quarta-feira, 30 de junho de 2010

Ah! O futebol... – Jayme Copstein

Jamais passou pela minha cabeça um Parlamento, com a tradição da Assembleia Nacional da França, reunir-se para analisar o fracasso da sua seleção no campeonato mundial de futebol. Há o precedente da Guerra do Futebol quando Honduras e El Salvador se engalfinharam em 1969, após conflitos entre torcedores nas eliminatórias para a Copa de 1970, mas o futebol foi apenas pretexto. Por trás, a expulsão imigrantes salvadorenhos de território hondurenho, com o confisco de plantações dentro de um projeto de reforma agrária. Houve mais de 12 mil baixas, a maior parte civis.

A França, pois, haveria de parecer o primeiro país civilizado a levar a sério problemas de futebol, não fossem rumores sobre as suas dificuldades financeiras. Há muita resistência à pretendida reforma da previdência social impondo o aumento da idade mínima para aposentadoria, de 60 para 65 anos. Discutir o fiasco da seleção serviria de cortina de fumaça, enquanto o governo de Sarkozy negocia a aprovação do projeto nos bastidores.

Se verdade ou apenas mito nascido em mesa de bar, onde diplomatas amadores decidem os destinos do mundo, é difícil saber. Que os países europeus não andam bem das pernas, não é segredo. O bilhão de euros disponibilizados para socorrer os países europeus em dificuldades não tem nada de benemerência. É dedo de menino tapando buraco de dique como nas histórias infantis holandesas. O menino não aguenta ficar eternamente segurando a enxurrada com o dedo e não há solução a curto prazo, tanto assim que a recente reunião do G-20 aprovou drásticas medidas de contenção para os próximos cinco anos.

Em tudo isso não deixa de ser interessante, entretanto, que os fiascos na Copa do Mundo e as nuvens espessas toldando os céus da economia desviaram completamente as atenções dos 70 anos da Retirada de Dunquerque e da queda da França na Segunda Guerra Mundial. Foi um momento trágico e impactante. Ninguém esperava que o Exército Francês, tido então como um dos melhores do mundo, resistisse menos tempo aos nazistas que o Exército Polonês, mal equipado e até opondo a ultrapassada Cavalaria contra as poderosas Divisões Panzer.

Até hoje se discute a responsabilidade pelo desastre. A direita acusa a esquerda de ter sabotado o esforço de guerra por ordem da União Soviética, então aliada à Alemanha. A esquerda acusa a direita de ter impedido a resistência para não expor suas propriedades ao risco de destruição. Os dois lados parecem ter razão. E sobre este antagonismo que impedia a estabilidade política, a corrupção corria solta. Somerset Maugham, em "Assunto Pessoal", conta sobre aviões de combate encomendados à indústria americana, que não puderam ser acabados porque o detentor da patente de uma peça vital – francês, por sinal - queria royalties de mil dólares por avião. Quando percebeu o risco a que tinha exposto o país – dois dias antes da queda de Paris – baixou o preço para 50 dólares.

O próprio governo era um caos. Nos últimos tempos, antes da derrota, foi notável a intromissão da amante do primeiro-ministro Paul Reynaud na condução dos negócios. Chamava-se Hélène de Portes. Herdeira de um milionário construtor de navios, no mais aceso da crise chefiou uma reunião do Ministério, para conduzir "o barco do |Estado", em virtude de Reynaud estar acamado com gripe.

Todas essas coisas poderiam ser contadas ao se assinalar um aniversário redondo, como o de 70 anos. Mas, sabe, o futebol...


 


 


 


 

terça-feira, 29 de junho de 2010

Catarinas ao vento – Jayme Copstein

Foi no site do Zé Prévidi (www.previdi.com.br), aonde busco a gargalhada de cada dia, que soube de um bar na Cidade Baixa onde as senhoras têm copa franca desde que elas concordem em tirar a camiseta da seleção e andar de catarinas à vela a cada gol do Brasil.

Desencavei as "catarinas" (sempre no plural; no singular é outra coisa) no saco de antiguidades porque tenho certeza de que não faltará alguém, com cara de santo martirizado em folhinha de boliche, que me cite o Cícero mal aprendido no colégio dos padres: "O tempora! O mores!" (Ó tempos! Ó costumes!).

Ora, que hipocrisia: se Cícero em 64 a.C. já se queixava dos costumes, que história é essa de achar que são dos nossos tempos? Mas eu já ia me perdendo: os portugueses d'antanho chamavam os seios de catarinas porque a moralidade de sua época sequer permitia mencionar até as partes menos íntimas da anatomia feminina. O que não impediu um escândalo no século 17, quando Isabel, mulher de Afonso VI, mostrou o pezinho e uma nesga de tornozelo ao descer da carruagem.

De nome comprido como gente de nobreza, a francesa Maria Francisca Luísa Isabel d´Aumale e Sabóia-Nemours, ao casar-se com o Rei de Portugual, trouxe para a ultraconservadora sociedade portuguesa um pouco do brilho da corte de Paris. Luiz Edmundo, em "O Rio de Janeiro no tempo dos vice-reis" conta o incidente:

"Certa vez, Isabel, negligente, vae descer do seu coche vistoso. Abre-se a portinhola. Cercam-na curiosos, varios nobres da Corte, De tal sorte, porém, ela, ao resvalar do perversão da carruagem para o estribo, ergue o merinaque vivaz e sem cuidado, que mostra, não só a biqueira innocente do sapatinho á Cendrillon, mas, ainda - imagine-se o escandalo - todo o arqueado brejeiro do pé curto e gentil, até ao contorno perturbador do tornozelo. (...) Lisboa inteira indignou-se. Lísboa inteira fremiu, agastada e feroz. Audácia! Vira-se já impudicicia igual? Mostrar o pé! E logo quem havia de mostrá-lo? A Senhora Rainha, que deveria ser a mais legitima representante do pudor feminino em Portugal! E nem ao menos se podia dizer que o exhibido fora apenas a curva de um salto fugace, ou o bico imprevidente e irrequieto do calçado, rompendo a polheira de tela, surgindo no estribo dourado do coche. Nada disso. Isabel de Nemours, à luz meridiana, talvez despudoradamente, premeditadamente, havia mostrado, à Lisbôa em peso, por malicia soez, a parte mais recatada do corpo de uma mulher - o pé (...) O interessante, porém, é que esse protesto, e toda essa grita de indignação e pavor, que quase chega aos ouvidos do rei e o obriga a meter numa nau do Estado, em viagem de retorno, Isabel, a índesejada, era feito por senhoras, que se decotavam até quase aos joelhos, sem pensar que mais recato merece, muitas vezes, a curva rósea de um seio breve que a innocente forma gentil de um sapato de couro".

O Rei Afonso VI, se ficou sabendo, com toda a certeza, não tomou nenhuma providência porque "devia" à Rainha, se é que me entendem, por alegadas doenças de infância – ou "supostas", como é moda escrever no jornalismo "moderno". O casamento foi anulado e Isabel convolou núpcias, permitam-me a expressão antiquada, mas solene, com o cunhado Pedro II, assegurando a sucessão ao trono e a moral em Portugal.

Assim sendo, nada tenho a opor que, a cada gol da seleção, as catarinas sejam "baloiçadas" aos ventos deste agitado século 21. Só me preocupa, se o Brasil for campeão por goleada, aonde irá parar tanto silicone.

segunda-feira, 28 de junho de 2010

Bagadus e tinteiros – Jayme Copstein

Estava revisando alguns livros, quando me bateu a curiosidade de ver que efemérides Coruja Filho (pseudônimo literário de Sebastião Leão) registrou em "Datas Rio-grandenses", neste Dia de São Pedro. Pois nem de propósito: em 1849, ele assinalou uma batalha campal travada por adolescentes, que marcou a história da cidade de Porto Alegre – bagadus x tinteiros.

Era um tempo em que não havia tevê, drogas ou computadores, a cuja influência se atribui, hoje em dia, muitos dos problemas protagonizados por menores. Já podiam ser identificados, entretanto, então, dois males que persistem na sociedade brasileira: educação e má distribuição de renda

Os bagadus eram meninos de famílias pobres que moravam no então 3º Distrito de Porto Alegre, área compreendida pelas Ruas do Arroio (Bento Martins), Varzinha (Demétrio Ribeiro), Pantaleão Telles (Washington Luís), Cadeia (desaparecida na reurnabização da cidade), Praça da Harmonia e parte das Ruas dos Andradas, Ponte (Riachuelo) e Igreja (Duque de Caxias). As famílias dos tinteiros, mais abonadas, habitavam a área entre as Ruas do Arroio e Portão.

Os dois bandos viviam brigando e por mais de uma vez causaram ferimentos sérios uns nos outros. Geralmente os bagadus eram os vencedores porque tendo de trabalhar desde cedo, eram fisicamente mais fortes.

Naquele ano de 1849, um fato agravou a rivalidade: em uma novena ou festejo do Espírito Santo, um grupo de tinteiros encontrou três bagadus desprotegidos e decidiram surrá-los para se vingar das derrotas sofridas.

Imediatamente, os bagadus se mobilizaram, pois um dos surrados era seu próprio chefe. Os dois grupos trocaram notas e combinaram a tarde de 29 de junho para resolver a questão no Alto da Bronze. O que se seguiu foi hilariante. É Sebastião Leão que nos conta:

"De fato, na hora e dia indicados, ali se achavam armados com bengalas e facas, dezenas de meninos dos dois partidos. Travou-se tremenda luta entre os dois grupos, que inopinadamente viram-se cercados por numerosa força armada, que para ali fora enviada pelo Chefe de Polícia, Dr. Sayão Lobato. O comandante da força recebera ordens terminantes de não maltratar os meninos, e, simplesmente, amedrontá-los, pois era convicção do Chefe de Polícia que a presença da força bastaria para que os dois partidos batessem em retirada. (...)

Vendo-se cercados pela polícia, os dois grupos inimigos aliaram-se e reagiram como homens. A princípio os soldados foram apanhando às pauladas, sem tugir nem mugir, mas, quando sentiram as costas quentes, começaram a despejar bordoadas a torto e a direito. O aspecto da luta tornou-se mais grave, e terríveis seriam as suas conseqüuências, se não tivessem acudido ao local do combate, grande número de chefes de família e as mães dos jovens guerreiros, que conseguiram dar têrmo à batalha."

Soares Andréa, o Presidente da Província, para terminar de vez com as brigas entre os dois bandos, anunciou que seriam presos e remetidos para a Escola de Aprendizes de Marinheiro os menores que brigassem nas ruas. Para dar exemplo, ordenou a prisão de "alguns meninos vagabundos, de maus costumes, e mandou que passassem pelas ruas da cidade, no meio de um pelotão de soldados de baionetas caladas, e depois embarcassem para o Rio de Janeiro".

Segundo a nota de Sebastião Leão foi o suficiente para acabar de vez com as brigas de tinteiros e bagadus. Temerosos do mesmo destino, nunca mais se engalfinharam.

domingo, 27 de junho de 2010

Da visão de Lula à miopia de Pelé – Jayme Copstein

O leitor Paulo Renato contesta: "Em sua coluna (O Cipó da Ford, 3 de junho) o senhor opina que a Ford decidiu se instalar na Bahia e não no Rio Grande do Sul conforme o contrato que assinara (e pelo qual já havia recebido dezenas de milhões de reais do governo gaúcho, por isso foi condenada a ressarcir o erário) por culpa do então governador Olívio Dutra, sem interferência alguma do governo federal.
Sem desconsiderar a imensa inabilidade política da gestão petista, não podemos esconder o fato que houve interferência direta do governo do presidente Fernando Henrique Cardoso – naturalmente, após a derrota de Antônio Brito – através da medida provisória 1740, de 02/06/1999, convertida posteriormente na lei 9808, o que possibilitou a Ford descumprir o contrato e decidir se instalar na Bahia".

Resposta: Se não dá para desconsiderar a "imensa inabilidade política da gestão petista", então todo o resto é mera consequência, a não ser que se quisesse mandar a Ford embora do Brasil. Isso o então Presidente Fernando Henrique Cardoso não queria. Além do mais, pouco tempo depois, a decisão do então Governador Olívio Dutra teve aplauso público do futuro Presidente Lula, em pronunciamento na Federasul. A visão que ambos tinham do tema era esta.

