O que os eleitores brasileiros indignados ainda não perceberam é que o problema do país não está nos políticos corruptos que se elegem. É no sistema de voto proporcional que possibilita e facilita a eleição de qualquer cafajeste, desde que bem dotado para a demagogia.
O que é o voto proporcional? É uma lista de candidatos, organizada por um partido, na qual o eleitor indica apenas quem ele desejaria eleger. O número de votos obtidos por cada lista, que tem o nome de legenda, dá aquele partido certo número de cadeiras. Daí o nome de voto proporcional: o número de cadeiras conquistadas é proporcional à quantidade de votos alcançados.
O problema começa aí. Como o vota na lista, o eleitor não vota em ninguém. Apenas indica o candidato de sua preferência. O seu voto pode ser atribuído a qualquer nome daquela lista.
Tomemos como exemplo o Rio Grande do Sul, cujo quociente eleitoral – o número mínimo de votos para eleger um deputado federal – foi de 130 mil na última eleição. Se o eleitor votou em um candidato que fez 150 mil votos, a preferência dos 20 mil eleitores excedentes será atribuída a outro candidato no qual não tinham intenção de votar, ao mais das vezes um desconhecido, quando não um cafajeste em quem jamais votariam.
Foi o que aconteceu em São Paulo, na última eleição federal, quando Enéas Carneiro fez mais de 2 milhões de votos. Deu ao seu partido, o Prona, o direito de eleger seis deputados federais – ele e outros cinco. Os 2 milhões de eleitores queriam Enéas Carneiro. Bastavam 300 mil votos. Sobraram 1.700 mil votos, transferidos para candidatos que além de não ter mais do que 600 votos nem de São Paulo eram. Tinham fraudado o domicílio eleitoral.
Pior ainda o ridículo da situação criada: como o Prona só tinha registrado quatro candidatos além de Enéas Carneiro, não pôde aproveitar a sexta vaga. Digamos que tivesse registrado alguém, e esse alguém, desinteressado, não tivesse sequer votado em si mesmo. Eis um dogma a ser acrescentado aos muitos que fazem as delícias do Judiciário brasileiro: poderia considerar-se eleito quem não recebeu sequer um voto, mas estava legalmente registrado como candidato e, portanto, apto a ocupar a vaga conquistada?
Digamos que a situação seja oposta. O eleitor votou em um candidato que não fez votos suficientes para se eleger. O seu voto e o dos demais eleitores, que preferiam aquele candidato, acabaram mesmo despejados em outro, o mais das vezes, repita-se, um desconhecido, quando não um cafajeste em quem ele jamais votaria.
Cria-se, também, uma situação absurda. Como o sistema transfere os votos automaticamente de um candidato a outro, o eleitor não sabe em quem está votando. O pior: o eleito não sabe quem votou nele. Logo não tem compromissos com ninguém.
Pior ainda: o candidato não disputa a vaga com candidatos adversários, mas sim com os candidatos do mesmo partido. Os seus adversários são os seus próprios correligionários. Isso faz também com ele não crie raízes naquele partido. Afinal, os seus inimigos estão ali e não nos outros partidos. Daí a bacanal do mensalão. Não sabendo que o elegeu, tendo de sobreviver dentro do seu próprio partido, só tem compromissos consigo mesmo.
Portanto, o problema não está nos cafajestes que se elegem, mas no sistema pervertido que possibilita e facilita a eleição de qualquer de qualquer cafajeste.
Sem mudar este sistema, não tem túnel à vista, menos mais luz no seu fim. É puro abismo em que mergulha o país.
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Comentários:
1. Danilo (Porto Alegre, RS, Brasil): Qual sistema considera adequado, Jayme?
Blog do Jayme - Voto distrital puro. O tema será abordado a partir de segunda-feira, após a análise de um conto de vigário chamado "voto de lista".
2. Valdir A. von Mühlen (Porto Alegre, RS, Brasil) : Muito bom. O caminho é por aí.
3. Edson(São Paulo, SP, Brasil): Concordo que o voto proporcional está na raiz de nossas mazelas, mas não é votando dentro dele que esta situação vai mudar. É preciso uma reforma política profunda que não será feita pelos que se refestelam com o status quo, mas que deveria ser exigida pela sociedade civil nos quatro cantos do país.
Blog do Jayme - Tens razão em parte. Se não é votando dentro do voto proporcional, menos ainda não votando se consegue mudar alguma coisa. Que tal pesquisar a biografia dos candidatos, escolher e impor a condição do voto distrital ao escolhido? No mínimo abre o debate. E o que dizes de sairmos às ruas, para pedir uma nova Assembléia Nacional Constituinte EXCLUSIVA, eleita já pelo voto distrital. Deve encurtar caminho.
4. Alexandre Clos (Porto Alegre, RS, Brasil): Bastante esclarecedor. Merece atenção e análise por parte dos descontentes que ainda não sabem o rumo a tomar nas próximas eleições. Como seria possível adotar o voto distrital puro?
Blog do Jayme – É preciso criar uma forte corrente de opinião pública. Por favor, veja a resposta ao Edson, de São Paulo.
sexta-feira, 30 de junho de 2006
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Qual sistema você considera adequado, Jayme?
ResponderExcluirVoto distrital puro, Roman. Tema para a segunda-feira.
ResponderExcluirSr. Jayme,
ResponderExcluirNão somos ingênuos. Sabemos muito bem que precisamos de gente decente em todos os cargos eletivos. Mas, se os candidatos que se apresentam não têm essa qualidade, o que fazer?
Prefiro anular meu voto a legitimar alguém que não me representa de forma alguma.
Concordo que o voto proporcional está na raiz de nossas mazelas, mas não é votando dentro dele que esta situação vai mudar. É preciso uma reforma política profunda que não será feita pelos que se refestelam com o status quo, mas que deveria ser exigida pela sociedade civil nos quatro cantos do país.
Edson - SP
Sr. Jayme, bastante esclarecedor esse seu "post". Trata-se de assunto merecedor da maior atenção e análise por parte de todos que, descontentes com a atual conjuntura política do país, ainda não sabem que rumo tomar durante as próximas eleições, como eu...
ResponderExcluirDe que forma seria possível alterar a forma do voto para distrital puro? Parabéns e obrigado. Alexandre Clos - aborbac@yahoo.com.br
Querido Jayme, que saudade do Brasil na Madrugada...
ResponderExcluirEm relação ao assunto, gostaria que você comentasse o outro lado da moeda. Veja a opinião, dentre muitas, extraída do seguinte endereço eletrônico:
http://72.14.209.104/search?q=cache:_ALEZHGwwHwJ:www.vermelho.org.br/museu/principios/anteriores.asp%3Fedicao%3D43%26cod_not%3D695+voto+distrital+puro&hl=pt-BR&gl=br&ct=clnk&cd=11
Um grande abraço.