O site eletrônico da revista Exame publica queixas dos barões da cana-de-açúcar. Eles atribuem à bagunça nacional os preços extorsivos impostos ao consumidor. O diretor de uma usina de São Paulo diz que os usineiros, os distribuidores e o governo precisam sentar para planejar em longo prazo e evitar a escassez da entressafra. Mas avisa: o preço não baixa de 90 centavos a um real por litro.
Ora quando se fala em bagunça nacional, os primeiros vilões a surgir no palco são os barões do álcool e do açúcar. Só nos últimos 30 anos, há toda uma história de escândalos, sonegação de impostos, fraudes, calotes, empréstimos subsidiados, trabalho escravo e agressões ao meio ambiente.
Desde a criação do Proálcool, na década de 1970, os assaltos dos barões sucroalcooleiros ao Banco do Brasil foram de tal ordem que, em 1995, a diretoria teve de esconder o respectivo calote para melhorar o balanço. Um dos casos mais rumorosos foi o pagamento pelo mesmo Banco do Brasil, em 1991, de US$ 86 milhões, como avalista da dívida contraída em 1985 pela Cooperativa Regional dos Produtores de Açúcar de Alagoas com um pool de bancos estrangeiros. No mesmo ano de 1991, o então governador alagoano Collor isentou os produtores do Norte e do Nordeste do pagamento do IPI, Foi também o único segmento privado contemplado com aumento de preço (46,7%).
Outro caso famoso foi a "Conexão Amazonas", envolvendo usineiros da Região Sudeste. Fiscais da Receita e a Polícia Federal descobriram que sonegavam impostos, ICMS e IPI, emitindo notas fiscais frias de venda de açúcar para empresas fantasmas instaladas na Zona Franca de Manaus, onde esses dois tributos não são cobrados.
O Rio Grande do Sul foi e continua sendo vítima dos barões alcooleiros. Eles moveram campanha insidiosa para proibir a adição de MTBE, produzido em Triunfo e que trazia aos cofres gaúchos mais de um milhão de reais por mês de ICMs. Ao ser obrigado a trocar por álcool, o Rio Grande do Sul não só deixou de arrecadar esse mais de um milhão de reais, mas ainda teve de desembolsar outros 15 milhões, também mensais, para pagar o ICMs de São Paulo, de onde o álcool é importado.
Não se apressem em apontar na cotação do álcool, bem no final do primeiro parágrafo ("preço não baixa de 90 centavos a um real por litro") ou uma ou outra inexatidão deste texto. Foi escrito em 10 de janeiro de 2006, quando, pela milésima vez, mais uma vez o preço do combustível tinha ido às alturas. Resumia, então, a vasta "folha corrida" do setor, a partir dos anos 1970. Fui buscá-lo nos arquivos, ao ler em O Sul que o governo pensa em importar álcool dos Estados Unidos, a 480 dólares o metro cúbico, porque desonrando mais uma vez seus compromissos com a Nação, os barões destinaram quase toda a cana para a produção de açúcar, fazendo o preço do nosso álcool subir para 790 dólares o metro cúbico, quase o dobro do produto norte-americano.
Em resumo: no Brasil, colunista só precisa de arquivo. A esterqueira não muda. Basta mudar o nome das moscas e, eventualmente, atualizar um número ou outro. Aliás, que belos tempos aqueles em que a um real o litro, o preço do álcool combustível parecia extorsão.