Inácio Lula da Silva prova do seu próprio veneno. Tudo o que disse de mim, ele e os seus asseclas, mostrando hoje que é ele que está praticando.”
Já que hoje estamos bíblicos, com o gosto amargo da impunidade na boca, vale encerrar este comentário com mais uma citação tirada do Eclesiastes: “Que proveito tem o homem de todo o seu trabalho, com que se afadiga debaixo do sol?”
Aparentemente, nenhum. Em um país onde Collor e Lula são o alfa e ômega, o princípio e o fim, a conclusão é melancólica: assim como era no princípio será agora e por todos os séculos dos séculos, se o eleitor continuar dizendo amém à demagogia.