Já Ademar Romeiro Medeiros Netto discorda de A bola do filósofo (25 de junho): "(...)João Saldanha não deixou a seleção pronta para a Copa de 1970 na preparação da seleção. Uma de suas aleivosias foi a de declarar que o Pelé estava com miopia e teria dificuldade para jogar. Quem preparou a seleção, quer queiramos ou não, foi Zagalo,  e por isso temos que engoli-lo até hoje."

Resposta: Quando João Saldanha foi alijado, dias antes do embarque para o México, a equipe já estava pronta e treinada, e livre dos medalhões que tinham protagonizado o vexame de 1966 na Suíça. A sua demissão Saldanha nada teve a ver com a sugestão do General Médici, de convocar Dario, e não foi ordenada pelos militares, como tem sido dito. Resultou de campanha liderada pelo rival Yustrich, que queria o posto. Saldanha formara a Seleção apenas com base no Botafogo e no Santos, onde estavam os melhores jogadores, contrariando óbvios interesses.

Quanto à miopia de Pelé, em entrevista a Geneton Moraes Netto (http://tinyurl.com/2cbh4wu) Saldanha nega que tinha afirmado aquilo: "(...) Aquela história deve ter surgido dentro do SNI. Quem tinha problema de vista na seleção era Tostão e, ainda assim, fiz Tostão ser convocado à força (...) porque sabia que na operação de Tostão havia mais charlatanismo e publicidade do que propriamente uma lesão. Quanto a Pelé, não tive nenhum problema. (...) Nunca fiz um pronunciamento daqueles sobre a vista de Pelé por duas razões. Uma é que seria injusto: sou leigo e não entendo. Nós só tínhamos uma preocupação quanto à boa visão: com os goleiros. Dos goleiros, a gente exige que tenham uma visão igual aos exames que são feitos com os aeronavegadores, os pilotos de aviação. Quanto aos demais jogadores, o campo visual é tão vasto que nós nunca nos preocupamos. O importante é que enxerguem a bola. E Pelé enxergava! A segunda razão é que não sou burro. Se eu vejo o cara jogar e ser o melhor jogador do mundo, eu vou dizer "não"? A onda não era em cima de mim: era em cima de Pelé. Eu e Pelé já conversamos sobre essa coisa e rimos."

sexta-feira, 25 de junho de 2010

Este jogo não foi zero a zero – Jayme Copstein

Com o pedido de desculpas à torcida, Dunga deu por encerrado o incidente provocado por um repórter da Rede Globo, durante a entrevista coletiva que o treinador concedia logo após a partida contra a Costa do Marfim. Saiu maior do episódio que seu antagonista.

Curiosa, porém, foi a reação dos poucos leitores que me honram com sua preferência. Uns me criticaram, outros concordaram comigo, e houve quem me advertisse do perigo de desafiar a Rede Globo ou me alertasse para a ingenuidade de estar favorecendo redes concorrentes.

O que me deixou feliz e orgulhoso foi o nível elevado dessas mensagens, e não se trata de uma "elite" intelectual. Há quem enfrente dificuldades com regras de linguagem, mas nem por isso infringe as normas da civilidade. São poucos os meus leitores, mas são os que desejo ter.

Todavia, essas manifestações e as que li em outros jornais e na Internet me convencem que, por trás do homem cordial, como o historiador Sérgio Buarque de Holanda definia o brasileiro, há um brigão sempre pronto para a guerra. É, porém, tão despreparado para ela que não percebe a importância de vencer a última batalha. Não sabe que todas as demais são mero preparativo para a vitória final.

Digo isso porque, ontem, durante a partida contra Portugal, em todos os canais de tevê só se ouviam críticas à "pelada", à falta de acrobacias circenses e a reclamação sobre a ausência de Robinho que hipoteticamente encheria as redes lusitanas de gols.

Mas quem analisasse a situação do Brasil, já classificado na chave, perceberia que a única hipótese que não interessava à nossa seleção era a vitória. Se quiséssemos forçá-la, os portugueses, a quem a única hipótese que não interessava era a derrota pelo risco de desclassificação, haveriam de vendê-la caro. Seria uma carnificina. Tendo apenas 48 horas pela frente até a partida seguinte, como recuperar a equipe em tão pouco tempo?

Pena que se tem memória curta no país. Na Copa do Mundo de 1954, na Suíça, o Brasil chegou à partida final de seu grupo na mesma situação, após ter derrotado o México (5 a 0) e a França (1 a 0), mas entrou em campo para massacrar os iugoslavos. Os "gringos" faziam sinais desesperados para que nossos jogadores se acalmassem, que ambas as equipes estavam classificadas.

Não houve jeito. O jogo terminou empatado (1 a 1) e também em patadas. Na partida seguinte o Brasil foi eliminado pela Hungria por 4 a 2.

Em compensação, nesta mesma Copa de 1954, quando se enfrentaram pela primeira vez no Grupo, a Alemanha Ocidental levou 8 a 3 da Hungria que andava goleando todo mundo. Ninguém quis linchar o técnico, a honra nacional não foi maculada, porque, na batalha final, a que valia pelo título, a Alemanha ganhou por 3 a 2.

Não entendo de futebol, não sei se o Brasil será campeão do mundo – tudo indica que sim porque o técnico é gaúcho e esta é a tradição. Mas que esse empate de ontem, em 0 a 0, foi passo bem maior na direção do caneco do que se tentássemos fazer 10 a 0, isso foi.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

A fraude – Jayme Copstein

Vários leitores me passam matérias de colegas, negando a versão de ter a senhora Fátima Bernardes provocado o incidente referido em "A Bola de Dona Fátima" (coluna de terça-feira), e citando desmentidos do próprio Dunga. Segundo os textos recebidos, a história foi invenção de um colega de outra emissora. Perguntam-me; "E agora?"

Outros leitores apontam a punição de Maradona em 2009 e assinalam como equívoco a minha afirmação de que "a FIFA não tem nenhum tipo de poder ou autoridade para regular as relações de atletas, juízes, auxiliares, técnicos, massagistas, enfim, dos protagonistas de suas atividades esportivas com quem delas não participe, como os jornalistas ou os vendedores de cachorro quente". Também me perguntam: "E agora?"

Primeiro item: vou esperar o pronunciamento de Dunga. Se ele desmentir o episódio, me retrato, apresento desculpas e passo a exigir a identidade de quem o inventou para lhe dirigir as críticas que merece.     

Quanto ao equívoco, não é meu. Maradona foi punido não por "ofender jornalistas", mas por falta de decoro. O que ele disse, na ocasião, desculpando-se previamente com "las señoras", se levado a peito, poderia lhe valer até processo por atentado ao pudor ou coisa que o valha. São delitos que se cometem também por palavras, não só por atos.

Nada disso, porém, tem a ver com um repórter provocando Dunga com movimentos negativos de cabeça para expressar desaprovação ao que ele dizia e a reclamação de Dunga contra a descortesia. O que Dunga resmungou, só perceptível através de leitura de lábios, não existe no mundo como dizem os nossos bacharéis, não tem existência concreta, a não ser que já se tenham proclamado o Reino do Grande Irmão e pretendam controlar os pensamentos alheios.

Quando escrevi "fraude" na coluna de anteontem estava me referindo ao complô premeditado para irritar Dunga, fazê-lo explodir e ser suspenso pela FIFA. Acho curioso que ninguém tenha se detido no pormenor de um repórter fazendo provocações mudas com gestos de cabeça, para se passar por vítima das "ofensas gratuitas" do treinador. Portanto, não era a FIFA que cabia agir.

A bola do filósofo

O problema do Dr. Sócrates é a sua desmemória. O outro dia, confessava na tevê não se lembrar de mais nada do que estudara na Faculdade. Não faz tanto tempo assim que se formou médico.

O Dr. Sócrates, na mesma entrevista, desceu a lenha na "grossura" dos gaúchos, quando perguntado sobre Dunga como treinador da Seleção. Não fosse a desmemória, até dava para pensar em ingratidão, feio sentimento, impróprio de um filósofo da sua envergadura.

O Brasil ganhou cinco Jules Rimet. A primeira e a segunda, porque o treinador, Vicente Feola, dormia e deixava os jogadores por sua própria conta. A terceira, porque um gaúcho, João Saldanha, "limpou a casa", como o Dunga está fazendo agora, e organizou o melhor time que o Brasil já teve. Foi deposto como também querem fazer com Dunga. Zagalo só teve o trabalho de erguer a taça.

A quarta copa já se deve à "Era Dunga", quando ele, como companheiro de quarto, botou o Romário nos eixos e cobrou disciplina dos demais jogadores. A quinta e mais recente, teve o gaúcho Luiz Felipe como treinador. Se vencermos mais esta vez, também será por contribuição de um gaúcho.

E o Dr. Sócrates? Quantas Copas do Mundo ele venceu? Esqueçam, como homenagem à sua desmemoria, o pênalti que desperdiçou em 1986, na decisão contra a França, desclassificando o Brasil.

O filósofo pisou na bola.

quarta-feira, 23 de junho de 2010

O Ipad vale uma missa – Jayme Copstein

Fosse eu dono de editora ou de livraria e não estivesse pensando em mudança de ramo ou aposentadoria, começaria a investir com firmeza para me adaptar ao mundo que vem chegando. O padre italiano Paolo Padrini – acabo de saber pela portal da Abril (http://tinyurl.com/377f686) – está concluindo a transposição do Missal Romano para o Ipad, o livro eletrônico aqui falado anteontem. Sinal que é chegado o fim dos tempos... do papel.

Segundo a notícia, o Missal eletrônico deverá ser lançado em julho (menos de 30 dias), em inglês, francês, espanhol, italiano e latim. Se uma instituição como a Igreja de Roma, aferrada às tradições e consumindo séculos para admitir mudanças, não vê inconveniência em aposentar o Missal de papel, o debate encaminha-se para o encerramento.

Resta é o exercício de profecia sobre como será este mundo editorial sem papel. Ele já está antecipado nas bibliotecas online, na quais já se pode consultar, gratuitamente, milhões de livros cujos direitos autorais são de domínio público, seja por decurso de tempo seja porque seus autores a eles renunciaram voluntariamente. Para consultar, por exemplo, o que foi debatido no Segundo Colóquio Luso-Espanhol de História Ultramarina de 1975, sobre "A viagem de Fernão de Magalhães e a Questão das Molucas", basta entrar na Biblioteca Nacional da Austrália (http://tinyurl.com/34zjn4d) e obter em minutos uma cópia do grosso volume de quase 800 páginas, socando tudo dentro de um cantinho do pen drive. Nada de cupins ou de traças, nada de encadernação se abrindo e soltando folhas, nada de fichas de cartolina com as anotações preciosas que a gente não sabe onde botou.

A Biblioteca Nacional da Austrália não é a única a fornecer a cópia digitalizada de "A viagem", mas, por ficar no outro lado do mundo, foi citada de propósito para mostrar como a tecnologia aboliu as distâncias. Tanto faz pedir a ela, que fica do outro lado do mundo, como à Biblioteca Pública de Porto Alegre, que fica na esquina de casa para quem mora na Rua Riachuelo.

A propósito: quem desejar literatura brasileira de boa qualidade, em abundância e de graça, comece por " http://tinyurl.com/ramrz. O portal é do Governo Federal.

