segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Perdendo o latim – Jayme Copstein

Enfim, as luzes do conhecimento derramam-se copiosas sobre nós, ignaras criaturas brasílicas: o presidente do Supremo Tribunal Federal nos ensina que condenação não é motivo para o Senado recusar indicação de novo ministro da Corte. Como aconselha Eurípedes – "A sapiente viro sapientiam discere convenit" = convém aprender sabedoria com o homem sábio – aproveitemos a disposição do Meritíssimo para saber se alguém como Fernandinho Beira-Mar, caso se disponha a estudar Direito, em uma daquelas faculdades que aprovam crianças de oito anos em vestibulares, pode aspirar a tão elevada investidura.

Por favor, Sua Excelência não se zangue: atentos e devotados discípulos seus, tudo o que desejamos é varrer de nossos corações a ignorância e seus filhos diletos, o preconceito e o obscurantismo nesta época pra lá de politicamente correta. Porque, para o Zé da Silva, qualquer coisa é como coçar, basta começar – vai em português mesmo, pois se não se precisa saber "ingreis" para nada neste país, latim então nem se fala.

Imagine se o Fernandinho Beira-Mar começa a se coçar, onde é que isso vai parar? Nem de longe pode se comparar a gravidade dos seus crimes com o de advogados condenados por "jeitinhos" nas leis de licitação, mas está se perdendo de vista que o governador do Amapá, que contratou o escritório de João Antônio Toffoli, era João Capiberibe, cassado pelo STE sob acusação de corromper eleitores, pagando-lhes duas passagens de ônibus (R$ 52,00) para se eleger senador.

Claro, sempre se pode dizer, como o irrevogável Aloizio Mercadante, que um caso é um caso e outro caso é outro caso, ao menos até segunda ordem e ulterior deliberação. Contudo, por mais tênue que seja, há uma dedo mexendo na panela da vaca amarela: o de José Sarney, condestável também do Amapá, temeroso de ser ejetado do trono pela liderança de Capiberibe, antecipando o que faria com Jakson Lago no Maranhão. E como Toffoli no STF é invenção de Luiz Inácio Lula da Silva e Tarso Genro, sarneystas de carteirinha, o caso de Capiberibe é um, o de Toffoli é outro, o de Cesare Battisti é ainda outro, e não adianta apelar para Hamlet e os odores do reino da Dinamarca: o Senado vai aprová-lo sem tugir nem mugir.

Em um país onde Sarney é tão poderoso, Shakespeare não tem vez. O máximo que se consegue é perder o latim.

Ditos e achados

"Na sociedade civilizada, o mérito pessoal não lhe servirá tanto quanto o dinheiro. Faça a experiência: vá à rua e faça a uma pessoa uma conferência sobre moralidade, e a outra, dê uma moeda, e verá qual das duas o trata com mais respeito". Samuel Johnson.