quarta-feira, 18 de janeiro de 2006

Na terra do bagatelão - Jayme Copstein

Que as excentricidades no mundo das togas não são monopólio do Brasil, prova a notícia vinda da Inglaterra, onde uma mulher, Christine Ryder, de 53 anos, processou e obteve indenização por danos morais de Kevin Reeves, de 40 anos, que prometeu assassiná-la por 2 mil libras, mas não cumpriu o trato.
Os dois se conheceram e se tornaram-se amigos – só podia – em um hospício que hoje é chamado de hospital psiquiátrico, como se isso fizesse alguma diferença. Personagens apropriados para uma comédia tipo “Grande Família” ou “Os trapalhões”, Kevin alegou a Cristina que não cumprira o trato porque tivera de matar o pistoleiro contratado para assassiná-la. Homem justo e caridoso, tinha usado o dinheiro para indenizar a viúva do coitado do bandido.
Desfecho do pastelão: Kevin foi condenado a um ano de três meses de cadeia, a devolver o dinheiro e pagar mais uma indenização por danos morais a Cristina. Que em lugar de voltar para o hospício, onde é o seu lugar, com toda a certeza vai procurar um assassino que pelo menos tenha palavra. Como vocês sabem, já não se fazem assassinos como antigamente.
Cá no Brasil, somos menos engraçados. Nossos magistrados agora se empenham em uma séria discussão sobre a tese da bagatela. Um traficante foi preso quando vendia maconha. Como só foi apreendido um cigarro, pesando menos de 10 gramas – era tão pouco, uma bagatela – o Tribunal de Justiça de Goiás entendeu que “não havia intenção comercial” e o absolveu. Bem que os empresários vivem se queixando de que são perseguidos. Que mandou ter mania de lucro.
Aliás, em Goiânia, mesmo, um ladrão de supermercado, foi também solto porque só furtou – vejam a bagatela – algumas barras de chocolate, o que, palavras da sentença, “não ofende a ordem social, jurídica ou mesmo o patrimônio da vítima”.
A grande dúvida é se não estamos inventado a impunidade a prestações. Se alguém decidir furtar uma bagatela todos os dias, com a continuação a soma pode dar um grande valor. Mas como são bagatelas, a absolvição se impõe pelo sagrado princípio do bagatelão.

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