Dunga e a Vênus Platinada – Sérgio Reis

Chico Anísio, quando ainda tinha espaço para trabalhar, fazia um programa na Rede Globo em que interpretava diversos personagens (uma cópia do programa que tinha na TV Tupi nos idos de 1960, logo que surgiu o videotape). Um desses personagens, emblemáticos era o Bozó. Um "nada" que trabalhava na Globo em alguma função medíocre, mas se achava importante e poderoso, peitando qualquer um e dizendo o seu bordão: "Eu sou o Bozó. Trabalho na Globo. Tá aqui meu crachá!"
Era uma gozação aos seus colegas e à própria Globo. Satirizava como alguns profissionais misturam o veículo com eles mesmos, passando a acreditar que eles, e não o veículo, têm o Poder. Quando são postos na rua com um pé no traseiro, caem em depressão. Nenhum outro canal lhes oferece o que a Globo tem: Poder!
Você sabe de sua importância em uma empresa de comunicação não é contando quantos funcionários estão abaixo de você, mas, sim, quantos estão acima. Assim são todas, não apenas a Globo. Triste e trágica verdade.
A declaração de um destes Bozós sobre o affair Dunga – "Ele precisa saber que não está falando para a Rede Globo; ele está falando para o Brasil!" dá a dimensão exata do tamanho do seu cérebro: inversamente proporcional  ao tamanho da Globo. Desconhece o Bozó de 2010 que este é o pior momento para a Globo brigar com Dunga.
Agora ele é imexível! (como diria o saudoso ministro de Collor, Magri, o da cadela humana!). E tirá-lo, quem há dê? E substituí-lo por quem? E quem assume a responsabilidade em caso de derrota?
Mesmo que a seleção de Dunga, com Dunga, dê com os burros n'água sempre haverá o risco de respingar gotas de culpa na Globo. Tá na hora de Dunga usar o bordão de Zagalo: Vão ter que me engolir! E se ganhar, hein? Hein?
A Vênus Platinada está nua e mostra suas rugas, sua celulite, seus dentes amarelecidos, seus cabelos brancos mal pintados.Agora o  tempo é de Dunga. E sem trocadilho, há muita coisa em jogo fora das linhas dos estádios, ops, desculpe, das Arenas, para ficar na moda.

terça-feira, 22 de junho de 2010

A bola de dona Fátima – Jayme Copstein

Quando ouvi no noticiário que a "FIFA havia decidido não punir o técnico Dunga por ofensas a um jornalista", convenci-me de que há algo muito apodrecido neste reino que não é da Dinamarca. A informação é uma fraude: a FIFA não tem nenhum tipo de poder ou autoridade para regular as relações de atletas, juízes, auxiliares, técnicos, massagistas, enfim, dos protagonistas de suas atividades esportivas com quem delas não participe, como os jornalistas ou os vendedores de cachorro quente.

Ambos são elementos marginais às competições. Aos vendedores de cachorro quente cabe aplacar a sede e a fome dos torcedores; aos jornalistas, somente colher a informação para transmitir ao público.

Se dos vendedores de cachorro quente se exige, sob pena de cadeia, cuidados de higiene para não intoxicarem seus consumidores, dos jornalistas cobra-se veracidade no que informam, para não envenenarem a opinião pública. Pena que não há cadeia quando infringem a regra.

O que se pôde ver, mesmo depois de o vídeo ser desonestamente editado, foi o repórter da Globo tentando perturbar a entrevista que Dunga concedia, após a vitória contra Costa do Marfim. Se a fraude mais recente, a notícia de que a "FIFA havia decidido não punir o técnico Dunga por ofensas a um jornalista", tivesse procedência, estaríamos diante de uma situação idêntica a dos Tribunais da Inquisição, onde tudo podia ser assacado gratuitamente contra quem quer que seja por autoinvestidos representantes da divindade. Os jornalistas poderiam fazer o que lhes desse na telha, por estarem protegidos pela mesma imunidade – ou impunidade – que todos criticamos nos bandoleiros do Congresso.

Aliás, a arrogância e a truculência, fruto deste sentimento de onipotência são a origem do tumulto que se armou na África do Sul e que não terá maiores consequência graças à liderança firme de Dunga.

A senhora Fátima Bernardes, que apresenta um informativo na Rede Globo com seu marido William Bonner apresentou-se na concentração brasileira, acompanhado da equipe, para uma entrevista exclusiva com os jogadores da seleção. Dunga , mesmo sob ameaça de queixa ao "dono da bola", Ricardo Teixeira, recusou: "Me desculpe, minha senhora, mas aqui não tem essa de 'reportagem exclusiva' para a rede Globo. Ou a gente fala pra todas as emissoras de TV ou não fala pra nenhuma..."

Zangada, dona Fátima decidiu declarar a guerra. Terá ela confundido ficção e realidade e tentado encarnar alguma versão televisiva de madrasta de Branca de Neve para convencer o seu espelho nada mágico que é a mulher mais poderosa do país?

Se foi isso, que bola fora...

Ditos e achados

João Saldanha, desfazendo mitos, entrevistado em 1983 por Geneton Moraes Neto (www.geneton.com.br e http://colunas.g1.com.br): "É bom que o brasileiro saiba que ele não é absoluto. É bom que o brasileiro saiba que lá fora há times tão bons quanto os nossos – e às vezes melhores. É bom que o brasileiro saiba que a Europa se atrasou perante nós por causa de uma guerra que dizimou quase toda a juventude entre 15 e 45 anos. Isso não se refaz com decreto-lei nem com planos quinquenais. É preciso esperar que nasçam outros, formem-se e reaprendam".

segunda-feira, 21 de junho de 2010

A revolução do Ipad – Jayme Copstein

Finalmente estive com um "Ipad" na mão, trazido por um sobrinho, o Artur, que vive e estuda nos Estados Unidos. Já tinha lido sobre esses "gadgets", mas não tivera ainda ocasião de manejá-los, como aconteceu agora. Primeira impressão: errei feio quando previ que o papel seria substituído em dez anos no máximo como mídia para tudo que se imprime hoje em dia, livro, jornal, revista. Não leva tanto tempo.

Lá pelos idos de 1970, quando trabalhava no velho Correio do Povo, envolvi-me em uma polêmica com entusiasmados cultores da microfilmagem que haviam decretado uma guerra de morte, verdadeira "jihad", contra do livro. Bastou o título do único artigo que escrevi para liquidar a questão: "Na briga do microfilme com o livro, vence a cadeira de balanço. Não passava pela cabeça de ninguém, levar o volumoso leitor de microfichas para a cadeira de balanço ou para qualquer outro lugar – a areia da praia, o macio da cama – que escolhemos para ler um livro.

Só que com esse Ipad, ou seus congêneres, é diferente: são mais cômodos de serem manejados que o próprio livro de papel. São do tamanho de um volume comum (13 cm de largura por 16 de comprimento, altura em torno de 1,5 cm), podem ser lidos no "escuro" porque têm iluminação própria, mas sem o brilho das telas de monitores que irritam os olhos.

Bastam movimentos fáceis dos dedos para fazer tudo o que se faz com um livro de papel e até o que com ele não se pode fazer sem folhear umas tantas páginas, como achar a frase antológica lida lá atrás. Ou até fazer o que não se pode fazer de nenhuma maneira, como aumentar o tamanho da letra para quem tenha problemas de visão.

É revolução igual à ocorrida no Século 15, quando Gutenberg inventou o tipo móvel, abrindo caminho para a imprensa e a indústria editorial. O entusiasmo pela novidade, entretanto, não significa que o conceito de livro tenha sido revogado. É apenas o papel que após tantos séculos de bons serviços à civilização, cedendo seu lugar à eletrônica.

O livro continua o mesmo, a atividade editorial, também. Vão ter de mudar as editoras, as livrarias, as distribuidoras de livros e a indústria gráfica. É bom que comecem a tomar suas providências desde agora. Se há algo certo neste mundo, esse algo é o amanhã. Ele já está a caminho.

A arte no futebol

Que estamos perdendo o senso de humor e caindo em um fundamentalismo ranheta, comprovam-no os comentários da crônica esportiva sobre o segundo gol do Brasil, o de Luiz Fabiano, ontem, contra a Costa do Marfim. Nem mesmo o Paulo Santana, que dá lições diárias de criatividade a todos nós, escapou da cilada do moralismo caboclo, na referência ao gol "escandalosamente ilegítimo" de Luís Fabiano.

Kevin Garside, editor de esportes do jornal inglês Daily Telegraph foi quem escreveu algo à altura do que aconteceu: "Pode ter havido um lance de basquete no segundo gol de [Luís] Fabiano, mas, ora bolas, até quem só consegue apenas pensar em fazer o que ele fez, merece tudo o que conseguiu assim."

Então, o juiz não foi perguntar a Luiz Fabiano se tinha ajeitado a bola com o braço. Estava até sorrindo para lhe dizer algo como: "Eu vi, mas não tive coragem de inutilizar uma obra de arte".

Se não disse, com toda a certeza pensou. Por isso, sorriu.


 


  

Você é livre para escolher – Carlos Brickmann

Democracia é o regime que, entre outras vantagens, nos permite escolher quem serão nossos governantes. Se você não quiser Marina, Serra ou Dilma, pode optar por Levy Fidelix, aquele do Aerotrem, ou Mário de Oliveira, o "Obama brasileiro", ou Plínio de Arruda Sampaio, que começou democrata-cristão, virou petista e hoje é PSOL desde criancinha (mas que nem Heloísa Helena aceita).

Para governador de São Paulo, as opções são ainda maiores. Os candidatos principais são Geraldo Alckmin, que foi derrotado por seu próprio partido nas últimas eleições, e Aloízio Mercadante, aquele que renunciou irrevogavelmente à liderança e revogou a decisão irrevogável assim que Lula mandou revogá-la.

Há muita variedade de escolha: Celso Russomanno, um Maluf que ainda não deu certo, ou Paulo Skaf, o socialista que dirige a Federação das Indústrias (e cujo vice pode ser Marcelinho Carioca, que foi um excelente jogador de futebol e que acaba de ser eliminado na Dança dos Famosos). Skaf vem com Duda Mendonça no comando de sua estratégia. Nos anúncios, começa contando seu nome: "Paulo Skaf, mas pode me chamar de Skaf". Embora faça parte de uma campanha eleitoral, onde essas coisas não são comuns, é um anúncio verdadeiramente verdadeiro: tirando os parentes mais próximos, todos o chamam de Skaf.

Enfim, o que não falta são opções para exercer seu direito democrático de escolha dos governantes. Até Ciro Gomes andou na lista. Mas percebeu que seus aliados petistas o queriam não para ser eleito, mas só para ser queimado.

Do outro lado

Um dos mais vitoriosos marqueteiros do país faz a própria campanha: Chico Santa Rita (que trabalhou na eleição de Quércia e Fleury, e que comandou a campanha pelo presidencialismo) está confirmado para deputado federal, pelo PV paulista. Está na chapa de Fábio Feldmann, uma exceção entre os candidatos ao Governo paulista: tem bom passado, muito conteúdo, mas poucos votos.

Chance perdida

O presidente nacional do PTB, Roberto Jefferson, quer indicar o vice de Serra. Pensa no baiano Benito Gama. Se não fosse o problema regional - o vice não deve ser do mesmo Estado do titular - Jefferson poderia apostar num dos melhores quadros do país: o prefeito de São Caetano, SP, José Auricchio. Auricchio, eleito e reeleito no primeiro turno, tem 88% de aprovação. Mais até do que Lula.

Photo-op

Não se preocupe em analisar as conversas da candidata Dilma Rousseff com políticos europeus: o objetivo da viagem não era esse. O objetivo exclusivo era conseguir photo-opportunities, encontros em que fosse fotografada com gente importante, para mostrar ao eleitorado brasileiro que é conhecida no Exterior.

Chávez contou tudo

Está na entrevista do presidente da Venezuela ao jornal britânico Financial Times: segundo diz, a influência americana na América do Sul se reduziu nos últimos dez anos, e vários países penderam para a esquerda, seguindo a liderança venezuelana. Citou Equador, Paraguai, Argentina, Bolívia e Brasil.

Isso é para tapar a boca de quem diz que Chávez nunca tem razão.

LG, la garantía soy yo

Já há dois blogs reunindo centenas de consumidores prejudicados pela LG: advalexandrers.wordpress.com/denuncias/tv-lcd-lg-defeito-cronico e www.reclameaqui.com.br/346038/lg-electronics/tv-lg-32-time-machine-nao-liga.

Os televisores LG Time Machine LCD de 32 e 42 polegadas têm um problema recorrente que a empresa se nega a corrigir. Depois de pouco tempo de uso, a TV não liga mais. As oficinas autorizadas já sabem do que se trata e nem abrem o aparelho para diagnóstico: se o LED alterna de vermelho para verde e a TV não funciona, recomendam a troca da placa de energia, que custa entre R$ 600 e R$ 750. Recall, para resolver o problema de vez? A LG nem pensa nisso, em gastar dinheiro para manter a imagem da marca. Os consumidores que se lixem.

Capisco?

Edevam Marcomini, arguto leitor desta coluna, está surpreso com a informação de que a esposa do presidente Lula, Mariza Letícia Lula da Silva, obteve cidadania italiana. "Pois é, estou tentando desde 16 de julho de 2003 e até agora, nada. Nem a minha, nem a de dois filhos".

