terça-feira, 1 de novembro de 2005

César e as aparências - Jayme Copstein

Foi só agora, com a decisão do ministro Eros Grau, favorecendo José Dirceu e soando como interferência indevida do Judiciário no Legislativo, que a Comissão de Ética da Câmara Federal achou por bem duvidar dos critérios de nomeação dos membros do Supremo Tribunal Federal.
Há muito tempo setores responsáveis da opinião pública, na qual se incluem magistrados federais, expressam insatisfação com a contaminação política da Corte Suprema, iniciada quando Francisco Resek renunciou à toga para ser ministro da Justiça de Collor, e foi renomeado, ao deixar a Pasta.
O critério de nomeação cria vínculos inadequados entre o Judiciário e eventuais ocupantes do Palácio do Planalto, que podem continuar a exercer influência muito tempo após ter concluído seu mandato.
O exame de duas situações presentes evidencia a impropriedade da situação. Enquanto o próprio José Dirceu consegue inéditos direitos de defesa, tal como assinalou seu correligionário Chico Alencar, o senador pelo Amapá, João Capiberibe, do Partido Socialista Brasileiro, está comendo o pão que o diabo amassou para preservar o mandato.
Em lugar de mensalões, cuecões, uísque escocês e charutos cubanos, pesa contra Capiberibe a acusação de compra de votos. A prova apresentada se resume à doação de 26 reais a dois eleitores, entre os milhares que elegem um senador.
O que se esconde por trás do suposto escândalo é a derrota que Capiberibe, tanto por sua popularidade como pelo cansaço do eleitor com antigas velhacarias, inflingiu ao candidato do todo poderoso cacique maranhense José Sarney.
O que é a “fortuna” de 52 reais – duas vezes 26 reais – tirados do próprio bolso para atender dois eleitores, comparada com a “ninharia” de milhares de reais caídos do céu em cima de uma mesa da empresa do genro de Sarney, favorecido, aliás, também por financiamentos da Sudam, aprovados pela esposa, Roseana Sarney?
Haverá alguma relação entre essas contradições? Provavelmente, não. Mas o desgastado dito – à mulher de César não basta ser honesta – mostra com clareza que o vínculo entre o Judiciário e eventuais ocupantes do Planalto é inadequado e constrangedor para um país que se pretenda civilizado.

Nenhum comentário:

Postar um comentário