sexta-feira, 20 de março de 2009

De volta à Babel - Jayme Copstein

Alguém me perguntou qual a coisa mais engraçada que testemunhei como jornalista.

Ora, foi tanta ridicularia que não caberia em uma simples lista. Mas uma proposta da qual dei muita risada e hoje me preocupa foi apresentada no último Fórum Social de Porto Alegre, o de 2005, por Bernard Cassen, diretor do jornal francês Le Monde Diplomatique.

Ele defendeu que os povos de origem romana deveriam se comunicar cada um em seu idioma, para banir o inglês e quebrar a hegemonia norte-americana. A proposta de monsieur Cassen não incluía a proibição de os norte-americanos aprenderem outras línguas, um sério risco, pois assim poderiam reaver logo a hegemonia perdida.

Na época, achando maluca a sugestão, fiquei pensando na Babel em que desembocaríamos, cada um falando sua língua em entendimentos internacionais. Já imaginaram um francês dizendo a uma brasileira que ela tem um pescoço muito bonito? Ou um brasileiro pedindo a uma castelhana a concha emprestada para servir-se de sopa?

A tese é ridícula em si, não passa de rematada asneira, mas implica em algo muito sério: parte de quem nos considera o mesmo bando de botocudos que, no século 16, os franceses mobilizaram contra outro bando de botocudos, para disputar aos portugueses o monopólio do pau-brasil.

Claro que Cassen não é nenhuma Branca de Neve ou Bela Adormecida, despertando de repente com o beijo de uma idéia salvadora da humanidade. A mensagem era bem clara e no Fórum Social ele não a escondeu em sutilezas: “Para quebrar a hegemonia norte-americana”. Ou seja, na cabeça dos europeus, os povos da América Latina têm de ser subservientes a potências imperialistas – eles ou os norte-americanos.

Como cada puxa a brasa para a sua sardinha, Cassen quis nos seduzir e engajar como tropa de choque, das ambições francesas de hegemonia mundial, aquela que nos daria o tratamento fraternal e civilizado que foi dispensado ao Haiti no continente e a todas as colônias que dominaram ou ainda dominam na África.

A tese na verdade pretendeu ressuscitar os sonhos imperialistas de Luiz Napoleão, dos quais são exemplos a tragédia de Maximiliano no México e a Guerra do Paraguai, outro fiasco hegemônico, enigma que um dia os historiadores haverão de decifrar.

O que desejamos é, na falta de uma língua universal, falar todos os idiomas que pudermos aprender – o inglês, o francês, o alemão, o russo o chinês. Tem gente que acha desnecessário para ser presidente da República. Mas serve para entender e evitar os contos de vigários que os imperialistas e seus beleguins queiram nos passar.

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