Eu era guri quando li nos jornais, pela primeira vez, sobre o golpe do bilhete premiado. Quase 70 anos passados, não me admiro que ainda haja gente, e muita gente, caindo no logro porque o vigarista e o otário são os espécimes mais antigos da estirpe humana. Pensei nisso ao ler que o e-mail de um consultor da Nasa se congestionou com mensagens de pessoas afligidas pelo boato de que o mundo vai acabar em 2012, quando o planeta Nibiru chocar-se com a Terra.
O mito nasceu do fato de serem conhecidos, no calendário maia, apenas cálculos astronômicos até 2012, sugerindo aos espíritos mais crédulos profecias de apocalipse. David Morrison, cientista da NASA, comenta que o fato de a "folhinha" que ganhamos de presente todos os anos terminar em 31 de dezembro, não significa o fim do mundo, mas apenas que necessitamos de uma nova "folhinha". A irrelev|ância, porém, tem sido aproveitada por escritores de ficção científica de qualidade duvidosa, destacando-se entre eles Zacharias Sitchin, inventor do tal planeta no romance "The Twelfth Planet" ("O 12º Planeta"), de cuja existência alegava ter encontrado provas em documentos sumérios.
Escrita em 1976, quando andou em voga esta subliteratura, estilo "Eram os deuses astronautas", a história incluía visitas de Ets à Terra e traçava órbita de 3.600 anos em redor do Sol para o planeta, identificado depois como "X" ou Nibiru, por uma senhora que alegava ter comunicação com alienígenas, mas que errou feio na data do Apocalipse. Ela previu o choque para 2003. Como nada aconteceu, a grande catástrofe foi convenientemente adiada para 2012.
Não vai acontecer nada em 2012 por mil razões, como na velha anedota. A primeira é que o planeta Nibiru não existe. As demais razões não Têm a menor impoirtância. Mas de novo me remeto à infância, quando morei alguns meses na casa de meu tio Maurício em Santa Maria, naquele tempo, Santa Maria da Boca do Monte. Surgido ninguém sabe como, um boato de que o mundo ia acabar em um dia próximos, o qual dia já não consigo lembrar porque naquela idade não cuidava de pormenores. A cidade ferveu de medo e todos os devotos se apressar em comprar velas benzidas pelos dois párocos locais, para alumiar as trevas finais.
Até aí tudo bem porque a resignação é a virtude dos crentes, mas em outro de repente, novo boato: só valiam as velas sacramentadas por um dos párocos que era santo, o outro, não. Como ninguém dizia qual era e qual não era, estourou a polêmica, com o rebanho dividido: dois bandos em mútua demonização, um terceiro, o da Irmandade da Eterna Prudência, comprando mais velas para fazê-las benzer também pelo "outro" pároco.
O que estava por trás disso não tenho como saber. Quase setenta anos é tempo demais até para formular hipóteses. Fosse, porém, historiador em Santa Maria, eu haveria de pesquisar entre os fabricantes de velas da época, para saber qual deles era o profeta mais bem dotado. Os dois padres nada cobravam pela bênção.