Caro sr. Marcomini: o primeiro-ministro italiano Silvio Berlusconi virá ao Brasil no dia 29, com um grupo de empresários. Fica só um dia, só em São Paulo. Não é com o sr. nem com a imensa fila de pessoas que aguardam a aprovação do pedido de dupla cidadania, que ele vai conversar, nem a quem ele tentará vender produtos italianos. Nem a ela, claro. Mas ter bons contatos é essencial!

Bons frutos

Na notícia sobre a excelente recepção ao dirigente petista Valter Pomar pela Embaixada brasileira em Paris, um trecho passou despercebido. Dizendo que não houve despesa extra em oferecer carro oficial e motorista a quem não ocupa cargo no Governo, o funcionário da Embaixada explicou que o carro está ali mesmo e o motorista fica parado, sem fazer nada. Então, por que está contratado?

domingo, 20 de junho de 2010

O riso das urnas – Jayme Copstein

Criada para moralizar a política no Brasil, a Justiça Eleitoral não só não conseguiu eliminar os gatunos que se organizam em bandos na vida pública como acabou com o que havia de engraçado na época de campanha. Cabe aqui a frase desgastada – já não se faz mais eleição como antigamente.

Que saudades daquele Brasil que não levava nada a sério e ria de tudo, principalmente dos seus políticos. Nesta época de campanha eleitoral, se fosse como antes, já estaríamos todos rindo das gafes e até das atribulações dos candidatos.

Nunca me esqueço, ali nos anos 50 do século passado, de quando Raul Gudolle, recém se iniciando sua vida pública e pagando tributo à inexperiência, candidatou-se a deputado estadual. Mal inspirado por conta própria ou mal aconselhado por algum, marqueteiro incompetente, encheu todos os muros e paredes disponíveis da cidade com apenas seu sobrenome – Gudolle.

Em toda parte que se andasse, estava ali o nome desconhecido, sugerindo mistérios. Por azar, um de seus pichadores pintou o nome em letras garrafais na parede recém-caiada de um bar da Avenida Cristóvão Colombo.

Furioso, o dono do bar não titubeou: embaixo daquele imenso Gudolle, escreveu: "Uma delícia, de gole em gole". E criou um aperitivo com este nome que, dizia ele, fazia muito sucesso entre a freguesia.

Gudolle, com o correr dos anos, teve presença na política e tornou-se advogado de renome. A historinha ficou nos anais da cidade, na boa companhia de Jorge Achutti que durante muitos mandatos, sempre reeleito, exerceu a vereança em Porto Alegre, representando o Bairro Floresta.

Certa vez, teve de enfrentar um concorrente que era de outra parte da cidade. Para realçar a sua condição de habitante do bairro, fez escrever nas paredes: "Achutti! Nasceu na Floresta, se criou na Floresta, vive na Floresta". Para o adversário foi bola picando na área. Seus pichadores escreveram embaixo: "Então, mata que é bicho".

Menos sorte, ainda, teve o dono de uma pequena chácara em Belém Velho, aonde só ia em fins de semana, assim mesmo para comer churrasco. Apesar disso, nunca deixava de apregoar aos quatro ventos a sua condição de "pequeno e sofrido agricultor".

Candidato a deputado, o homenzinho se arvorou em defensor do agronegócio. No único comício que organizou para defender suas ideias, bradou com toda a força dos pulmões: "Eu sou da terra, vivo na terra, não saio da terra!"

Foi quando alguém, no meio dos pouco assistentes, gritou: "Cala a boca, minhoca!". O candidato achou que era demais e decidiu desistir de salva a pátria, voltando aos churrasquinhos de fim de semana.

A Justiça Eleitoral, dificultando a propaganda e proibindo os comícios, não conseguiu terminar com o riso das urnas. Na enxurrada de queixas que recebe diariamente, por esta época, em uma cidade do Interior um candidato denunciou o adversário Toníco Bayer por abuso de poder econômico. Além de grandes painéis que excediam em muito as dimensões permitidas, o tal adversário ainda omitia o nome do partido pelo qual concorria.

O juiz ficou intrigado porque não havia candidato registrado com aquele nome. Resolveu averiguar "in loco" o abuso. Quando chegou ao local, teve de se beliscar para não cair na gargalhada na frente do queixoso: o cartaz de Tonico Bayer não passava de "outdoor" do Tônico Bayer, medicamento muito popular, à venda em qualquer botequim de beira de estrada de qualquer paragem perdida neste imenso Brasil.

Eu sei o que vocês fizeram no século passado – Marli Gonçalves (*)

O que estão deixando atrás de si, além de lantejoulas, papelotes vazios, copos quebrados e roupas exóticas?

Queria poder incluir uma trilha sonora, especial para esses próximos momentos que passaremos juntos a partir de agora, quando você começou a ler o que estou querendo comentar. E eu quero dizer que, na contramão, acho que estamos andando para trás. Veja se não. Qualquer coisa hoje é qualquer coisa!

Revolucionários, quem? Lady Gaga? Britney Spears? Amy Winehouse? Por causa do quê? Estão inventando algo mais do que modas passageiras, vícios comuns, seus próprios fricotes? O que estão deixando atrás de si, além de lantejoulas, papelotes vazios, copos quebrados e roupas exóticas? Figurinhas e fotos nos álbuns das menininhas. Ok, elas são legais, jovens, ricas, excêntricas, algumas até bonitas ou talentosas. Mas elas passam, e passarão, descartáveis, ou como pequenos verbetes da enciclopédia do comportamento humano.

Por outro lado, e nem precisamos atravessar o Atlântico para achá-las, por aqui e lá tivemos mulheres absurdamente fantásticas, inteligentes, astutas, revolucionárias, líderes. E todas - algumas poucas estão vivas, velhas, pouco lembradas - do século passado. Sim, senhor. Sim, senhora! Do século passado.

Sempre tive verdadeiro fascínio pelos Anos 30, 40, 50. Pela arte, pela literatura, pelas loucuras daqueles malucos sobrevivendo ali entre guerras, mulheres e homens, com sua elegância clássica e chapéus e bengalas e piteiras. Criando grandes histórias, já a partir de suas próprias vidas, assinando seu nome de modo único. Política como arte criadora (inclusive de monstros). Drogas, influências libertadoras e criativas transpostas para a arte de forma quase que suicida, de tão viva; doenças, foice na vida de poucos anos de idade já com muitos feitos, entre tuberculoses e a insanidade simplesmente dita.

Tantas! Pagu, Chiquinha Gonzaga, Luz Del Fuego, Carmen Miranda, Maysa, Dolores Duran, Dalva, Ângela, Elza, Leila Diniz, Cacilda Becker, Carolina de Jesus, Lygia Fagundes Telles - alguns exemplos de marcas desse tempo que never more vêm. Você conhece estas pessoas e, mesmo se é jovem, ouve sobre os seus nomes e feitos. Tantos! Você fecha os olhos e vê cores, luz, ouve música, sons de alegria, enxuga lágrimas verdadeiras, se impressiona. Sente o cheiro do bom perfume, passa a mão em tecidos finos, conhece obras de arte.

Falo daqueles tempos que também não vivi, mas que são a origem de tudo, e algo mais profundo, mais intenso, passional. Falo da vida. Falo do que vemos, do que estamos ouvindo, hoje, das histórias que lemos sobre um mundo ficando sem graça, sem tempero, sem cheiro que não o de esgoto.

Tecnologia é maravilhosa, assim como a modernidade, o avanço, o progresso. Não pensem que quero o contrário. Mas sinto que podemos estar nos perdendo em meio à sua intensa rapidez e voracidade. Hoje, pelo chão, ficam corpos tatuados ou implantados. Histórias efêmeras. Nem a tatuagem é mais o que era - atitude, ou raiva. Ou a marca dos deserdados e excluídos da sociedade, dos párias marcados a ferro e fogo. Imagina a pele branca de Isadora Duncan toda marcada?

Imagina algum outro alguém com peito e bunda e coragem para criar uma ilha, um partido e declarar uma filosofia, como Luz Del Fuego? Imagina a beleza de Carmen Miranda, alta nos seus tamancos, cantarolando: "Eu dei! O que foi que você deu, meu bem?". Oh, Billie Holliday, Josephine Baker, Janis Joplin, Edith Piaf, Maria Callas - que falta! Anais Nin, Dorothy Parker, e, por que não? - Adelaide Carraro, Cassandra Rios? Não tem mais Benazir, Indira, Golda, Margareths, Evitas, Dianas, nem Imeldas, nem Cocos, nem bolsas de Soraya ou Farah Diba.


Não meço se fizeram bem, mal, certo ou errado. Só que naqueles momentos que viveram, entre homens, fatos, revoluções, censura, perseguições, fome e preconceitos, foram fontes incansáveis de energia. Para morrer, capricharam. Assassinadas, suicidadas, doentes por amores impossíveis, em meio às suas próprias aventuras, altivas. Algumas divas, mais do que outras, sumiram, tornaram-se transparentes, recolhidas, deixando apenas a existência e suas imagens conservadas nas nossas vidas, como Betty Page, a vedete número 1.

Quantas histórias fascinantes! Falo das mulheres, e é porque sempre foi por nós, mulheres, que dediquei admiração crescente. O outro sexo também hoje está sem graça, e os exemplos para referência seriam tão fortes como a lembrança do requebrado másculo de Elvis, a boca carnuda de Jagger, o peito nu de Robert Plant, os cachinhos de Roger Daltrey em Tommy. Os voleios de Barishnikov, Nureyev. O olhar de paixão de Brando, a beleza mítica de Alain Delon. Os bigodes de Dali, os pincéis de Picasso.

Gostaria de comemorar avanços mais do que fundamentais que conseguimos dia após dia. Mas não vejo por que eu não possa desejar mais de tudo isso. Vejo a foto de Dilma entre os homens do Presidente, e não a vejo se destacando entre eles, a não ser pela empáfia. Vejo lindas atrizes, coitadinhas, chegando para contracenar com Fernanda Montenegro, Marília Pera, Cleide Yáconis. Lindas continuam, salvo raras exceções, ofuscadas pelo verdadeiro talento. Vejo Danielas, Ivetes, Claúdias em todos os lugares. Mas foi Rita Lee a ovelha negra. E é Hebe Camargo quem pilota o sofá tentando se manter em algum horário, guardando sua biografia de ouro.

São Paulo, 52 anos depois de 1958, quando abri os olhos e comecei a contagem.

(*)
Marli Gonçalves, jornalista. Na torcida por um Brasil, campeão de gente boa, terra de pessoas admiradas por seus talentos. Não podemos nos contentar com qualquer coisa. Devemos exigir o melhor.

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Lula e a Previdência – Jayme Copstein

Depois de algum suspense, o Presidente Lula sancionou o reajuste de 7,7% para benefícios com valor acima de um salário mínimo e vetou a abolição do Fator Previdenciário, mecanismo criado pelo Governo FHC para evitar aposentadorias precoces.

O Presidente andou certo e mostrou coragem nas duas decisões, enfrentando os estrilos dos ministros da área econômica e dos líderes sindicais. O reajuste dos 7,7% é uma questão de justiça, apesar de não repor o total das perdas de segurados e pensionistas: só este ano a inflação já anda pelos 5%; os 2,7% excedentes não cobrem o que lhes tem sido surripiado há quase duas décadas.

O veto à extinção do Fator Previdenciário impede que o Brasil repita o Uruguai dos anos 50 e 60 do século passado, quando as benemerências o transformaram em um pais de "jubilados" e faliram o tesouro. Com as políticas públicas de prevenção e universalização da assistência médica, somadas à exigência de normas e aperfeiçoamento das normas de higiene do trabalho, a expectativa de vida mais que duplicou, desde que a Previdência Social foi criada no Brasil Não há como manter o sistema sem um limite mínimo de idade para a concessão desses benefícios.

Enquanto tal limite não for definido, o Fator Previdenciário ameniza o rombo que as aposentadorias precoces produzem. O Presidente Luiz Inácio da Silva, há tempo, manifestou receptividade ao mínimo de 65 anos para os homens, 60 anos para as mulheres. O problema, porém, é a resistência de quem acha que, por ser brasileiro, já deve nascer aposentado. Para romper as barreira é preciso mais coragem ainda. Lula tem até dezembro para demonstrá-la.

