quinta-feira, 25 de maio de 2006

Novela da vida real - Jayme Copstein

O juiz Joaquim Domingos de Almeida Neto, da 9ª Vara Criminal do Rio de Janeiro, acaba de demonstrar que o código dos rábulas de porta de cadeia não prevalece sobre a justiça quando o magistrado não se escraviza, como autômato, à rotina da indolência e da mediocridade. Coube a ele julgar o ator Kadu Moliterno, processado por dar um soco na cara da esposa, Ingrid Saldanha, quando ela o advertiu pela imprudência com que dirigia o carro em que viajavam.
O ator não alegou ao juiz que, por distração, pensou estar em um estúdio de tevê, protagonizando um vilão de novela. A defesa apenas pediu a habitual conversão da pena em cestas básicas, como se fez recentemente no Rio Grande do Sul, onde alguns milhares de reais foram trocados por dúzia e meia de vinténs.
O juiz Joaquim Domingos de Almeida Neto não aceitou a transação. Ponderou com raro senso de realidade: “Como o ator tem elevado padrão financeiro, submetê-lo a uma pena financeira serviria como reforço à sensação geral de impunidade”.
O magistrado não se referiu a nenhum outro caso, especificamente, mas as suas palavras expressam a perplexidade e a desconformidade da sociedade brasileira com a leniência de alguns tribunais, diante da riqueza ou da popularidade dos réus.
Kadu Moliterno foi condenado a um ano de serviços comunitários. Até maio de 2007, será obrigado a trabalhar oito horas por semana no Lar Maria de Lourdes, Zona Oeste do Rio de Janeiro.
Mais ainda: terá que prestar depoimento a um programa de tevê, sobre o episódio e contar como se relacionou, desde então, coma ex-mulher.
Eis o final perfeito para uma novela da vida real.

2 comentários:

  1. Juiz e autor do blog estão de parabéns - um pela decisão, e o outro pelo texto.

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