Notícia colhida há muito tempo em tablóides ingleses, os mesmos cuja maior preocupação parece ser a cor das calcinhas de Elisabeth II, atribuiu o anti-semitismo de Hitler e o conseqüente Holocausto a sífilis que ele teria contraído de uma prostituta judia.
Ou seja: se a prostituta não fosse judia, Hitler não teria sido anti-semita e não teria havido Holocausto e todos seríamos felizes para sempre...
A tese foi levantada por um psiquiatra de nome Bassem Habeeb em congresso ou seminário internacional do Royal College of Psychiatrists, em Edimburgo, Escócia, transformado pelo noticiário da época em “encontro mundial”.
Procurei na própria Internet currículo que qualificasse Bassem Habeeb como palestrante de um encontro mundial. Em vão. Menos ainda encontrei que os psiquiatras escoceses tenham cacife para iluminar a psiquiatria universal.
Enfim, vá lá. Vivemos em uma época de irrestrita liberdade de expressão, que oxalá não se esgote nunca, para que jamais volte a prevalecer o obscurantismo do qual o Holocausto foi conseqüência. Dentro do mesmo princípio, ninguém me negará o direito de defender a tese de que psiquiatras escoceses possam se contaminar com a paranóia de seus pacientes, ou contaminá-los com sua própria loucura.
Minha maior preocupação, entretanto, é bem outra. É o cuidado para não enxergar anti-semitismo em tudo, até mesmo quando alguém esbarra em mim na rua, sem querer. O problema, contudo, aqui se coloca de maneira diferente. Atribuir culpa às minorias – aos negros, aos homossexuais, aos judeus, aos ciganos, aos armênios – pelas tragédias que os vitimaram ao longo do tempo, é artimanha muito antiga do racismo.
É uma técnica que consiste em ordenar fatos, sem nenhum critério lógico ou cronológico, para justificar crimes que muitas vezes os antecederam. Os autores e comentaristas de “Os protocolos dos sábios do Sião” foram mestres nesta distorção, a ponto de o próprio Adolf Hitler reconhecer a fraude, mas convencer-se que a “realidade dos fatos” a legitimava.
A seriedade impunha aos psiquiatras reunidos em Edimburgo que exigissem de Bassem Habeeb, para admitir sua tese ao debate e seqüente divulgação, as evidências científicas sobre as quais criou a versão.
Não há nenhuma referência, em toda a vasta bibliografia sobre o nazismo e seus protagonistas, de que Hitler tenha contraído sífilis em qualquer época de sua vida. Suas dificuldades em se relacionar com mulheres, prostitutas ou não, tinha outra origem: a invencível timidez, descrita em “O jovem Hitler que conheci”, por seu único amigo de infância, o maestro August Kubizek.
Nada a ver com homossexualismo, como algumas análises superficiais também pretenderam retratá-lo.
Mas que Hitler tivesse contraído a sífilis de uma prostituta, a não ser com ela tivesse vivido um razoável período de tempo, como identificá-la como judia, em encontros instantâneos e fortuitos? Não seria, acaso, cigana, cujo povo ele também massacrou? Ou eslava? – Os civis poloneses e soviéticos mortos pelos nazistas, fora de ações bélicas, apenas para fabricar “espaço vital”, somam mais de 10 milhões de pessoas.
Quem sabe um travesti? – O ódio de Hitler aos homossexuais era igualmente invencível.
Pode ser que não haja nada por trás tese de Bassem Habeeb e que eu apenas fique cismado com coisas desse tipo. Será que os psiquiatras de Edimburgo não vieram com a novidade de deixar que pacientes também apresentem teses em seus congressos?
Ora, ora...
sábado, 18 de abril de 2009
Hitler e os judeus - Jayme Copstein
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