Os profetas da redonda

O assunto é Copa do Mundo, dele não há como fugir. O mais notável, porém, são jornalistas esportivos do Centro do País, travestidos de Nostradamus da pelota, que depois ficam torcendo pela profecia, em vez de simplesmente narrar o jogo.

Há, também, ex-jogadores posando de "comentaristas", muito parecidos com Delfim Neto e Bresser Pereira, recordistas de inflação nos tempos do regime militar ou na desgovernança de Zé Sarney, hoje dando lições de como conduzir a economia.

Exceto Falcão, que já teria sido jornalista se o talento não o tivesse impelido antes aos gramados, os demais sabem tudo, até o melhor dedo para marcar gol... no microfone. Poderiam eles responder a mesma pergunta que se coloca a Delfim Neto e a Bresser Pereira: por que não fizeram quando eram os donos da bola? O Brasil seria o país mais rico do mundo. Ou teria ganho todas as Copas Jules Rimet. Ou tudo ao mesmo tempo.


Bernardo de Souza

Em abril, quem foi à Assembleia Legislativa para o lançamento de "A palavra como instrumento de justiça", documentando os dez anos de mandato de Bernardo de Souza, já adivinhava a despedida. Os sintomas da doença eram por demais devastadores para alimentar esperanças de tê-lo conosco por muito mais tempo.

Bernardo de Souza faleceu anteontem. Diante do irremediável, resta o consolo de ter recebido em vida o reconhecimento pela contribuição maiúscula à vida pública rio-grandense.

Ditos e achados

Lin Yutand, em "Com a mor e ironia": "As mulheres vivem a vida, ao passo que os homens falam a respeito desta. Elas entendem os homens, ao passo que os homens nunca entendem as mulheres. Enquanto os homens passam a vida fumando ou caçando ou inventando ou compondo música, elas têm filhos e cuidam deles, e isso é uma grande coisa."

quarta-feira, 16 de junho de 2010

De Durban a Tel Aviv – Jayme Copstein

Converso com Nahum Sirotsky, que há muitos anos vive em Israel e é correspondente do jornal "Zero Hora", de Porto Alegre, e do portal Último Segundo, do Centro do País. Nahum tem em seu extenso currículo desde passagens por jornais importantes do mundo, como "The New York Times" à criação de "Senhor", sem dúvida alguma a melhor revista cultural que já se fez no Brasil.

Se eu tivesse de descrever o que há de melhor nele como jornalista, começaria, é claro, pelo talento específico, do qual fazem parte a curiosidade insaciável e a "antena" ou "faro" para perceber os desvãos dos fatos onde a notícia se esconde. Agregaria, também, relações com profissionais da diplomacia que sabem, com meses de antecedência, alguma vezes até anos, o rumo que os acontecimentos estão tomando.

Mas conversava com Nahum, ontem de manhã, seis horas de diferença no fuso horário, ele em Tel Aviv, eu no Bairro Petrópólis, graças ao milagre da Internet. E falamos sobre a Copa do Mundo, se o Michel chutou aquela bola para fazer o gol ou se apenas quis passar e, de "chiripa", acabou marcando. Falei-lhe sobre o "cacete" que a revista alemã "Der Spiegel" está descendo sobre a cabeça de Joseph Sepp Blatter, o presidente da Fifa.

Blatter tem procurado passar imagem de Madre Tereza de Calcutá do Futebol e mostrar seu amor pela África, trazendo a realização da Jules Rimet para a República Sul-Africana, decisão que o Presidente Jaco Zuma qualificou de "voto de confiança da comunidade internacional". A reportagem de "Der Spiegel" publica também o outro lado, o das críticas que acusam Blatter DCE ser um oportunista e de ter modificado as normas para favorecer cumprir promessas eleitorais aos africanos, cujos votos o conduziram e o mantêm na Presidência da Fifa desde 1998.

Nahum me chama a atenção que a Copa desviou o foco do noticiário, dos acontecimentos do Oriente Médio onde prosseguem os desdobramentos. Escapou de todos uma pequena nota, dando conta que o Auditor Geral de Israel, Micha Lindenstrauss, decidiu examinar as ações do Governo para impedir a flotilha de suposta ajuda humanitária de chegar a Gaza, e que isso pode resultar na queda do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu pelas trágicas consequências do episódio.

O Auditor Geral de Israel, eleito por sete anos, é independente, só deve satisfações ao Knesset (Parlamento) e tem poderes para analisar qualquer ato do Governo, apurando se foram executados segundo os princípios da ética e da eficiência. Micha Lindenstrauss, no cargo desde 2005, após ter sido Presidente da Corte Suprema, deve decidir se as decisões de Netanyahu e do ministro da Defesa, Ehud Barak, por sinal o mais condecorado militar da historia de Israel, estiveram ou não de acordo com aqueles princípios.

Há precedentes, como o de 1973, quando Golda Meir, pioneira e até agora a primeira e única mulher a governar o país, e Mosche Dayan, o do tapa-olho, o maior herói militar da moderna história israelense, foram responsabilizados, por imprevisão, pelas dificuldades na defesa contra o ataque egípcio. Golda e Dayan perderam prestígio, os cargos (ele era Ministro da Defesa) e foram para casa e para o esquecimento.

O mesmo pode acontecer com Netanyahu e Barak.

Informe-se e não se informe – Carlos Brickmann

Durante muito tempo, este colunista acreditou que o noticiário esportivo era o menos sujeito a erros. Os repórteres entendem do assunto e o acompanham por prazer, mesmo quando não estão trabalhando. Mas veja só: está na imprensa que o meia Zé Roberto, 35 anos, ex-Seleção brasileira, hoje na Alemanha, está sendo convidado para voltar ao Brasil. Segue-se a frase fatal: "Corinthians e Santos são os clubes do Rio de Janeiro interessados no jogador".

Dá para imaginar que até os três principais candidatos à Presidência, que confundem o Pato com o Ganso, tenham alguma noção das cidades que abrigam alguns dos maiores times do país. Dá para imaginar também o que é que aconteceu: a notícia deve ter saído em algum noticioso internacional, daqueles que se referem ao time brasileiro como "Seleção carioca". Traduzido o texto no tapa, qualquer time brasileiro vai parar no Rio.

E o pior é que essas coisas não acontecem só no Brasil. Na TV americana, aparece a África do Sul lá no Norte da América do Sul. Já fazem até piada com isso: "Não se surpreendam se os americanos não encontrarem o caminho para a Copa". O pior é que o país-sede da Copa tem nome vinculado diretamente à localização geográfica. Como é que, mesmo assim, os gringos conseguem errar?

Sem problemas: não faz muito tempo, o Governo paulista distribuiu livros de geografia com mapas em que havia dois Paraguais, um deles dentro da Bolívia (o que implicaria, imagine! a presença de dois pais da Pátria como o presidente Lugo). O outro Paraguai ficava no lugar do Uruguai, que em compensação ficava onde deveria estar o Paraguai, o de verdade. Talvez para compensar a falha, o mapa omitia o Equador, garantindo a estabilidade do número de países do continente. E livro deveria ser mais imune a erros do que jornal ou notícia de TV: há tempo disponível para a revisão. Mas revisão dá trabalho e trabalho cansa.

E pensar que houve tempo em que a gente lia para se ilustrar!

Viagens? Esqueça!

E não pense também no velho provérbio segundo o qual as viagens ilustram. Tem gente que viaja o tempo todo e ilustrado é exatamente o que não ficou.

A demanda pelo erro

Mas, citando o gênio Chico Buarque, deixa a festa acabar, deixa o barco correr, deixa o dia raiar. Está cheio de gente na praça que não quer saber se a informação é correta: só se interessa em descobrir se pode ser bem explorada politicamente.

Há coisas notáveis: Dilma Rousseff nos Estados Unidos, passeando com Marta Suplicy, indo à entrega de um prêmio a Henrique Meirelles, e milhares de e-mails garantindo que ela não pode entrar nos Estados Unidos, por ter participado do sequestro do embaixador americano no Brasil e ter sido condenada.

Bom, Dilma deve ter um monte de defeitos, talvez tenha seus esqueletos no armário, mas não participou do sequestro do embaixador americano. Não há processo nenhum contra ela nos Estados Unidos. E o fato é que ela estava lá, sem que ninguém a incomodasse - mas o boato continuou circulando.

É como o tal livro proibido, que de proibido não tem nada: apenas foi recusado por duas editoras e o autor preferiu colocá-lo na Internet. É como a análise segundo a qual as inundações que houve em São Paulo foram culpa do Governo e da Prefeitura, mas as do Rio tinham a ver apenas com São Pedro e a fatalidade, jamais com a inoperância das autoridades locais.

É como a demissão de Alexandre Garcia, que continua na Globo, que apresenta os jornais mais importantes da rede, mas não faz mal: segundo os boatos, foi demitido por causa da censura.

Para que buscar informação correta, se boa parte dos consumidores de informação está ávida pela notícia falsa, mas que pode render exploração eleitoral?

Nem novela escapa

E há uma história deliciosa de novela e de análise jornalística da novela. O personagem vivido pelo ator Cauã Reymond em Passione vai de bicicleta da avenida Paulista ao Parque Ibirapuera (que ficam a não mais de três quilômetros de distância) seguindo uma rota estranhíssima, que o leva à avenida Marginal do rio Pinheiros e à ponte estaiada. É mais ou menos como ir de Minas à Bahia passando por Goiás e Tocantins. Aí vem a análise jornalística, informando que o personagem, para fazer o percurso de três quilômetros ou pouco mais, acaba pedalando 26 km.

Não é bem assim: somando tudo, como fez o leitor Luciano Mello, dá 21 km. Mas jornalista, como sabemos, odeia fazer contas.

Será que ele é?

Escândalo na Argentina: Martín Redrado, ex-presidente do Banco Central, entrou com ação contra a jornalista Agustina Kamfer, que o chamou de gay num programa de TV. Agustina perdeu o emprego, já que a emissora considerou que ela tratara Redrado de forma discriminatória; ela alega que não o discriminou, e que não dá a menor importância à sua sexualidade (então, por que foi buscar o tema?)

O detalhe mais interessante vem agora: diz a France-Presse que a jornalista é namorada de Amado Boudou, ministro da Economia da Argentina e antigo adversário de Martín Redrado.

É briga boa. Martín Redrado é aquele presidente do Banco Central que se recusou a obedecer a ordens da presidente Cristina Kirchner e rejeitou também a ordem de demissão, já que tinha mandato por tempo fixo. Como demonstrou, não tem medo de cara feia.

Ele volta

Sílvio Luiz, um dos mais experientes apresentadores esportivos do país, acaba de deixar a Bandsports: como não fez parte da equipe que foi à África do Sul, considerou-se desprestigiado e foi embora. Silvio havia sido demitido de duas outras empresas do grupo, em 2007 e 2008; e tem a certeza de que, se não saísse, seria demitido mais uma vez.

Este colunista já viu Silvio Luiz subir e descer várias vezes; e ele sempre voltou bem, com prestígio e audiência. Já o viu como repórter de campo, como juiz de futebol, como comentarista, como locutor, como apresentador; sempre teve um público fiel, que o apoia onde quer que esteja. Por enquanto, fica na RedeTV!, transmitindo o Campeonato Brasileiro da Série B.

E o Morumbi?

A informação varia conforme o repórter, conforme o jornal, conforme o blog, conforme o programa de TV: quais as possibilidades de o Estádio Cícero Pompeu de Toledo receber a abertura da Copa de 1914 (ou, pelo menos, alguma partida importante)?

O Morumbi foi afastado, o Morumbi está nos planos, não há Plano B, há Plano B - em resumo, o que não há é um trabalho de reportagem que busque rastrear os fatos. Existe apenas um ou outro repórter que transcreve o que lhe diz sua fonte - uma fonte não raro interessada em divulgar determinado tipo de informação. E há algumas informações que poderiam ser obtidas (e cobradas);

1 - a Prefeitura paulistana não investirá, em hipótese alguma, num estádio particular? Ou, em certas circunstâncias, pode investir? Quais seriam essas circunstâncias?

2 - a Prefeitura paulistana tem ou não tem planos de construir um novo estádio em São Paulo? Em caso positivo, haverá tempo para que fique pronto até 1914?

