quinta-feira, 10 de agosto de 2006

Fumaça numerada - Jayme Copstein

Curioso como a mídia engoliu, sem tugir nem mugir, a entrevista de um dirigente do Bradesco, justificando a exorbitância dos lucros fora de qualquer bitola mundial, obtidos pelo banco. As perguntas do entrevistador era de uma infantilidade e de uma superficialidade comovedoras: diziam respeito nitidamente aos seus problemas pessoais no enfrentamento dos juros extorsivos do cheque especial ou do cartão de crédito.
O banqueiro saiu com aquele caminhão de estatísticas, cortina de fumaça inventada pelos tecnocratas nos anos 60 para esconder o pulo do gato quando se tenta abrir a caixa preta. Candidamente, mostrou os enganos do jornalista. Dos bilhões de reais investidos pelo Bradesco em financiamentos a juros que significariam longa sentença de prisão em qualquer país decente, só 2% estão no cheque especial, onde cobram quase 200% ao ano e assim mesmo porque, como todos sabem, são os maus pagadores que obrigam os coitados dos bancos a cobrar seus prejuízos dos bons pagadores.
O entrevistador limitou-se a perguntar se isso era justo e encerrou a entrevista aí. Mas, e o cadastramento de clientes, cobrado e bem cobrado, também a preços escorchantes, cuja finalidade é apurar se o postulante de um empréstimo tem capacidade para pagar a dívida que contrai, onde fica isso? E essa artimanha que transformou o comércio varejista em mero angariador de empréstimos bancários, a juros mensais de 4,8%, informação sonegada na propaganda enganosa do preço à vista ou em 10 prestações sem juros?
O banqueiro veio com outra conversa mole: 15 bilhões de reais – 25% do investimento é destinado ao financiamento de carros, a juros módicos, pasmem vocês, de apenas 2,7% ao mês. É uma taxa de agiotagem que, em país sério, daria cadeia. Não se precisa de grande pesquisa para desvendar a tramóia: a caderneta de poupança rende entre 0,66% e 0,77% - ou seja, 0,5% ao mês, taxa de juros normal para poupança em qualquer país do mundo, e mais entre 0,15 e 0,22%, correspondente à correção monetária pela inflação, que só existe no Brasil e em alguns outros países em desenvolvimento. Portanto, a taxa de juros para financiamento de carros deveria ser, no máximo de 1,22%. Como se explica o 1,48% a mais, o dobro de que legal e decentemente deveria ser cobrado?
O banqueiro disse, também, que a fonte principal desses lucros alibabescos vinha do setor de seguros. Ah! Os seguros. Há poucos dias, estava nos jornais a denúncia de que participantes de um grupo chamado de executivos, que a seguradora, após 30 anos de religiosa contribuição, havia exigido do segurado o aumento da mensalidade, de 66 reais para 931, 76 – 1.412 % para que a sua família consiga receber os mesmos 81.500 contratados da apólice.
Essa é apenas uma análise superficial deste crime, muito bem organizado e bem argumentado, que se pratica no Brasil, sob o olhar maternal das autoridades ditas políticas, monetária, fazendárias, o que rimar com isso. Em matéria de autoridade moral, isso é outra conversa.

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