quinta-feira, 16 de março de 2006

Sob os nossos narizes - Jayme Copstein

Se há algo trágico e estarrecedor no noticiário dos jornais, é a imagem de crianças, vítimas do desvario dos adultos. Em sua edição de hoje, a Folha de São Paulo estampa na primeira página a foto da Agência France Press, mostrando corpos infantis, embrulhados em cobertores como se fossem trouxas de roupa suja, cuja morte é atribuída ao ataque do exército americano na cidade de Ishaqui, para prender colaborador estrangeiro da Al Qaeda.
Contestando a informação do prefeito sunita, de que tenha havido 11 mortos, dos quais cinco eram crianças, fontes do exército americano disseram que os mortos foram apenas quatro, dos quais só um era criança. Como se fizesse diferença.
O que realmente faz diferença é como essas tragédias são noticiadas, sem ênfase para as crianças mortas em atentados terroristas, seja no próprio Iraque ou em qualquer outro lugar do mundo. O exemplo mais gritante é o do menino-bomba de três anos de idade, explodido por controle remoto em lancheria de Tel-Aviv, onde um adolescente israelense festejava seu 13º aniversário.
Também aqui no Brasil, há poucos dias, as cinco crianças, uma das quais morreu, foram internadas com desidratação grave porque o MST impediu seus pais de abandonar a invadida Fazenda Coqueiros para procurar socorro médico. A imagem dessas crianças não foi para o noticiário internacional nem a agência francesa se preocupou muito em obter fotos para documentar a tragédia.
Quando a suposta sacralidade da causa substitui a solidariedade humana, mais do que voltar à selva, estamos na vizinhança do caos. É bom que as pessoas prestem atenção. Está debaixo dos nossos próprios narizes.

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