3 - o São Paulo, proprietário do estádio, informou que não teria dificuldades para levantar com a iniciativa privada e a obtenção de empréstimos o dinheiro necessário à reforma do Morumbi. A informação está mantida? Há quem diga que, tamanhas as exigências da FIFA, o custo se multiplicou de tal maneira que não há mais condições de levantar dinheiro privado em quantidade suficiente.

5 - Caso haja necessidade de realizar obras de infraestrutura, haverá movimento suficiente, fora da Copa, para torná-las economicamente viáveis?

Dá para começar por aí. Sem isso, o consumidor de notícias e os repórteres estarão permanentemente reféns de fontes que nem sempre se revelarão, mais tarde, as mais confiáveis.

O suposto incesto

O cavalheiro é preso em flagrante, mantendo a filha e os filhos que ela teve em cárcere privado, sujeitos a maus-tratos. Confessa o crime de incesto e admite que é o pai de pelo menos três dos filhos que a moça teve (segundo ela, os sete filhos são dele). Preso em flagrante, réu confesso, sem demonstrar qualquer arrependimento, admite tranquilamente que começou a manter relações sexuais forçadas com a filha quando ela mal completara os 12 anos de idade; e os meios de comunicação o tratam como "suspeito".

Tudo bem, ele só será considerado criminoso depois de julgado e condenado. Mas os atos que cometeu foram cometidos; a Justiça só dirá se configuram crime. Mas ele não é suspeito de incesto, não: ele cometeu o incesto. A filha e os filhos que ela teve viviam mal, em cárcere privado - e isso não é suspeita, é fato.

É um avanço que os meios de comunicação já não tratem pessoas ainda não julgadas como criminosas, ou monstros, ou bruxas (embora, como no caso da procuradora acusada de espancar a menina que queria adotar, tenha abandonado a contenção, e precisamos admitir que era dificílimo mantê-la naquele caso). Mas também não é para fingir que não se sabe se o cavalheiro fez alguma coisa.

Um exemplo: o jornalista Pimenta Neves matou a namorada a tiros. A Justiça decide se cometeu crime ou se houve circunstâncias pelas quais não houve crime. Mas ele não é o "suposto" matador. Ele matou e disse que matou.

Um atento leitor desta coluna, Henrique Galinkin, lembra que boa parte dos meios de comunicação usa essa terminologia esquisita por medo de processo. Mas teme o dia em que o Fluminense ganhe de 6x0 do Flamengo e a imprensa noticie uma "suposta goleada".

Como...

De um grande jornal:

" Cristiano Ronaldo foi acionado 15 vezes, acertou dez dos nove passes que tentou (...) "

Isso é que é craque: acerta até os passes que nem deu.

...é...

Da Internet:

"Faculdade paga R$ 61 para homem ser cobaia de exame de próstata"

É a primeira vez em que pagam a alguém que será beneficiado pela inclusão digital.

...mesmo?

De um grande portal noticioso:

"Americano é preso após mostrar o pênis durante festa de casamento"

Questão de timing. Normalmente se espera a saída dos convidados.

Mundo, mundo

Da Internet:

" Mulher vai presa ao telefonar cinco vezes para polícia pedindo marido "

Coisa de americano. Aqui, uma mulher muito bonita, muito famosa, demorou pouquíssimo tempo até conseguir um atlético bombeiro para chamar de seu.

Vasto mundo

A Christie's, uma das mais famosas casas de leilões da Inglaterra, vendeu um conjunto para matar vampiros, composto de estacas de madeira, crucifixo e frascos de água benta (pelo jeito, ficaram faltando os dentes de alho e a bala de prata, além do espelho para comprovar se o vampiro é ou não autêntico).

Ainda bem que isso ocorreu na Inglaterra: não é para ser chato, mas aqui há candidatos a cargos importantíssimos cujo reflexo certamente não vai aparecer num espelho. E pelo menos um deles de-tes-ta alho.

E eu com isso?

Houve época, caro colega, em que um tornozelo descoberto, como se fosse Helena de Tróia, lançava mil navios ao mar. Está na música, aliás: "a sombra de um torturante band-aid no calcanhar". As saias subiram, a fugaz visão de uma calcinha virou um troféu. Mas as calcinhas sumiram. De Sharon Stone em Instinto Selvagem até as cantoras americanas em que o álcool libera seus selvagens instintos, calcinha passou a ser uma roupa, algo que mais atrapalha a visão do que funciona, à maneira de antigamente, como um excitante visual.

E pensar que ainda tem gente interessada em calcinhas!

1 - Jennifer Lopez cruza pernas e mostra calcinha em evento

Relembre cantoras que deixaram suas calcinhas à mostra em shows

Tem gente que não se contenta com pouco:

3 - Professora é presa após mandar fotos em que aparece nua para aluno.

E as intimidades vão sendo divulgadas:

4 - Russa quer indenização por danificar silicone durante turbulência em voo

A passageira alega, provavelmente com razão, que a distância entre os bancos era minúscula, e ela acabou batendo o seio turbinado no encosto da frente.

5 - Luan Santana acha normal "pegar fã" e conta que não abre mão de sexo.

Andaram falando coisas do rapaz - se bem que o título da Internet ofereça muita amplitude de interpretação.

6 - Chineses fazem competição de beijo em posição esquisita

Certa vez, uma redação parou para descobrir o que era "beijo grego", oferecido num anúncio daqueles colados em postes. Agora vem o beijo chinês. O problema é o prêmio minúsculo: para o vencedor, o equivalente a R$ 240,00.


7 - Casal inglês é flagrado namorando no jardim pelo Google Street View

8 - Inglesa vende leite materno para "marmanjos"

E há o frufru propriamente dito:

9 - Cachorrinha de Mariah Carey dá à luz uma fêmea

10 - Ozzy Osbourne quer doar seu corpo para a Ciência

O grande título

Há para todos os gostos, até mesmo do tipo piada pronta:

Lindsay Lohan participa de aula sobre alcoolismo

Como se precisasse de aula!

Há o título que, nas mentes mal-formadas, despertará a malícia:

Regina Duarte aprende a descascar milho antes de novela

Há dois bons exemplos de coisas inusitadas:

Polícia divulga foto de raposa suspeita de ataque a gêmeas

A tal foto é um reflexo na vidraça da casa. Pode ser aquela raposa, pode ser outra. E, se for aquela, como distingui-la de alguma outra?

Freiras são presas por plantar maconha no quintal de convento

Alegam que a plantação se destinava a alimentar animais. Veja só o caro colega: os bichinhos detestavam capim e alfafa!

E há um título absolutamente fantástico:

Garoto perde parte do testículo depois de campeonato de tapas no colégio

Aconteceu no Estado americano de Minnesota, onde, por algum motivo estranho, dar tapas nos testículos dos outros virou moda entre estudantes. Como se diria por aqui, pura boiolagem. E boiolagem perigosa.

terça-feira, 15 de junho de 2010

Mas pode me chamar de Dilma – Carlos Brickmann


 

Do jornalista Alon Feuerwerker: "Da série O Acre não existe: os quatro diários do Estado deixam de circular na quarta por causa do jogo da Seleção na terça".

Há muitas variações possíveis:
1 - Meu nome é Felipe Melo, mas pode me chamar de Dunga;
2 - Meu nome é Dunga, mas pode me chamar de Zangado ou de Mestre. E não se atreva a me chamar de Feliz;
3 - Meu nome é Dilma, mas pode me chamar de Norma Bengell;
4 - Meu nome é Dilma Bengell, mas meu novo cabeleireiro disse que pode me chamar de Carolina Herrera;
5 - Meu nome é Jabulani, mas pode me chamar de desculpa de frangueiro;
6 - Meu nome é Mercadante, se o legalmente irrevogável registro de nascimento em cartório não foi revogado;
7 - Meu nome é Aécio, mas meus companheiros de partido adorariam me chamar de Messias;
8 - Meu nome é Sarney, mas se tiver algum cargo pode me chamar do nome que quiser que eu atendo;
9 - Meu nome é senador Suplicy da Renda Mínima, e será que alguém faria a gentileza de me chamar para alguma coisa?
10 - Meu nome é Alckmin, mas pode me chamar de Geraldo, ou Geraldinho, ou Geraldo Alckmin, eu digo assim que decidirem como vou ser conhecido;
11 - Meu nome é Sérgio Guerra, mas pode me chamar de vice, ou de senador, ou de deputado, ou sei lá, que algum lugar eu ainda pego.
Mamãe Noela
Imagine agora Sua Excelência, o presidente Lula, na TV, dizendo algo como "cumpanhêro, meu nome é Dilma". Dilma já tem maquiadora pessoal, o mesmo cabeleireiro de Marta Suplicy, personal stylist - e tudo para ouvir um cavalheiro barrigudinho de barbas brancas, a cara de Papai Noel, dizer que é ela!
Irma Vap
Já o adversário de Dilma, José Serra, tem um perfeito clone visual, o dr. Dráuzio Varela, e um clone espiritual, Michel Temer - ambos seriam rivais de Boris Karloff em qualquer filme de terror. Mas Temer não pode dizer que seu nome é Serra. Ele está na outra chapa.
Tuminhas e Tumão
O cartão vermelho que o Governo aplicou ao secretário nacional de Justiça, Romeu Tuma Jr., resolveu um problema sério do senador Romeu Tuma: o PTB, ao qual está filiado, vai com Serra (e o PTB paulista, sob o comando do deputado Campos Machado, é Serra e Alckmin de porteira fechada). Com a queda de Tuma Jr., fica mais fácil para Tuma pai seguir a orientação do partido. Resta apenas um obstáculo, e grande, para que Tuma pai volte a ser petebista desde criancinha: outro filho seu, Robson, está no Governo Federal, como diretor de Planejamento Corporativo da Liquigás. É um belíssimo cargo.
O sentido das coisas
A pressão sobre Aécio Neves para que aceitasse ser vice de José Serra não tinha nada a ver com votos que pudesse atrair (ninguém vota em vice), nem com uma eventual tentativa de agradar os mineiros (que há oito anos ocupam a vice, com José Alencar). O objetivo era outro: garantir que Aécio se empenhasse de verdade na campanha (o que não fez em eleições anteriores), sob pena de ficar sem cargo. Aécio rejeitou a vice, jurou fidelidade ao partido, mas está preocupado mesmo com sua própria candidatura ao Senado e com a de Alberto Anastasia a governador. Ainda não se moveu nem para impedir que os prefeitos do PSDB, fascinados pela caneta amiga do Governo Federal, façam campanha por Dilma.
Meninos, não vi
Informação publicada em
http://twitter.com/AlonFe, do jornalista Alon Feuerwerker: "Da série O Acre não existe: os quatro diários do Estado deixam de circular na quarta por causa do jogo da Seleção na terça".
Roskoff ...
A Cereser (aquela da sidra) desmente a notícia desta coluna de que mudou a marca de sua vodca Roskoff para Kadov depois que o jornalista Cláudio Tognolli apelidou a candidata petista de Dilma Roskoff. Roskoff era a marca de um relógio redondo, que se chamava de "cebolão", de qualidade discutível, e cujo formato o transformou em sinônimo de uma parte do corpo que não se mencionava na frente de senhoras. Aqui, o desmentido:
"A Cereser esclarece que a marca da vodca Roskoff não foi mudada para Kadov, conforme erroneamente informado na nota "A marca que marca", publicada no dia 13 de junho. A marca Roskoff está no mercado desde 1980, inclusive ainda é a campeã de exportações da Cereser. E a vodca Kadov foi lançada no ano passado, ampliando portfólio de produtos da empresa nessa categoria de bebida, considerada uma das principais do país."
...na mira
Para conferir notícia e desmentido, passe no seu supermercado ou no seu bar e peça vodca Roskoff. Não vai achar: Roskoff ainda existe nos grotões, onde os estoques não foram gastos. Mas a marca que a Cereser hoje usa é Kadov.

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Mulheres na política – Jayme Copstein

Leitores que gostaram da coluna de ontem ("As mulheres da República Imperial") me pedem que conte mais a respeito das mulheres na política brasileira. Confesso que não sou especialista no assunto, apenas tenho algumas anotações em cadernos, cadernetas, agenda, blocos, bloquinhos e fichas soltas, que teimam em se esconder quando delas preciso, mas surgem lampeiras quando estou pesquisando coisa completamente diferente, como, por exemplo, o consumo de sorvete pelos esquimós.

