segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Fim do mundo, segundo Nostradamus – Jayme Copstein

Fosse em outro tempo, quando ainda subsistia a rivalidade entre as cidades de Pelotas e Rio Grande, no Rio Grande do Sul, eu diria que é desfeita de "sebeiro" a tentativa de transformar um "papa-areia" como eu em especialista em fim-do-mundo. Os pelotenses daquela época nunca se conformaram com o fato de que habitávamos onde o mundo começa, mas é coisa do passado: dos leitores que me confrontam com as profecias de Nostradamus, o Grande Vivo, para me provar que estou errado e em sério risco diante da iminência da Catástrofe Derradeira – nenhum deles é Pelotas.

Que siga o barco, mas com prévio aviso: última vez. O assunto já está para lá de chato. Carlos Jorge me manda uma "centúria" de Nostradamus, profetizando que este velho mundo sem porteira exalará seu último suspiro, "Quando Jorge crucificar Deus,/ Marcos o ressuscitar / e São João o levar / o fim do mundo chegará."

Traduzindo: quando a Sexta-Feira da Paixão cair no dia de São Jorge (23 de abril), a Ressurreição de Jesus, a Páscoa Cristã, for comemorada no dia de São Marcos (25 de abril) e Corpus Christi celebrar-se no dia de São João (24 de junho), babaus, minha gente, lá se foi o que a Marta fiou, como se dizia bem antigamente, quando esses mitos nasceram.

Carlos Jorge conta que caprichou nos cálculos e constatou que vai acontecer em 2011, não em 2012, como andam espalhando por aí. Pena que ele também tenha se equivocado, pois a Páscoa do ano que vem não cai em 25 de abril, mas na véspera, 24. Logo, São Jorge fica absolvido da crucificação, São João vai chegar atrasado em um dia para o Corpus Christi e o mundo não vai terminar.

O equívoco de Carlos Jorge explica-se porque o cálculo do calendário eclesiástico do Cristianismo não é tão simples como alguns endereços da Internet querem fazer crer. Resultam incorreções como a afirmação de que o Domingo da Ressurreição pode cair entre 21 de março e 24 de abril. Sobra um dia na ponta menor, falta um dia na ponta maior: é entre 22 de março e 25 de abril. Ambas são raras. O próprio Nostradamus, em vida, só teve uma ocasião de presenciar a Páscoa cristã no dia 25 de abril – em 1546. É provável que tivesse em mente, quando começou a escrever as Centúrias em 1547 (só as publicou em 1555) que a coincidência só voltaria a se repetir em 1666, cuja combinação de algarismos sugere enigmas e assombrações.

A data se repetiu em 1745, 1886 e 1943. Provavelmente a origem do mito, inventado ou apenas aproveitado por Nostradamus, esteja no início tardio das comemorações de Corpus Christi. Definidas em 1264, pelo Papa Urbano IV, só depois do Concílio de Viena (1311) é que se universalizaram, A primeira coincidência – Ressurreição no dia de São Marcos, Corpus Christi no dia de São João – só aconteceu em 1451.

Como se vê, desde Nostradamus, o mundo teve cinco oportunidades de dizer "adeus, morro por falta do amor dos homens", mas não o fez. Se realmente pretender encerrar suas atividades, vai ter de esperar até 2038, quando de novo a Páscoa ocorrerá em 25 de abril.

Ditos e achados

Pérola colhida em prova de recente de vestibular a uma universidade federal: "A India por exemplo adoram vacas, as quais estão em grande número e acabam matando animais endemicos." Pois é. No Brasil é diferente: adoramos os jumentos que são animais epidêmicos.