domingo, 13 de setembro de 2009

Maracutaias de A a Z

Há um conto de Arthur Azevedo sobre uma donzela (naquele tempo elas se chamavam assim) para a qual nenhum candidato a marido servia. Como o tempo fosse passando e os maritáveis escasseando, para não se tornar solteirona (era o estágio seguinte do donzelato e alternativo ao de freira), aceitou casar com honrado comerciante de secos e molhados (o pitecantropo erectus dos supermercados de hoje).

Pois dito e feito. No dia seguinte ao himeneu (=casamento. Permitam: o conto é antigo) a respeitável senhora achou de tirar o atrasado e começou a colecionar amantes, arquivando os respectivos nomes por ordem alfabética. Começou pelo Amâncio, apesar de lhe lembrar de longe o marido, passou por Berilo, preferiu César a Cornélio para não esquecer definitivamente o marido, e teve alguma dificuldade para encontrar um Querubim devasso, mas quem procura sempre acha.

Quando a mulher concluiu sua alfabetização com um certo Zenóbio, o marido houve por bem (como diziam os jornais do século 19) dar um tiro na cabeça, para fugir ao ridículo. Deixou um bilhete lacônico: "Antes de casar, ninguém lhe servia. Depois, não há quem não lhe sirva".

Lembrei-me do conto, aqui reproduzido de memória, quando o PT, casado com a Presidência da República, começou a colecionar aliados cujos nomes, se não correspondiam às letras do alfabeto, compensavam portando todos os artigos e parágrafos do Código Penal. Pensei que o "zenóbio" da coleção tivesse chegado com as dadivosas biografias atribuídas por Luiz Inácio Lula da Silva a Zé Sarney, Renan Calheiros e Collor de Mello. Eram apenas o "x" da questão. A última letra do alfabeto veio mesmo com este espaventoso convite da deputada petista Stela Farias, presidente da suposta CPI do Detran, para ouvir Lair Ferst, réu principal do processo que corre na Justiça Federal.

Com toda a certeza é o Zenóbio da lista. O suicida tinha razão: "Antes de casar, ninguém lhe servia. Depois, não há quem não lhe sirva".    

A propósito

Lair Ferst, personagem e réu principal do escândalo do Detran responsabiliza quatro jornalistas – Fernando Albrecht, José Barrionuevo, Rogério Mendelski e Políbio Braga por seu infortúnio. Declarou ao Ministério Público – trechos liberados pela deputada Stela Farias, segundo Zero Hora – os "quatro jornalistas (...) eram veículos de plantar informações sempre com a característica bem clara de quem lia".

O trecho, tal como foi publicado, só permite certeza quanto ao assassinato da língua portuguesa. Contudo, é instigante. Se todos os jornais e todos os jornalistas citaram diretamente o nome de Lair Ferst na comandância do esquema, por que só os quatro jornalistas foram citados? Por que furaram todo o mundo, denunciando a roubalheira do Detran quando ainda era segredo de bastidores, bem antes de Yeda Crusius tornar-se governadora do Estado?

Ora, o Zenóbio...

Ditos e achados

"A Política é arte. E arte difícil que requer longo aprendizado além de alguma sensibilidade. Tomando um eminente militar que nunca fora político e entregando-lhe o poder unipessoal, praticamente absoluto, apesar da aparente manutenção do Congresso, condenou-o a praticar erros graves que, se não por patriotismo, pelo menos por habilidade, os políticos mais ordinários não perpetrariam. (...) Apesar da pouco estima que geralmente se lhes vota, por causa, principalmente do infeliz sistema de governo que não só não sabe formá-los, mas também os deseduca e perverte, os políticos são indispensáveis ao funcionamento do Estado democrático". Raul Pilla – Discurso de despedida da vida pública – 31 de agosto de 1966