Por sorte, nos últimos 25 anos, boa parte de tais notas foram recolhidas ao computador e elas me informam que a primeira líder feminista brasileira foi Nísia Floresta Brasileira Augusta. Nascida em 1810 no Rio Grande do Norte, com apenas 22 anos publicou "Direitos das mulheres e injustiças dos homens", exigindo o reconhecimento de que as mulheres também eram seres inteligentes e mereciam respeito. Nísia tocou na raiz de todos os preconceitos e desigualdades: a falta de instrução das vítimas, por isso mesmo presas fáceis dos mais sabidos. No caso das mulheres, o acesso a dois únicos direitos – aquecer a barriga no fogão e resfriá-la no tanque de lavar roupa – as tornava meras incubadeiras. As mais abonados, conseguiam acrescentar à sua educação o crochê, o tricô, o bordado e o piano.

Nísia viveu no Recife, em Porto Alegre e no Rio de Janeiro, antes de ir embora para a Europa onde morreu em 1885, muito tempo antes de a primeira mulher eleger-se para um mandato político no Brasil. Chamava-se Alzira Soriano, era também nascida no Rio Grande do Norte, como Nísia, e elegeu-se intendente (prefeita) do município potiguara de Lages, em 1928.

Como este é um país de maledicências, correram rumores de que a eleição de Alzira Soriano,cujo nome completo era Luiza Alzira Soriano Teixeira, não representou um passo adiante na emancipação política da mulher brasileira. Dizem que houve uma briga de coronéis em Lages e que um deles, Miguel Teixeira, o pai de Alzira, decidiu humilhar o desafeto, fazendo-o perder até para uma mulher. Só que, precavido, para manter o poder, cuidou que a mulher fosse sua filha.

Na época as mulheres não tinham direito de votar no Brasil, logo também não podiam ser votadas, não porque a Constituição proibisse expressamente, mas por equipará-las aos menores de idade e aos índios, considerando-as juridicamente incapazes. Nada podiam fazer sem a tutela do marido, do pai ou de parente homem.

A eleição de Alzira Soriano deveu-se, por linha travessas, a uma proeza jurídica da advogada mineira Mieta Santiago que, em 1928, argumentando com a falta da proibição expressa na Constituição, obteve na Justiça do seu Estado o direito de votar nas eleições municipais e estaduais de 1928. Com base nesta decisão, o Partido Republicano dso Rio Grande do Norte conseguiu ir mais adiante e pode candidatar Alzira. A vitória nas urnas foi fácil porque além do poderoso cacique que era seu pai, teve também o apoio do governador Juvenal Lamartine.

O mandato de Alzira Soriano durou pouco. Foi cassado dois anos depois pela Revolução de 1930. Ela retornou Política com a redemocratização de 1945, elegendo-se vereadora pela UDN, de oposição a Getúlio Vargas, em 1947, rendo reeleita mais duas vezes antes de falecer em 1963.

O ovo que a galinha ainda vai botar – Carlos Brickmann

Era uma vez uma menina que, pela primeira vez, ordenhou sua vaquinha. Andava toda contente, com o balde de leite nas mãos, pensando no futuro. Ia vender o leite e, com o dinheiro, comprar uma galinha. A galinha ia botar ovos, ela venderia os ovos e, com o dinheiro, compraria outra vaquinha. A produção de leite ia aumentar, e em pouco tempo ela teria dinheiro para comprar uma casa, uma granja... Mas, lembrando o poeta Drummond, tinha uma pedra no meio do caminho. A menina tropeçou, derramou o leite e se desfez seu sonho de riqueza.

Suas Excelências, no Executivo e no Congresso, passaram da idade de ouvir e entender as fábulas. Já dividiram os lucros do petróleo do pré-sal. Há até quem brigue querendo mais. Só que o petróleo não está nem no balde: está no fundo do mar, bem longe, mais fundo do que o mar do Golfo do México; e, quando se chega lá embaixo, há ainda a rocha e uma grossa camada de sal meio derretido, de perfuração altamente complexa, de extração brutalmente cara.
Deve dar tudo certo: a Petrobras é uma empresa competente, de ótima reputação, e o preço do petróleo, neste momento, compensa o custo da extração. Mas, mesmo dando tudo certo, sem qualquer imprevisto, é coisa para o futuro, para daqui a alguns anos. Talvez até lá já exista um carro elétrico viável; talvez até lá já se domine a fusão do hidrogênio a frio. O petróleo continuará sendo útil e necessário, mas seu preço compensará? Nas boas granjas, recomenda-se que os ovos sejam colhidos só depois de botados. Ninguém cocorica antes da hora.

Dilma quem?

O PDT enviou informação à imprensa sobre a convenção que apoiaria a candidatura de Dilma Rousseff à Presidência da República. Na nota, a candidata é tratada por três nomes diferentes: Dilma Roseff, Dilma Roussef e até mesmo pela versão correta, Dilma Rousseff. Ufa! Ou seria "Uffa"?
Ah, sim: por favor, não desmintam. O e-mail original está guardadinho.

A marca que marca

A melhor história de nomes destas eleições aconteceu com a vodca Roskoff, produzida pela Cereser (aquela mesmo, a da sidra). Roskoff era a marca de um relógio redondo, de qualidade discutível, que foi muito vendido no Interior paulista (e até hoje, em certas áreas, o nome funciona como sinônimo de uma parte do corpo não mencionável perto de senhoras distintas e crianças). Tão logo o jornalista Cláudio Tognolli, no http://twitter.com/claudiotognolli, apelidou a candidata de Dilma Roskoff, a marca da vodca foi mudada: agora é Kadov.

Pesos e medidas

A Justiça Eleitoral do Tocantins decidiu abrir processo contra o técnico Vanderlei Luxemburgo, do Atlético Mineiro, por "inscrição fraudulenta de eleitor". Luxemburgo pretendia candidatar-se ao Senado por Tocantins, mas não conseguiu "comprovar residência na cidade por pelo menos três meses, como determina a lei". Tudo bem: na época em que fez o pedido, Luxemburgo morava em São Paulo e hoje mora em Belo Horizonte. Mas José Sarney, que se elegeu pelo Amapá, também não chega a ser um assíduo frequentador do Estado. Até as areias da praia de Curupu sabem que ele vive entre Maranhão e Brasília. Ciro Gomes tem domicílio eleitoral em São Paulo, onde não mora: ou está em Brasília ou no Ceará. Por que Vanderlei Luxemburgo não pode o que outros podem?

Restos da ditadura

A propósito, o domicílio eleitoral foi inventado pela ditadura, para impedir a candidatura do marechal Lott ao Governo do Rio. Por algum motivo, o entulho autoritário sobreviveu. Antes disso, o Rio de Janeiro sempre se orgulhou de buscar políticos notáveis em outros Estados e elegê-los, como o mineiro Affonso Arinos e o baiano Nelson Carneiro (ambos, diga-se, retribuíram com conduta exemplar a acolhida que tiveram). Qual é o problema, se são todos brasileiros?

Tudo explicado

Agora dá para saber por que, em oito anos de Governo, o presidente Lula não confiou a Aloizio Mercadante nenhum cargo em sua área, a Economia: é que Mercadante gosta de chateá-lo. Por exemplo, o senador (e candidato ao Governo paulista pelo PT) dá hoje um livro ao presidente. A obra é "Brasil: a Construção Retomada - análise do Governo Lula". Mercadante anteriormente já tinha chateado Lula, ao pedir-lhe que escrevesse o prefácio do livro. Outro professor de Economia que jamais recebeu um cargo de Lula foi o senador Eduardo Suplicy. Deve, sem dúvida, ter dado ao presidente seu livro sobre Renda Mínima.

Fala que te escutam

Nível da campanha: um jornalista ligou para um amigo, que trabalha para um candidato à Presidência, para bater papo. A folhas tantas, o homem da campanha perguntou ao amigo: "Você está gravando?" Não, não estava. Era tudo conversa fiada. Mas o campanheiro disse que ele, sim, estava gravando o amigo.

Lula cá

O primeiro-ministro italiano, Silvio Berlusconi, deve vir ao Brasil no dia 29, para um encontro com o presidente Lula. Verá também uma das mais novas cidadãs italianas: a primeira-dama Mariza Letícia, que obteve dupla nacionalidade.

Israel nega passagem a navios do Irã - Nahum Sirotsky, de Tel Aviv (*)

Um diplomata israelense, que pediu para não ser identificado, declarou que não será permitido a navios iranianos romper o bloqueio naval a Gaza. É resposta considerada oficial á ameaça do Irã, de deve enviar seus navios dentro em breve.

Informa-se que um navio-hospital também está preparado transportando médicos, enfermeiros e equipamento para cirurgias de emergência.

Os israelenses disseram que, se não permitiram a passagem de navios da Irlanda, "claro que não abriremos exceção para os iranianos.".

A carga iraniana seria enviada pelo organização "Crescente Vermelho", equivalente à Cruz Vermelha. O caso do Irã é mais especial pois afirma-se que arma o Hamas. O Movimento Islâmico de Resistência é inimigo declarado de Israel, cuja destruição é parte de seu programa .

O diplomata israelense lembrou que cargas iranianas são preocupantes por definição. O bloqueio a Gaza por todos os meios já completou três anos. E quatro anos, a detenção do soldado israelense Shalit, sobre cuja libertação já foram tentadas varias negociações para um preço a ser pago pelos israelenses. Não se chegou a acordo.

Gaza antiquíssima, a cidade do maior templo dos filisteus, é o centro do mito de Dalila que se casou com Sansão, gigante invencível, cuja força estava no comprimento dos cabelos, cortados traiçoeiramente por sua mulher.

Sansão foi aprisionado, torturado e cegado. Mas preso a uma coluna sentiu a volta de suas forças durante um festival da liderança filisteia. Ele derrubou a coluna, fazendo desabar o templo, e morreu com seus inimigos.

É imprevisível o que acontecerá, quando a marinha de Israel impedir a passagem dos navios iranianios , seus maiores inimigos no Oriente Médio.

[I](*) Nahum Sirotsky é correspondente de Zero Hora no Oriente Médio e colunista do portal "Último Segundo". [/I]


 

domingo, 13 de junho de 2010

As mulheres da República Imperial – Jayme Copstein

Uma das "curiosidades" apontadas nesta campanha de 2010 é a presença de uma mulher, a primeira na história brasileira, com reais possibilidades de se eleger presidente da República – Dilma Rousseff.

Confesso a vocês, cético como sou, que não vejo realmente as coisas assim. Não vejo Dilma como um ser político emancipado, capaz, como mulher, de liderar uma corrente política, como o faz Marina Silva entre os ambientalistas. Não que não tenha as condições para exercer o mandato maior da Nação. Pelo contrário, ela e Palocci são, sem sombra de dúvida, os dois grandes nomes petistas da administração de Luiz Inácio Lula da Silva.

Dilma, porém, é uma imposição do Presidente aos correligionários e aliados, usando das prerrogativas que esta Republica Imperial confere a quem é bom de voto, para nomear o sucessor. Coisas de homem. Ela só foi a escolhida porque Palocci meteu-se naquela enrascada de todos conhecida, assim mesmo pela quebra do sigilo bancário do caseiro, não pelas farras de que participava porque, afinal, isso é "defeito de homem".

Nas repúblicas imperiais, a promiscuidade masculina até é recomendação, tanto ontem, quando Perón amava as ninfetas de 14 anos, quanto agora, com o bispo Fernando Lugo ostentando harém de causar inveja a "sheik" das Mil e Uma Noites. Imaginem vocês Dilma, ou Marina Silva, envolvida em algo parecido. No fragor da campanha, "galinha" até soaria como pregão de muezim exaltando as grandiosidades de Allah.

A candidatura de Dilma não foi empreitada fácil nem para Lula, dono da bola (PT) e do campinho (a sopa de letrinhas da chamada "base aliada"). Mal o nome se consolidou, veio a reação da própria "cumpanheirada". Estourou o caso do "dossiê" contra Fernando Henrique e Ruth Cardoso, gestado nas entranhas do Ministério da Justiça. Providenciou-se às pressas uma CPI no Senado, vieram o coice da oposição através da grosseria do senador José Agripino Maia e o canhonaço de correligionários, com o então ministro da Justiça, Tarso Genro, avisando a gregos e troianos – e principalmente às mulheres de Atenas – que a Polícia Federal não pouparia sequer os aliados em suas investigações.

