domingo, 20 de junho de 2010

O riso das urnas – Jayme Copstein

Criada para moralizar a política no Brasil, a Justiça Eleitoral não só não conseguiu eliminar os gatunos que se organizam em bandos na vida pública como acabou com o que havia de engraçado na época de campanha. Cabe aqui a frase desgastada – já não se faz mais eleição como antigamente.

Que saudades daquele Brasil que não levava nada a sério e ria de tudo, principalmente dos seus políticos. Nesta época de campanha eleitoral, se fosse como antes, já estaríamos todos rindo das gafes e até das atribulações dos candidatos.

Nunca me esqueço, ali nos anos 50 do século passado, de quando Raul Gudolle, recém se iniciando sua vida pública e pagando tributo à inexperiência, candidatou-se a deputado estadual. Mal inspirado por conta própria ou mal aconselhado por algum, marqueteiro incompetente, encheu todos os muros e paredes disponíveis da cidade com apenas seu sobrenome – Gudolle.

Em toda parte que se andasse, estava ali o nome desconhecido, sugerindo mistérios. Por azar, um de seus pichadores pintou o nome em letras garrafais na parede recém-caiada de um bar da Avenida Cristóvão Colombo.

Furioso, o dono do bar não titubeou: embaixo daquele imenso Gudolle, escreveu: "Uma delícia, de gole em gole". E criou um aperitivo com este nome que, dizia ele, fazia muito sucesso entre a freguesia.

Gudolle, com o correr dos anos, teve presença na política e tornou-se advogado de renome. A historinha ficou nos anais da cidade, na boa companhia de Jorge Achutti que durante muitos mandatos, sempre reeleito, exerceu a vereança em Porto Alegre, representando o Bairro Floresta.

Certa vez, teve de enfrentar um concorrente que era de outra parte da cidade. Para realçar a sua condição de habitante do bairro, fez escrever nas paredes: "Achutti! Nasceu na Floresta, se criou na Floresta, vive na Floresta". Para o adversário foi bola picando na área. Seus pichadores escreveram embaixo: "Então, mata que é bicho".

Menos sorte, ainda, teve o dono de uma pequena chácara em Belém Velho, aonde só ia em fins de semana, assim mesmo para comer churrasco. Apesar disso, nunca deixava de apregoar aos quatro ventos a sua condição de "pequeno e sofrido agricultor".

Candidato a deputado, o homenzinho se arvorou em defensor do agronegócio. No único comício que organizou para defender suas ideias, bradou com toda a força dos pulmões: "Eu sou da terra, vivo na terra, não saio da terra!"

Foi quando alguém, no meio dos pouco assistentes, gritou: "Cala a boca, minhoca!". O candidato achou que era demais e decidiu desistir de salva a pátria, voltando aos churrasquinhos de fim de semana.

A Justiça Eleitoral, dificultando a propaganda e proibindo os comícios, não conseguiu terminar com o riso das urnas. Na enxurrada de queixas que recebe diariamente, por esta época, em uma cidade do Interior um candidato denunciou o adversário Toníco Bayer por abuso de poder econômico. Além de grandes painéis que excediam em muito as dimensões permitidas, o tal adversário ainda omitia o nome do partido pelo qual concorria.

O juiz ficou intrigado porque não havia candidato registrado com aquele nome. Resolveu averiguar "in loco" o abuso. Quando chegou ao local, teve de se beliscar para não cair na gargalhada na frente do queixoso: o cartaz de Tonico Bayer não passava de "outdoor" do Tônico Bayer, medicamento muito popular, à venda em qualquer botequim de beira de estrada de qualquer paragem perdida neste imenso Brasil.

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