A Varig agoniza em seu leito de morte como um ente querido. A família faz o que pode, gasta o que não tem, apela para o sobrenatural, mas sabe que tudo é em vão. Está em vésperas de completar 80 anos e é a única sobrevivente, em todo mundo, das empresas pioneiras que “em tempos heróicos, rasgaram o horizonte para traçar os caminhos do céu”.
É uma metáfora antiga, usada e abusada pela propaganda daquela época. Fosse mera questão de lirismo, a solução seria fácil. Bastaria convocar os poetas de plantão Em dois rabiscos, criariam figuras geniais para fazer os seus aviões “flutuarem no firmamento”. O problema, porém, é de DNA incompatível com a época em que vivemos, onde também não há mais lugar para o acendedor de lampiões ou o sineiro das igrejas.
Todas as empresas pioneiras de navegação aérea nasceram como estatais ou segundo um modelo que, no Brasil, previa subsídios por quilômetro voado para cobrir eventuais prejuízos. Entre as que se criaram no país, a Varig foi a única que se estruturou verdadeiramente como empresa.
Rubem Berta, dotado de excepcional visão para o futuro daquela atividade ainda no nascedouro, utilizou os subsídios em investimentos para desenvolver um padrão de qualidade que incluía pontualidade e segurança. Os aviões da Varig, a não ser que o tempo não permitisse, saíam sempre na hora certa. Era a companhia com o menor número de acidentes e incidentes em todo o mundo. Talvez pouca gente saiba hoje em dia, mas foi Berta quem criou a refeição aquecida nos vôos internacionais.
Nos anos 60, com o jato transformando a aviação em transporte de massas, o modelo de subsídios caducou. Todas as empresas estatais, em todo o mundo, acabaram privatizadas. No Brasil, a única que tinha condições de voar por suas próprias asas, era a Varig. Foi por isso que absorveu as demais companhias subsidiadas e não por favores do regime militar como quis fazer crer a maledicência dos perdedores.
Nesta ocasião, praticamente com o monopólio construído, Berta profetizou o que poderia acontecer se a Varig deixasse de ser uma empresa para se transformar em ação entre amigos. Ele a havia estruturado, também para preservá-la de aventureiros supervenientes ao mundo do capital, segundo o modelo social-democrata alemão, com os funcionários participando da gestão. O risco existia e ele advertiu: “A Varig só quebra se os seus funcionários assim o desejarem”.
O resto é da história recente e está nos jornais: excesso de gente, com “empregos” em vez de “trabalho”, manipulados por pequenos feudos, calcados no modelo sindical, que se preservavam com concessão de supostos privilégios aos liderados e impediam decisões empresariais, como racionalização das atividades, redução de pessoal e contenção de despesas.
É doloroso não só sepultar a história bonita da Varig pioneira, mas também presenciar o sofrimento e o desespero de uma multidão de funcionários devotados, engambelados por fictícias benemerências de quem os conduzia ao abismo.
É pena que não se tenha mais nada a fazer.
quinta-feira, 22 de junho de 2006
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