O dito acabou por não dito quando José Dirceu mandou seu lugar-tenente, José Aparecido Nunes Pires, chamado pela revista Veja de "homem-bomba", avisar a quem interessar pudesse que ia jogar algo no ventilador, capaz de fazer bosta de dinossauro cheirar melhor que Chanel nº 5. O que era, o que não era, nunca ficou bem esclarecido. O então ministro Tarso Genro ainda resmungou, em entrevista ao jornal Zero Hora, que a falta de militância partidária de Dilma Rousseff era uma barreira para credenciá-la a uma candidatura ao Planalto, mas logo em seguida cuidou de se candidatar ao Governo do Rio Grande do Sul.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

Notas breves para uma história da corrupção – Jayme Copstein

Quando começou a corrupção e a impunidade no Brasil? Foram os portugueses que a trouxeram ou ela já estava aqui à espera de devotos que a cultuassem como religião?

Nem uma coisa nem outra. Pero Vaz de Caminha em sua longa carta a El-Rei D. Manoel, o Venturoso, relata uma cena de esperteza mútua, quando descreve um dos dois índios trazido ao navio capitânia, apontando para o colar de ouro no pescoço de Pedro Álvares Cabral e acenando para terra, como se oferecesse ouro por um colar de miçangas que lhe haviam presenteado.

"Isto tomávamos nós nesse sentido, por assim o desejarmos!" – descreve Caminha em sua carta. "Mas se ele queria dizer que levaria as contas e mais o colar, isto não queríamos nós entender, por que lho não havíamos de dar!"

Caminha não tinha necessidade de escrever a El-Rei, posto que – palavras dele – "o Capitão-mor desta Vossa frota, e assim os outros capitães escrevam a Vossa Alteza a notícia do achamento desta Vossa terra nova, que se agora nesta navegação achou, não deixarei de também dar disso minha conta a Vossa Alteza, assim como eu melhor puder, ainda que - para o bem contar e falar - o saiba pior que todos fazer!"

Então, por que o fez? Porque, sendo a terra tão "graciosa que, querendo-a aproveitar, dar-se-á nela tudo", aproveitou para plantar sua sementinha. Pero Vaz de Caminha ia para Calicut (cidade da Índia. Hoje se chama Kozhikode ) e bem no finzinho da longa missiva pede "singular mercê: "(...) mande vir da ilha de São Tomé a Jorge d'Osouro, meu genro". O qual genro, por acaso, estava preso em São Thomé por ter assaltado uma igreja e espancado o pároco.

Também as frequentes febres de moralização, tipo crime hediondo, ficha limpa, são antigas no país. Luiz Edmundo, em "O Rio de Janeiro do meu tempo", conta que Estácio de Sá, ao fundar a cidade do Rio de Janeiro, quase 400 anos antes do Presidente Eurico Gaspar Dutra proibiu o jogo, sob pena de rigorosa punição.

De pouco adiantou. Logo se descobriu que os soldados contrabandeavam os baralhos nas ceroulas, antecedendo também em mais de quatro séculos aquele pessoal do PT que andou escondendo dólares nas cuecas. Há de se entender que nem as ditas cujas tinham sido inventadas ainda e faltava muito para os Estados Unidos existirem.

A proibição de Estácio de Sá não durou muito, mas não foi porque ele morreu flechado pelos índios. Em 1606, a Imprensa do Rei de Portugal começou a imprimir baralhos para vender ao povo e ficou ou dito por não dito. Ninguém justificou a "benemerência" com desenvolvimento econômico e criação de empregos porque, naquele tempo, a demagogia era outra.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Shakespeare e o Brasil – Jayme Copstein

De repente, como se fosse rodízio em perpétua falta de assunto, o crescente aumento do número de acidentes e mortes no trânsito ocupa a cobertura dos jornais. Para quem apenas passa os olhos por cima do noticiário, sem preocupação de ser meticuloso e de fazer estatísticas, essa tendência ao crescimento sempre existiu.

Se me permitem a reminiscência, em julho de 1966 - há 44 anos - quando eu trabalhava na Revista do Globo, escrevi reportagem intitulada "50 pessoas marcadas", exatamente o número que se previa de mortes por atropelamento, exclusivamente no trânsito de Porto Alegre, caso se repetissem os números registrados no primeiro semestre daquele ano.

Pouco depois, em setembro, quando criaram o primeiro código nacional de trânsito, como repórter do Diário de Notícias me coube entrevistar uma comissão de técnicos que vinha instruir as autoridades locais na aplicação das novas leis. Só nos 15 minutos pela avenida Farrapos, percorrendo o trajeto entre a redação na Avenida São Pedro e o Plaza Porto Alegre, na Rua Senhor dos Passos, eu e o fotógrafo Niro Xavier Gaspary contamos mais de 50 infrações das regras mais comezinhas de segurança, mas nenhum guarda de trânsito para coibi-las.

Durante a entrevista contamos aos técnicos o que tínhamos presenciado. Ouvimos um belo discursos sobre a necessidade de educar para o trânsito, fiscalização eficiente etc. etc. etc. Para poupar tempo e fazer este texto caber dentro do espaço reservado à coluna, salto para 2008, quando se badalou do Oiapoque ao Chuí o advento da Lei Seca.

Eu apresentava, então, o programa Paredão na Rádio Pampa, e perguntei a um entusiasmado agente da Polícia Rodoviária Federal, se aquilo ia "pegar". Não havia bafômetros suficientes para equipar a fiscalização, o que também não tinha muita importância porque não havia sequer agentes em número suficiente para fiscalizar o cumprimento da lei. Mas havia promessas e ele confiava nelas.

Alguns meses depois, a Polícia Rodoviária Federal estava em greve por reivindicações salariais, as fiscalizações municipais já não "estavam mais nem aí" porque ninguém é de ferro, os bares desativaram a entrega domiciliar dos bebuns e tudo voltou ao que era dantes no quartel de Abrantes.

O que aconteceu com a Lei Seca é apenas um dos muitos itens desta questão do morticínio no trânsito – maior do que em todas essas guerras entre tribos africanas que também ocupam o noticiário. Houve escândalos em vários departamentos estaduais de trânsito, induzindo à suspeita de que requisitos mínimos de capacitação tenham sido passados por cima ao se habilitar a multidão de novos motoristas, surgidos com a facilidade de adquirir carros zero. Mas, agora, temos uma novidade para prevenir a morte das crianças nos acidentes: cadeirinhas especiais para acomodar crianças nos bancos traseiros. Faz dois anos que a resolução 277 do Contran criou a exigência só agora ela começa a ser cumprida. A ser cumprida? Como diz a colega Beatriz Fagundes – a conferir. Por falta de cadeirinhas, ficou tudo para setembro.

Enfim, nada muda. Tanto discurso, tanto blábláblá, tanta parolagem só induzem à conclusão: Shakespeare é o maior profeta nascido depois dos tempos bíblicos. Quando escreveu no Hamlet – "Palavras, palavras, palavras" – com toda a certeza estava vaticinando o futuro de um país recém-nascido, chamado Brasil.

A dança dos famosos – Carlos Brickmann (*)

A partir de agora, entretanto, a campanha esfria um pouco: é a hora da Copa. No fim do mês, vem a festa junina promovida pelo casal Lula-Mariza Letícia, na Granja do Torto. A festa dá pouco trabalho: cada convidado leva um prato típico. E, em Brasília, formar a quadrilha não chega a ser muito difícil.

Foi constrangedor: o candidato José Serra, mal-humorado, de gênio difícil, impaciente, precisou dançar algo chamado "Ah, Moleque", para atender a pedido da humorista Sabrina Sato - a mesma que fez o senador Eduardo Suplicy vestir uma cueca vermelha por cima do terno para imitar o Super-Homem.

Foi constrangedor: a candidata Dilma Rousseff, exausta de tantos compromissos de campanha - sabatina na Folha Serrana de Xiririca do Alto, palestra na União dos Plantadores de Frutas Exóticas, inauguração da ideia de construção de uma maquete da pedra fundamental do Obelisco Bolivariano de Carreiral - trocou o nome de uma de suas principais aliadas, e chamou-a de Márcia Suplicy.

Estamos chegando ao ponto principal de um longo processo, em que cada corrente política do país escolheu uma pessoa de prestígio e capacidade para representá-la; uma dessas pessoas receberá o encargo de dirigir um país cheio de problemas, mas com enorme potencial, nos próximos quatro anos. E essas pessoas, escolhidas entre as notáveis, entre as melhores de cada corrente política, passam a representar papéis que para elas nada significam, apenas para mostrar que também podem ser ridículos.

A campanha, uma caminhada pelo país, passa a não ter utilidade para os candidatos: em vez de assistir pessoalmente ao dia a dia e aos problemas da população, passam a preparar-se para resistir a maratonas antinaturais, a comer coisas exóticas (e malfeitas) a exibir seus parcos dotes humorísticos, a dançar músicas que em situações normais jamais ouviriam. Não é por aí.

Avancê!
A partir de agora, entretanto, a campanha esfria um pouco: é a hora da Copa. No fim do mês, vem a festa junina promovida pelo casal Lula-Mariza Letícia, na Granja do Torto. A festa dá pouco trabalho: cada convidado leva um prato típico. E, em Brasília, formar a quadrilha não chega a ser muito difícil.

Ah, Brasília!

Lembra do escândalo do Senado (um deles: aquele do excesso de funcionários)? Pois é, deu demissões, valeu a contratação de consultores para planejar o enxugamento da máquina, etc., etc.

Como o tempo já passou, tudo começou de novo: o Senado acaba de contratar empresas que terceirizarão o serviço de arrumação, cozinha, copa, e oferecerão garçons, jornalistas (ou melhor, "pessoal de comunicação social"), além de cuidar de serviços administrativos. Em bom português, são R$ 72 milhões por ano a mais.

Quase um milhão de gasto extra, diretamente do bolso de cada um dos leitores para cada um dos 81 senadores.

Ah, sim, as despesas novas não ficam só nisso: a mesma consultoria que fez o plano anterior de redução de gastos de pessoal foi contratada de novo, com o mesmo objetivo, naturalmente cobrando de novo, com a devida correção.

Fogo amigo

Como não disse Geraldo Vandré, é só para não dizer que não falamos do dossiê. Tudo indica que José Serra, embora seja o protagonista do dossiê, não seria seu alvo: o alvo era a própria equipe que produziu o dossiê, talvez induzida por inimigos de dentro do partido que, mais tarde, alegaram que a iniciativa era inaceitável, condenável e ineficaz, e que seus produtores deveriam cair fora da campanha. Vitória total: os produtores caíram fora. E o chefe de sua ala, Fernando Pimentel, candidato ao Senado por Minas, também balança na campanha: deve receber passe livre para dedicar-se só à sua candidatura. Neste momento, a equipe que toca o barco de Dilma é a que gira em torno de Marta Suplicy.

Fogo inimigo

Quanto a Serra, aparentemente aproveitou a oportunidade: já que havia um dossiê contra ele, denunciou-o, de um lado para colocar-se como vítima, de outro para desqualificá-lo, se trouxesse novidades. O tema continuará em debate por mais algum tempo, até que a Copa o esfrie de vez. Depois da Copa, se alguém quiser reavivar o debate, terá de apresentar novos fatos - talvez o lançamento do livro que engloba todas as acusações contra Serra e parentes.

A greve, sim e não

O STJ, Superior Tribunal de Justiça, determinou que a Federação Nacional dos Trabalhadores do Judiciário Federal e Ministério Público da União mantenham em atividade, durante sua greve, pelo menos 60% dos trabalhadores. Caso a determinação não seja cumprida, haverá multa de R$ 100 mil por dia de desobediência.

Tudo muito bom, tudo muito bem, mas até agora os sindicatos que não cumpriram decisões judiciais conseguiram evitar o pagamento das multas. Se o próprio presidente da República debocha das multas que a Justiça lhe impôs, que esperar de um sindicato numa hora de radicalização?

(*) Carlos Brickmann, colunista do Observatório da Imprensa, do Diário do Grande ABC, antigo editor-chefe da Folha de São Paulo, é dono de invejável currículo no jornalismo brasileiro